Estruturas Organizacionais Professor conteudista: Roberto M. Tomaoka Sumário Estruturas Organizacionais Unidade I 1 ORGANIZANDO AS ORGANIZAÇÕES ..........................................................................................................2 2 A ORGANIZAÇÃO COMO EMPRESA ............................................................................................................5 2.1 A organização em transformação ....................................................................................................7 2.2 O homem flexível ................................................................................................................................. 13 2.3 Perspectivas ............................................................................................................................................ 17 2.3.1 Abordagem sistêmica ............................................................................................................................ 18 2.3.2 Configuração organizacional ............................................................................................................. 21 2.3.3 Componentes básicos ........................................................................................................................... 27 Unidade II 3 A ORGANIZAÇÃO COMO FUNÇÃO ADMINISTRATIVA....................................................................... 34 3.1 Conceitos básicos: a administração e o processo administrativo .................................... 34 3.2 A função organização ........................................................................................................................ 37 3.2.1 O processo de organização da organização ................................................................................ 37 3.3 Estrutura organizacional ................................................................................................................... 39 3.3.1 Organograma e os níveis organizacionais .................................................................................... 40 3.3.2 Dimensões organizacionais ................................................................................................................ 41 Unidade III 4 PROJETOS ORGANIZACIONAIS E EFICIÊNCIA ADMINISTRATIVA .................................................. 55 4.1 Estruturas tradicionais ....................................................................................................................... 58 4.1.1 Estrutura funcional ................................................................................................................................ 58 4.1.2 Estrutura divisional ................................................................................................................................ 59 4.1.3 Estrutura geográfica ou territorial .................................................................................................. 62 4.1.4 Estrutura matricial ................................................................................................................................. 63 4.2 Estruturas emergentes ....................................................................................................................... 67 4.2.1 Estrutura horizontal .............................................................................................................................. 67 4.2.2 Estrutura em rede ................................................................................................................................... 70 4.2.3 Estrutura em rede virtual .................................................................................................................... 73 4.2.4 Aplicações .................................................................................................................................................. 74 Unidade IV 5 NOVAS PERSPECTIVAS .................................................................................................................................. 83 5.1 Estrutura tríplice ................................................................................................................................... 84 ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS 5 Unidade I 10 15 20 APRESENTAÇÃO Prezado aluno, 25 O presente livro-texto, Estruturas Organizacionais, do curso 30 de administração, está estruturado em cinco partes. 35 Neste introito apresentamos os objetivos e justificativas da disciplina. No item 1 damos a conhecer mais de um dos significados da palavra organização, isto é, o de entidade social e o de função administrativa. Na parte 2 discutimos a função administrativa da organização, focando as considerações e as soluções típicas para dar forma às entidades. O item 3 é dedicado aos projetos organizacionais, ou seja, nele você aprenderá como adequar os diversos elementos da organização para obter os resultados esperados, e, complementando o conteúdo desta matéria, incluímos vários exercícios para que possa praticar o que aprendeu ao estudar este tema. A disciplina Estruturas Organizacionais mostra-se fundamental para todos aqueles – e esperamos que para você, em particular – que tenham interesse pelo estudo da administração. Em primeiro lugar, vamos apresentar e discutir conceitos e aplicações que levem à devida compreensão da organização como entidade social e sua posição central na sociedade contemporânea. Em segundo, estudaremos a organização como uma das funções administrativas, dos fundamentos aos elementos necessários para o processo de organização, as dimensões organizacionais. Finalmente, mostraremos como as empresas, de maneira geral, 1 Unidade I resolvem suas questões explorando as diversas formas que podem assumir os projetos de estruturas organizacionais, tanto as tradicionais quanto as emergentes, definidas de maneira a tentar obter o máximo em ganhos de eficiência e eficácia, ou seja, a excelência no desempenho. Esperamos que, ao concluir a leitura deste livro-texto, não só tenha ampliado seu conhecimento teórico sobre o assunto, como tenha ficado instigado a procurar mais fontes para aprofundar ainda mais seu aprendizado. Bons estudos. 