Estruturas Organizacionais

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Estruturas
Organizacionais
Professor conteudista: Roberto M. Tomaoka
Sumário
Estruturas Organizacionais
Unidade I
1 ORGANIZANDO AS ORGANIZAÇÕES ..........................................................................................................2
2 A ORGANIZAÇÃO COMO EMPRESA ............................................................................................................5
2.1 A organização em transformação ....................................................................................................7
2.2 O homem flexível ................................................................................................................................. 13
2.3 Perspectivas ............................................................................................................................................ 17
2.3.1 Abordagem sistêmica ............................................................................................................................ 18
2.3.2 Configuração organizacional ............................................................................................................. 21
2.3.3 Componentes básicos ........................................................................................................................... 27
Unidade II
3 A ORGANIZAÇÃO COMO FUNÇÃO ADMINISTRATIVA....................................................................... 34
3.1 Conceitos básicos: a administração e o processo administrativo .................................... 34
3.2 A função organização ........................................................................................................................ 37
3.2.1 O processo de organização da organização ................................................................................ 37
3.3 Estrutura organizacional ................................................................................................................... 39
3.3.1 Organograma e os níveis organizacionais .................................................................................... 40
3.3.2 Dimensões organizacionais ................................................................................................................ 41
Unidade III
4 PROJETOS ORGANIZACIONAIS E EFICIÊNCIA ADMINISTRATIVA .................................................. 55
4.1 Estruturas tradicionais ....................................................................................................................... 58
4.1.1 Estrutura funcional ................................................................................................................................ 58
4.1.2 Estrutura divisional ................................................................................................................................ 59
4.1.3 Estrutura geográfica ou territorial .................................................................................................. 62
4.1.4 Estrutura matricial ................................................................................................................................. 63
4.2 Estruturas emergentes ....................................................................................................................... 67
4.2.1 Estrutura horizontal .............................................................................................................................. 67
4.2.2 Estrutura em rede ................................................................................................................................... 70
4.2.3 Estrutura em rede virtual .................................................................................................................... 73
4.2.4 Aplicações .................................................................................................................................................. 74
Unidade IV
5 NOVAS PERSPECTIVAS .................................................................................................................................. 83
5.1 Estrutura tríplice ................................................................................................................................... 84
ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS
5
Unidade I
10
15
20
APRESENTAÇÃO
Prezado aluno,
25
O presente livro-texto, Estruturas Organizacionais, do curso
30 de administração, está estruturado em cinco partes.
35
Neste introito apresentamos os objetivos e justificativas
da disciplina. No item 1 damos a conhecer mais de um dos
significados da palavra organização, isto é, o de entidade
social e o de função administrativa. Na parte 2 discutimos
a função administrativa da organização, focando as
considerações e as soluções típicas para dar forma às
entidades. O item 3 é dedicado aos projetos organizacionais,
ou seja, nele você aprenderá como adequar os diversos
elementos da organização para obter os resultados
esperados, e, complementando o conteúdo desta matéria,
incluímos vários exercícios para que possa praticar o que
aprendeu ao estudar este tema.
A disciplina Estruturas Organizacionais mostra-se fundamental
para todos aqueles – e esperamos que para você, em particular –
que tenham interesse pelo estudo da administração. Em primeiro
lugar, vamos apresentar e discutir conceitos e aplicações que
levem à devida compreensão da organização como entidade
social e sua posição central na sociedade contemporânea. Em
segundo, estudaremos a organização como uma das funções
administrativas, dos fundamentos aos elementos necessários
para o processo de organização, as dimensões organizacionais.
Finalmente, mostraremos como as empresas, de maneira geral,
1
Unidade I
resolvem suas questões explorando as diversas formas que
podem assumir os projetos de estruturas organizacionais, tanto
as tradicionais quanto as emergentes, definidas de maneira a
tentar obter o máximo em ganhos de eficiência e eficácia, ou
seja, a excelência no desempenho.
Esperamos que, ao concluir a leitura deste livro-texto, não
só tenha ampliado seu conhecimento teórico sobre o assunto,
como tenha ficado instigado a procurar mais fontes para
aprofundar ainda mais seu aprendizado.
Bons estudos.
1 ORGANIZANDO AS ORGANIZAÇÕES
Por uma dessas particularidades presentes em muitos
idiomas, entre eles a língua portuguesa, uma mesma palavra
pode ter diversos significados. Organização é uma delas.
Se consultarmos um dos mais conceituados dicionários
da nossa língua, o Houaiss (2009), encontraremos pelo
menos quatro sentidos para essa palavra. Para os objetivos
deste livro-texto, observaremos os significados contidos
no jogo de palavras do título deste item: organizando
as organizações ou, dito de forma ainda mais enfática:
organização da organização.
De um lado, podemos considerar a organização como
uma entidade social, na qual pessoas e recursos diversos se
agrupam a fim de atingir objetivos específicos. A empresa na
qual trabalhamos ou a universidade na qual estudamos dão a
ideia de um local físico, concreto, estabelecido.
Por outro lado, também é válido considerar organização
como uma das funções administrativas, encarregada
de dar forma ordenada ao trabalho, ou seja, de cuidar do seu
projeto organizacional, de maneira que as pessoas e os recursos
consigam os melhores resultados possíveis.
2
Organização
social
como
entidade
Pense na sua empresa ou, caso
não trabalhe, na própria universidade
e identifique as pessoas, os recursos
e os objetivos. Repita o exercício com
outras entidades, como lojas, clubes,
uma repartição pública. É o primeiro
passo para estudar e compreender as
organizações.
Organização
administrativa
como
função
Como você administra sua vida?
