POR UMA PERSPECTIVA AMPLIADA DE INCLUSÃO Maria

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POR UMA PERSPECTIVA AMPLIADA DE INCLUSÃO
Maria Terezinha C. Teixeira dos Santos*
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A escola nossa de cada dia
Chegar à escola, estar na escola, fazer escola.
Esta imersão no universo escolar permite evidenciar espaços, tempos, atividades
e organizações que sugerem classificações, planejamentos, arquivos, programas,
parâmetros entre muitas outras configurações.
Existe sim uma lógica em todas estas realidades e rituais e há que se conectar em
significados para perceber a escola como lócus privilegiado de possibilidades, desafios e
limitações.
O documento da Política Nacional da Educação Especial na perspectiva da
Educação Inclusiva em seu parágrafo primeiro do item Marcos Históricos, abre o
contexto da trajetória do ethos escolar de maneira bastante significativa:
“A escola historicamente se caracterizou (e ainda, continua se
caracterizando!) pela visão da educação que delimita a escolarização como
privilégio de um grupo, uma exclusão que foi legitimada nas políticas e práticas
educacionais reprodutoras da ordem social. A partir do processo de
democratização da escola, evidencia-se o paradoxo inclusão/exclusão quando
os sistemas de ensino universalizam o acesso, mas continuam excluindo
indivíduos e grupos considerados fora dos padrões homogeneizadores da
escola. Assim, sob formas distintas, a exclusão tem apresentado características
comuns nos processos de segregação e integração, que pressupõem a seleção,
naturalizando o fracasso escolar”
A escola que trabalha com padrões engessados, evidencia-se por uma postura
comodista, não crítica e que reproduz modelos. Predominam crenças tais como: - “o
aluno é sempre zero à esquerda”;“não se interessa por nada”, ou ainda “é um marginal”;
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- as famílias são sempre vistas como “desestruturadas” (porque o viés que se analisa, é o
de um modelo de família convencional, tido e havido como o melhor); - o meio
ambiente é considerado pobre em todos os sentidos e não ajuda; os pais não
comparecem às reuniões e isto é o comum... entre outras idéias dominantes.
Neste rastro, tudo já está pronto e o Projeto Político Pedagógico existe apenas
para constar, porque não se trabalha com a realidade em movimento e sim com
estereótipos, produtos dados e acabados e que desencadeiam por sua vez, posturas
saudosistas e suspiros em direção a um aluno inexistente e construído como “ideal”.
Nesta perspectiva o Projeto Político Pedagógico pode ser um modelo já
determinado, fornecido a todas as escolas, até mesmo uma logomarca já estabelecida.
Ignora-se o contexto e decreta-se o que está no papel, embora a realidade continue
teimando a existir.
É uma escola que não trabalha com as diferenças. Nela só permanecem os que se
encaixam no padrão: decorou? Tirou nota? É centrada no mérito e aí é só para alguns.
Como diz a profa. Mantoan, no Seminário de Educação Inclusiva (Brasília, maio de
2009), esta escola é preocupante, porque ela tem trabalhado com conteúdos
selecionados a partir do “poder” instalado de um modelo hegemônico; de uma lógica de
conhecimento definida por alguns e os alunos são monitorados apenas por medidas
quantitativas. Essa escola ainda está sendo muito procurada e é ainda a grande meta da
educação brasileira. É a cultura dos rankings, é uma lógica que desconhece os alunos
concretos e infelizmente continua predominando na maioria das escolas atuais.
A compreensão dos modelos “ideais”, da homogeneidade perseguida tanto para
o ponto de partida do trabalho escolar, bem como ensejada para o ponto de chegada,
tem sustentado a existência de classes especiais, currículos adaptados, avaliação como
produto, a terminalidade decretada, a seleção por atributos, e aprisionam tanto a escola
comum como a escola especial numa configuração que as torna excludentes.
Nesta perspectiva, as escolas não estão atendendo a todos os alunos com ou sem
deficiência em suas turmas e se justificam por não estarem preparadas, ou pela
inexistência de professores formados e especializados. Temem também que possam
prejudicar os melhores alunos, ou até mesmo não poderem atender os alunos com
problemas de forma mais específica.
A deficiência permanece entendida como uma questão puramente de ordem
médica e sinônimo de anormalidade pelo dito cujo “portador” dessa deficiência. A
busca de soluções neste universo é da ordem de buscar a “acomodação” dessa
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anormalidade, da disparidade que ameaça o conjunto dos normais no mundo físico e
social.
