abordagens teóricas para o estudo de representações

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ABORDAGENS TEÓRICAS PARA O ESTUDO DE REPRESENTAÇÕES SOBRE
IDENTIDADE PROFISSIONAL DOCENTE
PROCHNOW, Ana Lucia Cheloti1
BONUMÁ, Adriana Silveira2
MACHADO, Jr. José Ferreira3
RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo apresentar teorias que dão suporte à investigação
das representações sobre identidade profissional do ser professor a partir de uma visão
sócio-histórica, em Bakhtin, e da teoria cognitivista de Vygotsky. Apresentaremos o escopo
teórico dessas abordagens, que permitiriam investigar os limites normativos de
competências profissionais, os papeis sociais e as atribuições profissionais extranormativas, que conferem respaldo aos profissionais quanto à definição de sua identidade.
Trata-se de pesquisa de cunho bibliográfico, que permitirá identificar as representações
sobre identidades profissionais. Partiremos da premissa de que somos seres sociais,
históricos e culturais, à medida que nos apropriamos dos conhecimentos das gerações que
nos precederam em atividades que são sempre mediadas pela linguagem e que se realizam
em condições sociais de produção específica. Assim, a base de investigação desse estudo
será fundamentada em autores como Vygotsky (2007), Bakhtin (1997), Berger e Luckmann
(2009), Moita Lopes (2003) e Hall (2006).
PALAVRAS-CHAVE: Identidades profissionais – abordagens teóricas – representações.
INTRODUÇÃO
As questões que envolvem identidade profissional vêm sendo objeto de pesquisas
nas mais diferentes áreas, tais como sociologia e antropologia. Nos estudos linguísticos, o
foco dessas investigações recai sobre a identidade profissional do professor. Neste
particular, elegemos como objeto de pesquisa do presente trabalho representações sobre
identidades profissionais.
1
Professora do Colégio Militar de Santa Maria, doutoranda em estudos Linguísticos no Programa de Pósgraduação em Letras da UFSM, e-mail: [email protected].
2
Professora do Colégio Militar de Santa Maria, doutoranda em Estudos Linguísticos no Programa de Pósgraduação em Letras da UFSM, e-mail: [email protected].
3
Professor do Colégio Militar de Santa Maria, mestrando em Estudos Linguísticos no Programa de Pósgraduação em Letras da UFSM, e-mail: [email protected].
Isso decorre de alguns questionamentos que emanam do próprio sujeito que se
encontra na condição de professor. A prática docente tem despertado interesse e motivação
para discutir questões relativas à identidade do professor e a tudo o que está implicado
neste conceito, suas competências, atribuições extra-normativas e papeis.
O fato de este profissional defrontar-se frequentemente com situações que fogem ao
exercício propriamente da docência, tanto em sala de aula quanto em reuniões fora dela, é
uma das razões para empreender essa pesquisa. Da mesma forma, não raro o professor se
depara com situações em que sua formação e prática docente são questionadas por pais ou
outros profissionais que atuam na educação, mas que não têm formação na área.
Ainda, fora dos limites da escola, o professor se vê alvejado por opiniões e ataques
da sociedade em seus mais diversos segmentos, em especial, pela mídia, com seus
“especialistas em educação”, que se sentem no de direito de interpelar o professor e dizer
como deve conduzir sua prática escolar, sem ter, muitas vezes, competência para a
docência.
A partir dessas constatações empíricas, nossas considerações tomam por base o
professor, por exercer suas atividades docentes em um contexto complexo, em que padece
com o acúmulo de atribuições, tendo que dar conta de tudo, o que parece não acontecer
com algumas outras profissões, como é o caso da Psicologia, Direito ou Medicina.
Assim, o problema desta proposta é oriundo de alguns questionamentos no que
tange à profissão docente, tais como: os limites normativos das competências do professor,
o seu papel social e as suas atribuições profissionais extra-normativas.
Procuraremos desenvolver este artigo a partir de um leque de perguntas norteadoras
que nos auxiliarão no desenvolvimento do trabalho:
a)
Quais são os limites normativos das competências dos profissionais investigados?
b)
Que papeis esses profissionais se atribuem dentro do contexto escolar?
c)
E, quais são as representações de professores sobre sua identidade profissional?
Para tanto, o suporte teórico está embasado em autores como Vygotsky (2007), cujo
aporte teórico fundamenta a noção de linguagem como instrumento de mediação necessário
no processo de internalização e desenvolvimento das funções superiores nos seres
humanos; Bakhtin (1997), que fundamenta o caráter dialógico da linguagem e do discurso;
Berger e Luckmann (2009), que discutem questões relacionadas à sociologia do
conhecimento, a qual trata da construção da realidade; e Moita Lopes (2003) e Hall (2006),
que trazem suas contribuições nos estudos das construções discursivas das identidades
sociais.
