Para dormir (e sonhar) melhor

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anatomia do sono
Para dormir
(e sonhar) melhor
em maio, mente e cérebro reuniu neurocientistas, psicanalistas
e médicos no seminário “anatomia do sono”, o primeiro
promovido pela revista, no rio de em janeiro e em são paulo.
o impacto da tecnologia em nosso relógio biológico,
intervenções e tratamentos de distúrbios do sono e a
importância dos sonhos foram alguns dos temas discutidos
por Fernanda Teixeira Ribeiro
A AUTORA
Fernanda Teixeira Ribeiro,
jornalista, editora-assistente de
Mente e Cérebro
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l mentecérebro l julho 2013
aleshyn andrei/shutterstock
E
m algum momento você já pensou que, se não
fosse necessário dormir, teria à sua disposição
valiosas horas extras para trabalhar, estudar, se
divertir, enfim, produzir? Em uma sociedade na
qual o tempo parece não dar conta de tanta coisa a ser
feita, um aspecto importante para a saúde do corpo e da
mente é frequentemente negligenciado: o sono. No último
século, nosso ritmo de sono sofreu uma influência sem precedentes – a da tecnologia, que coloca à nossa disposição
uma série de estímulos (luz elétrica, TV, computadores)
para o cérebro. Assim, estamos indo para a cama cada
vez mais tarde. Em São Paulo, por exemplo, as pessoas
dormem em média seis horas e meia por noite, uma hora
a menos que há 40 anos. A qualidade do sono também
mudou. O estresse e ansiedade relacionados a estímulos
urbanos (como barulho, tempo gasto no trânsito, sensação
de falta de segurança) e ao sedentarismo não raro estão
associados a alguns dos distúrbios do sono mais comuns,
como a insônia e a apneia.
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marcello hollanda
anatomia do sono
Os médicos do sono Gleison Guimarães (à esquerda) e Francisco Hora (à direita) e o neurocientista Sidarta Ribeiro
(centro) em debate no Rio de Janeiro
Em maio, Mente e Cérebro reuniu especialistas em medicina do sono, neurocientistas
e psicanalistas no seminário “Anatomia do
Sono”, o primeiro promovido pela revista, no
Rio de Janeiro e em São Paulo. O impacto da
tecnologia sobre o nosso relógio biológico,
intervenções e tratamentos de problemas do
sono e a importância dos sonhos para o processo evolutivo foram alguns dos temas discutidos, nas palestras e na mesa-redonda, na qual
os participantes responderam a perguntas do
público. Veja alguns dos assuntos abordados.
RESGATE DA SESTA
Uma bela metáfora do que ocorre no cérebro
enquanto dormimos é a obra Sono (1937),
de Salvador Dalí – uma enorme cabeça sem
corpo, apoiada sobre muletas, sugere que, enquanto estamos aparentemente “desligados”,
acontecem inúmeros processos mentais,
essenciais para a saúde orgânica e psíquica,
como os sonhos. “Existe a percepção equivocada de que dormir é perda de tempo ou lazer.
Mas cada vez mais a ciência aponta a estreita
relação do sono com processos importantes,
como o fortalecimento das defesas imunológicas”, diz o pneumologista Francisco Hora,
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l mentecérebro l julho 2013
presidente da Associação Brasileira do Sono.
A crescente demanda por produtividade
praticamente extinguiu o hábito do cochilo,
“que é natural e tem função fisiológica”, segundo Hora. Dormir por 30 minutos no meio
do dia diminui a irritabilidade e contribui para
a melhora da produtividade e das relações
interpessoais. Um estudo da Faculdade de
Saúde Pública da Universidade de São Paulo
(FSP-USP) mostrou que tirar uma soneca no
serviço é uma estratégia que aumenta o alerta de enfermeiros que trabalham à noite. Ao
mapear o ritmo biológico de 20 enfermeiros
de um hospital da capital paulista, os pesquisadores observaram que os que podiam
dormir breves períodos durante a jornada noturna apresentavam menos sonolência. Além
disso, a qualidade do sono variou conforme
a tolerância a trabalhar em diferentes turnos.