Pode não se dar conta, mas há muitas
semelhanças com a administração
de uma empresa. Planejamos sobre
o que queremos para o nosso futuro,
orientamos ou direcionamos ações
relacionadas a nossas atividades,
controlamos e corrigimos rumos e
organizamos nosso tempo. Somos, em
essência, uma pequena empresa!
ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS
Embora distintas, as duas definições encontram-se
estreitamente ligadas. Existe uma diversidade grande de setores,
áreas de atuação, características específicas de cada ramo, que
fazem com que as empresas se diferenciem uma das outras, que
se distingam pelas suas peculiaridades.
Presidente
RD*
Ger. produto
Engenharia
Ger. comercial
Produção
Ger. financeiro
Vendas
Contabilidade
*Representante da Direção
Por exemplo, uma indústria de transformação, que produz
bens, precisa converter insumos como matérias-primas, energia,
tecnologias diversas em produtos, utilizando instalações,
maquinário e trabalho especializado.
Proprietário
Gerente
Secretária
Vendedora 1
Vendedora 2
Vendedora 3
Montador
Já em um comércio de varejo, muitas vezes encontra-se
uma estrutura bastante enxuta, bastando um espaço para a
apresentação dos produtos, um local de estocagem e alguns
poucos vendedores.
3
Unidade I
A situação pode ser ainda mais distinta se essencialmente
não existir um bem material envolvido.
Assembleia geral
Conselho administrativo
Conselho fiscal
Contabilidade Financeiro Jurídico R. humanos Informática Serv. gerais
Cliente/Mercado
Projeto A
Projeto B
Projeto C
...
...
...
...
...
...
...
Projeto N
Uma empresa de consultoria presta serviços e pode executar
vários projetos ao mesmo tempo, compartilhando os seus
especialistas.
Pósgraduação
Graduação
Pesquisa
Diretor
Extensão
Intercâmbio
cultural
Na mesma linha, uma universidade oferece diversos campos
e áreas de atuação, proporcionando basicamente conhecimento
e formação.
4
ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS
Ao considerarmos esses exemplos de organizações,
encontramos diferenças de tal porte que é inconcebível imaginar
que todas possam ter as mesmas soluções administrativas.
Deve-se orientar o projeto de estrutura organizacional segundo
cada situação específica, de forma que se obtenha resultados
mais satisfatórios. As figuras representam exemplos de soluções
típicas de estruturas organizacionais em relação ao tipo de
atividade da empresa.
2 A ORGANIZAÇÃO COMO EMPRESA
As organizações estão integradas
de tal maneira a nossa vida que nem
nos damos conta de sua importância e
representatividade. Praticamente todas
as atividades humanas, com exceção de
algumas poucas, em alguns locais mais isolados (e talvez, quem
sabe, privilegiados), dependem de produtos ou serviços de alguma
organização. Pode parecer uma afirmação contemporânea
sobre as organizações, mas Amitai Etzioni já afirmava, em 1964,
em seu clássico livro Organizações modernas, que nascemos,
somos educados, trabalhamos, nos divertimos e morremos em
organizações.
Amitai Etzioni é considerado o criador
da Teoria Estruturalista, formada com
base nas quatro teorias da administração
até então conhecidas: administração
científica, administração clássica, relações
humanas e burocracia. Ele tentou uma
abordagem mais ampla, permitindo uma
análise comparativa entre as diferentes
organizações (Oliveira, 2008). Após passagem pelas prestigiosas
universidades de Columbia, George Washington e Harvard,
aposentou-se, mas ainda é uma voz ativa e ouvida.
Foto: site da Fundação Etzioni.
5
Unidade I
Mas, se como falamos na introdução, as organizações são
tão diferentes, com atividades tão distintas, como podemos
defini-las? Muitos pesquisadores elaboraram suas visões de
organização, entretanto, no que é essencial, praticamente
todas carregam o mesmo sentido. Para este livro-texto utilizo a
definição dada por Richard L. Daft (2008, p. 10): “Organizações
são entidades sociais, orientadas por metas, projetadas como
sistemas de atividades deliberadamente estruturados e
coordenados e ligados ao ambiente externo”.
Entidades sociais, porque compostas por pessoas que,
reunidas, formam um grupo social. Mas tal reunião não é
fortuita, tem como base a necessidade de atingir metas, que
possivelmente não seriam possíveis de ser alcançadas a partir
de esforços isolados.
Os recursos necessários para a consecução dos objetivos
precisam ser convenientemente alocados e as atividades
coordenadas, visando não somente à obtenção da máxima
sinergia interna, mas também para possibilitar a flexibilidade,
qualidade fundamental para as inevitáveis adaptações a um
mundo em contínua mudança. É crescente a necessidade de
interação com o ambiente externo e cada vez mais as empresas
estão redefinindo o conceito de fronteira que, em vez de
claramente definida, se torna mais tênue e difusa (figura 2.1).
Da mesma forma que não se definem claramente os limites
da influência da organização sobre diversos agentes externos,
é crescente a influência destes nos rumos e até mesmo na
condução dos negócios. É uma via de mão dupla.
Recalls na indústria automobilística
A indústria automobilística, assumindo cada vez mais
a sua condição de “montadora”, é um excelente exemplo
de fronteiras tênues e influências mútuas. Por um lado, as
6
ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS
empresas parceiras, fornecedoras, assumem grande parcela
do projeto e do desenvolvimento de peças, componentes e
sistemas. De outro, existe um acompanhamento contínuo e
rigoroso por parte das empresas automobilísticas. Tal arranjo
permite reduzir os ciclos de desenvolvimento e lançamento
de produtos, mas, em contrapartida, perde-se em controle.