1 ORGANIZANDO AS ORGANIZAÇÕES Por uma dessas particularidades presentes em muitos idiomas, entre eles a língua portuguesa, uma mesma palavra pode ter diversos significados. Organização é uma delas. Se consultarmos um dos mais conceituados dicionários da nossa língua, o Houaiss (2009), encontraremos pelo menos quatro sentidos para essa palavra. Para os objetivos deste livro-texto, observaremos os significados contidos no jogo de palavras do título deste item: organizando as organizações ou, dito de forma ainda mais enfática: organização da organização. De um lado, podemos considerar a organização como uma entidade social, na qual pessoas e recursos diversos se agrupam a fim de atingir objetivos específicos. A empresa na qual trabalhamos ou a universidade na qual estudamos dão a ideia de um local físico, concreto, estabelecido. Por outro lado, também é válido considerar organização como uma das funções administrativas, encarregada de dar forma ordenada ao trabalho, ou seja, de cuidar do seu projeto organizacional, de maneira que as pessoas e os recursos consigam os melhores resultados possíveis. 2 Organização social como entidade Pense na sua empresa ou, caso não trabalhe, na própria universidade e identifique as pessoas, os recursos e os objetivos. Repita o exercício com outras entidades, como lojas, clubes, uma repartição pública. É o primeiro passo para estudar e compreender as organizações. Organização administrativa como função Como você administra sua vida? Pode não se dar conta, mas há muitas semelhanças com a administração de uma empresa. Planejamos sobre o que queremos para o nosso futuro, orientamos ou direcionamos ações relacionadas a nossas atividades, controlamos e corrigimos rumos e organizamos nosso tempo. Somos, em essência, uma pequena empresa! ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS Embora distintas, as duas definições encontram-se estreitamente ligadas. Existe uma diversidade grande de setores, áreas de atuação, características específicas de cada ramo, que fazem com que as empresas se diferenciem uma das outras, que se distingam pelas suas peculiaridades. Presidente RD* Ger. produto Engenharia Ger. comercial Produção Ger. financeiro Vendas Contabilidade *Representante da Direção Por exemplo, uma indústria de transformação, que produz bens, precisa converter insumos como matérias-primas, energia, tecnologias diversas em produtos, utilizando instalações, maquinário e trabalho especializado. Proprietário Gerente Secretária Vendedora 1 Vendedora 2 Vendedora 3 Montador Já em um comércio de varejo, muitas vezes encontra-se uma estrutura bastante enxuta, bastando um espaço para a apresentação dos produtos, um local de estocagem e alguns poucos vendedores. 3 Unidade I A situação pode ser ainda mais distinta se essencialmente não existir um bem material envolvido. Assembleia geral Conselho administrativo Conselho fiscal Contabilidade Financeiro Jurídico R. humanos Informática Serv. gerais Cliente/Mercado Projeto A Projeto B Projeto C ... ... ... ... ... ... ... Projeto N Uma empresa de consultoria presta serviços e pode executar vários projetos ao mesmo tempo, compartilhando os seus especialistas. Pósgraduação Graduação Pesquisa Diretor Extensão Intercâmbio cultural Na mesma linha, uma universidade oferece diversos campos e áreas de atuação, proporcionando basicamente conhecimento e formação. 4 ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS Ao considerarmos esses exemplos de organizações, encontramos diferenças de tal porte que é inconcebível imaginar que todas possam ter as mesmas soluções administrativas. Deve-se orientar o projeto de estrutura organizacional segundo cada situação específica, de forma que se obtenha resultados mais satisfatórios. As figuras representam exemplos de soluções típicas de estruturas organizacionais em relação ao tipo de atividade da empresa. 2 A ORGANIZAÇÃO COMO EMPRESA As organizações estão integradas de tal maneira a nossa vida que nem nos damos conta de sua importância e representatividade. Praticamente todas as atividades humanas, com exceção de algumas poucas, em alguns locais mais isolados (e talvez, quem sabe, privilegiados), dependem de produtos ou serviços de alguma organização. Pode parecer uma afirmação contemporânea sobre as organizações, mas Amitai Etzioni já afirmava, em 1964, em seu clássico livro Organizações modernas, que nascemos, somos educados, trabalhamos, nos divertimos e morremos em organizações. Amitai Etzioni é considerado o criador da Teoria Estruturalista, formada com base nas quatro teorias da administração até então conhecidas: administração científica, administração clássica, relações humanas e burocracia. Ele tentou uma abordagem mais ampla, permitindo uma análise comparativa entre as diferentes organizações (Oliveira, 2008). Após passagem pelas prestigiosas universidades de Columbia, George Washington e Harvard, aposentou-se, mas ainda é uma voz ativa e ouvida. Foto: site da Fundação Etzioni. 5 Unidade I Mas, se como falamos na introdução, as organizações são tão diferentes, com atividades tão distintas, como podemos defini-las? Muitos pesquisadores elaboraram suas visões de organização, entretanto, no que é essencial, praticamente todas carregam o mesmo sentido. Para este livro-texto utilizo a definição dada por Richard L. Daft (2008, p. 10): “Organizações são entidades sociais, orientadas por metas, projetadas como sistemas de atividades deliberadamente estruturados e coordenados e ligados ao ambiente externo”. Entidades sociais, porque compostas por pessoas que, reunidas, formam um grupo social. Mas tal reunião não é fortuita, tem como base a necessidade de atingir metas, que possivelmente não seriam possíveis de ser alcançadas a partir de esforços isolados. Os recursos necessários para a consecução dos objetivos precisam ser convenientemente alocados e as atividades coordenadas, visando não somente à obtenção da máxima sinergia interna, mas também para possibilitar a flexibilidade, qualidade fundamental para as inevitáveis adaptações a um mundo em contínua mudança. É crescente a necessidade de interação com o ambiente externo e cada vez mais as empresas estão redefinindo o conceito de fronteira que, em vez de claramente definida, se torna mais tênue e difusa (figura 2.1). Da mesma forma que não se definem claramente os limites da influência da organização sobre diversos agentes externos, é crescente a influência destes nos rumos e até mesmo na condução dos negócios. É uma via de mão dupla. Recalls na indústria automobilística A indústria automobilística, assumindo cada vez mais a sua condição de “montadora”, é um excelente exemplo de fronteiras tênues e influências mútuas. Por um lado, as 6 ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS empresas parceiras, fornecedoras, assumem grande parcela do projeto e do desenvolvimento de peças, componentes e sistemas. De outro, existe um acompanhamento contínuo e rigoroso por parte das empresas automobilísticas. Tal arranjo permite reduzir os ciclos de desenvolvimento e lançamento de produtos, mas, em contrapartida, perde-se em controle. Talvez essa possa ser a explicação para a quantidade de recalls de automóveis no ano de 2010 no Brasil. Segundo o Portal de Notícias G1, do Sistema Globo, somente nos dez primeiros meses desse ano foram efetuadas 44 convocações, envolvendo em torno de 1,2 milhão de veículos. Um recorde absoluto.1 Ambiente geral Ambiente externo Zona de influência Ambiente interno Fig. 2.1 – Zona de influência entre a empresa e o ambiente. 