“Necessitamos, em média, de 7 a 8 horas de sono por dia. Mas uma minoria se
desvia da curva: há ‘dormidores curtos’, que
descansam bem com poucas horas de sono;
já os ‘dormidores longos’ precisam de mais
tempo para acordar com a sensação de sono
reparador. É uma característica biológica,
muito difícil de modificar”, diz o neurologista
Rubens Reimão, líder do Grupo de Pesquisa
Avançada em Medicina do Sono da Universidade de São Paulo (USP). De acordo com ele,
15% dos adultos são vespertinos: tendem a
ir para a cama de madrugada e a dormir até
mais tarde, quando possível. Concentram-se
e desempenham melhor suas tarefas no final
da tarde e à noite e têm mais dificuldade para
se encaixar no horário padrão de trabalho, o
que, de certa maneira é uma “desvantagem
social”, em um ritmo que privilegia “quem
cedo madruga” – hábito que, na verdade, é
espontâneo em apenas 15% das pessoas.
O neurologista
Rubens Reimão, líder
do grupo de pesquisa
avançada em medicina do
sono da Universidade de
São Paulo (USP)
daniel caccia
EFEITOS DA PRIVAÇÃO
Cerca de 30% da população trabalha à noite ou
em turnos que interferem no horário de sono.
E a maioria não consegue dormir bem de dia,
por causa da presença de luz, o que interfere
na produção do hormônio melatonina, “o
maestro do sono”, explica o neurologista e
especialista em distúrbios do sono Nonato
Rodrigues, professor da Universidade de Brasília (UNB). Essa subversão ao ritmo circadiano
– nosso relógio interno, que sinaliza ao corpo
quando é necessário descansar, sincronizado
ao longo da evolução com a iluminação solar –
resulta em um sono pouco restaurador, que
afeta o humor, a resistência imunológica,
a memória de curto prazo, e causa
sonolência, entre outros efeitos.
A privação de sono, aliás, está
associada a 42% dos acidentes automotivos no Brasil. “Caminhoneiros,
por exemplo, dirigem por horas
ininterruptas e não raro abusam de
cafeinados para se manter acordados.
Um único acidente com caminhão resulta
na morte de mais 3 ou 4 pessoas, o que faz
disso uma questão de saúde pública”, diz Rodrigues, que ressalta que, com o avanço das
pesquisas na área do sono, tem sido possível
identificar e compreender novos distúrbios,
como os transtornos do despertar. Marcados
por transições rápidas e tênues entre vigília,
sono REM (rapid eye movement) e sono não
REM, estão associados a comportamentos
que vão desde confusão mental ao acordar até
sonambulismo, paralisia do sono (a sensação
de que se está consciente, mas não se pode
mover o corpo) e terror noturno.
Estudos recentes também associam as
mudanças nos padrões de sono a transtornos
alimentares. Em 2010, pesquisadores da Uni-
Público assiste ao seminário na Universidade Mackenzie, em São Paulo
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anatomia do sono
daniel caccia
Os neurologistas
Nonato Rodrigues,
da Universidade de
Brasília (UNB), e Dalva
Poyares, da Universidade
Federal de São Paulo
(Unifesp): sonolência está
relacionada a mais de 40%
dos acidentes automotivos
no Brasil
versidade de Chicago, em Illinois, prescreveram
a dez voluntários com sobrepeso uma dieta
de duas semanas. Os participantes do projeto
foram divididos em dois grupos: aos integrantes de um deles era permitido dormir até oito
horas e meia por noite e, ao outro, não mais
que cinco horas e meia. As pessoas, como esperado, emagreciam em ambos os grupos, mas
aqueles que repousavam menos se livravam de
apenas metade da gordura corpórea em relação
aos outros e, ao mesmo tempo, perdiam 60%
a mais da massa muscular (o que costuma ser
prejudicial). “A prevalência de obesidade na
população geral é proporcional à redução do
tempo de sono, tanto que há mais obesos entre
dormidores curtos. Dormir menos é marcador
de um estilo de vida considerado desfavorável.