Talvez essa possa ser a explicação para a quantidade de
recalls de automóveis no ano de 2010 no Brasil. Segundo o
Portal de Notícias G1, do Sistema Globo, somente nos dez
primeiros meses desse ano foram efetuadas 44 convocações,
envolvendo em torno de 1,2 milhão de veículos. Um recorde
absoluto.1
Ambiente geral
Ambiente externo
Zona
de influência
Ambiente
interno
Fig. 2.1 – Zona de influência entre a empresa e o ambiente.
2.1 A organização em transformação
Aquela velha organização estática,
com acontecimentos previsíveis, tentando
solucionar seus problemas, deixou de existir
há muito tempo. Você, como futuro ou atual
administrador, encontrará novos desafios
na função, ligados ao extremo dinamismo da vida moderna e
às possibilidades de integração que a tecnologia oferece. Griffin
(2007) oferece uma abrangente perspectiva desses desafios e
suas consequências:
Rios, Milene. Número de recalls no Brasil supera recorde registrado
no ano passado. Portal de Notícias G1, 14 out. 2010.
1
7
Unidade I
• Economia instável
É crescente a dificuldade para visualizarmos o futuro, o
que resulta na limitação de nossa capacidade de elaborar
planejamentos consistentes. Por exemplo, em 2007,
a crise econômica iniciada nos Estados Unidos, e que
ganhou escala mundial, surpreendeu gestores, analistas e
pesquisadores dos mais diversos pontos do planeta. E isso
em plena era do “tempo real”. Outro exemplo é o fatídico
11 de Setembro de 2001, ocorrido em um Estados Unidos
praticamente isento de ataques terroristas até então. O
mundo literalmente mudou após esse evento.
• Globalização
Se por um lado permite expandir a atuação das
organizações, levando-as a alcançar mercados em todo
o mundo, por outro pode significar um acirramento
expressivo da competição, com grandes riscos potenciais,
já que abre a possibilidade de se deparar com oponentes
internacionais por vezes muito melhor desenvolvidos
e preparados. Outro fator decorrente são as diferenças
culturais e comportamentais, que causam grande impacto
na forma de administração das empresas pela dificuldade
de se estabelecer estilos e procedimentos globalizados.
As atribulações encontradas, por exemplo, na fusão da
Chrysler com a Daimler-Benz (que inclusive já foi desfeita)
e da Renault com a Nissan demonstram bem como certas
integrações podem se tornar verdadeiras batalhas.
Globalização: o lado “B”
Embora a concepção de globalização, como um fenômeno
inevitável, de eliminação das fronteiras e da instituição do
comércio internacional irrestrito, seja dominante, muitos
contestam seus potenciais benefícios, indicando, em vez
8
ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS
disso, um fortalecimento da dominação dos países mais
desenvolvidos, além da aceleração dos danos ao meio
ambiente. Para compreender melhor a visão do lado “B”
da globalização, ver, por exemplo, a obra de J. Stiglitz, A
globalização e seus malefícios.2
• Diversidade
A época do Ford T – “qualquer cliente pode ter um
carro pintado de qualquer cor que ele queira, desde que
seja preto” 3 – acabou há muito tempo. Os produtos e
serviços, mais do que diversificados, caminham para
a personalização, com grande impacto nos sistemas
produtivos, pois a ideia não é a de fabricar em massa
produtos padronizados, mas aqueles que permitam
atender às expectativas do mercado. O cliente está muito
mais exigente e influencia uma parte significativa das
ações da empresa. Agora é possível acessar o site de um
fabricante e “montar” o seu carro, de acordo com o seu
gosto e sua necessidade, ou comprar um computador sob
medida, diretamente do fabricante.
A fabricação sob encomenda do cliente da Dell
Muitos se perguntam como a Dell foi capaz de reinventar
a indústria de computadores e tornar-se um símbolo da nova
economia. A resposta é simples: soube vender de um modo
inteligente, do jeito que o cliente quer. Michael Dell fundou a
empresa com apenas mil dólares e uma ideia revolucionária.
Decidiu vender computadores pessoais, sob medida,
diretamente para seus clientes. A empresa provou que vale
a pena tirar partido de oportunidades que os outros estão
convencidos que não existem. Enquanto outros fabricantes
de computadores vendem seus produtos por meio de
revendedores, a Dell procura vendê-los diretamente para
Stiglitz, J. A globalização e seus malefícios, São Paulo: Futura, 2002.
Tradução minha da frase “Any customer can have a car painted
any color that he wants, so long as it is black” (Ford & Crowther, 2007
[1922], p. 65).
2
3
9
Unidade I
o consumidor final, o que lhe permite um corte significativo
de custos. Assim, oferece o dinheiro poupado em forma de
preços mais atraentes para o público.4
• Tecnologias
As tecnologias têm, cada vez mais, maior importância
dentro das organizações. Elas impõem grandes desafios,
pois exigem atualização constante e investimentos
em desenvolvimento produtivo e de pessoal, mas ao
mesmo tempo oferecem oportunidades que precisam
ser aproveitadas. A tecnologia da informação (TI), a
microeletrônica, a nanotecnologia, além de novos
materiais e processos produtivos, são exemplos a serem
explorados.
• Trabalho
O velho cartão de ponto (modernizado ou não), horário
definido e fixo e carteira assinada são ainda importantes e
valorizados, mas abrem-se novas e diversas possibilidades
para as relações de trabalho. A oportunidade de emprego
em tempo parcial possibilita flexibilidade na montagem
de turnos, o trabalho remoto reduz os investimentos
em estrutura física, as terceirizações reduzem custos
trabalhistas.
• Qualidade
Mesmo sem ocupar a condição de protagonista que
tinha em outros tempos, principalmente após a ascensão
das empresas japonesas, a partir da década de 1980, a
qualidade é fator de competitividade, sendo fundamental
na escolha dos consumidores, mas também tem papel
decisivo para o aumento da produtividade, o que reduz
4
10
Texto extraído do site www.casodesucesso.com
Dica de leitura
É interessante conhecer com mais
detalhes a trajetória da Dell e de seu
criador, Michael Dell. Para tanto, leia
Dell: estratégias que revolucionaram o
mercado, editora Market Books, 1999.
ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS
desperdícios e retrabalho e colabora para a diminuição
de custos.
• Setor de serviços
Segundo Alvin Toffler (2007[1980]), conhecido futurólogo,
o setor de serviços ocupa, e deve permanecer assim
durante muito tempo, o espaço principal nas economias,
substituindo a até então dominante manufatura. Tal
condição impõe o desenvolvimento de novas soluções
gerenciais, mais específicas. Embora se deva considerar a
existência de muitas similaridades na condução das duas
operações, restam ainda diferenças fundamentais que
precisam ser melhor trabalhadas.
As três ondas de Toffler
Para Alvin Toffler, conhecido escritor futurista, a
história humana pode ser dividida em ondas. A primeira,
a da agricultura, perdurou até o fim do século XIX. A
segunda, a da industrialização, até a década de 1960. E a
terceira, a da informação, iniciou-se na década de 1970 e
perdura até hoje. Segundo ele, o grande impacto está na
criação de uma elite de trabalhadores do conhecimento,
ao mesmo tempo em que aumenta o número de empregos
de baixa qualificação, destinados ao setor de serviços.
(Toffler, 2007[1980]).
• Governança corporativa e responsabilidade corporativa
Cada vez mais as empresas vêm se preocupando
com as principais questões associadas à governança
corporativa – transparência de gestão e conduta ética
–, essenciais para proporcionar maior confiabilidade e,
consequentemente, maior valor de mercado, além de
maior valor do papel da organização perante a sociedade,
11
Unidade I
tanto em termos de ecologia e meio ambiente quanto de
suas contrapartidas.
Momento decisivo para os mercados
de capitais brasileiros
As ações da Natura foram lançadas no novo mercado em
maio de 2004 – uma época difícil para a economia brasileira
e para os mercados globais. O índice Bovespa havia caído
14% em dólares, e mesmo o índice Dow Jones recuara 3%.
Mas o mercado demonstrou que podia reconhecer o valor
de uma empresa sólida, que contava com boa governança,
e que, portanto, representava menos riscos para os
investidores.
A IPO5 da Natura foi um sucesso, atraindo cerca de 5
mil investidores, e a demanda por ações foi de 14 vezes o
volume ofertado. Tal solicitação ajudou a elevar o preço
das ações no aftermarket, resultando em ganhos de 18%
logo no primeiro dia. Mesmo antes da IPO, a procura por
ações da Natura parecia forte. Durante uma pré-IPO,
em um road-show internacional, o número de pedidos
(174) foi maior que o número de investidores visitados
(170). A IPO da empresa, a primeira ocorrida no Brasil
desde janeiro de 2002, também sinalizava o início de um
renascimento do mercado de ações no país. A IPO de maio
de 2004 foi seguida por uma segunda oferta, que levantou
R$ 768.120.636,00.
Fonte: Estudos de caso de boa governança corporativa – OECD (2005)
Já Robbins, Stephen P. (2002), considerando as mudanças e
as novas perspectivas da administração, apresenta comparações
entre a “velha” e a “nova” organização, esta mais condizente
com os novos tempos:
IPO – do inglês Inicial Public Offering, ou Oferta Pública Inicial,
representa o lançamento das ações de uma empresa, anteriormente de
capital fechado, no mercado de ações.
5
12
ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS
Velha organização
Nova organização
Fronteiras nacionais limitam a
competição
Fronteiras nacionais são quase
insignificantes na definição dos limites
de operação de uma organização
Empregos estáveis
Cargos temporários
Mão de obra relativamente
homogênea
Mão de obra diversificada
A qualidade é uma reflexão tardia
O aprimoramento contínuo e a
satisfação do cliente são essenciais
As grandes corporações fornecem
segurança no emprego
As grandes corporações estão
reduzindo drasticamente o número de
funcionários
Se não quebrou, não conserte
Redesenhe todos os processos
Disperse os riscos pela participação em Concentre-se em competências
múltiplos negócios
centrais
A hierarquia proporciona eficiência e
controle
Desmantele a hierarquia para
aumentar a flexibilidade
Jornadas de trabalho definidas, como
das 9h às 18h
Os expedientes não possuem nenhum
limite de tempo
O trabalho é definido pelos cargos
O trabalho é definido em termos das
tarefas a serem realizadas
O pagamento é estável e relacionado ao O pagamento é flexível e de ampla
tempo de serviço e ao nível do cargo
faixa
Os gerentes tomam decisões sozinhos
Os funcionários participam das
decisões
A tomada de decisão é motivada pelo
utilitarismo
Os critérios de decisão são ampliados
para incluir direitos e justiça
Para exercitar
Analise sua empresa seguindo os
critérios de Robbins. Ela está organizada
de forma mais tradicional ou moderna?
Quadro 2.1 – A organização em transformação (adaptado de Robbins (2002))
Mas as mudanças não se restringem às organizações. As
pessoas que nelas atuam também têm participação importante
em todo o processo.
2.2 O homem flexível
A mudança nas organizações vem
necessariamente
acompanhada
por
modificações ou redefinições no perfil da
mão de obra. Robbins (2002) apresenta
algumas delas:
13
Unidade I
• Classes de força de trabalho
Durante a era industrial, ou segunda onda, conforme a
já comentada acepção de Toffler, havia muita oferta de
empregos industriais, bem remunerados, com um mínimo
de exigência de qualificação. Atualmente, a situação
encontra-se bem diferente. Boa parcela dessa oferta de
empregos foi suprimida com a crescente automação
dos processos e operações. O contingente excedente foi
redirecionado para atividades que exigem habilidades
e competências diferenciadas ou foi substituído por
trabalhadores de outros locais, a um custo menor. Sai de
cena a estabilidade, entra a flexibilidade.
