ENCARTE ESPECIAL John DEWEY = Democracia e Educação

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ÁGORA Revista Eletrônica
Ano XII
Nº 23
Dezembro de 2016
Páginas 154 - 158
ISSN 18094589
ENCARTE ESPECIAL
John DEWEY = Democracia e Educação: introdução à filosofia da educação
RESENHA - DEWEY, John. Democracia e educação: introdução à filosofia da
educação. 4.ed. São Paulo: Nacional, 1979. Capítulo 7 : A concepção democrática de
educação.
Junior Bufon Centenaro1
Dewey retoma no início do capítulo a ideia de que a educação pode existir em
qualquer grupo social. Seu principal objetivo, nessa parte, é problematizar a afirmação
existente de “que a educação é uma função social que assegura a direção e o desenvolvimento
dos imaturos” (p. 87). Esse processo de educação, na visão de Dewey, ocorre na relação do
imaturo com a comunidade onde está inserido, e, por isso, “a educação variará de acordo com
a qualidade de vida que predominar no grupo” (p. 87). Nesse sentido, cada sociedade ao ter
suas particularidades terá normas e métodos educacionais diferentes que aspirem a
perpetuação de seus próprios costumes. O problema em questão é o de como pensar ideias
gerais que se apliquem as práticas educacionais peculiares. Para isso, tratar da natureza da
presente vida social apresenta-se como ponto de partida.
O capítulo sete está subdividido em cinco tópicos. O primeiro tematiza o que
subentende a associação humana, o segundo o ideal democrático, o terceiro a filosofia
educacional platônica, o quarto o ideal individualista do século XVIII e o quinto a educação
sob o ponto de vista nacional e social. Do terceiro ao quinto tópico Dewey faz uma análise
crítica de cada uma das concepções elencadas, tidas como basilares para a filosofia da
educação, apontando potencialidades e limites de cada uma. Em todos os tópicos do capítulo,
paira a ideia da constituição da democracia como forma de vida.
No item O que subentende a associação humana Dewey inicialmente expõe o que
subentende a associação humana, ou seja, os “homens associam-se de todos os modos e para
todos os fins” (p. 87). O termo “sociedade” implica uma ambiguidade, pois possui dois
sentidos, sendo um o normativo (sua natureza, plano teórico do que ela é) e outro pelas
constatações do que é praticado que não é unitário e, “sim uma pluralidade de associações
boas e más” (p.88). Haverá os que dirão que muitas associações não satisfazem aos ideais de
sociedade e, por outro lado, os que dirão que se torna tão ideal a noção de sociedade que
chega a ser inútil, por não poder se aplicar aos fatos. Dewey acrescente que, “toda educação
ministrada por um grupo tende a socializar seus membros, mas a qualidade e o valor da
socialização dependem dos hábitos e aspirações do grupo” (p. 88-89).
1
Licenciado em Filosofia pela Universidade de Passo Fundo (2016), Pós Graduando em Espiritualidade pela
Itepa Faculdades.
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No tocante da sociedade, o problema é conciliar dois extremos: primeiro de criar uma
sociedade ideal e outro de reproduzir as formas encontradas na realidade. “É preciso extrair os
traços desejáveis das formas de vida social existentes e empregá-los para criticar os traços
indesejáveis e sugerir melhorias” (p. 89). Uma característica desejável que exista nos grupos
sociais é o interesse comum. Contudo, um governo despótico não possibilita interesse comum
entre governantes e governados. Para Dewey, nesse modo, “equivale dizer que não há livre
reciprocidade do dar e receber entre os membros do grupo social” (p. 90). Numa sociedade é
preciso possibilitar intercâmbio, compartilhamento de interesses e variedade de estímulos que
“significa novidade e novidade significa desafio e provocação à pesquisa e pensamento” (p.
91). Quando as fortes divisões de classes impedem a mútua comunicação das experiências os
estímulos intelectuais tendem a ser uma rotina para as classes menos favorecidas e capricho,
impulsivo e sem motivos para as classes em boa situação material.
