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POLÍTICAS DE COTAS NO ENSINO SUPERIOR: A FAVOR DA SUA
IMPLANTAÇÃO.1
2
Adriana de Fátima Martins e Belane Rodrigues de Melo
RESUMO: O presente artigo discute o atual sistema de cotas para negros e
pardos no Ensino Superior. Para tanto ressalta os fundamentos jurídicos e sociais
que amparam tal ação afirmativa que tem por objetivo democratizar o acesso ao
ensino superior, diminuindo assim as desigualdades sociais e raciais provocadas
pela escravidão e pela ausência de políticas que reparassem tais desigualdades.
Palavras-chave: Ações afirmativas; Cotas; Igualdade.
Abstract: This article discusses the current system of quotas for blacks and
mulattos in Higher Education. For that, it emphasizes the social and legal
fundamentals that sustain this affirmative action that aims to democratize the
access to higher education, reducing the social and racial inequalities caused by
slavery and the absence of politics to repair the inequalities.
Keywords: Affirmative action, Quotas, Equality.
INTRODUÇÃO
Com o objetivo de democratizar o acesso ao Ensino Superior tão elitizado e
composto visivelmente por brancos, várias instituições públicas de ensino superior
vêm adotando o sistema de cotas para negros, pardos, índios e alunos oriundos
de rede pública de ensino.
Dados estatísticos do IBGE e de atuais indicadores sociais produzidos
pelos órgãos do governo revelam que os brancos constituem 52,1% da população,
enquanto que os negros e pardos 47,3%(IBGE 2004). E quando focamos esse
percentual por cor entre os estudantes de 18 e 24 anos do Ensino Superior,
1
Este texto surgiu como requisito parcial da disciplina Políticas de Educação e Gestão Educacional II –
Tópicos Especiais, Ministrada pela Professora Clélia Capanema, no Mestrado em Educação da Universidade
Católica de Brasília – UCB.
2
Adriana de Fátima Martins e Belane Rodrigues de Melo são professoras do departamento de Letras da FAE
– Faculdade das Águas Emendadas e alunas do Mestrado em Educação da Universidade Católica de Brasília.
1
observamos que somente 14,1% dos negros e pardos estão cursando o nível
superior, em discrepância a 46,4% dos brancos (BRASIL, 2005). Tais indicadores
nos revelam ainda que as mudanças sociais ocorridas na sociedade brasileira nas
últimas
décadas,
provocadas
pela
universalização
do
capitalismo,
pela
urbanização e industrialização não foram capazes de garantir a igualdade de
oportunidades aos negros e seus descendentes, haja vista o lastimável e reduzido
número de componentes dessa raça que ocupam os bancos universitários, os
postos de trabalhos mais privilegiados, e o número significante daqueles que são
vítimas da mortalidade infantil.
Nesse contexto, torna-se importante reafirmar a necessidade de políticas
públicas de ações afirmativas, que se constituem como discriminação positiva,
para desta forma superar a defasagem social e educacional vivida pela raça
negra. E, de acordo com nossa constituição, tais políticas possuem respaldo
jurídico. O presente artigo embasa-se nesse respaldo legal, apontando as razões
jurídicas e sociais para a implementação de tal medida.
1 – Políticas de Ações afirmativas no Ensino Superior
De acordo com Sarmento (2006, p. 154) as “Políticas de ação afirmativa
são medidas públicas ou privadas, de caráter coercitivo ou não, que visam a
promover a igualdade substancial, através da discriminação positiva de pessoas
integrantes de grupos que estejam em situação desfavorável, e que sejam vítimas
de discriminação e estigma social. Elas podem ter focos muito diversificados,
como as mulheres, os portadores de deficiência, os indígenas ou afro
descendentes, e incidir nos campos mais variados, como educação superior,
acesso a empregos privados ou cargos públicos, reforço à representação política
ou preferência na celebração de contratos”.
Nesse contexto, observa-se que os grupos mais fragilizados recebem
incentivos das ações afirmativas e têm melhores oportunidades de superar as
diferenças. É importante ressaltar que tais incentivos são respaldados pela lei.