Para saber mais
Em vez de flexibilidade, um termo talvez eufemístico,
alguns autores preferem falar em precarização quando
se referem a menor carga horária, menor formalidade
e, consequentemente, menores salários. Para uma visão
mais detalhada sobre o assunto, recomendamos a leitura
do artigo de Passos A. F.; Ansiliero, G.; Paiva, L. H. Mercado
de trabalho: evolução recente e perspectivas, publicada
na Revista Mercado de Trabalho – conjuntura e análise,
do IPEA, Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas, em
fevereiro de 2005.
• Rotatividade
Como observado anteriormente, com as mudanças nas
relações de trabalho, um emprego para a vida toda soa
como um sonho (ou pesadelo). Embora a segurança
proporcionada por uma garantia de emprego ainda
seja atraente para muitas pessoas, haja vista a imensa
quantidade de candidatos a empregos no setor público,
a ideia de permanecer estacionado muito tempo em um
14
ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS
mesmo lugar pode ser um suplício para as pessoas mais
empreendedoras. As empresas mantêm os trabalhadores
enquanto estes adicionam valor à operação. Em
contrapartida, os trabalhadores permanecem enquanto
enxergam desafios estimulantes e retornos condizentes à
contribuição oferecida à empresa.
• Carreira
Como a lealdade já não é mais a palavra de ordem e sim a
troca de interesses, não existe lógica em se investir em um
trabalhador que tem um futuro incerto na empresa. Assim,
a responsabilidade pela administração da carreira está a
cargo do próprio trabalhador, visando não somente a uma
eventual ascensão interna, mas também à possibilidade
de uma troca de emprego ou mesmo de carreira, mas para
tanto é mandatório que o treinamento e o aprendizado
sejam contínuos.
• Equipes
A visão burocrática de normas e procedimentos,
notadamente individuais, está sendo substituída pelo
trabalho de equipe, visando ao aumento do rendimento
através do aproveitamento de sinergias. Entretanto,
trabalhar em grupo requer o desenvolvimento e o
aprimoramento de novas habilidades e competências,
um grande desafio para um mundo em que iniciativas
e resultados individuais eram crescentemente
valorizados.
A regra do 1+1+1
Pense nas atividades de uma equipe e em seus possíveis
resultados. Quanto resulta a soma de 1+1+1? Não é
pegadinha, depende dos resultados obtidos:
15
Unidade I
Se
1+1+1 = 3 Simplesmente não há ganho. O resultado
é a soma dos trabalhos individuais. Neste caso é indiferente
se a equipe existir ou não.
1+1+1 < 3 Provavelmente os integrantes do grupo
atrapalham uns aos outros e o resultado é aquém das
possibilidades individuais (entropia).
1+1+1 > 3 Neste caso, justifica-se o uso da equipe.
O resultado é superior à soma dos resultados individuais,
apontando colaboração e busca de objetivos comuns
(sinergia).
• Estresse
A intensa aceleração que testemunhamos nas mudanças
relativas a nossa vida pode torná-la por vezes mais
empolgante frente à visão de monotonia que podemos
relacionar ao estilo de vida do passado, no entanto ela
traz consigo preocupação e estresse. Redução de quadros,
aumento das pressões por resultados, portabilidade
do trabalho permitida com os desenvolvimentos da
informática, insegurança da manutenção do emprego são
alguns dos ingredientes que podem resultar em problemas
físicos e mentais. Existem programas governamentais, como
o HiperDia – hipertensão e diabetes, dedicados a doenças
relacionadas diretamente ao estresse, principalmente
porque estas não apresentam sintomas perceptíveis em
estágios iniciais, o que as torna uma bomba-relógio.
Para saber mais
Burn out – Conjunto de sinais e sintomas conhecido
como a doença dos idealistas, esta síndrome é desencadeada
16
ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS
por situações estressantes e se caracteriza por uma desilusão
profunda em relação ao próprio trabalho. Ver artigo
completo de Guilherme Genestreti no Caderno Equilíbrio
(p. 6-9) da Folha de S.Paulo de 2 de novembro de 2010.
Robbins (2002) apresenta as mudanças no perfil do
empregado. De funcionário, com uma relação notadamente
utilitária com a empresa, passa a ganhar novas condições e
responsabilidades, sendo melhor identificado, agora, como
colaborador. O quadro 2.2 faz uma comparação entre esses dois
tipos de empregados.
O funcionário
O colaborador
Cargos industriais eram de baixa
qualificação, mas bem remunerados
Cargos de baixa qualificação são mal
pagos
Troca sua lealdade à empresa por
segurança no emprego
A segurança no emprego é mínima
A organização é responsável pelo
desenvolvimento da carreira
O funcionário é responsável pelo
desenvolvimento da carreira
É um realizador individual
É um participante de equipe
A previsibilidade e a estabilidade
minimizam o estresse
A imprevisibilidade e a instabilidade
aumentam o estresse
Quadro 2.2 – Mudança no perfil do funcionário (adaptado de Robbins (2002))
2.3 Perspectivas
Mesmo considerando as organizações
em plena transformação, certamente
não existe nenhuma condição de ruptura
ou de revolução traumática. Velhas e
novas organizações podem conviver no
mesmo espaço, da mesma forma que
as diversas abordagens administrativas são encontradas
simultaneamente em qualquer sistema de gestão. Assim, é
natural que existam também diversas maneiras de se enxergar
17
Unidade I
as organizações. Essas visões ou perspectivas nos dão uma ideia
de como é seu funcionamento. Daft (2008) nos indica duas das
mais importantes: a abordagem sistêmica, especialmente com
relação aos sistemas abertos, e a configuração organizacional.
