O desenvolvimento cognitivo da criança.

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Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo
São Paulo, Seis de fevereiro de 2014.
Milena Toschi de Andrade
Nº USP: 9020792
Turma: 02- Vespertino.
Email: [email protected]
Responsável: Profa. Dra. Ana Laura Godinho Lima.
Trabalho Final da disciplina Psicologia da Educação I
(Teorias psicogenéticas e temáticas educacionais contemporâneas)
Tema: Desenvolvimento, diferenças individuais e desigualdades.
Título: O desenvolvimento cognitivo da criança.
O desenvolvimento cognitivo da criança.
1. Contribuições das teorias de Piaget e Vygotsky
Cognição é o nome dado ao processo de aquisição de conhecimento através da
percepção, e se trata de um mecanismo de conversão do que é captado para o nosso
modo interno de ser e agir em relação ao meio em que vivemos. A própria
aprendizagem é um dos fatores mais importantes neste processo de aquisição, sem ela,
não seria possível tornar real o desenvolvimento.
Embora a aprendizagem tenha sido um tema recorrente desde a Grécia Antiga, na
educação contemporânea Jean Piaget e Lev Vygotsky são os nomes mais conhecidos
quando o assunto é teorias sobre a aprendizagem.
Segundo Piaget em sua Teoria de Epistemologia Genética, (que objetivava definir a
partir de um olhar biológico, como o sujeito adquire um conhecimento maior,
posteriormente a adquirir um conhecimento menor, passando assim por níveis graduais
de conhecimento), o conhecimento se constrói pela interação do sujeito com o meio, a
partir de estruturas já existentes. Segundo esta teoria, todo o desenvolvimento obedece a
estágios hierárquicos que têm inicio no nascimento e se consolidam aos 16 anos, que
são apresentados a seguir.
O primeiro deles, o sensório-motor, se trata basicamente do período que antecede a
linguagem, entre o nascimento e aproximadamente dois anos. Comprova-se assim, com
base nesta teoria que o desenvolvimento cognitivo é prévio à linguagem, pois quando
uma criança se adentra no universo da linguagem oral, já “possui um mundo” do qual
pode falar, uma inteligência pré-verbal. É o estágio da inteligência prática, pois nele a
criança não faz uso da linguagem em seu processo de desenvolvimento, mas sim da
percepção, capaz de estimular o desenvolvimento mental. As crianças começam neste
momento a aprender manipular os objetos, como uma forma de compreendê- los através
de seu uso. Não há, porém, nenhuma diferenciação entre o “eu” e o mundo exterior, esta
construção se faz inicialmente, por um egocentrismo inconsciente, que leva a criança à
elaborar uma percepção de mundo exterior.
O segundo estágio é o operatório concreto que se constitui inicialmente de uma
inteligência intuitiva e depois operatória, baseada na reciprocidade do pensamento, se
inicia por volta dos dois anos, e é marcado por uma transição onde se inicia o
pensamento como linguagem, o jogo simbólico a imitação e outras formas de função
simbólica. Neste estágio, a inteligência ainda é prática, mas acompanhada de uma
inteligência representativa, recebe este nome porque significa que a criança usa a
representação, aliado a um trabalho de assimilação e organização dessas representações.
Para Piaget, esta passagem entre esses dois primeiros estágios não são reflexos apenas
da vida social, mas também dos progressos da inteligência pré- verbal e da
interiorização da imitação em representações. Há também neste estágio, o surgimento
de uma introdução à moral, ou seja, às noções de valores, regras, virtudes e “certo e
errado”, para o autor é só aos 4 anos que a criança é capaz de compreender a moral.
Por volta dos sete anos se inicia o terceiro estágio, paralelo ao início da escolaridade da
criança, é o estágio das operações formais, no qual a criança começa a constituir uma
lógica concreta, embasada nos objetos que analisam e manipulam. É nesta fase que as
crianças conhecem e passam a participar de jogos regrados, os quais possibilitam uma
reflexão sobre a conduta social, e interior da criança, a capacidade de cooperação e uma
autonomia pessoal.
O último estágio, o operatório formal, que surge entre os 11 e 12 anos, é onde a criança
finalmente chega ao mundo das operações formais. A característica principal dessa fase
está na realização de operações a partir, não só de objetos, mas também de hipóteses e
proposições, que podem se aplicar a qualquer conteúdo. Mesmo sendo o último dos
estágios, este se perpetua por todo o desenvolvimento do indivíduo, os quais vão
avançando cada vez mais em direção à um raciocínio formal e abstrato.
Assim, na concepção piagetiana, a passagem de um estágio para o outro depende da
consolidação e superação do estágio anterior. Esses estágios agem como mecanismos de
“equilibração das estruturas mentais”, que transformam em novo um conhecimento
prévio, formando a base da aprendizagem e do desenvolvimento cognitivo da criança.
Já para Vygotsky, em sua Teoria do Sócio- Interacionismo o conhecimento se
construiria através das interações entre o sujeito, o meio e o outro, e o funcionamento do
cérebro humano se fundamenta em fundamenta na ideia de que as funções psicológicas
são construídas durante toda a história do indivíduo, ao longo de sua vida, e com base
também nas relações que este estabelece com o mundo que o cerca, evidenciando assim,
que o ser humano se diferencia dos animais por ser capaz de criar meios de ação.