Nesta ótica, a questão de garantia da acessibilidade fica altamente comprometida
pois não se alcança a compreensão de
interatividade, da comunicação e do
conhecimento.
O paradigma presente nesta concepção trabalha com a idéia da igualdade como
sinônimo de homogeneização e valoriza modelos a serem copiados, reproduzidos,
deixando claro o caráter não processual de construção de pessoas e conhecimentos, mas
produtos já definidos em regularidades engessantes e a-históricas.
Este referencial mostra sinais de esgotamento e nas lacunas abertas das
incompreensões oportuniza as transformações necessárias que abrem horizontes
ampliando uma perspectiva ampliada de inclusão.
A escola é uma realidade histórica em processo contínuo. É preciso que seja
entendida como uma instituição voltada para a realização da prática pessoal e social,
contextualizada nas dimensões espacial e temporal, revestida de caráter contraditório e
complexo. É preciso privilegiar sua abordagem como processo, não produto acabado. A
escola não é, e, sim, está sendo.
Um novo paradigma: AMPLIANDO VISÃO
Neste contexto de encontros e desencontros o desafio está sendo constantemente
lançado: o processo de construção de uma escola para todos, democrática e inclusiva
que contemple os alunos com e sem deficiência em suas diferenças no exercício da
cidadania.
“O movimento mundial pela educação inclusiva é uma ação política,
cultural, social e pedagógica, desencadeada em defesa do direito de todos os
alunos estarem juntos, aprendendo e participando, sem nenhum tipo de
discriminação. A educação inclusiva constitui um paradigma educacional
fundamentado na concepção de direitos humanos, que conjuga igualdade e
diferença como valores indissociáveis, e que avança em relação à idéia de
equidade formal ao contextualizar as circunstâncias históricas da produção da
exclusão dentro e fora da escola” (MEC, janeiro de 2008)
Este texto do documento da Política Nacional da Educação Especial na
perspectiva da Educação Inclusiva esclarece ainda:
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“Ao reconhecer que as dificuldades enfrentadas nos sistemas de ensino
evidenciam a necessidade de confrontar as práticas discriminatórias e criar
alternativas para superá-las, a educação inclusiva assume espaço central no
debate acerca da sociedade contemporânea e do papel da escola na superação
da lógica da exclusão. A partir dos referenciais para a construção de sistemas
educacionais inclusivos, a organização de escolas e classes especiais passa a
ser repensada, implicando uma mudança estrutural e cultural da escola para
que todos os alunos tenham suas especificidades atendidas”.
Torna-se imprescindível clarear as idéias para não haver mal entendidos na
questão essencial do processo de escolarização. Afinal, como questiona a profa. Maria
Teresa Mantoan (MEC, 2009)
Muda, então, a escola ou mudam os alunos, para se ajustarem às suas
velhas exigências? Ensino de qualidade para todos os alunos ou escola/classe
especial para alguns? Professores que atualizam suas práticas às diferenças de
todos os alunos, ou professores que continuam, encaminhando os alunos que
não aprendem para a educação especial, em caráter de substituição da escola
comum?
Quando a escola entende que as diferenças existem e começa a trabalhar com
elas, as mudanças ocorrem contemplando as demandas de todos e não apenas as das
pessoas com deficiência e/ou outros alunos da educação especial. Esta é a forma efetiva
de fazer acontecer o princípio democrático da educação com qualidade, que só se
garante, quando a instituição escolar se especializa em todos os alunos e não apenas em
alguns deles, os alunos com deficiência, por exemplo. Há que se registrar também, que,
não são apenas os alunos com deficiência os excluídos da escola, mas os que são
pobres, os que não vão às aulas porque trabalham, os que pertencem a grupos
minoritários e de risco social, os que de tanto repetir desistem de estudar.
A proposta pedagógica de uma escola inclusiva ganha outro significado. Ela vai
estar fazendo parte de uma escola viva, em movimento que valoriza as diferenças, na
perspectiva de construção de cidadania no dia a dia..
Assim é totalmente diferente a escola que faz acontecer a participação do aluno,
da família e da comunidade e que tem um rumo, sabe o que quer e lhe dá significado
constante. Com isso, a escola estará de fato, vivendo uma proposta que irá contribuir
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para transformar a realidade, tomando providencias para que as práticas aconteçam de
maneira pensada, articulada e refletida.
Quando isto acontece a escola trabalha os desafios do processo de ensino e de
aprendizagem, buscando alternativas, inventando caminhos, estudando as contribuições
pedagógicas existentes, elaborando propostas de currículo, de avaliação e de
organização dos tempos e dos espaços. Os educadores ensinam e aprendem sempre,
socializando suas experiências sócio-culturais, numa dimensão formadora e humana.