2.1 A organização em transformação Aquela velha organização estática, com acontecimentos previsíveis, tentando solucionar seus problemas, deixou de existir há muito tempo. Você, como futuro ou atual administrador, encontrará novos desafios na função, ligados ao extremo dinamismo da vida moderna e às possibilidades de integração que a tecnologia oferece. Griffin (2007) oferece uma abrangente perspectiva desses desafios e suas consequências: Rios, Milene. Número de recalls no Brasil supera recorde registrado no ano passado. Portal de Notícias G1, 14 out. 2010. 1 7 Unidade I • Economia instável É crescente a dificuldade para visualizarmos o futuro, o que resulta na limitação de nossa capacidade de elaborar planejamentos consistentes. Por exemplo, em 2007, a crise econômica iniciada nos Estados Unidos, e que ganhou escala mundial, surpreendeu gestores, analistas e pesquisadores dos mais diversos pontos do planeta. E isso em plena era do “tempo real”. Outro exemplo é o fatídico 11 de Setembro de 2001, ocorrido em um Estados Unidos praticamente isento de ataques terroristas até então. O mundo literalmente mudou após esse evento. • Globalização Se por um lado permite expandir a atuação das organizações, levando-as a alcançar mercados em todo o mundo, por outro pode significar um acirramento expressivo da competição, com grandes riscos potenciais, já que abre a possibilidade de se deparar com oponentes internacionais por vezes muito melhor desenvolvidos e preparados. Outro fator decorrente são as diferenças culturais e comportamentais, que causam grande impacto na forma de administração das empresas pela dificuldade de se estabelecer estilos e procedimentos globalizados. As atribulações encontradas, por exemplo, na fusão da Chrysler com a Daimler-Benz (que inclusive já foi desfeita) e da Renault com a Nissan demonstram bem como certas integrações podem se tornar verdadeiras batalhas. Globalização: o lado “B” Embora a concepção de globalização, como um fenômeno inevitável, de eliminação das fronteiras e da instituição do comércio internacional irrestrito, seja dominante, muitos contestam seus potenciais benefícios, indicando, em vez 8 ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS disso, um fortalecimento da dominação dos países mais desenvolvidos, além da aceleração dos danos ao meio ambiente. Para compreender melhor a visão do lado “B” da globalização, ver, por exemplo, a obra de J. Stiglitz, A globalização e seus malefícios.2 • Diversidade A época do Ford T – “qualquer cliente pode ter um carro pintado de qualquer cor que ele queira, desde que seja preto” 3 – acabou há muito tempo. Os produtos e serviços, mais do que diversificados, caminham para a personalização, com grande impacto nos sistemas produtivos, pois a ideia não é a de fabricar em massa produtos padronizados, mas aqueles que permitam atender às expectativas do mercado. O cliente está muito mais exigente e influencia uma parte significativa das ações da empresa. Agora é possível acessar o site de um fabricante e “montar” o seu carro, de acordo com o seu gosto e sua necessidade, ou comprar um computador sob medida, diretamente do fabricante. A fabricação sob encomenda do cliente da Dell Muitos se perguntam como a Dell foi capaz de reinventar a indústria de computadores e tornar-se um símbolo da nova economia. A resposta é simples: soube vender de um modo inteligente, do jeito que o cliente quer. Michael Dell fundou a empresa com apenas mil dólares e uma ideia revolucionária. Decidiu vender computadores pessoais, sob medida, diretamente para seus clientes. A empresa provou que vale a pena tirar partido de oportunidades que os outros estão convencidos que não existem. Enquanto outros fabricantes de computadores vendem seus produtos por meio de revendedores, a Dell procura vendê-los diretamente para Stiglitz, J. A globalização e seus malefícios, São Paulo: Futura, 2002. Tradução minha da frase “Any customer can have a car painted any color that he wants, so long as it is black” (Ford & Crowther, 2007 [1922], p. 65). 2 3 9 Unidade I o consumidor final, o que lhe permite um corte significativo de custos. Assim, oferece o dinheiro poupado em forma de preços mais atraentes para o público.4 • Tecnologias As tecnologias têm, cada vez mais, maior importância dentro das organizações. Elas impõem grandes desafios, pois exigem atualização constante e investimentos em desenvolvimento produtivo e de pessoal, mas ao mesmo tempo oferecem oportunidades que precisam ser aproveitadas. A tecnologia da informação (TI), a microeletrônica, a nanotecnologia, além de novos materiais e processos produtivos, são exemplos a serem explorados. • Trabalho O velho cartão de ponto (modernizado ou não), horário definido e fixo e carteira assinada são ainda importantes e valorizados, mas abrem-se novas e diversas possibilidades para as relações de trabalho. A oportunidade de emprego em tempo parcial possibilita flexibilidade na montagem de turnos, o trabalho remoto reduz os investimentos em estrutura física, as terceirizações reduzem custos trabalhistas. • Qualidade Mesmo sem ocupar a condição de protagonista que tinha em outros tempos, principalmente após a ascensão das empresas japonesas, a partir da década de 1980, a qualidade é fator de competitividade, sendo fundamental na escolha dos consumidores, mas também tem papel decisivo para o aumento da produtividade, o que reduz 4 10 Texto extraído do site www.casodesucesso.com Dica de leitura É interessante conhecer com mais detalhes a trajetória da Dell e de seu criador, Michael Dell. Para tanto, leia Dell: estratégias que revolucionaram o mercado, editora Market Books, 1999. ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS desperdícios e retrabalho e colabora para a diminuição de custos. • Setor de serviços Segundo Alvin Toffler (2007[1980]), conhecido futurólogo, o setor de serviços ocupa, e deve permanecer assim durante muito tempo, o espaço principal nas economias, substituindo a até então dominante manufatura. Tal condição impõe o desenvolvimento de novas soluções gerenciais, mais específicas. Embora se deva considerar a existência de muitas similaridades na condução das duas operações, restam ainda diferenças fundamentais que precisam ser melhor trabalhadas. As três ondas de Toffler Para Alvin Toffler, conhecido escritor futurista, a história humana pode ser dividida em ondas. A primeira, a da agricultura, perdurou até o fim do século XIX. A segunda, a da industrialização, até a década de 1960. E a terceira, a da informação, iniciou-se na década de 1970 e perdura até hoje. Segundo ele, o grande impacto está na criação de uma elite de trabalhadores do conhecimento, ao mesmo tempo em que aumenta o número de empregos de baixa qualificação, destinados ao setor de serviços. (Toffler, 2007[1980]). • Governança corporativa e responsabilidade corporativa Cada vez mais as empresas vêm se preocupando com as principais questões associadas à governança corporativa – transparência de gestão e conduta ética –, essenciais para proporcionar maior confiabilidade e, consequentemente, maior valor de mercado, além de maior valor do papel da organização perante a sociedade, 11 Unidade I tanto em termos de ecologia e meio ambiente quanto de suas contrapartidas. Momento decisivo para os mercados de capitais brasileiros As ações da Natura foram lançadas no novo mercado em maio de 2004 – uma época difícil para a economia brasileira e para os mercados globais. O índice Bovespa havia caído 14% em dólares, e mesmo o índice Dow Jones recuara 3%. Mas o mercado demonstrou que podia reconhecer o valor de uma empresa sólida, que contava com boa governança, e que, portanto, representava menos riscos para os investidores. A IPO5 da Natura foi um sucesso, atraindo cerca de 5 mil investidores, e a demanda por ações foi de 14 vezes o volume ofertado. Tal solicitação ajudou a elevar o preço das ações no aftermarket, resultando em ganhos de 18% logo no primeiro dia. Mesmo antes da IPO, a procura por ações da Natura parecia forte. Durante uma pré-IPO, em um road-show internacional, o número de pedidos (174) foi maior que o número de investidores visitados (170). A IPO da empresa, a primeira ocorrida no Brasil desde janeiro de 2002, também sinalizava o início de um renascimento do mercado de ações no país. A IPO de maio de 2004 foi seguida por uma segunda oferta, que levantou R$ 768.120.636,00. Fonte: Estudos de caso de boa governança corporativa – OECD (2005) Já Robbins, Stephen P. (2002), considerando as mudanças e as novas perspectivas da administração, apresenta comparações entre a “velha” e a “nova” organização, esta mais condizente com os novos tempos: IPO – do inglês Inicial Public Offering, ou Oferta Pública Inicial, representa o lançamento das ações de uma empresa, anteriormente de capital fechado, no mercado de ações. 5 12 ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS Velha organização Nova organização Fronteiras nacionais limitam a competição Fronteiras nacionais são quase insignificantes na definição dos limites de operação de uma organização Empregos estáveis Cargos temporários Mão de obra relativamente homogênea Mão de obra diversificada A qualidade é uma reflexão tardia O aprimoramento contínuo e a satisfação do cliente são essenciais As grandes corporações fornecem segurança no emprego As grandes corporações estão reduzindo drasticamente o número de funcionários Se não quebrou, não conserte Redesenhe todos os processos Disperse os riscos pela participação em Concentre-se em competências múltiplos negócios centrais A hierarquia proporciona eficiência e controle Desmantele a hierarquia para aumentar a flexibilidade Jornadas de trabalho definidas, como das 9h às 18h Os expedientes não possuem nenhum limite de tempo O trabalho é definido pelos cargos O trabalho é definido em termos das tarefas a serem realizadas O pagamento é estável e relacionado ao O pagamento é flexível e de ampla tempo de serviço e ao nível do cargo faixa Os gerentes tomam decisões sozinhos Os funcionários participam das decisões A tomada de decisão é motivada pelo utilitarismo Os critérios de decisão são ampliados para incluir direitos e justiça Para exercitar Analise sua empresa seguindo os critérios de Robbins. Ela está organizada de forma mais tradicional ou moderna? Quadro 2.1 – A organização em transformação (adaptado de Robbins (2002)) Mas as mudanças não se restringem às organizações. As pessoas que nelas atuam também têm participação importante em todo o processo. 2.2 O homem flexível A mudança nas organizações vem necessariamente acompanhada por modificações ou redefinições no perfil da mão de obra. Robbins (2002) apresenta algumas delas: 13 Unidade I • Classes de força de trabalho Durante a era industrial, ou segunda onda, conforme a já comentada acepção de Toffler, havia muita oferta de empregos industriais, bem remunerados, com um mínimo de exigência de qualificação. Atualmente, a situação encontra-se bem diferente. Boa parcela dessa oferta de empregos foi suprimida com a crescente automação dos processos e operações. O contingente excedente foi redirecionado para atividades que exigem habilidades e competências diferenciadas ou foi substituído por trabalhadores de outros locais, a um custo menor. Sai de cena a estabilidade, entra a flexibilidade. Para saber mais Em vez de flexibilidade, um termo talvez eufemístico, alguns autores preferem falar em precarização quando se referem a menor carga horária, menor formalidade e, consequentemente, menores salários. Para uma visão mais detalhada sobre o assunto, recomendamos a leitura do artigo de Passos A. F.; Ansiliero, G.; Paiva, L. H. Mercado de trabalho: evolução recente e perspectivas, publicada na Revista Mercado de Trabalho – conjuntura e análise, do IPEA, Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas, em fevereiro de 2005. • Rotatividade Como observado anteriormente, com as mudanças nas relações de trabalho, um emprego para a vida toda soa como um sonho (ou pesadelo). Embora a segurança proporcionada por uma garantia de emprego ainda seja atraente para muitas pessoas, haja vista a imensa quantidade de candidatos a empregos no setor público, a ideia de permanecer estacionado muito tempo em um 14 ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS mesmo lugar pode ser um suplício para as pessoas mais empreendedoras. As empresas mantêm os trabalhadores enquanto estes adicionam valor à operação. Em contrapartida, os trabalhadores permanecem enquanto enxergam desafios estimulantes e retornos condizentes à contribuição oferecida à empresa. • Carreira Como a lealdade já não é mais a palavra de ordem e sim a troca de interesses, não existe lógica em se investir em um trabalhador que tem um futuro incerto na empresa. Assim, a responsabilidade pela administração da carreira está a cargo do próprio trabalhador, visando não somente a uma eventual ascensão interna, mas também à possibilidade de uma troca de emprego ou mesmo de carreira, mas para tanto é mandatório que o treinamento e o aprendizado sejam contínuos. • Equipes A visão burocrática de normas e procedimentos, notadamente individuais, está sendo substituída pelo trabalho de equipe, visando ao aumento do rendimento através do aproveitamento de sinergias. Entretanto, trabalhar em grupo requer o desenvolvimento e o aprimoramento de novas habilidades e competências, um grande desafio para um mundo em que iniciativas e resultados individuais eram crescentemente valorizados. A regra do 1+1+1 Pense nas atividades de uma equipe e em seus possíveis resultados. Quanto resulta a soma de 1+1+1? Não é pegadinha, depende dos resultados obtidos: 15 Unidade I Se 1+1+1 = 3 Simplesmente não há ganho. O resultado é a soma dos trabalhos individuais. Neste caso é indiferente se a equipe existir ou não. 1+1+1 < 3 Provavelmente os integrantes do grupo atrapalham uns aos outros e o resultado é aquém das possibilidades individuais (entropia). 