2
Conforme afirma Joaquim Barbosa Gomes “as ações afirmativas se definem como
políticas públicas ou privadas voltadas à concretização do princípio constitucional
da igualdade material e neutralização dos efeitos da discriminação racial, de
gênero, de idade, de origem e de compleição física” (GOMES,2003,p.21).
Um primeiro registro do que hoje chamamos de ação afirmativa para negros data
de 1968, quando o Ministério do Trabalho manifestou-se em favor da criação de
uma lei que obrigasse empresas privadas a contratarem uma porcentagem de
empregados negros. Mas tal lei não chegou a ser elaborada (Moehlecke,2004).
Foi somente nos anos de 1980, com a redemocratização do país, que o então
deputado federal Abdias Nascimento formulou o primeiro projeto de lei propondo
uma “ação compensatória” ao afro-brasileiro em diversas áreas da vida social
como reparação pelos séculos de discriminação sofrida”. Mas tal debate começou
a ganhar força em 1995, quando o presidente da República reconhece que o
Brasil é um país racista e organiza um encontro, no ano seguinte, com o objetivo
de debater ações que modifiquem essa situação. Mas só depois de oito anos é
que o assunto entrou na agenda política nacional, através de um programa de
combate ao racismo apresentado pelo governo federal na Conferência
Internacional contra o Racismo, Xenofobia e Intolerância, realizado em Durban, na
África do Sul, em 2001. Desde então, políticas de ação afirmativa direcionadas à
população negra espalharam-se pelo país. Dentre elas, podemos destacar, a
criação do Grupo de Trabalho Interministerial para a Valorização da População
Negra, de 1995, ainda no governo FHC; as primeiras ações afirmativas no âmbito
dos Ministérios, em 2001; a criação da Secretaria Especial para Promoção de
Políticas da Igualdade Racial (SEPPIR), em 2003 no governo Lula; Estatuto da
Igualdade Racial e, as propostas dos atuais projetos de Lei que estabelecem cotas
para estudantes negros oriundos da escola pública em todas as universidades
federais brasileiras. De acordo com a
Secretaria Especial de Políticas de
promoção da Igualdade Racial, Relatório de Gestão 2003-2006, 29 instituições de
ensino superior público já implementaram a política de cotas para a raça negra e
indígena.
3
Observa-se então que um dos campos abrangidos pelas políticas
afirmativas é a educação superior. E como se mencionou anteriormente tais
políticas
se definem como públicas ou privadas voltadas à concretização do
princípio constitucional da igualdade material e neutralização dos efeitos da
discriminação racial, de gênero, de idade, de origem e de compleição física.
Através desse respaldo jurídico reconhece-se que as classes sociais e grupos
étnicos menos favorecidos devem receber incentivos capazes de promovê-los e
inseri-los no ensino superior. Além disso, é importante destacar que a educação
se constitui num dos melhores mecanismos de ascensão social. “... o modo mais
eficaz para se começar a lutar contra esse racismo que se globalizou é tentar
erradicá-lo do espaço em que atuamos e onde ele tem se reproduzido
secularmente: nas universidades brasileiras e nos discursos das nossas ciências
humanas e sociais”. (Carvalho,2006,p.113).
Portanto é devidamente aceitável que egressos das escolas públicas,
negros e índios sejam beneficiados pelas políticas afirmativas em instituições
públicas e privadas.
2 – Aspectos jurídicos das cotas
O Prouni – Programa Universidade para Todos – em vigor desde 2005,
amparado pela lei 11.096, de 13 de janeiro de 2005, contempla alunos de escolas
públicas, destinando-lhes bolsas de estudo em instituições superiores privadas.
Dentro dessas bolsas, existem ainda aquelas destinadas a negros, índios e
deficientes. Tal política está amparada pela constituição de 1988, artigo 207 que
diz
“ Art.207 – As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão
financeira e patrimonial, e obedecendo ao princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e
extensão.
§ 1º - É facultativo às universidades admitir professores, técnicos e cientistas estrangeiros, na
forma da lei.