A não existência de reciprocidade de interesses entre os membros de um grupo social
ou entre grupos sociais entre si acarreta isolamento que “tende a gerar, no interior do grupo, a
rigidez e a institucionalização formal da vida, e os ideais estáticos e egoístas” (p. 92). Sobre
isso, Dewey ressalta que as épocas de expansão na história da humanidade possibilitaram a
aproximação entre povos e classes antes tidas como isoladas.
No segundo item, o ideal democrático, Dewey continua expondo que a orientação dos
grupos sociais, numa nova perspectiva educacional, que deve dirigir-se para a democracia. O
primeiro traço para isso é reconhecer os interesses recíprocos como fatores da regulação e
direção social. Afirmar isso, significa que são fundamentais os numerosos e variados pontos
de participação do interesse comum.
O segundo traço é a contínua readaptação dos grupos sociais para juntarem-se as
novas instituições criadas pelos intercâmbios. Isso implica cooperação mais livre entre os
grupos sociais e mudanças de hábitos sociais. Para Dewey, “estes dois traços são
precisamente os que caracterizam a sociedade democraticamente constituída” (p. 93).
O amor que a democracia tem pela educação é cediço e os pertencentes a grupos
sociais recíprocos e comunicativos precisam ser constantemente educados. Nessa perspectiva,
“uma democracia é mais que uma forma de governo; é, principalmente, uma forma de vida
associada, de experiência conjunta e mutuamente comunicada” (p. 93). Por outro lado, a
fatalidade numa sociedade estratificada em classes separadas é inevitável e, deve procurar
fazer que as oportunidades intelectuais sejam acessíveis a todos os indivíduos igualmente. A
divisão de castas faz com que a sociedade se preocupe apenas em educar a classe dirigente.
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Por outro lado, uma sociedade móvel, “cheia de canais distribuidores de todas as mudanças
ocorridas em qualquer parte, deve tratar de fazer que seus membros sejam educados de modo
a possuírem inciativa individual e adaptabilidade” (p. 94).
Após expor seu ideal democrático Dewey adentra nas consequências das ideias
democráticas de educação com o item A filosofia educacional platônica. Nesse capítulo sete,
aprofunda três teorias educacionais de épocas bem distintas. A primeira delas, presente no
item três, é a filosofia educacional platônica. Para Platão, “uma sociedade se acha organizada
estavelmente, quando cada indivíduo faz aquilo para o que tem especial aptidão, [...] e que a
tarefa da educação se limita a descobrir estas aptidões e exercitá-las progressivamente para
seu uso social” (p. 95). Uma educação nesses moldes, seleciona o indivíduo, descobrindo
aquilo para que ele serve, proporcionando meios de determinar a “cada um, o trabalho para o
qual a natureza o tornou apto” (p. 96).
Em Platão, nem a riqueza e nem o nascimento em determinada casta deveriam
determinar o lugar do indivíduo, mas por sua própria natureza, descoberta no processo da
educação. O número reduzido de aptidões com que Platão trabalha revelam que os indivíduos
tornam-se meros servidores do estado, defensores na guerra e seladores internos da paz. “Sua
teoria da limitação de aptidões e de castas chegou, de fato, a consequência da subordinação da
individualidade à organização social” (p. 97).
A concepção platônica mostra seus limites ao sugerir que a verdadeira educação
surgiria quando se atingisse o estado ideal e sua tarefa seria conservar o mesmo. Dewey
afirma que, nessa esteira, “a educação logo atingiria um limite estático em cada classe, pois só
a diversidade cria mutação e o progresso” (p. 96).
O quarto item trata do ideal individualista do século XVIII, que é o segunda
concepção educacional que analisa no presente capítulo. Um dos grandes expoentes dessa
concepção é Rousseau, e para ele “a educação de acordo com a natureza fornece o alvo e o
método de instruir e disciplinar” (p. 98).