1+1+1 > 3 Neste caso, justifica-se o uso da equipe. O resultado é superior à soma dos resultados individuais, apontando colaboração e busca de objetivos comuns (sinergia). • Estresse A intensa aceleração que testemunhamos nas mudanças relativas a nossa vida pode torná-la por vezes mais empolgante frente à visão de monotonia que podemos relacionar ao estilo de vida do passado, no entanto ela traz consigo preocupação e estresse. Redução de quadros, aumento das pressões por resultados, portabilidade do trabalho permitida com os desenvolvimentos da informática, insegurança da manutenção do emprego são alguns dos ingredientes que podem resultar em problemas físicos e mentais. Existem programas governamentais, como o HiperDia – hipertensão e diabetes, dedicados a doenças relacionadas diretamente ao estresse, principalmente porque estas não apresentam sintomas perceptíveis em estágios iniciais, o que as torna uma bomba-relógio. Para saber mais Burn out – Conjunto de sinais e sintomas conhecido como a doença dos idealistas, esta síndrome é desencadeada 16 ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS por situações estressantes e se caracteriza por uma desilusão profunda em relação ao próprio trabalho. Ver artigo completo de Guilherme Genestreti no Caderno Equilíbrio (p. 6-9) da Folha de S.Paulo de 2 de novembro de 2010. Robbins (2002) apresenta as mudanças no perfil do empregado. De funcionário, com uma relação notadamente utilitária com a empresa, passa a ganhar novas condições e responsabilidades, sendo melhor identificado, agora, como colaborador. O quadro 2.2 faz uma comparação entre esses dois tipos de empregados. O funcionário O colaborador Cargos industriais eram de baixa qualificação, mas bem remunerados Cargos de baixa qualificação são mal pagos Troca sua lealdade à empresa por segurança no emprego A segurança no emprego é mínima A organização é responsável pelo desenvolvimento da carreira O funcionário é responsável pelo desenvolvimento da carreira É um realizador individual É um participante de equipe A previsibilidade e a estabilidade minimizam o estresse A imprevisibilidade e a instabilidade aumentam o estresse Quadro 2.2 – Mudança no perfil do funcionário (adaptado de Robbins (2002)) 2.3 Perspectivas Mesmo considerando as organizações em plena transformação, certamente não existe nenhuma condição de ruptura ou de revolução traumática. Velhas e novas organizações podem conviver no mesmo espaço, da mesma forma que as diversas abordagens administrativas são encontradas simultaneamente em qualquer sistema de gestão. Assim, é natural que existam também diversas maneiras de se enxergar 17 Unidade I as organizações. Essas visões ou perspectivas nos dão uma ideia de como é seu funcionamento. Daft (2008) nos indica duas das mais importantes: a abordagem sistêmica, especialmente com relação aos sistemas abertos, e a configuração organizacional. 2.3.1 Abordagem sistêmica O início da administração como área do conhecimento, na virada do século XX, foi marcado por um mundo muito menos dinâmico e mais previsível que o que presenciamos hoje. Naquelas condições, era perfeitamente aceitável que se considerassem as organizações como sistemas fechados, ou seja, independentes do ambiente externo. Assim, qualquer organização manteria sua autonomia, operando dentro de limites (fronteiras) bem estabelecidos e isolados do mundo exterior. É fato que representava uma condição idealizada, pois é impossível um completo isolamento, mas os aspectos internos eram considerados muito mais importantes que os externos. Tal situação foi substancialmente modificada a partir dos trabalhos do biólogo alemão Ludwig von Bertalanffy, por volta da década de 1950. Sua contribuição mais conhecida, Teoria geral de sistemas, propunha uma teoria interdisciplinar. Ele acreditava que os diversos ramos do conhecimento, ao efetuarem uma análise separada e exclusiva, provocavam brancos ou espaços vazios que somente poderiam ser preenchidos a partir da consideração da existência de uma dependência recíproca entre todas as ciências e a necessidade de sua integração a partir de uma visão globalizante. Essa integração e interdependência seriam obtidas considerando-se todos os objetos de estudo como sistemas abertos, inclusive a administração. (Chiavenato, 2003) Considerando-se uma empresa ou organização como sistema aberto (ver figura 2.2), podemos visualizá-la como um todo coerente, composto por elementos que estão em interação. Essas partes formam os subsistemas, que possuem 18 ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS funções específicas para garantir a sobrevivência: produção, manutenção, gerenciamento etc. Recebem entradas diversas do ambiente externo (recursos humanos, materiais e energéticos), transformam-nas a partir de processos específicos e as devolvem como saídas (produtos, serviços, resíduos e impactos diversos) ao mesmo ambiente. Ambiente externo Ambiente externo Fronteiras permeáveis Recursos Entradas Energia Ambiente interno Transformação Subsistemas - produção - manutenção - gerenciamento - etc. Produtos e serviços Saídas Resíduos e impactos Fig. 2.2 – Sistema aberto Nessa sociedade de organizações, as empresas que se fecharam e se “esqueceram” do mundo, talvez acomodadas por uma condição de liderança e pioneirismo, pagaram e pagam um preço muito alto. Estudo de caso: a Xerox A Xerox, por exemplo, que possuía praticamente o monopólio das máquinas copiadoras, passou a amargar fracassos sucessivos a partir do momento em que suas patentes começaram a expirar. Acomodada com os lucros e preços das ações crescentes, fechou-se para o mundo externo, ignorando as grandes mudanças que se avizinhavam. 