A inclusão está denunciando o abismo existente entre o velho e o novo na
instituição escolar brasileira e é reveladora dessa distância. Indica claramente que é
preciso adotar ações que mudem a organização administrativa e pedagógica. Muitas
experiências que estão acontecendo no Brasil e no mundo inteiro têm demonstrado a
viabilidade e a riqueza do trabalho com as diferenças.
Neste sentido, é importante deixar claro que a inclusão é decorrência de uma
escola que revisita suas práticas e se preocupa em atender a todos os alunos,
propiciando ensino de qualidade para todos e fazendo da aprendizagem o eixo de
preocupação de suas prioridades.
“A transformação da escola não é uma mera exigência da inclusão
escolar de pessoas com deficiência e ou dificuldades de aprendizado. Assim
sendo, ela deve ser encarada como um compromisso inadiável das escolas, que
terá a inclusão como conseqüência.” (Brasil, 2003)
O motivo que sustenta a luta pela inclusão, como uma nova perspectiva
educacional, é, sem dúvida, a qualidade de ensino nas escolas públicas e privadas, de
modo que se tornem aptas para responder às necessidades de cada um de seus alunos, de
acordo com suas especificidades, sem cair nas teias da educação especial, na sua visão
conservadora e modalidades excludentes - escolas, classes especiais e outras.
O projeto da escola inclusiva está inserido no contexto das diferenças. Cada
escola é única e inédita e desenvolve um processo repleto de desafios, possibilidades e
alternativas. A autonomia e a gestão democrática fazem parte da própria natureza
política e pedagógica do Projeto escolar para ser coerente com a formação cidadã que só
pode ocorrer acontecendo no cotidiano e não como verbalismo propedêutico para um
futuro que virá.
Todas as contribuições das ciências humanas têm reforçado a idéia de que o
aluno só aprende quando ele se torna sujeito da sua aprendizagem. E para se constituir
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como sujeito, é preciso que o processo de educação seja ativo e interativo, individual e
social e que desenvolva identidades no rastro das alteridades.
A deficiência é sinônimo de “diferença” e tem a ver com o reconhecimento do
Outro. Ela é constatada na interação entre individuo e sociedade e é nesta perspectiva
que as questões de acessibilidade devem ser pensadas não apenas do ponto de vista da
infra-estrutura física, bem como de aspectos pedagógicos e sociais. Estas possíveis
barreiras que precisam ser desconstruídas podem representar um ganho significativo no
acesso à escola, bem como na permanência e com qualidade na instituição.
Autonomia, gestão democrática e participação não podem ser apenas uma carta
de intenções, mas devem ser oportunizadas no exercício contínuo de: - Planejamento,
Organização e Avaliação do processo escolar de cada sala de aula e da escola como
um todo significativo.
Planejar é com certeza, uma das ações mais importantes do processo de uma
escola viva, em movimento. Desde a Proposta da escola, consolidam-se duas dimensões
significantes, a Política e a Pedagógica e a partir de um diagnóstico da realidade,
sistematiza-se o planejamento, o desenvolvimento e a avaliação das etapas e metas
propostas, evidenciando uma ação coletiva.
Escola que trabalha com pessoas. Pessoas que são seres humanos,
possibilidades, tendências e, portanto, projetos de vida.
Ao enunciar objetivos, metas, escolhas, concepções, estratégias a serem
tomadas, ela clareia uma direção, o seu caminhar para alguma realidade, e aí o caráter
POLÍTICO vem à tona, pois na medida em que se fazem escolhas para um ou outro
norte, assume-se uma posição, em detrimento de outras, e com isto surgem prioridades e
valores.
Ao mesmo tempo, enquanto uma instituição escolar, ela explicita as formas de
articulação, sistematiza ações, organiza o processo, dosando e seqüenciando, e aí a
dimensão PEDAGÓGICA comparece, para contribuir com pensares e fazeres
referenciados nas contribuições interdisciplinares de todas as ciências humanas.
Estas duas dimensões estão presentes em nível da sala de aula, de projetos
interdisciplinares, de propostas do curso, perpassando tudo até chegar ao Projeto
Político Pedagógico da instituição.
Neste processo ao considerar as diferenças, a escola precisa se preocupar em
contemplar todos os aspectos de alunos com ou sem deficiência. A inclusão não é um
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apêndice no PPP, mas um paradigma à luz do qual todas as atividades devem ser
pensadas.
