ID: 34680958 25-03-2011 Tiragem: 18000 Pág: 39 País: Portugal Cores: Cor Period.: Semanal Área: 27,76 x 15,17 cm² Âmbito: Economia, Negócios e. Corte: 1 de 1 PEDRO AZEVEDO Administrador da Golden Assets O império do Sol Nascente O terramoto de 9.0 na escala de Richter (e o tsunami que se lhe seguiu) matou já 8400 pessoas, excedendo as 6400 vítimas da tragédia de Kobe (6.8 na escala de Richter). A concomitante crise na central nuclear de Fukushima provocou interrupções na produção industrial no Japão e à volta do mundo, devido à escassez de encomendas de componentes provenientes do país do sol nascente. A Sony anunciou que fechou oito fábricas em Fukushima, Ibaraki e Miyagi, enquanto a Toyota apenas retomou os trabalhos em 21 fábricas no dia 22 de Março. Segundo estudo da JP Morgan, o crescimento nipónico abrandará para apenas 0.9% este ano (+4% em 2010), devido a uma queda prevista de 5% na produção industrial, durante o próximo trimestre. O iene manteve-se forte, nos últimos três anos, devido à robustez das suas exportações, mitigando assim o efeito provocado pela deterioração das finanças públicas. O Japão obteve sempre um superávit na balança de transacções correntes desde 1986. Isto significa que, ao contrário dos Estados Unidos ou da Zona Euro, os nipónicos nunca precisaram de capital estrangeiro para financiar o défice das contas públicas. No entanto, e à luz dos mais recentes e catastróficos desenvolvimentos, este “status-quo” poderá estar em risco: os estragos provocados pelo terramoto/ tsunami irão provocar um aumento das importações – à medida que o país se vai reconstruindo – e limitar as exportações devido a descontinuidades de produção, factores que poderão ajudar a enfraquecer o iene. Nos dias que se seguiram a tão dramático evento, os investidores pareceram menosprezar o potencial efeito descrito no parágrafo anterior, preferindo o habitual refúgio na moeda japonesa, num fenómeno habitualmente descrito como de “flight-to-quality”, mecanismo usual em tempos de crise. Mas o Ministério das Finanças (e o Banco Central) japonês, bastante atento, solicitou a cooperação do G7 – grupo dos sete países mais desenvolvidos do mundo – o que provocou uma intervenção cambial como não havia memória neste século, trazendo o iene de volta a níveis semelhantes ao pré-sismo. Apesar disso, nos próximos três meses, a fraqueza do iene poderá ser limitada pelo fantasma do repatriamento. Segundo fontes do mercado, a reconstrução pósterramoto de Kobe significou um custo de 9,9 triliões de ienes (equivalente a 2% do PIB japonês nessa altura), valor que se supõe ser significativamente superior desta vez. Assim, as autoridades japonesas poderão promover a venda de activos que possuem em moeda estrangeira (líquidos, como, por exemplo, dívida pública americana). A ocorrer, este fenómeno deverá manter a moeda nipónica bem suportada, obrigando a mais intervenções cambiais do G7. Interessante será verificar também qual o comportamento dos “treasuries” (dívida pública) americanos nos próximos 3 meses, à medida que as autoridades japonesas forem repatriando fundos. É de prever uma queda do preço das obrigações (subida dos yieds) nos próximos tempos. Irá o FED substituir as previsíveis vendas japonesas por mais recompras de dívida? Será que esta situação trar-nos-á o QE3 (“quantitative easing”, ou processo em que a política monetária é deixada perto de zero, acompanhada por recompra de activos, na sua versão 3, qual sequela de filme série B)? Aguardemos, mas acreditamos que o 2º Semestre do ano nos trará um maior enfraquecimento do iene, à medida que o diferencial de taxas de juro entre os países desenvolvidos e o Japão se vá alargando, ajustando-se ao ciclo de cada economia. O futuro o dirá. Até lá, importa realçar aqui a tenacidade, o sentido de organização e a disciplina admirável dos cidadãos japoneses, os quais deram uma lição a todo o mundo ocidental de como enfrentar uma crise profunda com resiliência e sem criar o caos nas ruas. Para eles, com eles, aqui ficam os votos de profundo pesar, mas também de significativa admiração. Bem hajam!