Porém, os dotes inatos ou originários são considerados como não sociais. Apesar de
sua filosofia ser aparentemente antissocial, abriu espaço para a concepção de uma sociedade
mais ampla e livre ao cosmopolitismo. Agora os indivíduos estão na condição de membros da
humanidade, e não apenas do estado como na concepção platônica, libertando-se as aptidões
dos homens. Comenta Dewey que “nas organizações políticas existentes essas aptidões são
reprimidas e falseadas para satisfazerem as exigências e interesses egoísticos dos detentores
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do governo” (p. 98). O conceito de individualista creditava certa perfectibilidade ao homem, e
sendo indivíduo emancipado, seria um fator importante de uma sociedade progressista.
Em A educação sob o ponto de vista nacional e social, a terceira concepção analisada
é sob o ponto de vista nacional e social que considerava impróprio confiar simplesmente tudo
a natureza que significava negar a própria ideia de educação e entregá-la as circunstâncias.
Além de um método, era necessário algum órgão próprio ou instituição administrativa que
assumisse o trabalho da educação escolar. Dewey cita que, “Pestalozzi reconheceu que um
eficaz empreendimento baseado no novo ideal educativo exigia o amparo dos poderes
públicos” (p. 100). O movimento que desencadeou o ideal democrático transformou-se numa
campanha de criação de escolas públicas, pois pôr em “prática novas ideias sobre educação,
ideias destinadas a criar uma nova sociedade, dependia, ao cabo e tudo, da ação dos estados
existentes” (p. 100).
Os ideais da filosofia germânica geraram grandes transformações na Europa, na
medida em que a educação tornou-se uma função cívica e esta, por sua vez, se identificou
com a realização do ideal de estado nacional. Por isso, “formar o cidadão, e não o ‘homem’,
tornou-se a meta da educação. [...], a atenção sistemática voltada para a educação era o
melhor meio de recuperar e manter a integridade e soberania política” (p. 100-101). O estado
afastou de certo modo a teoria individualista e começou a fornecer os meios para manter as
escolas públicas e os objetivos delas. Para Dewey, “a educação foi considerada mais como um
adestramento disciplinar do que como meio de desenvolvimento pessoal” (p. 101). A filosofia
da educação fez um esforço de conciliar duas tendências muito fortes, “a da completa
expansão da personalidade e a da total subordinação “disciplinar” às instituições existentes”
(p. 102).
Nessa concepção, novamente o indivíduo fica subordinado as instituições de estados
particulares centrados em si mesmos, defendendo-se dos vizinhos rivais, dado que, “cada
geração propende a educar os jovens para agir no seu tempo, em vez de atender a finalidade
mais própria da educação, que é conseguir a melhor realização possível da humanidade como
humanidade” (p. 102).
Perante essas tensões cabe a pergunta: “será possível, para um sistema educativo, ser
dirigido pelo estado nacional, e mesmo assim, conseguir-se que não seja restringida,
constrangida e deturpada a perfeita finalidade social da educação?” (p. 105). Para Dewey as
facilidades escolares devem ser asseguradas, de modo que contribuam com a redução dos
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efeitos das desigualdades econômicas e que todos os cidadãos tenham igualdade na
preparação de suas futuras profissões.
Dewey conclui o capítulo afirmando que o “ideal genuíno da educação como a
expansão das aptidões do indivíduo em um desenvolvimento progressivo orientado para fins
sociais” (p. 106), consiste num sóbrio e nobre desafio. Só assim haverá coerência na aplicação
de um critério democrático de educação.
O capítulo A concepção democrática de educação da obra Democracia e Educação
certamente é um referencial importante para todos aqueles que desejam realizar um
aprofundamento maior da concepção democrática de educação de Dewey, que vai além de um
modo de governo, mas consiste numa forma de vida intensamente comunicativa e com o
grande objetivo de uma maior realização possível da humanidade como humanidade. O
grande exame das principais teorias educacionais ocidentais lhe permite mapear e situar o
desafio da educação ser pensada como fim em si mesma, não sendo simples meio para fins
diferentes e ulteriores. Cabe ressaltar, ainda, o estilo agradável de escrita do autor que expõe
cuidadosamente as ideias que busca diferenciar e elencar. Por fim, destaca-se que o presente
capítulo é essencial para a compreensão da obra Democracia e Educação como um todo.
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