1 a Aula 2006.09.13 AMIV ! " # $ % &' # % ( # " # ) * # + 1.1 Um pouco da história dos números complexos. Considere-se a seguinte equação , z + 2z + 5 = 0. Aplicando precipitadamente a fórmula resolvente para equações quadráticas obtemos as raízes: √ √ z = −1 + −4 e z = −1 − −4. √ Do ponto de vista da análise , real o símbolo −4 não está definido e por outro lado a identificação da expressão z, + 2z + 5 com o gráfico de uma parábola retira qualquer dúvida sobre o facto da equação z + 2z + 5 = 0 não ter raízes reais. Contudo, se utilizarmos as seguintes as regras formais: √ , √ √ , −a = |a| −1 e −1 = −1, obtemos objectos "imaginários" z = −1 ± √ √ −4 = −1 ± 2 −1, , que podem ser considerados raízes da equação z + 2z + 5 = 0. De facto, formalmente temos: √ , √ √ √ −1 ± 2 −1 + 2 −1 ± 2 −1 + 5 = 1 ∓ 4 −1 − 4 − 2 ± 4 −1 + 5 = 0. Este tipo de considerações teve uma importância histórica na resolução de equações, não do segundo grau (que eram bem compreendidas na altura), mas do terceiro grau quando ainda se desconhecia uma forma de resolução geral destas equações. No século XVI, o matemático Cardano aperfeiçoou uma misteriosa fórmula resolvente para equações / do 3- grau (fórmula de Cardano). Esta fórmula aplica-se a equações da forma . normal x + px + q = 0 e escreve-se (em notação actual) , / 0 q p1 q p x=u− onde u = − + + . 3u 2 4 27 0 4 Contudo,0 embora4 esta fórmula funcionasse muito bem em certos casos ( 1 , 2 − 3 5 ), havia outros ( 1 , 2 < − 3 5 ) em que a fórmula envolvia as imaginárias raízes quadradas de números negativas. O caso era ainda mais misterioso pois eram conhecidos exemplos de equações cúbicas com três raízes reais em que a referida fórmula supostamente não funcionava por envolver raízes quadradas de números negativos. 6 798!: ; < 8 = >?= < !8 : @ A BC B9D EF > : 8HG =I!B C =J > : K!G L B > MN: >?K 8 MO:P= < 8!: @ A BQ B MR= G J :PL B > MO:9: J > : S T G?C =8 MN:MH8!C : K!@ : C =S : > U V S = U G ;UK = : > W 1 AULA 2006.09.13 AMIV Exemplo 1.1 Para a equação " $ % ! # ! & 2 / x − 15x − 4 = 0, G. Cardano (princípio do séc. XVI) obteve a solução' 0 0 √ √ x = 2 + −121 + 2 − −121. (1.1) Mais tarde R. Bombelli (meados do séc. XVI) observou que formalmente e 2+ √ √ √ = 2 + 11 −1 = 2 + −121 / −1 √ √ / 2 − −1 = 2 − −121 Pelo que uma solução da equação (1.1) é √ √ x = 2 + −1 + 2 − −1 = 4 √ √ As outras duas soluções (reais!), −2+ 3 e −2− 3 podem ser obtidas de forma semelhante ou através da regra de Ruffini. O mistério adensava-se. Só no princípio do séc. XIX é que Gauss e outros matemáticos, conseguiram um cada número imaginário , √ avanço significativo neste problema, identificando da forma x + y −1 com um ponto (x, y)√do plano (real- R ). Outra barreira psicológica que foi ultrapassada, foi a de ver o símbolo −1, não como uma raiz inexistente de uma certa equação, mas como um número de pleno direito, designado por , i, que era exterior ao corpo de números reais conhecidos, e que satisfazia a propriedade i = −1. Portanto, por um lado concretizou-se com uma interpretação geométrica, por outro lado idealizou-se alargando o conceito de número. ( ) * + , -#. /1012435768 9 , :;0#<243#<=56 <=5?> 3#6 08 @#, A /1B C ,*, B C#* D E /F#G * 3 < 576 < 5?> 3#6 0H4I J 0H7K2ML N OQP R *S P * R T P U , T R * P , V 3<Q56 <=H7K2ML 3#62WJ X . / -#. , P ,/ Y R S :;*, B C#* D E /B C#* . Z [ R T G *, :\3#< ] 3^_HK 3 < 5MI ` J2ML N / , P R *, B C#* D E /F#G * :/ P G / :3#<2M`Qbc HI ` I Q d e, R , Z : T #- * . / * PfR Z g P Z * h + , P G i Y T G * P . ,j @#/ ZQ, k , :@ A / l a , P / A 9 , -#. `5 c HI ` I / Y R , :/ P * = Z g / A # C D m , . * , B # C * D E 1 / G i Y G * / Z * f A * Z * P R P_P P T Tn T R 9 SP . , 012pq o `5 c HI ` I=5 J N r o `5?c H I` I 1 AULA 2006.09.13 AMIV 1.2 " $ % ! # ! & 3 Propriedades algébricas e geométricas Os números complexos (ou números imaginários) podem ser vistos como o conjunto dos pontos do plano (Plano complexo ou diagrama de Argand) munidos da adição vectorial e de um produto abaixo descrito. Temos pois uma identificação natural entre R ' e C: (a, b) ↔ a + ib. Os números complexos formam um corpo munido da soma e do produto C = {x + iy : x ∈ R, y ∈ R} , z ( + z = (x ( + iy ( ) + (x + iy ) = x ( + x + i (y ( + y ) ' ' ' ' ' z ( z = (x ( + iy ( ) (x + iy ) = x ( x − y ( y + i (y ( x + x ( y ) . ' ' ' ' ' ' ' Note-se que a soma é a soma vectorial usual e o produto generaliza o produto de um escalar