Essa relação é mais evidente na infância”, diz
a neurologista Dalva Poyares, professora da
Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
De acordo com Dalva, entre 10% e 20%
das pessoas dormem pouco e mal. Nesse universo, há mais mulheres que homens e mais
idosos que jovens. Marcada pela dificuldade
em iniciar o sono e pela permanente sensação
de “noite maldormida”, a insônia ganhou status de epidemia nas grandes metrópoles, pois
os estímulos urbanos de estresse contribuem
para deixar o cérebro alerta, atrapalhando o
sono. Adquirir hábitos que favorecem um sono
mais saudável (veja quadro na pág. 71) ajuda
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a combater a insônia de forma eficiente. Para
os casos mais severos, porém, é necessário
tratamento farmacológico combinado com
terapia comportamental cognitiva (TCC), que
busca reestruturar pensamentos e crenças
disfuncionais em relação ao sono.
RONCAR É “NORMAL”?
Provocado pelo estreitamento (ou obstrução)
das vias respiratórias superiores durante o
sono – o que dificulta a passagem do ar e causa
ruído – , o ronco é um fenômeno comum, muitas vezes não relacionado a nenhum distúrbio.
No entanto, quando frequente e irregular, é um
dos principais sinais de apneia obstrutiva do
sono (AOS), patologia caracterizada por parada
respiratória com duração de pelo menos dez
segundos nos adultos e dois (ou três) segundos nas crianças. “A dificuldade respiratória
geralmente aparece na infância, tanto que a
apneia prevalece em 7% a 10% das crianças.
Essa herança de uma via área reduzida indica
potencial para ser um futuro roncador”, diz o
médico do sono Gleison Guimarães, coordenador do Laboratório do Sono do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, da Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
As consequências do ronco vão muito
além de incomodar quem divide a mesma
cama. “A apneia está associada ao maior risco
de doenças cardiovasculares e também à piora
Para uma noite tranquila
Dormir bem é importante para manter uma vigília de qualidade. Alguns hábitos simples contribuem para a higiene do sono:
Diminuir o consumo de substâncias estimulantes, como cafeína (presente no chá,
café e outras bebidas) e nicotina (cigarro).
O álcool, apesar da ilusão de que causa
relaxamento, também atrapalha o sono: ele
favorece o ronco e o despertar frequente.
Praticar atividade física, no máximo, até 4
horas antes de ir para a cama, pois exercícios
liberam substâncias estimulantes.
Anotar as preocupações
antes de se deitar ajuda
a dispersá-las, facilitando o sono
do sono de maneira geral. Existe o
mito de que quem
ronca ‘dorme bem’,
mas o ronco nunca é
sinal de sono reparador”, diz. Os principais
sintomas da apneia são
ronco crônico, acordar várias
vezes ao longo da noite e sonolência durante o dia. O tratamento consiste em
controlar fatores de risco (como tabagismo,
obesidade, dormir de costas) ou, em casos
mais severos, usar um dispositivo, o CPAP
(pressão positiva contínua) nasal, que melhora o fluxo respiratório e reduz os ruídos e as
paradas respiratórias.
ENSAIO PARA A VIDA
Em uma passagem da Bíblia, o prisioneiro
José – conhecido por interpretar sonhos – foi
chamado à presença do faraó, que estava
preocupado com duas experiências oníricas,
muito similares, que tivera na noite anterior. Na
primeira, sete vacas doentes e magras devoravam sete vacas gordas. Na outro, sete espigas
de milho que floresciam se transformavam em
Ver TV, e utilizar o computador na cama,
estimula o cérebro. Além disso, a luz dos
monitores inibe a secreção de melatonina.
Deixar o celular ao lado da cabeceira
pode atrapalhar o sono, pois o cérebro
entende que é preciso ficar alerta.
Evitar, se possível, relógios de pulso e
no quarto despertadores.