19 Unidade I A concorrência conseguia conciliar rapidez de inovação e custos progressivamente mais baixos. Segundo Slack et alli (2009), no final da década de 1980, o preço de venda dos concorrentes japoneses era equivalente ao preço de custo da Xerox, eles tinham nove vezes menos fornecedores, menos rejeições e retrabalhos nas linhas de montagem e colocavam novos produtos no mercado na metade do tempo. O termo “Burox”, apresentado por Daft (2008), explica bem a situação da empresa. Apesar de um breve período de bonança, pelo bom aproveitamento das novas tecnologias digitais, experimentou novamente um período de crise ao subestimar a ascensão das impressoras pessoais com tecnologia de jato de tinta, bem mais acessíveis, como também ignorou o impacto nas vendas de copiadoras da virtualidade, com a internet, o e-mail e a portabilidade eletrônica. Após diversas reestruturações e trocas de comandos, a empresa experimenta um período de retomada, lenta, mas constante. Espera-se que tenha aprendido a lição. Fonte: adaptado de Daft (2008) Podemos ainda expandir o conceito e considerar que além da sociedade de organizações temos uma sociedade de organizações em rede. Manuel Castells, em seu livro A sociedade em rede (2000), fala em uma nova ordem social, que também seria econômica, tendo como epicentro as transformações operadas pela tecnologia da informação e das comunicações. Segundo Castells (2000, p. 497): Redes constituem a nova morfologia de nossas sociedades, e a difusão da lógica de redes modifica, de forma substancial, a operação e os resultados dos processos produtivos e de experiência, poder e cultura. Embora a forma de organização social em 20 ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS redes tenha existido em outros tempos e espaços, o novo paradigma da tecnologia da informação fornece a base material para sua expansão penetrante em toda a estrutura social. Para Castells, não podemos conceber a sociedade atual sem considerá-la sob o ponto de vista da informação, uma vez que, mais que um instrumento, a informação é o ativo atual das sociedades. 2.3.2 Configuração organizacional Segundo Mintzberg (2003), toda atividade humana organizada origina duas exigências fundamentais e opostas: a divisão do trabalho em tarefas mais simplificadas e a coordenação dessas tarefas para a obtenção dos resultados desejados. A partir desse ponto de vista, o autor considera que “a estrutura de uma organização pode ser simplesmente definida como a soma total das maneiras pelas quais o trabalho é dividido em tarefas distintas e como é feita a coordenação entre essas tarefas”. 2.3.2.1 A divisão do trabalho Muitos ainda associam a divisão do trabalho à administração científica de Taylor ou à linha de montagem de Ford, mas existem registros muito anteriores. Talvez o mais importante e conhecido seja o de Adam Smith, que já em 1776, ou seja, há mais de 230 anos, apontava em seu célebre livro, A riqueza da nações, a divisão do trabalho como fator multiplicador da produção, elemento essencial para gerar uma riqueza universal, ou seja, que contemplasse até as classes mais baixas da população. (Smith, 1985 [1776]). 21 Unidade I 2.3.2.2 A coordenação de tarefas Se, por um lado, dividir o trabalho em tarefas mais elementares resulta em ganhos de produtividade, pela simplificação e especialização, por outro, as pessoas passam a ter dificuldade para coordenar as ações para obter resultados, por empreender as atividades mecanicamente, desprovidas de sentimento de unidade e conjunto. Cumprem-se as tarefas sem se saber de sua contribuição ou consequência. Mintzberg (2003) propõe mecanismos básicos para se efetuar a coordenação das tarefas a serem executadas: ajustamento mútuo; supervisão direta, padronização de processos, de saídas e de habilidades e conhecimentos. Veremos cada um com mais detalhes a seguir. • Ajustamento mútuo Em organizações mais simples, a necessidade de coordenação limita-se ao ajuste entre as operações dos operadores, definido através de um processo simples de comunicação informal à medida que aparecem as exigências. Por exemplo, na operação de um pequeno supermercado, os caixas que ficam ociosos nos horários de menor movimento podem auxiliar na reposição dos estoques, podendo ser convocados a qualquer momento para reassumir suas tarefas caso a demanda de clientes assim o exija. Isso possibilita reduzir a necessidade de pessoal e otimizar o uso do tempo dos funcionários. Gerente Analista Operador Operador Fig. 2.3 – Mecanismo de coordenação por ajustamento mútuo (adaptado de Mintzberg, 2003) 22 ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS • Supervisão direta Quando a operação atinge uma complexidade maior, tende-se a utilizar outro mecanismo de coordenação. A supervisão direta ocorre quando se define uma pessoa para ser responsável pelo trabalho de outras, a quem dará instruções e cujas ações deverá monitorar. Aproveitando o exemplo anterior, fazemos uma adaptação para ilustrar este mecanismo: ao expandir os negócios, o proprietário do supermercado percebe que deve aumentar o número de caixas, o que exige a contratação de uma pessoa responsável pelo gerenciamento da equipe. As empresas do ramo utilizam a figura do “líder de caixas”, que é o responsável por todos os eventos e decisões relacionados ao setor. Gerente Analista Operador Operador Fig. 2.4 – Mecanismo de coordenação por supervisão direta (adaptado de Mintzberg, 2003) • Padronização Uma terceira ferramenta é a padronização do trabalho. Isso significa definir, previamente, como serão executadas as tarefas; quais serão as especificações dos produtos, quais deverão ser os resultados do desempenho de cada um e, ainda, que habilidades deverão possuir os funcionários para realizar seu trabalho. Mintzberg (2003) apresenta três formas básicas de padronização. Padronização de processos – Neste caso, a execução do trabalho é especificada e deve ser seguida pelo 23 Unidade I operador, isto é, ele deve conhecê-la para poder realizála. Numa peça de teatro, por exemplo, cada ator deve obedecer às marcações de palco estabelecidas pelo diretor. Se um dos artistas precisar ser substituído, o suplente seguirá as mesmas marcações. Veja estes outros exemplos: as instruções de instalação que acompanham um software adquirido por um consumidor; a sequência rígida de um roteiro de vendas que deve ser seguido por um operador de telemarketing. Veja no boxe uma curiosa (mas lamentável) consequência da padronização de processos, o “gerundismo”, que segundo o autor do texto, parece ter surgido justamente no setor de telemarketing. Para você estar passando adiante6 Por Ricardo Freire Este artigo foi feito especialmente para que você possa estar recortando, possa estar deixando discretamente sobre a mesa de alguém que não consiga estar falando sem estar espalhando essa praga terrível da comunicação moderna, o gerundismo. Você pode também estar passando por fax, estar mandando pelo correio ou estar enviando pela internet. O importante é estar garantindo que a pessoa em questão vá estar recebendo esta mensagem, de modo que ela possa estar lendo e, quem sabe, consiga até mesmo estar se dando conta da maneira como tudo o que ela costuma estar falando deve estar soando nos ouvidos de quem precisa estar escutando. Sinta-se livre para estar fazendo tantas cópias quantas você vá estar achando necessárias, de modo a estar atingindo o maior número de pessoas infectadas por esta epidemia de transmissão oral. Artigo publicado na coluna de Ricardo Freire, no Jornal da Tarde, em 16 fev. 2001. 