ECA? 06 Saiba mais sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente Dificuldades das crianças na sua própria aceitação são desafio para a educação Ser diferente é normal Livia Maria Esteves Pedro Henrique Scabim Garantir direitos individuais e coletivos à criança e ao adolescente é um dos objetivos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que reforça o reconhecido caráter humanitário da Constituição brasileira de 1988. No entanto, o ECA não é integralmente respeitado por governo algum, como boa parte das leis e garantias sociais presentes na Constituição. Pelo Estatuto, as crianças deveriam se desenvolver em ambientes livres de preconceitos. “Todas as atividades pedagógicas têm por objetivo promover a integração social entre as crianças para um melhor desenvolvimento das atividades propostas pelo professor. Esse é o primeiro passo para ensiná-las a repartir, a brincar, a serem solidárias, humildes e a viverem em grupos”, afirma Aparecida Antonia de Souza Moreira, professora de uma escola em Santana de Parnaíba, cidade pobre da grande São Paulo. Porém, nem sempre tais medidas levam ao resultado desejado. “Algumas crianças negras não admitem que são negras, outras não admitem que têm uma renda muito baixa. Basta obsevar o recreio das crianças para se perceber que as diferenças sociais existem dentro da escola”, diz Antonia. O enfrentamento desse problema, que é grave, depende apenas da boa vontade dos professores, já que o Estado não costuma oferecer cursos ou seminários para melhor orientação sobre o assunto, lamenta a professora. A questão da desigualdade entre raças e etnias está entre as principais preocupações da Unicef, explica a oficial de comunicação da instituição, Rachel Mello. Para ela, “o Brasil, que tanto avançou na garantia de alguns dos direitos de suas crianças, nos últimos anos, não pode mais adiar o enfrentamento da questão da discriminação”. O Unicef mantém diversos programas que põem o ECA em prática. Esses projetos protegem principalmente jovens negros e indígenas, considerados em situação social vulnerável pela instituição. Segundo Rachel, “o trabalho apoiado pelo Unicef visa promover o acesso à educação de qualidade para essas crianças e adolescentes e já ajudou a transformar as vidas de centenas de indígenas e negros, que aprenderam a se valorizar e hoje estudam em busca de boas profissões”. Nesse âmbito, a convivência com as diferenças é um dos grandes desafios a serem encarados pela sociedade. E mais, é preciso aprender que mais importante do que conviver com a diversidade é não torná-la diferença. Arte: Sheila Moreira Fotos: www.ogintonico.weblog.com.pt e Ingelore Moeller e Chowdhuri/Reuters 07 Importância não reduz impotência do Estatuto da Criança e do Adolescente Sheila Moreira Abandono. Abuso sexual. Analfabetismo. Trabalho infantil. Esses são alguns dos problemas que atingem as crianças e adolescentes brasileiros. Criado em 1990, pela lei nº 8069, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) surgiu da necessidade de proteger, educar e dispor os direitos e deveres de cerca de 60,8 milhões de brasileiros com idade entre 0 e 18 anos. Assim, o ECA exige políticas sociais voltadas para a infância e adolescência que instaurem relações entre o Estado e a sociedade de forma que sejam garantidos os direitos de cidadania desse público. A Agência de Notícias dos Direitos Infantis, mais conhecida como ANDI, é um exemplo da interação entre a sociedade e essas crianças e adolescentes que estão à margem da sociedade. A agência surgiu com a percepção de que a imprensa fazia uma cobertura pouco abrangente dos problemas que afligem a infância e a adolescência. Segundo Carlos Ely Souto de Abreu, gerente do Núcleo de Mobilização da ANDI, “além da pequena quantidade de notícias, a imprensa estava centrada principalmente em fontes governamentais e cometia erros conceituais e de percepção do problema”. A questão é que apenas a existência do ECA não é funcional em um país tão diversificado socialmente. “O Estatuto está em vigor desde 1990 e em algumas regiões ainda é conhecido apenas em sua teoria, muitas autoridades não sabem como executá-lo”, observa Aparecida de Lourdes França, que há 6 anos é conselheira tutelar. Segundo a ANDI, o ECA é um conjunto de leis muito avançado e moderno. O problema é que não foi acompanhado por investimentos sérios dos governos em políticas de ressocialização e redução de desigualdade para as famílias excluídas. “O resultado é que o ECA é, em muitos momentos, uma bela carta de intenções”, lamenta Carlos Ely.. Muitas vezes, os problemas de crianças e adolescentes beiram a intolerância; até mesmo dentro dos próprios lares não há respeito e solidariedade em relação a essa parcela da população. A conselheira Aparecida de Lourdes França ressalta que freqüentemente os problemas são causados pelos próprios pais: “A falta de responsabilidade faz com que os filhos não criem laços familiares e sintam-se sem amor e respeito”. A ANDI costuma receber denúncias de violência contra crianças feitas de diferentes estados brasileiros. “O que fazemos é apurar essas denúncias e enviar essas informações em formato de pauta para as redações de todo o país, nosso trabalho não é feito diretamente com o público infantil, ele se dá por meio da qualificação e mobilização da mídia para que os jornalistas cobrem dos governos, em diferentes níveis, a implementação de políticas públicas”, comenta Carlos Ely. Tanto que a cobertura da mídia sobre temas relativos à infância cresceu 1200% entre 1996 e 2005. Hoje é uma das áreas que tem recebido maior atenção da imprensa, entre as pautas da área social. As matérias tratam mais adequadamente aspectos como orçamento, políticas públicas e realidade de crianças e adolescentes. Para Aparecida de Lourdes França, só o “aumento do número de fontes da sociedade civil, de pessoas ouvidas durante os trabalhos de reportagem, já é um aspecto muito sensível da evolução”. Ela observou que as matérias não trazem mais apenas números e estatísticas. “As crianças estão aí para serem auxiliadas e não para se constituírem apenas em números”, adverte Aparecida.