Tentar manter uma rotina,
com horários regulares para
dormir e acordar, mesmo
nos fins de semana.
cereais ressequidos. O
jovem interpretou as
imagens: haveria sete
anos de prosperidade
no Egito, seguidos de
outros tantos de seca e
fome. A solução era estocar
comida para se preparar para
os períodos de baixa safra, que de
fato vieram. De acordo com o texto, Deus
usou a linguagem codificada dos sonhos para
revelar ao soberano o que ele devia fazer. A
neurociência atual, porém, provavelmente
examinaria a questão de maneira diferente: o
cérebro do faraó foi capaz de antecipar riscos
e de perscrutar possíveis soluções. “O sonho é
um ensaio para enfrentar a vida. É um oráculo
probabilístico, que simula recompensas e punições. Foi importante para aumentar as chances
de sobrevivência de nossos ancestrais – sonhar
com ataques de predadores e catástrofes, por
exemplo, era um ‘treino’ para reagir a essas
situações”, diz o neurobiólogo Sidarta Ribeiro,
diretor do Instituto do Cérebro da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).
Geralmente recebidos com estranhamento em nossa cultura, relatos de sonhos
Transtornos
de ansiedade
entre jovens
resultam,
em parte, de
um contexto
no qual há
pouco espaço
tanto para a
quantidade
adequada
de sono
quanto para a
subjetividade
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anatomia do sono
Acordamos
com níveis
baixos de
noradrenalina,
substância
relacionada à
consolidação
de memórias.
Permanecer
quieto
enquanto ela
é liberada
ajuda a
lembrar do
sonho
premonitórios ou de ideias inovadoras que
surgem durante o sono não são incomuns.
Foi ao sonhar com uma cobra mordendo o
próprio rabo, por exemplo, que o químico
alemão Friedrich Kekulé teve o insight da fórmula estrutural do benzeno. Os compositores Ludwig van Beethoven e Paul McCartney
acordaram com novas melodias soando na
cabeça. Também foi inspirado em um sonho
que Mahatma Gandhi concebeu um protesto
não violento na Índia.
“Há um século, Freud disse que os sonhos
contêm restos diurnos e que desejos são o
motor dos sonhos. Isso é neurociência do
melhor calibre: os ‘restos diurnos’ refletem a
vigília, por isso é de esperar que aprendamos
durante o sono; e estudos já mostraram que
em casos de lesão nos circuitos dopaminérgicos, relacionados à busca de prazer, não
há sonhos, apesar de haver sono REM”, diz
Ribeiro (ver quadro abaixo).
O neurobiólogo compara nossa “topografia
mental” a um terreno que sofre alterações durante a vida. “Quando nascemos, ela é plana,
mas se particulariza ao longo do tempo, formando desfiladeiros únicos. Nas tempestades
elétricas que ocorrem no cérebro enquanto dormimos, as águas correm por esses caminhos,
percorrendo relevos neurais definidos. Sonhos
não são ao acaso, são moldados por uma geografia singular – cada pessoa sonha de uma
maneira”, explica. Ele ressalta que, portanto, o
relato de sonhos e a livre associação (conceito,
criado por Freud, que consiste em encorajar
o analisando a dizer o que vem à mente) têm
utilidade clínica quantitativa.
Como disse o criador da psicanálise, sonhos
são um caminho real para o inconsciente, porta
de acesso para encarar (e tentar lidar com)
medos e vivências traumáticas. Lembrar deles
e registrá-los em um “sonhário” (diário de imagens oníricas) pode ajudar a explorar memórias
e possibilidades. Para tentar não esquecê-los,
Ribeiro dá duas dicas: autossugestão, isto
é, propor-se a sonhar e a lembrar antes de ir
dormir e criar o hábito de evitar levantar-se
apressadamente e começar a fazer as atividades
diárias logo ao abrir os olhos. “Acordamos com
níveis baixos de noradrenalina, neurotransmissor relacionado à consolidação de memórias.
Permanecer quieto ajuda essa substância a
chegar, o que aumenta as chances de recuperar
a lembrança do sonho.”
GERAÇÃO ZAPPING
Alguns neurocientistas consideram, aliás, que
nossa capacidade de sonhar acordados, de
devanear, tenha evoluído do sonho noturno.