6 24 ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS Mais do que estar repreendendo ou estar caçoando, o objetivo deste movimento é estar fazendo com que esteja caindo a ficha nas pessoas que costumam estar falando desse jeito sem estar percebendo. Nós temos que estar nos unindo para estar mostrando a nossos interlocutores que, sim!, pode estar existindo uma maneira de estar aprendendo a estar parando de estar falando desse jeito. Até porque, caso contrário, todos nós vamos estar sendo obrigados a estar emigrando para algum lugar onde não vão estar nos obrigando a estar ouvindo frases assim o dia inteirinho. Sinceramente: nossa paciência está estando a ponto de estar estourando. O próximo “Eu vou estar transferindo a sua ligação” que eu vá estar ouvindo pode estar provocando alguma reação violenta da minha parte. Eu não vou estar me responsabilizando pelos meus atos. As pessoas precisam estar entendendo a maneira como esse vício maldito conseguiu estar entrando na linguagem do dia a dia. Tudo começou a estar acontecendo quando alguém precisou estar traduzindo manuais de atendimento por telemarketing. Daí a estar pensando que “We’ll be sending it tomorrow” possa estar tendo o mesmo significado que “Nós vamos estar mandando isso amanhã” acabou por estar sendo só um passo. Pouco a pouco a coisa deixou de estar acontecendo apenas no âmbito dos atendentes de telemarketing para estar ganhando os escritórios. Todo mundo passou a estar marcando reuniões, a estar considerando pedidos e a estar retornando ligações. A gravidade da situação só começou a estar se evidenciando quando o diálogo mais coloquial demonstrou estar sendo 25 Unidade I invadido inapelavelmente pelo gerundismo. A primeira pessoa que inventou de estar falando “Eu vou tá pensando no seu caso”, sem querer acabou por estar escancarando uma porta para essa infelicidade linguística estar se instalando nas ruas e estar entrando em nossas vidas. Você certamente já deve ter estado estando a estar ouvindo coisas como “O que cê vai tá fazendo domingo?”, ou “Quando que cê vai tá viajando pra praia?”, ou “Me espera, que eu vou tá te ligando assim que eu chegar em casa”. Caramba! O que a gente pode tá fazendo pra que as pessoas tejam entendendo o que esse negócio pode tá provocando no cérebro das novas gerações? A única solução vai estar sendo submeter o gerundismo à mesma campanha de desmoralização à qual precisaram estar sendo expostos seus coleguinhas contagiosos, como o “a nível de”, o “enquanto”, o “pra se ter uma ideia” e outros menos votados. A nível de linguagem, enquanto pessoa, o que você acha de tá insistindo em tá falando desse jeito? Padronização de saídas – Ela ocorre quando os resultados do processo de trabalho são predeterminados, o que significa especificar de antemão como devem ficar os produtos fabricados, assim como qual deve ser o resultado obtido pelos empregados. Por exemplo, as dimensões que deve ter determinado produto ou o patamar mensal mínimo de vendas de automóveis que devem alcançar os vendedores de uma concessionária. Outro exemplo: um auxiliar de pedreiro precisa preparar uma massa para reboco que tenha as características necessárias para o acabamento de uma parede. Se ele não seguir à risca as especificações, a parede poderá futuramente apresentar rachaduras. Padronização de habilidades e conhecimentos – Ela se dá quando o tipo de treinamento exigido para 26 ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS o desempenho do trabalho já está especificado, ou seja, ou a pessoa recebe treinamento antes de assumir a atividade para a qual foi contratada ou ela já deve possuir os conhecimentos e habilidades necessários para exercer o cargo. Quando uma empresa contrata um administrador de empresas para um cargo de supervisão ou exige experiência prévia de um vendedor de calçados, a busca é por habilidades e conhecimentos padronizados. Gosselin, apud Mintzberg (2003), afirma que o mesmo acontece em situações mais complexas. Em seus estudos, o autor observou que em uma operação de coração, com duração de cinco horas, havia pouca comunicação entre o cirurgião e o anestesista. Suas atividades eram coordenadas a partir de suas qualificações. Gerente Analista Operador Habilidades e conhecimento Processo de trabalho Saídas Operador Fig. 2.5 – Mecanismo de coordenação por padronização (adaptado de Mintzberg, 2003) 2.3.3 Componentes básicos As organizações são formadas por subsistemas ou componentes, como indicado na figura 2.2, e a função destes é garantir a sua operação e sobrevivência. Para tal, eles dependem de fluxos de materiais e informações e inter-relacionamentos, o que sugere a possibilidade da adoção de diversas configurações possíveis. Entretanto, uma em particular merece destaque: a estrutura de trabalho proposta por Mintzberg (apud Daft, 27 Unidade I 2008). Ela é composta por cinco elementos, como mostra o esquema da figura 2.6, a saber: 1. o núcleo técnico; 2. a alta administração; 3. a média gerência; 4. o suporte técnico, e 5. o suporte administrativo. A importância e o tamanho de cada componente variam conforme as condições e características de cada organização. • Núcleo técnico (núcleo operacional) É composto pelas pessoas que realizam, na acepção da palavra, a produção da organização, em termos de produtos e/ou serviços. São elas as responsáveis diretas pela transformação das entradas em saídas. No caso de uma indústria manufatureira, por exemplo, o núcleo técnico é o setor de produção. Já em uma empresa de seguros ele pode ser representado pelos vendedores, analistas e avaliadores, apoiados por um sistema de informações. • Suporte técnico (tecnoestrutura) Sua função é auxiliar a organização a se adaptar ao ambiente. Possuidores de conhecimento técnico, estes funcionários buscam soluções para os problemas e oportunidades para novos desenvolvimentos. Criam inovações para serem utilizadas pelo núcleo técnico e auxiliam nas adaptações e mudanças. É composto principalmente por pessoal técnico especializado, qualificado e experiente. • Suporte administrativo (assessoria de apoio) É responsável pela operação e conservação da organização, considerando tanto os elementos físicos como humanos. Engloba a gestão de pessoas, a manutenção de máquinas, equipamentos e instalações e a segurança física e patrimonial. 