CONTORNOS INICIAIS
Segundo os princípios vygotskyanos e bakhtinianos, somos seres sociais, históricos
e culturais, nascemos num mundo humano e nos humanizamos à medida que vamos nos
apropriando dos conhecimentos das gerações que nos precederam em atividades que são
sempre mediadas pela linguagem e que se realizam em condições sociais de produção
específica.
No caso, Vygotsky (2007) afirma que a internalização das atividades socialmente
constituídas e historicamente desenvolvidas constitui o aspecto característico da psicologia
humana; é a ênfase do salto qualitativo da psicologia animal para a psicologia humana.
Desta forma, ancorado em uma perspectiva sócio-histórica do desenvolvimento
humano, este estudo focaliza o professor, buscando compreendê-lo na perspectiva da sua
relação com a cultura e como produto das suas interações sociais.
Para Berger e Luckmann (2009), as origens de qualquer ordem institucional
consistem na tipificação dos desempenhos de um indivíduo e do outro, dos seus papeis.
Segundo esses autores, o mais importante é o caráter dos papeis como mediadores de
particulares setores do acervo comum do conhecimento. Em virtude dos papeis que
desempenha, o indivíduo é introduzido em áreas específicas do conhecimento socialmente
objetivado, no sentido do “conhecimento” de normas, valores e emoções.
Tais considerações nos motivam a apostar em uma pesquisa que focalize a busca
pelas representações da identidade do professor, que se determina principalmente pela
assunção dos seus papeis sociais.
VYGOTSKY E A ABORDAGEM SOCIOINTERACIONISTA DA LINGUAGEM
Na teoria sociointeracionista, Vygotsky destaca as contribuições da cultura, da
interação social e da linguagem para o processo de desenvolvimento e aprendizagem social
e histórica do sujeito. O autor entende que a linguagem se constrói com a interação homem
e meio e é aprendida, ensinada ou adquirida por meio da interação social. O contexto é,
então, determinante para o desenvolvimento da linguagem no processo de comunicação.
Essa premissa, conforme Rego (2010), reforça um dos pressupostos teóricos desse
modelo, a saber, de que o desenvolvimento cognitivo da criança é um processo de
assimilação ativa do conhecimento histórico-social existente na sociedade em que ela
nasceu e ocorre através de trocas recíprocas, que se estabelecem durante toda a vida,
entre indivíduo e meio, cada aspecto influindo sobre o outro.
Um dos conceitos fundamentais da teoria sociointeracionista é a noção de mediação.
Em suas pesquisas, Vygotsky buscou comparar a inteligência humana com o
comportamento animal, o que o levou a concluir que os seres humanos lançam mão de
ferramentas físicas e simbólicas (psicológicas) a fim de mediar e regular suas relações com
o outro e com eles mesmos.
Assim, segundo Rego (2010, p. 42), “a relação do homem com o mundo não é uma
relação direta, pois é mediada por meios que se constituem nas ‘ferramentas auxiliares’ da
atividade humana”. Por essa razão, Vygotsky percebe na linguagem o principal fator da ou
para a aprendizagem, conferindo-lhe um papel de destaque no processo de interação.
Ainda em relação à linguagem, destaca-se um outro pressuposto da abordagem
vygotskyana: o papel da linguagem na sistematização das experiências do indivíduo, visto
que serve para orientar o seu comportamento social. Vygotsky (2007, p. 58) explica essa
questão a partir da noção de que “a internalização de formas culturais de comportamento
envolve a reconstrução da atividade psicológica tendo como base as operações com
signos.”
A partir do momento em que a fala e os signos se incorporam, a ação de uma
criança, por exemplo, está se transformando, assumindo características próprias do ser
humano, diferente das suas ações no período pré-verbal.
O processo de aquisição da linguagem, segundo essa perspectiva, precisa ser
entendido à luz das características individuais e dos aspectos sociais relacionados ao
aprendiz, uma vez que existem variações no contexto sociocultural da qual fazem parte.
Tais variações entre o contexto são marcadas pelos diferentes modelos de uso da
linguagem que o meio social lhe oferece.
Isso implica assumir que todas as funções mentais e superiores ou modos de
participação na atividade são relações internalizadas. Tal fato é provado pela relação que
existe entre a transferência das formas de agir do indivíduo para diferentes contextos e o
processo de internalização e posterior externalização.
BAKHTIN E A CONCEPÇÃO DIALÓGICA DA LINGUAGEM
Para Bakhtin, o conceito de dialogismo possui um vínculo indissolúvel com o de
interação, sendo a base do processo de produção do discurso e da própria linguagem. Isso
quer dizer que não há interação sem diálogo, uma vez que se trata de uma relação entre
mais de um sujeito.