Assim, a busca da compreensão do desenvolvimento psicológico, não pode ser encarada
como um processo natural do sistema nervoso central. Vygotsky, vai contra a ideia de
que as funções mentais são fixas e imutáveis, e trabalha com o preceito de que o
cérebro funciona como um sistema aberto e flexível, cuja estrutura e modo de
funcionamento são moldados ao longo da história da espécie e ao longo do
desenvolvimento individual e coletivo.
De acordo com essa teoria, a linguagem impulsiona o desenvolvimento, o que
possibilita o homem a visão do homem como ser biológico, histórico e cultural. Para
ele, o desenvolvimento é indissociável da aprendizagem, pois esta já se trata do próprio
processo que promove as estruturas mentais, diferente de Piaget que acredita que a
estruturação
do
organismo
antecede
o
desenvolvimento.
Em ambas as teorias, é preciso evidenciar o fato de que, tanto a escola quanto a família
possuem papéis fundamentais na descoberta e construção do conhecimento, e que
devem sempre buscar o estímulo, a autonomia e a busca pelo conhecimento nas
crianças.
2. Desigualdades no campo do conhecimento- determinismo e preconceito.
Durante toda a história, e especialmente a partir dos estudos deterministas, testes e
pesquisas buscaram especificar e medir a inteligência humana. Porém, estes testes
muitas vezes foram usados para justificar um preconceito preexistente, onde dita um
conhecimento hierárquico e pré-definido.
O determinismo biológico foi usado como justificativa para sustentar o argumento de
que diferença social, comportamental, racial e econômica entre os grupos humanos são
provenientes de herança genética, imutáveis e um reflexo fiel da biologia. Assim, os
hereditaristas concluem que desde o nascimento possuímos certa quantidade de
inteligência que se dá de forma intransferível e incapaz de ser aumentada. Portanto, a
desigualdade seria algo natural e ir contra a natureza faria mal para a sociedade e para a
própria pessoa, já que forçar a pessoa a fazer algo que ela, biologicamente, não é capaz
de fazer seria errôneo.
O reflexo destas teorias entre a sociedade, são suspeitas de que os preconceitos são
fatores biológicos e científicos. Estes problemas e pré-conceitos se perpetuam até a
educação atual, onde a diferença social, racial e de classes é usada para subjugar os
indivíduos.
As teorias que explicam as desigualdades na escola contribuíram para o rompimento do
mito de que a educação promove a igualdade, pelo contrário, muitas vezes apenas
mantém ou até reafirma as desigualdades sociais. Segundo Bourdieu, a realidade escolar
vai contra a visão paradisíaca de democracia e igualdade, pois tem como principal
função a reprodução, inclusive das desigualdades sociais.
É fato que o desenvolvimento dos seres humanos sempre foi condicionado pelo meio ao
qual este está inserido, pela cultura, e pelas interações sociais, materiais e simbólicas.
Deste modo, analisamos que são estes intercâmbios os fatores que culminam o
desenvolvimento, se tornando essenciais e indispensáveis, tanto para o próprio
indivíduo como para o coletivo.
Dentro do ambiente escolar, é comum ver alunos que não correspondem às expectativas
de rendimentos ou comportamento, serem encaminhando para diagnóstico pelos
professores, uma atitude medicalizada das dificuldades de escolarização das crianças. É
uma atitude que pressupõe que se o aluno não se adapta às imposições escolares é
portador de alguma anormalidade, restando apenas consultar os testes, para
supostamente descobrir qual.
Assim, o professor passa a acreditar que o aluno que tem mais dificuldade de
aprendizagem, por exemplo, precisa ser acompanhado por psicólogos, transferindo a
responsabilidade para a ciência, que não é contestada pelo prestigio que assume, ainda
que seja uma atividade de cunho social, administrada por humanos, e assim sujeita a
erros. O texto “A produção do fracasso escolar” (1991), da autora Maria Helena Souza
Patto, mostra um exemplo de equívoco na aplicação dos testes de inteligência, ao
desconsiderar a experiência escolar de cada criança durante a realização desses testes.
Questões como a má organização escolar, falta de profissionais competentes, falta de
acolhimento e inclusão por parte da instituição escolar, não são consideradas como
fatores de intervenção no desempenho psicológico cognitivo, normalmente, apenas
questões familiares ou individuais são levadas em conta.
Um bom profissional não deve se basear no pressuposto de que as famílias pobres são
indignas, mas sim fundamentar seu trabalho no respeito ao cliente, à sua dignidade, e à
diversidade. A Psicologia deve ter uma desconfiança saudável a respeito do valor dos
testes de inteligência e de personalidade, e os professores, por sua vez, não devem ver a
ciência como algo maior e mais confiável, uma vez que ele também é o responsável por
observar as diferenças individuais de seus alunos. Dentro do ambiente escolar, é papel
do professor, proporcionar aos alunos meios que facilitem sua aprendizagem e
aproveitamento dos estudos. Para que isso ocorra, é necessária uma observação contínua
e detalhada dos alunos, podendo assim reverter fatores negativos que não favorecem a
aprendizagem, para que as particularidades possam ser atendidas igualmente.
3. Bibliografia
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NOGUEIRA, M. A.; CATANI. Afrânio (orgs). Escritos de educação. Petrópolis, Vozes,
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2.
ed.
Trad.
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Villalobos.
São
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Patto, M. H. S. (2000). A produção do fracasso escolar. Histórias de
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