4
§ 2º - O dispositivo neste artigo aplica-se Às instituições de pesquisa científica e tecnológica.”
Por conseguinte, as instituições de ensino superior têm autonomia
administrativa para inserir cotas no critério de ingresso ao ensino superior. A
Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e a Universidade Estadual do
Norte Fluminense (UENF) foram as primeiras instituições a adotar o sistema de
cotas, em 2002. Dados do Ministério da Educação até agosto de 2006, mostram
que 29 universidades públicas já adotaram algum sistema de cotas. Entre elas, 22
combinam critérios socioeconômicos e étnico-raciais, reservando vagas para
alunos egressos de escolas públicas, negros e indígenas.
A Universidade Federal da Bahia (UFBA), por exemplo, no vestibular de
2005 implantou um sistema que reserva 45% das vagas para alunos que tenham
cursado os três anos do ensino médio e mais um ano do ensino fundamental em
escolas públicas. Dessas vagas, 85% destinam-se, ainda, aos alunos que se
identificam como pretos ou pardos. Foram reservadas 2% para quem declarar
ascendência indígena (chamados índio-descendentes) e duas vagas, de cada
curso, para índios que vivem em aldeias e estudantes de comunidades
remanescentes de quilombos.
2.1 A legalidade das Cotas: a concretização do princípio da Isonomia
O direito de ser igual se constitui num princípio importante para o Direito e,
por conseguinte, para as relações humanas. A isonomia, enquanto direito, resultou
de conquistas históricas, que datam o período posterior às revoluções do final o
século XVIII: a Americana e a Francesa. Mas possuía conotação simplesmente
jurídico-formal. Nesse sentido, a lei deve ser igual para todos, sem qualquer
distinção ou privilégio, devendo o aplicador fazê-la agir de forma neutra sobre os
conflitos entre indivíduos e situações jurídicas concretas. Assim não existe
privilégio, nem regalias. Essa igualdade formal fechava os olhos para a injustiça e
a opressão na vida social. Tal princípio formal está presente no caput do artigo 5º
da constituição: “Todos são iguais perante a lei sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país
5
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e a
propriedade...”
A partir do século XX, houve uma reconceituação deste princípio de
igualdade, afirmando-se que esta teria também um sentido material. De acordo
com Sarmento (2006, p.114)
O advento do Estado social, já no século XX, provocou no mundo toda uma releitura do
princípio da igualdade. A crescente intervenção estatal na seara das relações econômicas foi
acompanhada por uma preocupação maior com a igualdade material. Aos poucos os Estados e as
constituições vão reconhecendo novos direitos voltados para a população mais pobre, que
envolviam prestações positivas e demandavam uma atuação mais ativa dos poderes públicos
voltados para a garantia de condições mínimas de vida para todos.”
O Estado Social inclui no princípio de igualdade a concepção material, pois
garante os direitos dos cidadãos ao mesmo tempo em que cria mecanismos para
a efetivação os mesmos. A vertente material da igualdade leva em consideração
elementos condicionantes externos como condição social, etnia, origem escolar
que acabam por marcar profundamente a vida do indivíduo Assim, diante de
tantas desigualdades econômicas e sociais, busca-se promover a justiça social, o
que está evidenciado na constituição de 88, artigo 3º incisos I,II e III:
Art. 3º - Constituem –se objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I – Construir
uma sociedade livre, justa e solidária; II – garantir o desenvolvimento nacional; III – erradicar a
pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais.
O Estado ao
assumir uma postura mais veemente e sólida diante das
desigualdades sociais, abandona a posição de neutralidade e de mero expectador
dos conflitos que se travam
nas relações humanas. O Estado passa a atuar
ativamente na resolução desses conflitos de forma a garantir a igualdade
estabelecida nos textos constitucionais. Assim a isonomia no aspecto material, só
será conquistada a partir da implantação de políticas eficazes, dentre elas as
cotas e os programas de bolsas, de modo a democratizar o acesso ao ensino
6
superior. Observa-se que a política de cotas tem seu respaldo no texto
constitucional e é perfeitamente compatível a ele.