Organizar as atividades é de vital importância. A escola inclusiva precisa pensar
nas atividades e estratégias como práticas educativas, que como meios de ensino e de
aprendizagem possibilitam incluir ou não os alunos. Os ambientes precisam ser
colaborativos e ativos, com ênfase na aprendizagem e com atividades que trabalhem as
diferenças, os ritmos, utilizando diferentes linguagens na construção do conhecimento.
A aprendizagem como o centro das atividades escolares e o sucesso dos alunos,
como a meta da escola, independentemente do nível de desempenho a que cada um seja
capaz de chegar são essenciais para que se adotem práticas escolares acolhedoras e
inclusivas. O sentido desse acolhimento não é o da aceitação passiva das possibilidades
de cada aluno, mas o de ser receptivo a todos eles, pois as escolas existem, para formar
gerações, e não apenas alguns de seus futuros membros, os que mais se encaixam em
seus modelos.
Da mesma forma, é preciso articular a organização dos tempos escolares. Eles
precisam ser pensados como meios de construção do conhecimento com flexibilidade
nos horários de aula, nos calendários, na organização de módulos, enquanto trabalho
significativo com os ritmos de aprendizagem.
A organização dos espaços também vai denotar as ênfases do paradigma da
inclusão. Representam uma forma de ser e de estar, um jeito de viver. Ao observar a
configuração dos espaços escolares, percebe-se um tipo de estrutura social que vai
evidenciar um “encarteiramento” ( no sentido de estar fixando e imobilizando o aluno
na carteira escolar) ou não, e também a existência de uma possível centralização da voz
autorizada do conhecimento, no caso apenas a do professor.
A escola inclusiva precisa viabilizar a utilização de diferentes salas e ambientes
de forma participativa e com parceria da comunidade, abrindo campos de saber.
Parcerias e articulações intersetoriais precisam estar garantidas. Além da
presença marcante da família no processo escolar, não podem ser esquecidas as
articulações com a comunidade: empresas, ONGs, outros segmentos do poder público,
contribuindo para a aculturação de que a educação não é apenas uma área restrita à
escola aos órgãos do sistema educacional.
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A visão intersetorial respalda-se nas ações integradas de todos os segmentos da
sociedade civil e sociedade política dos Municípios e Estados, ampliando o processo
pedagógico como fator do desenvolvimento humano.
Indicadores importantes dessas parcerias são as articulações entre as secretarias
municipais com o Poder Executivo, Poder Legislativo, Poder Judiciário, Ministério
Público, instituições, empresas e demais segmentos sociais. Essas parcerias
complementam, em muitos casos o trabalho com os alunos, as famílias e no caso do
público-alvo do Atendimento Educacional Especializado são muito significativas pois
irão corroborar as ações a serem desencadeadas em cada aluno a ser atendido.
Em termos de Avaliação, o processo adotado pela escola é outra questão bastante
representativa da escola inclusiva. Alguns sinais precisam ser analisados para se
identificar o paradigma que a escola está adotando:
•
A escola utiliza da avaliação como castigo e classificação?
•
A escola reprova alunos por décimos?
•
Os professores não dão retorno de aprendizagem?
•
A escola utiliza diferentes instrumentos de avaliação?
•
A escola divide os alunos em classes fortes, fracos e médios?
•
A avaliação é processual?
A escola ao trabalhar com o processo de avaliação, deve se preocupar com seu
caráter de aprendizagem e cuidar para que esta prática não se constitua em
discriminação, classificação e exclusão de nenhuma pessoa. Isto implica em formação
continuada de professores e especialistas fortalecendo valores de respeito mútuo e de
aprendizagem permanente e atualizada na construção do conhecimento
Uma visão ampliada de inclusão oportuniza acesso, permanência e sucesso com
qualidade para todos na escola e irá contribuir para a construção de uma nova cultura e
valorização das diferenças a partir da visão dos direitos humanos e do conceito de
cidadania que garantem a cada ser humano o direito à educação.
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* Maria Terezinha Teixeira dos Santos é Consultora da Secretaria de Educação
Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão- SECADI, do Ministério da
Educação – MEC; pesquisadora do Laboratório de Estudos e Pesquisas das Diferenças
– LEPED - Unicamp. Foi Secretária Municipal de Educação de Três Corações (MG)
durante 12 anos, em 3 mandatos. Autora de Bem-vindo à escola: a inclusão nas vozes
do cotidiano (Ed. DP&A – Rio de Janeiro), entre outros.
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