28 ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS • Alta administração e média gerência (cúpula estratégica e linha intermediária) Os membros desses setores são responsáveis pela direção e coordenação das outras partes da organização. A alta administração define as estratégias e os rumos gerais a serem seguidos pela organização como um todo, ficando com a média gerência as atividades de mediação entre a alta direção e as outras áreas da organização e também a implementação das diretrizes e a coordenação dos diversos subsistemas. A figura 2.6 apresenta um modelo dos cinco componentes básicos, posicionados de acordo com sua atuação na estrutura. cni e té ort Sup Média gerência o orte rativ Sup inist adm co Alta administração Núcleo técnico Fig. 2.6 – Os cinco componentes básicos de Mintzberg (adaptado de Mintzberg, 2003 e Daft, 2008) Apesar de a figura 2.6 apresentar os elementos separadamente, na prática eles encontram-se interligados e com atividades sobrepostas. Assim, nada impede que um diretor atue também no suporte técnico, dividindo sua expertise técnica e, ainda, auxiliando o suporte administrativo na seleção de um novo executivo. A tabela 2.1, por sua vez, apresenta algumas posições típicas relacionadas a cada 29 Unidade I componente básico em uma empresa fabril (baseado em Mintzberg, 2003). Componente Membros e unidades Alta administração Conselho de diretoria Presidência Comissão executiva Diretoria Núcleo técnico Encarregados Operadores Montadores Vendedores Despachantes Suporte técnico Planejamento estratégico Controladoria Treinamento Pesquisa operacional Programação da produção Estudo de trabalho Apoio técnico Suporte administrativo Assessoria jurídica Relações públicas Relações industriais Pesquisa e desenvolvimento Preços Folha de pagamento Portaria e recepção Restaurante Média gerência Supervisor de operações Supervisor de marketing Gerentes de fábrica Gerentes de vendas regionais Gerentes de vendas locais Supervisores Tabela 2.1 - Exemplos de membros e unidades de empresa fabril (baseado em Mintzberg, 2003) Com os fundamentos definidos – os mecanismos de coordenação e os componentes básicos da organização –, podemos estudar e analisar a fundo as soluções usualmente utilizadas para o problema básico da coordenação das atividades, ou seja, que configurações permitem os melhores resultados, respeitando-se as particularidades e contingências de cada organização. 30 ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS A realidade brasileira: delegação de autoridade e terminologia Enquanto a delegação de autoridade é imprescindível e unânime, a terminologia empregada no Brasil para classificar os estratos de autoridade não é homogênea. Há empresas que usam os termos supervisão ou supervisor para os níveis hierárquicos intermediários. Outros preferem gerente. Há ainda aqueles que adotam os dois termos para cargos com níveis de autoridade distintos. Em geral, o supervisor está hierarquicamente acima do gerente. Em alguns casos, porém, como em departamentos de engenharia de grandes empresas, um gerente pode se reportar ao diretor e ter como subordinados supervisores mecânicos ou supervisores eletricistas, por exemplo. Fonte: Robbins (2007) EXERCÍCIO 1) Em qual componente você se encaixa?7 O teste que vem logo abaixo, e segue a linha do autoconhecimento, pretende avaliar sua aptidão para a administração. Certamente não representa um rigoroso teste psicológico, mas pode sugerir tendências ou habilidades e competências a serem desenvolvidas. Na lista apresentada na sequência, você encontrará afirmações de natureza geral. Provavelmente discordará de algumas e concordará com outras. Indique, conforme a escala, em que medida você concorda ou discorda delas fazendo um círculo no número da coluna à direita que representa sua opinião. 7 Exercício proposto em Sobral & Peci (2008). 31 Unidade I 1 Discordo totalmente 2 3 4 5 6 7 Discordo Discordo Neutro Concordo Concordo Concordo bastante ligeiramente ligeiramente bastante totalmente 1. Em geral, tenho uma atitude positiva em relação àqueles que possuem uma posição de autoridade sobre mim (pais, professores, chefes etc.). 1 2 3 4 5 6 7 2. Gosto de competir e de ganhar, tanto individualmente como com o meu grupo de trabalho. 1 2 3 4 5 6 7 3. Gosto de dizer aos outros o que devem fazer e não tenho problemas em impor sanções para reforçar minhas diretrizes. 1 2 3 4 5 6 7 4. Gosto de ser ativo, assertivo e de proteger os integrantes de meu grupo de trabalho. 1 2 3 4 5 6 7 5. Gosto de me destacar no meu grupo ou equipe e não me sinto bem quando passo despercebido. 1 2 3 4 5 6 7 6. Estou disposto a realizar atividades e tarefas repetitivas para alcançar meus objetivos. 1 2 3 4 5 6 7 7. De modo geral, aceito e procuro seguir as diretrizes daqueles que têm autoridade sobre mim (pais, professores, chefes etc.). 1 2 3 4 5 6 7 8. Vejo a competição como uma forma de motivação para revelar o que tenho de melhor. 1 2 3 4 5 6 7 9. Gosto de assumir a liderança de meu grupo ou equipe. 1 2 3 4 5 6 7 10. Gosto de assumir a defesa de minhas opiniões e daquilo em que acredito 1 2 3 4 5 6 7 11. Gosto de me comportar de forma que me permita ter visibilidade perante os outros. 1 2 3 4 5 6 7 12. Reconheço que a rotina e a ordem são aspectos importantes no ambiente de trabalho. 1 2 3 4 5 6 7 Resolução do exercício: Nem todas as pessoas estão aptas e motivadas a desempenhar funções de administração. Esse questionário mede as seis dimensões de personalidade consideradas determinantes para explicar o desempenho de cargos gerenciais, especialmente em grandes organizações. As dimensões referidas são: • atitude favorável perante a autoridade (afirmações 1 e 7); 32 ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS • desejo de competir (afirmações 2 e 8); • desejo de exercer poder (afirmações 3 e 9); • assertividade (afirmações 4 e 10); • desejo de alcançar uma posição de destaque (afirmações 5 e 11); • disposição para desempenhar (afirmações 6 e 12). tarefas repetitivas Para determinar o seu resultado, basta adicionar o valor correspondente a cada uma das respostas. A pontuação do teste variará entre 12 e 84. Uma pontuação entre 12 e 36 significa que a pessoa tem reduzida aptidão administrativa; entre 38 e 58, aptidão moderada; e entre 60 e 84, aptidão elevada. Esse teste tem como objetivo ajudar a perceber até que ponto uma pessoa se sentirá confortável ao realizar atividades administrativas. No entanto, esse instrumento enfatiza as tarefas associadas à administração de organizações grandes e burocráticas. Um resultado de fraca ou moderada aptidão poderá ser um indicador de que a pessoa tem predisposição maior para gerir uma pequena empresa, uma empresa orgânica ou para desenvolver iniciativas empreendedoras. 33