Portanto fica evidente que as cotas não ferem o princípio da igualdade, pelo
contrário concretiza tal princípio com políticas e ações positivas e eficazes que
promovem a redução das desigualdades no que diz respeito à educação superior.
3 – A implantação do sistema de cotas e seu fundamento social
Para fundamentar esse item, faz se necessário uma abordagem história do
processo de escravidão e de libertação dos escravos no Brasil.
3.1 Escravidão no Brasil
No Brasil, a escravidão teve início com a produção de açúcar na
primeira metade do século XVI. Os portugueses traziam os negros africanos de
suas colônias na África para utilizar como mão-de-obra escrava nos engenhos
de açúcar do Nordeste. Os comerciantes de escravos portugueses vendiam os
africanos como se fossem mercadorias aqui no Brasil. Os mais saudáveis
chegavam a valer o dobro daqueles mais fracos ou velhos.
Nas fazendas de açúcar ou nas minas de ouro (a partir do século XVIII),
os escravos eram tratados da pior forma possível. Trabalhavam muito (de sol a
sol), recebendo apenas trapos de roupa e uma alimentação de péssima
qualidade. Passavam as noites nas senzalas (galpões escuros, úmidos e com
pouca higiene) acorrentados para evitar fugas. Eram constantemente
castigados fisicamente, sendo que o açoite era a punição mais comum no
Brasil Colônia. Além disso, eram obrigados a seguir a religião católica, imposta
pelos senhores de engenho, e a adotar a língua portuguesa na comunicação.
No Século do Ouro (XVIII) alguns escravos conseguiam comprar sua
liberdade após adquirirem a carta de alforria. Juntando alguns "trocados"
7
durante toda a vida, conseguiam tornar-se livres. Porém, as poucas
oportunidades e o preconceito das sociedades acabavam fechando as portas
para estas pessoas.
O negro também reagiu à escravidão, buscando uma vida digna. Foram
comuns as revoltas nas fazendas em que grupos de escravos fugiam,
formando nas florestas os famosos quilombos.
3.2 Campanha Abolicionista e a Abolição da Escravatura
A partir da metade do século XIX, a escravidão no Brasil passou a ser
contestada pela Inglaterra. Interessada em ampliar seu mercado consumidor
no Brasil e no mundo, o Parlamento Inglês aprovou a Lei Bill Aberdeen (1845),
que proibia o tráfico de escravos, dando o poder aos ingleses de abordarem e
aprisionarem navios de países que faziam esta prática.
Em 1850, o Brasil cedeu às pressões inglesas e aprovou a Lei Eusébio
de Queiroz que acabou com o tráfico negreiro. Em 28 de setembro de 1871 era
aprovada a Lei do Ventre Livre que dava liberdade aos filhos de escravos
nascidos a partir daquela data. E no ano de 1885 era promulgada a Lei dos
Sexagenários que garantia liberdade aos escravos com mais de 60 anos de
idade.
Somente no final do século XIX é que a escravidão foi mundialmente
proibida. Aqui no Brasil, sua abolição se deu em 13 de maio de 1888 com a
promulgação da Lei Áurea, feita pela Princesa Isabel.
Porém não devemos esquecer que em 1888, ano da abolição da
escravatura, os brancos (e aqueles não brancos, que se incorporaram ao seu
grupo) detinham o controle sobre todas as áreas de decisão e influência na
sociedade: eram os proprietários das terras e dos meios de produção; controlavam
o comércio interno e externo, a alta burocracia, o judiciário, o exército e a polícia;
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detinham o poder político e dominavam as profissões liberais, como os médicos e
engenheiros. E esse controle de quase todos os espaços jamais saiu de suas
mãos. Quanto aos negros, estavam confinados às atividades de baixo prestígio e
de difícil acumulação de riqueza, como as tarefas agrícolas e os trabalhos
manuais de menor qualificação. Nas primeiras décadas do século XX, aqueles
pequenos nichos de trabalho qualificado que os negros haviam adquirido foram
deles retirados e transferidos para os imigrantes europeus, numa política
deliberada de embranquecer todos os espaços de poder e importância no país.