2.3.1 Abordagem sistêmica
O início da administração como área do conhecimento,
na virada do século XX, foi marcado por um mundo muito
menos dinâmico e mais previsível que o que presenciamos
hoje. Naquelas condições, era perfeitamente aceitável que
se considerassem as organizações como sistemas fechados,
ou seja, independentes do ambiente externo. Assim, qualquer
organização manteria sua autonomia, operando dentro de
limites (fronteiras) bem estabelecidos e isolados do mundo
exterior. É fato que representava uma condição idealizada, pois
é impossível um completo isolamento, mas os aspectos internos
eram considerados muito mais importantes que os externos.
Tal situação foi substancialmente modificada a partir dos
trabalhos do biólogo alemão Ludwig von Bertalanffy, por volta
da década de 1950. Sua contribuição mais conhecida, Teoria geral
de sistemas, propunha uma teoria interdisciplinar. Ele acreditava
que os diversos ramos do conhecimento, ao efetuarem uma
análise separada e exclusiva, provocavam brancos ou espaços
vazios que somente poderiam ser preenchidos a partir da
consideração da existência de uma dependência recíproca entre
todas as ciências e a necessidade de sua integração a partir de
uma visão globalizante. Essa integração e interdependência
seriam obtidas considerando-se todos os objetos de estudo
como sistemas abertos, inclusive a administração. (Chiavenato,
2003)
Considerando-se uma empresa ou organização como
sistema aberto (ver figura 2.2), podemos visualizá-la como
um todo coerente, composto por elementos que estão em
interação. Essas partes formam os subsistemas, que possuem
18
ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS
funções específicas para garantir a sobrevivência: produção,
manutenção, gerenciamento etc. Recebem entradas diversas do
ambiente externo (recursos humanos, materiais e energéticos),
transformam-nas a partir de processos específicos e as devolvem
como saídas (produtos, serviços, resíduos e impactos diversos)
ao mesmo ambiente.
Ambiente
externo
Ambiente
externo
Fronteiras
permeáveis
Recursos
Entradas
Energia
Ambiente
interno
Transformação
Subsistemas
- produção
- manutenção
- gerenciamento
- etc.
Produtos e
serviços
Saídas
Resíduos e
impactos
Fig. 2.2 – Sistema aberto
Nessa sociedade de organizações, as empresas que se
fecharam e se “esqueceram” do mundo, talvez acomodadas por
uma condição de liderança e pioneirismo, pagaram e pagam um
preço muito alto.
Estudo de caso: a Xerox
A Xerox, por exemplo, que possuía praticamente o
monopólio das máquinas copiadoras, passou a amargar
fracassos sucessivos a partir do momento em que suas
patentes começaram a expirar. Acomodada com os
lucros e preços das ações crescentes, fechou-se para o
mundo externo, ignorando as grandes mudanças que se
avizinhavam.
19
Unidade I
A concorrência conseguia conciliar rapidez de inovação
e custos progressivamente mais baixos. Segundo Slack et
alli (2009), no final da década de 1980, o preço de venda
dos concorrentes japoneses era equivalente ao preço de
custo da Xerox, eles tinham nove vezes menos fornecedores,
menos rejeições e retrabalhos nas linhas de montagem
e colocavam novos produtos no mercado na metade do
tempo. O termo “Burox”, apresentado por Daft (2008),
explica bem a situação da empresa. Apesar de um breve
período de bonança, pelo bom aproveitamento das novas
tecnologias digitais, experimentou novamente um período
de crise ao subestimar a ascensão das impressoras pessoais
com tecnologia de jato de tinta, bem mais acessíveis, como
também ignorou o impacto nas vendas de copiadoras da
virtualidade, com a internet, o e-mail e a portabilidade
eletrônica.
Após diversas reestruturações e trocas de comandos, a
empresa experimenta um período de retomada, lenta, mas
constante. Espera-se que tenha aprendido a lição.
Fonte: adaptado de Daft (2008)
Podemos ainda expandir o conceito e considerar que
além da sociedade de organizações temos uma sociedade de
organizações em rede. Manuel Castells, em seu livro A sociedade
em rede (2000), fala em uma nova ordem social, que também
seria econômica, tendo como epicentro as transformações
operadas pela tecnologia da informação e das comunicações.
Segundo Castells (2000, p. 497):
Redes constituem a nova morfologia de nossas
sociedades, e a difusão da lógica de redes modifica,
de forma substancial, a operação e os resultados
dos processos produtivos e de experiência, poder e
cultura. Embora a forma de organização social em
20
ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS
redes tenha existido em outros tempos e espaços, o
novo paradigma da tecnologia da informação fornece
a base material para sua expansão penetrante em
toda a estrutura social.
Para Castells, não podemos conceber a sociedade atual sem
considerá-la sob o ponto de vista da informação, uma vez que,
mais que um instrumento, a informação é o ativo atual das
sociedades.
2.3.2 Configuração organizacional
Segundo Mintzberg (2003), toda atividade humana
organizada origina duas exigências fundamentais e opostas:
a divisão do trabalho em tarefas mais simplificadas e a
coordenação dessas tarefas para a obtenção dos resultados
desejados.
A partir desse ponto de vista, o autor considera que “a
estrutura de uma organização pode ser simplesmente definida
como a soma total das maneiras pelas quais o trabalho é dividido
em tarefas distintas e como é feita a coordenação entre essas
tarefas”.