Recentemente, a revista Perspectives on Psychological Science publicou uma compilação de
pesquisas que associam o “ócio neural” ao
aumento da criatividade e da capacidade de
resolver problemas. Quando a mente se dispersa, a rede neural de modo padrão (DMN,
na sigla em inglês) se torna mais ativa. Esse
circuito está relacionado à introspecção, a pensamentos internos, à imaginação do futuro, à
recuperação espontânea de memórias, à divagação e ao surgimento de soluções criativas.
Segundo os autores, a crescente quantidade
de ofertas para “preencher” o tempo – navegando na internet ou vendo TV por horas a fio,
hank morgan/photo researchers, inc.
Mapa do cérebro adormecido
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Sono REM
vigília
Os sonhos são identificados por rápidos
movimentos oculares (REM) durante
o sono, quando o cérebro se mostra
tão ativo como se a pessoa estivesse
acordada. As imagens de tomografia por
emissão de pósitrons (PET) mostram
a atividade cerebral durante essa etapa
(esquerda) e em vigília (direita). A cor
vermelha indica as áreas mais ativas, e
as menos ativas aparecem em azul.
daniel caccia
As psicanalistas Erane
Paladino (à esquerda) e
Maria Helena Saleme (à
direita): vivências oníricas
são importantes para
elaborar experiências
por exemplo – atrapalha a dispersão natural.
Para a psicanalista Erane Paladino, autora
de O adolescente e a sociedade contemporânea
(Casa do Psicólogo, 2005), a cultura antiócio
pode prejudicar principalmente os mais jovens. Os estímulos externos interferem no
tempo naturalmente dedicado à reflexão, no
hábito de olhar para dentro, essencial para
construir memórias e conferir sentido às suas
vivências. Segundo Erane, os adolescentes
tendem a ficar recolhidos em seu quarto, não
raro ‘interagindo’ na rede madrugada adentro.
No monitor do laptop ou no visor do celular
incontáveis telas são abertas, reduzidas e
fechadas em segundos. “A informação chega
entrecortada, revelando uma concentração
‘mais plástica’ que apreende informações
de várias fontes, parcial e simultaneamente,
caracterizando a chamada geração zapping”,
diz a psicanalista, referindo-se à expressão de
origem inglesa que significa mudar constantemente de canal.
O aumento da sonolência e dos transtornos de ansiedade entre jovens são efeitos
desse contexto no qual há pouco espaço para
a quantidade adequada de sono e para o desenvolvimento da subjetividade. “Assim como
as informações zapeadas, a mente, o corpo
e as relações podem estar fragmentados,
dificultando uma percepção mais apurada e
cuidadosa, seja de seus sentimentos, seja dos
próprios sonhos e de como eles se relacionam
a experiências que o mundo tão intensamente
lhes oferece”, observa Erane.
ENCENAÇÃO DO DESEJO
Prestar atenção nos sonhos é uma maneira de
acessar anseios e desejos que a mente consciente – perdida em meio a tantas cobranças,
internas e externas –, não raro, bloqueia. Para
Freud, o esquecimento dos sonhos é uma
maneira de evitar se aprofundar no mundo
psíquico. “Durante o sono, continuamos ‘pensando’, mas em ordem de percepção diversa
da que temos quando despertos. O aparelho
psíquico forja a realização de desejos. Essa
encenação é uma linguagem, que não deve ser
‘biologizada’ nem passível de medicação”, diz
a psicanalista Maria Helena Saleme, coordenadora do curso de formação em psicanálise
do Instituto Sedes Sapientiae.
Relatar sonhos em uma sessão de análise,
por exemplo, possibilita apropriar-se dessas
imagens e buscar relações entre elementos
oníricos, experiências recentes – “os restos
diurnos”, nas palavras de Freud – e memórias
antigas do sonhador no contexto psíquico individual e único de cada um de nós. “É um trabalho de elaboração pela repetição do que foi
vivenciado. É uma condensação de elementos
que quase sempre remete a uma questão que
estamos vivendo”, conclui Maria Helena. mec
PARA SABER MAIS
Reparos secretos durante o
sono. Jason Castro. Mente e
Cérebro no 243, págs. 64-67,
abril de 2013.
As respostas que vêm dos
sonhos. Deidre Barret. Mente e Cérebro no 229, págs.
26-33, fevereiro de 2012.
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