Observa-se que, apesar do fim do sistema escravista racial, a ordem racial
permaneceu intacta, estabelecendo-se “uma espécie de composição entre o
passado e o presente, entre a sociedade de castas e a sociedade de classes”
(Moehlecke, 2004)
O antigo regime persistiria na mentalidade, no comportamento, na organização
das relações sociais e nas desigualdades entre brancos e negros. No entanto,
imaginava que, com a intensificação da industrialização e das mudanças
estruturais na sociedade brasileira, as injustiças raciais históricas seriam
superadas. Ma pode se observar que a discriminação racial é um traço
contemporâneo da sociedade brasileira.
Já nos anos trinta, foram criadas e consolidadas mais instituições de ensino
superior, pelos brancos e para os brancos: novas redes de ensino, da pesquisa e
da expansão e melhoria das profissões liberais foram formadas e reproduzidas
desde então, entre os brancos.
“Por tudo isso, a sociedade brasileira tem funcionado, ao longo de mais de cem anos, como
um sistema que se auto-regula de modo a reproduzir constantemente a mesma desigualdade
racial. Apesar da rigidez dos estamentos no Brasil, vimos no século vinte alguns momentos de
mobilidade social; já a nossa mobilidade racial, porém, tem sido extremamente restrita. Em suma: a
desigualdade social foi construída em cima da desigualdade racial, que foi naturalizada por efeito
de um discurso ideológico legitimador que fechou as portas para a exposição de conflitos,
facilitando a reprodução da nossa crônica desigualdade sócio-racial, em que a cor emblemática da
ascensão social é a branca e a cor emblemática da exclusão e do fracasso é a negra.”
(Carvalho,2006, p.60)
9
Assim quando afirmamos que o estudante negro perde para o estudante
branco no processo de seleção para entrar no ensino superior porque não pode
pagar por um ensino de qualidade, é comum muitas pessoas interpretarem que a
diferença entre os dois é puramente econômica (diga-se: social) e não racial.
Contudo, é preciso lembrar que o “estudante negro não pode pagar por um ensino
de qualidade, não porque esteja socialmente incapacitado a alcançar esse nível
de renda, mas porque seus pais negros herdaram a discriminação racial no
mercado de trabalho sofrida pelos seus avós e bisavós, os quais sempre foram
preteridos pelos brancos nas melhores posições”. (Carvalho,2006,p.61)
Observa-se que a escravidão que durou aproximadamente 300 anos e o
modelo perverso de libertação dos escravos conferiram ao povo negro uma
miserabilidade que têm seus efeitos na pirâmide social do País. Os negros são a
maioria nas favelas, nos penitenciárias, nos índices de desemprego e
analfabetismo; e são a
minoria nas faculdades , nos altos cargos públicos
governamentais. Por mais esse motivo, a inserção das cotas no ensino superior é
justificada, por ser uma forma de reparar a discriminação sofrida por eles durante
séculos, garantindo melhorares oportunidades de mobilização social dos negros,
bem como a democratização do acesso ao ensino superior.
É sabido que melhores oportunidades de ascensão social estão
intimamente relacionadas com os anos de escolaridade. Todavia, as camadas
mais pobres das população têm acesso a um ensino de baixa qualidade, o que
dificulta o acesso ao ensino superior público. Entende-se dessa forma que
políticas afirmativas para inserir estudantes oriundo de escolas públicas são
justificadas.Promove-se dessa forma oportunidades para esse público de mudar
as condições sociais.