2.3.2.1 A divisão do trabalho
Muitos ainda associam a divisão
do trabalho à administração científica
de Taylor ou à linha de montagem de
Ford, mas existem registros muito
anteriores. Talvez o mais importante
e conhecido seja o de Adam Smith,
que já em 1776, ou seja, há mais de 230 anos, apontava em seu
célebre livro, A riqueza da nações, a divisão do trabalho como
fator multiplicador da produção, elemento essencial para gerar
uma riqueza universal, ou seja, que contemplasse até as classes
mais baixas da população. (Smith, 1985 [1776]).
21
Unidade I
2.3.2.2 A coordenação de tarefas
Se, por um lado, dividir o trabalho em tarefas mais elementares
resulta em ganhos de produtividade, pela simplificação e
especialização, por outro, as pessoas passam a ter dificuldade
para coordenar as ações para obter resultados, por empreender
as atividades mecanicamente, desprovidas de sentimento de
unidade e conjunto. Cumprem-se as tarefas sem se saber de sua
contribuição ou consequência.
Mintzberg (2003) propõe mecanismos básicos para se efetuar
a coordenação das tarefas a serem executadas: ajustamento
mútuo; supervisão direta, padronização de processos, de saídas
e de habilidades e conhecimentos. Veremos cada um com mais
detalhes a seguir.
• Ajustamento mútuo
Em organizações mais simples, a necessidade de
coordenação limita-se ao ajuste entre as operações dos
operadores, definido através de um processo simples
de comunicação informal à medida que aparecem as
exigências. Por exemplo, na operação de um pequeno
supermercado, os caixas que ficam ociosos nos horários
de menor movimento podem auxiliar na reposição dos
estoques, podendo ser convocados a qualquer momento
para reassumir suas tarefas caso a demanda de clientes
assim o exija. Isso possibilita reduzir a necessidade de
pessoal e otimizar o uso do tempo dos funcionários.
Gerente
Analista
Operador
Operador
Fig. 2.3 – Mecanismo de coordenação por ajustamento mútuo (adaptado de
Mintzberg, 2003)
22
ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS
• Supervisão direta
Quando a operação atinge uma complexidade maior,
tende-se a utilizar outro mecanismo de coordenação. A
supervisão direta ocorre quando se define uma pessoa
para ser responsável pelo trabalho de outras, a quem dará
instruções e cujas ações deverá monitorar. Aproveitando
o exemplo anterior, fazemos uma adaptação para ilustrar
este mecanismo: ao expandir os negócios, o proprietário
do supermercado percebe que deve aumentar o número
de caixas, o que exige a contratação de uma pessoa
responsável pelo gerenciamento da equipe. As empresas
do ramo utilizam a figura do “líder de caixas”, que é o
responsável por todos os eventos e decisões relacionados
ao setor.
Gerente
Analista
Operador
Operador
Fig. 2.4 – Mecanismo de coordenação por supervisão direta (adaptado de
Mintzberg, 2003)
• Padronização
Uma terceira ferramenta é a padronização do trabalho. Isso
significa definir, previamente, como serão executadas as
tarefas; quais serão as especificações dos produtos, quais
deverão ser os resultados do desempenho de cada um e,
ainda, que habilidades deverão possuir os funcionários
para realizar seu trabalho. Mintzberg (2003) apresenta
três formas básicas de padronização.
Padronização de processos – Neste caso, a execução
do trabalho é especificada e deve ser seguida pelo
23
Unidade I
operador, isto é, ele deve conhecê-la para poder realizála. Numa peça de teatro, por exemplo, cada ator deve
obedecer às marcações de palco estabelecidas pelo
diretor. Se um dos artistas precisar ser substituído, o
suplente seguirá as mesmas marcações. Veja estes outros
exemplos: as instruções de instalação que acompanham
um software adquirido por um consumidor; a sequência
rígida de um roteiro de vendas que deve ser seguido
por um operador de telemarketing. Veja no boxe uma
curiosa (mas lamentável) consequência da padronização
de processos, o “gerundismo”, que segundo o autor
do texto, parece ter surgido justamente no setor de
telemarketing.
Para você estar passando adiante6
Por Ricardo Freire
Este artigo foi feito especialmente para que você possa
estar recortando, possa estar deixando discretamente sobre
a mesa de alguém que não consiga estar falando sem estar
espalhando essa praga terrível da comunicação moderna, o
gerundismo.
Você pode também estar passando por fax, estar
mandando pelo correio ou estar enviando pela internet. O
importante é estar garantindo que a pessoa em questão vá
estar recebendo esta mensagem, de modo que ela possa
estar lendo e, quem sabe, consiga até mesmo estar se dando
conta da maneira como tudo o que ela costuma estar
falando deve estar soando nos ouvidos de quem precisa
estar escutando. Sinta-se livre para estar fazendo tantas
cópias quantas você vá estar achando necessárias, de modo
a estar atingindo o maior número de pessoas infectadas por
esta epidemia de transmissão oral.
Artigo publicado na coluna de Ricardo Freire, no Jornal da Tarde,
em 16 fev. 2001.
6
24
ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS
Mais do que estar repreendendo ou estar caçoando, o
objetivo deste movimento é estar fazendo com que esteja
caindo a ficha nas pessoas que costumam estar falando desse
jeito sem estar percebendo.
Nós temos que estar nos unindo para estar mostrando
a nossos interlocutores que, sim!, pode estar existindo uma
maneira de estar aprendendo a estar parando de estar falando
desse jeito. Até porque, caso contrário, todos nós vamos estar
sendo obrigados a estar emigrando para algum lugar onde
não vão estar nos obrigando a estar ouvindo frases assim o
dia inteirinho.
Sinceramente: nossa paciência está estando a ponto de
estar estourando. O próximo “Eu vou estar transferindo a
sua ligação” que eu vá estar ouvindo pode estar provocando
alguma reação violenta da minha parte. Eu não vou estar me
responsabilizando pelos meus atos.