por um vector (y ( = 0). Dar um número complexo z ∈ C, z = x + iy, é portanto dar um par de números reais, x, y ∈ R, designados respectivamente por parte real ( x = Re z) e por parte imaginária (y = Im z) desse número complexo z. Note-se que z = Re z + i Im z e que Im z ∈ R. O eixo real {z ∈ C : Im z = 0} corresponde ao eixo das abcissas, que pode ser considerado o conjunto dos números reais R como subconjunto do plano C dos números complexos ( se x ∈ R, então x = x + i0 ∈ C), notando que a soma e o produto em R são a restrição da soma e do produto em C (y ( = 0 e y = 0). ' Da mesma forma temos o eixo imaginário {z ∈ C : Re z = 0} corresponde ao eixo das coordenadas. O conjugado de um número complexo z = x+iy é o número complexo z = x−iy = x+i(−y). Corresponde ao ponto que se obtém por simetria em relação ao eixo real. Munidos desta operação podemos escrever Re z = z+z 2 e Im z = É imediato verificar a seguinte propriedade z( z = z( z , ' ' z−z . 2i i. e. o conjugado do produto é igual ao produto dos conjugados. Do mesmo modo se verifica que o produto de um número pelo seu conjugado é sempre um número real não negativo: zz = x ' + y ' . 1 AULA 2006.09.13 AMIV " $ % ! # ! & 4 O Módulo de um número complexo é definido por √ |z| = zz = x ' + y ' corresponde à norma em R ' . O módulo da diferença entre dois números complexos z ( = x ( + iy ( e z = x + iy é igual, portanto, à distância entre os pontos do plano que estes ' ' ' números representam |z ( − z | = (x ( − x ) ' + (y ( − y ) ' . ' ' √ ' Por outro lado, se Im z = y = 0, então |z| = x ' = |x|, concluindo-se que o módulo de um número complexo é também a generalização da função módulo real de variável real. Temos então que |z| é um número real não negativo, sendo nulo apenas no caso z = 0. Temos ainda as seguintes propriedades bem conhecidas: (desigualdade triangular) e ||z ( | − |z || |z ( + z | |z ( | + |z | ' ' ' max {|Re z| , |Im z|} |z| |Re z| + |Im z| ( |x| x ' + y ' |x| + |y|). Por outro lado |z ( z | = |z ( | |z | ' ' (o módulo do produto é igual ao produto dos módulos), de facto |z ( z | ' = z ( z z ( z = z ( z z ( z = z ( z ( z z = |z ( | ' |z | ' . ' ' ' ' ' ' ' ' Facilmente se verifica que C é um corpo em que o elemento neutro da adição é 0 = 0 + i0 e o elemento neutro de multiplicação é 1 = 1 + i0. Em particular para cada z ∈ C \ {0} existe 1 um (único) inverso w ∈ C (i. e. wz = 1 ou w = = z ( ), que facilmente se verifica ser z dado pela expressão 1 ( z = z. |z|' ( ( De facto zz = |z| ' = 1. Ou seja (x + iy) ( = x y −i x' + y ' x' + y ' Sendo C um corpo, tal como R, diferencia-se deste, porque C não é ordenado. Por outro lado a diferença com R ' consiste na operação produto; em C a multiplicação de dois pontos do plano é ainda um ponto do plano. Curiosa é a relação do produto de números complexos e o produto interno e externo de vectores no plano: (x ( + iy ( ) (x + iy ) ' ' (x ( − iy ( ) (x + iy ) ' ' x ( x + y ( y + i (x ( y − y ( x ) ' ' ' ' (x ( , y ( ) . (x , y ) + i (x ( , y ( ) × (x , y ) ' ' ' ' No entanto para interpretarmos geometricamente o produto de números complexos, convém representar os números complexos (pontos do plano) em coordenadas polares. z( z ' = = = = 1 AULA 2006.09.13 AMIV 1.3 " $ % ! # ! & 5 Representação polar dos números complexos Dado o número complexo z = x + iy, a sua parte real x e a sua parte imaginária y, podem ser representadas em coordenadas polares ρ e θ: x = ρ cos θ Pelo que Temos então e y = ρ sen θ. z = ρ (cos θ + i sen θ) . e ρ = |z| θ = arg z. O argumento de um número complexo z (diferente de zero), arg z, é o ângulo que o segmento de recta que une 0 a z faz com eixo real, medido no sentido positivo (contrário aos ponteiros do relógio) e definido a menos da adição de um múltiplo inteiro de 2π. O produto de números complexos é facilmente descrito em temos de coordenadas polares: = ρ ( (cos θ ( + i sen θ ( ) ρ (cos θ + i sen θ ) ' ' ' = ρ ( ρ [cos θ ( cos θ − sen θ ( sen θ + i (cos θ ( sen θ + sen θ ( cos θ )] ' ' ' ' ' = ρ ( ρ [cos (θ ( + θ ) + i sen (θ ( + θ )] . ' ' ' Portanto no produto de dois números complexos multiplicam-se os módulos e somam-se os argumentos. O que motiva a seguinte definição: e = cos θ + i sen θ. z( z ' De acordo com esta definição temos: e =1 Note-se ainda que (com θ ∈ R) e e =e e e e =e e = 1. . Um número complexo escreve-se, então, na forma polar, do seguinte modo: z = ρe . (1.2)