Tal concepção denomina-se dialógica, porque propõe que a linguagem tem seus
sentidos quando produzida na interação entre subjetividades, no intercâmbio verbal, ou seja,
nas situações concretas de exercícios da linguagem. É importante considerar; porém, que
as relações dialógicas de que trata Bakhtin “não se circunscrevem ao quadro estreito do
diálogo face a face, que é apenas uma forma composicional, em que elas ocorrem. Ao
contrário, todos os enunciados no processo de comunicação, independentemente de sua
dimensão, são dialógicos”. (FIORIN,2009, p. 18)
Por isso, os pressupostos teóricos de Bakhtin fundamentam essa pesquisa. Por meio
dos discursos orais dos sujeitos envolvidos na pesquisa – professores e psicólogos
escolares – e da própria interação, pretende compreender esses sujeitos e, por seu
intermédio, compreender também o seu contexto. Além disso, as entrevistas que serão
realizadas com os sujeitos da pesquisa, por exemplo, atendendo aos princípios
bakhtinianos, não serão reduzidas a simples perguntas e respostas, mas concebidas como
produção da linguagem, portanto, dialógica.
IDENTIDADE PROFISSIONAL
Hall (2006) distingue três concepções de identidade. A primeira é de identidade do
sujeito do Iluminismo, segundo a qual o sujeito estava baseado numa concepção de pessoa
humana como um indivíduo centrado, unificado; a segunda concepção é de identidade do
sujeito sociológico, visto como aquele que refletia a crescente complexidade do mundo
moderno e a consciência de que este núcleo interior do sujeito não era autônomo; e a
terceira é de identidade do sujeito pós-moderno, visto como não tendo uma identidade fixa,
essencial ou permanente, sendo a identidade formada e transformada continuamente.
Moita Lopes (2003, p.15) reforça essa última concepção ao afirmar que “Há nas
práticas cotidianas que vivemos um questionamento constante de modos de viver a vida
social que têm afetado a compreensão da classe social, do gênero, etc., em resumo, de
quem somos na vida social contemporânea.”
Todo profissional, frente a essa realidade, necessita pensar sobre si próprio. Essa
prática indica que ele está preparado para refletir sobre sua identidade e seu papel
profissional, e que tem clareza da diferença entre ambos. As identidades organizam o
significado, e os papeis sociais definem a função.
Assim, a identidade profissional inclui as crenças, representações e os valores que
cada profissional nutre a seu respeito, a respeito dos outros e de todo o ambiente social em
que vive e trabalha. É a partir dessa base de valores que se investe de significado os papeis
que assume.
No que diz respeito à identidade do professor, conforme Derouet (1988) apud Moita
(1995), é chamada de “montagem compósita”. Trata-se de uma construção que atravessa a
vida profissional desde a fase da opção pela profissão até a sua aposentadoria. Passa pelo
período de formação inicial propriamente dito e pelos diferentes espaços institucionais onde
a profissão se efetiva.
Segundo Moita (1995, p. 116), “O processo de construção de uma identidade
profissional própria não é estranho à função social da profissão, ao estatuto da profissão e
do profissional, à cultura do grupo profissional e ao contexto sociopolítico em que se
desenrola.”
A constituição da identidade profissional do professor acontece de forma contínua.
Passa pelas relações pessoais que estabelece no seu ambiente de trabalho com alunos,
família e instituição; pelo meio da construção de saberes e conhecimento; pelas interações
que estabelece entre o universo profissional e o sociocultural; e pela formação continuada,
em um processo de formação e transformação.
Essa concepção é compartilhada por Rajagopalan (2003, p. 71), ao afirmar que “as
identidades estão, todas elas, em permanente estado de transformação, de ebulição. Elas
estão sendo constantemente reconstruídas. Em qualquer momento dado, as identidades
estão sendo adaptadas e adequadas às novas circunstâncias que vão surgindo.” A
identidade, portanto, não é algo imutável, mas trata-se de um processo de construção do
sujeito historicamente situado.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Tendo em vista o exposto, acredita-se que o percurso teórico delimitado a partir de
estudiosos como Bakhtin e Vygotsky revela-se como importante contribuição para o
entendimento e apreensão de representações sobre identidades profissionais, em especial
no que se refere à profissão do professor.
Em consonância com esse escopo, entendemos que a identidade profissional está
ligada, dentre outros fatores, ao papel que os indivíduos representam socialmente; à relação
entre o contexto/ambiente em que realiza o seu trabalho; e à sua competência, ou seja, à
clareza da abordagem teórica em que está respaldada a sua prática. Para Almeida Filho
(2010, p. 20), “os professores, todos, quando adentram suas salas de aula, ou quando
atuam como profissionais antes e depois das aulas, passam a agir orientados por uma dada
abordagem”.
Portanto, a identidade profissional é fundamentalmente construída a partir do
significado social da profissão, bem como a partir do sentido e da importância que cada
profissional confere à sua atividade no cotidiano, considerados os seus valores, sua história,
seus saberes e o sentido que tem o ser professor em sua vida.
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