É importante mencionar que tais políticas afirmativas foram e continuam
sendo alvos de críticas que afirmam que os beneficiários desse sistema de cotas
não conseguiriam ter êxito nos estudo e seriam incapazes de acompanhar os
demais acadêmicos que ingressaram pelo sistema regular de ingresso à
10
faculdade. Entretanto pesquisas realizadas por várias instituições de ensino
superior que adotam tal política provam o contrário. Na página eletrônica da
Unicamp, e acordo com a notícia dada em 10 de junho de 2006, observa-se que
O desempenho acadêmico dos alunos contemplados pelo Programa de Ação Afirmativa e
Inclusão Social (PAAIS) ao longo de 2005 foi melhor do que os dos demais colegas em 31 dos 56
cursos da Unicamp. Os números foram apresentados sexta-feira (9) pelo reitor José Tadeu em
entrevista coletiva, na qual foi feito o balanço do primeiro ano de funcionamento do programa,
instituído em 2004 e implantado no vestibular de 2005. Pioneiro no país, o PAAIS prevê que
estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio na rede pública recebam, na
segunda fase do vestibular, 30 pontos a mais na nota final. Acresce também 10 pontos à nota final
de candidatos auto declarados negros, pardos e indígenas que tenham cursado o ensino médio em
escolas públicas(ALUNOS DE ESCOLA PÚBLICA TÊM MELHOR DESEMPENHO, 2006).
Na UERJ, por exemplo, 49% dos alunos ingressantes pelo sistema de cotas
passaram de ano sem nenhuma dependência, contra 47% dos alunos escolhidos
pelo sistema vestibular.A evasão entre os alunos negros, no primeiro ano foi de
5% e entre os demais alunos, de 9%. Na ENEB, a evasão entre os alunos negros
também foi menor: 1,9% contra 2,7%. (Souza, 2004, in Moehlecke, 2004)
Tais pesquisas são importantes para mostrar que tais políticas afirmativas
têm tido resultados positivos e se justificam. Além disso, o fato de apenas 2,5%
dos negros (incluídos aí os pardos), com mais de 25 anos de idade estarem no
ensino superior, em contrapartida 10,2% dos brancos(IPEA,2005) fundamentam
tal ação afirmativa e mostra que ela é necessária para nivelar a sociedade em
termos raciais e sociais. Não se pode deixar de mencionar aqui o sucesso
alcançado pelo Prouni nas diversas instituições de ensino superior. O Programa
Universidade para Todos destina bolsas para alunos de escolas públicas e partes
dessas objetivam ao negro e seus descendentes.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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Os argumentos levantados neste trabalho não pretendem esgotar o tema
que é bastante polêmico, mas deixam claro que a política de cotas não fere o
princípio da igualdade, pelo contrário provam que elas são legítimas e legais. O
direito constitucional vigente é perfeitamente compatível com as ações afirmativas.
Além disso, a falsa idéia de que os cotistas reduzem a qualidade do ensino
superior não é verdadeira, o que se pode comprovar com os estudos feitos por
várias universidades federais, como a Unicamp.
Por fim, as cotas possuem fundamentos políticos, sociais e históricos. Elas
se embasam na idéia de solidariedade social, de igualdade ou redução das
desigualdades raciais e de reparação social e histórica. Dessa forma, serve como
mecanismos para promover a ascensão social e racial dos negros e afrodescendentes que por muito tempo não foram beneficiados por políticas de
inclusão. Se os interesses sociais do Estado visam à redução das desigualdades,
a promoção das classes sociais menos favorecidas ou fragilizadas, seja pelo
aspecto étnico ou social, as cotas para a raça negra se justificam.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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a Justiça Social.Educ. Soc., Campinas, vol 25 n.88, p. 757-776, Especial – Out.
2004. Disponível em <htpp://www.cedes.unicamp.Br>
CARVALHO, J.J Inclusão Ético e Racial no Brasil: a questão das cotas no
ensino superior. São Paulo, Attar Editorial, 2006.
GOMES, Joaquim Barbosa. O debate constitucional sobre as ações
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12
SARMENTO, Daniel. A Igualdade Étnico-Racial no Direito Constitucional
Brasileiro: Discriminação “De Facto”, teoria do Impacto Desproporcional e Ação
Afirmativa. In: Livres e Iguais. Rio de Janeiro: Lumens Júris, Editora,2006.
Escravidão no Brasil: Disponível em
http://www.suapesquisa.com/históriadobrasil/escravidão.htm.
Acesso em: 10 nov. 2007.
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