As pessoas precisam estar entendendo a maneira como
esse vício maldito conseguiu estar entrando na linguagem do
dia a dia.
Tudo começou a estar acontecendo quando alguém
precisou estar traduzindo manuais de atendimento por
telemarketing. Daí a estar pensando que “We’ll be sending it
tomorrow” possa estar tendo o mesmo significado que “Nós
vamos estar mandando isso amanhã” acabou por estar sendo
só um passo.
Pouco a pouco a coisa deixou de estar acontecendo apenas
no âmbito dos atendentes de telemarketing para estar ganhando
os escritórios. Todo mundo passou a estar marcando reuniões,
a estar considerando pedidos e a estar retornando ligações.
A gravidade da situação só começou a estar se evidenciando
quando o diálogo mais coloquial demonstrou estar sendo
25
Unidade I
invadido inapelavelmente pelo gerundismo. A primeira
pessoa que inventou de estar falando “Eu vou tá pensando
no seu caso”, sem querer acabou por estar escancarando uma
porta para essa infelicidade linguística estar se instalando
nas ruas e estar entrando em nossas vidas.
Você certamente já deve ter estado estando a estar
ouvindo coisas como “O que cê vai tá fazendo domingo?”, ou
“Quando que cê vai tá viajando pra praia?”, ou “Me espera,
que eu vou tá te ligando assim que eu chegar em casa”.
Caramba! O que a gente pode tá fazendo pra que as pessoas
tejam entendendo o que esse negócio pode tá provocando
no cérebro das novas gerações? A única solução vai estar
sendo submeter o gerundismo à mesma campanha de
desmoralização à qual precisaram estar sendo expostos seus
coleguinhas contagiosos, como o “a nível de”, o “enquanto”,
o “pra se ter uma ideia” e outros menos votados. A nível
de linguagem, enquanto pessoa, o que você acha de tá
insistindo em tá falando desse jeito?
Padronização de saídas – Ela ocorre quando os
resultados do processo de trabalho são predeterminados,
o que significa especificar de antemão como devem ficar os
produtos fabricados, assim como qual deve ser o resultado
obtido pelos empregados. Por exemplo, as dimensões
que deve ter determinado produto ou o patamar mensal
mínimo de vendas de automóveis que devem alcançar os
vendedores de uma concessionária. Outro exemplo: um
auxiliar de pedreiro precisa preparar uma massa para
reboco que tenha as características necessárias para o
acabamento de uma parede. Se ele não seguir à risca as
especificações, a parede poderá futuramente apresentar
rachaduras.
Padronização de habilidades e conhecimentos –
Ela se dá quando o tipo de treinamento exigido para
26
ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS
o desempenho do trabalho já está especificado, ou
seja, ou a pessoa recebe treinamento antes de assumir
a atividade para a qual foi contratada ou ela já deve
possuir os conhecimentos e habilidades necessários para
exercer o cargo.
Quando uma empresa contrata um administrador
de empresas para um cargo de supervisão ou exige
experiência prévia de um vendedor de calçados, a busca é
por habilidades e conhecimentos padronizados. Gosselin,
apud Mintzberg (2003), afirma que o mesmo acontece
em situações mais complexas. Em seus estudos, o autor
observou que em uma operação de coração, com duração
de cinco horas, havia pouca comunicação entre o cirurgião
e o anestesista. Suas atividades eram coordenadas a partir
de suas qualificações.
Gerente
Analista
Operador
Habilidades e
conhecimento Processo de
trabalho
Saídas
Operador
Fig. 2.5 – Mecanismo de coordenação por padronização (adaptado de
Mintzberg, 2003)
2.3.3 Componentes básicos
As organizações são formadas por subsistemas ou
componentes, como indicado na figura 2.2, e a função destes é
garantir a sua operação e sobrevivência. Para tal, eles dependem
de fluxos de materiais e informações e inter-relacionamentos, o
que sugere a possibilidade da adoção de diversas configurações
possíveis. Entretanto, uma em particular merece destaque:
a estrutura de trabalho proposta por Mintzberg (apud Daft,
27
Unidade I
2008). Ela é composta por cinco elementos, como mostra o
esquema da figura 2.6, a saber: 1. o núcleo técnico; 2. a alta
administração; 3. a média gerência; 4. o suporte técnico, e 5.
o suporte administrativo. A importância e o tamanho de cada
componente variam conforme as condições e características de
cada organização.
• Núcleo técnico (núcleo operacional)
É composto pelas pessoas que realizam, na acepção
da palavra, a produção da organização, em termos de
produtos e/ou serviços. São elas as responsáveis diretas
pela transformação das entradas em saídas. No caso de
uma indústria manufatureira, por exemplo, o núcleo
técnico é o setor de produção. Já em uma empresa de
seguros ele pode ser representado pelos vendedores,
analistas e avaliadores, apoiados por um sistema de
informações.
• Suporte técnico (tecnoestrutura)
Sua função é auxiliar a organização a se adaptar ao
ambiente. Possuidores de conhecimento técnico, estes
funcionários buscam soluções para os problemas e
oportunidades para novos desenvolvimentos. Criam
inovações para serem utilizadas pelo núcleo técnico
e auxiliam nas adaptações e mudanças. É composto
principalmente por pessoal técnico especializado,
qualificado e experiente.
• Suporte administrativo (assessoria de apoio)
É responsável pela operação e conservação da organização,
considerando tanto os elementos físicos como humanos.
Engloba a gestão de pessoas, a manutenção de máquinas,
equipamentos e instalações e a segurança física e
patrimonial.
28
ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS
• Alta administração e média gerência (cúpula
estratégica e linha intermediária)
Os membros desses setores são responsáveis pela
direção e coordenação das outras partes da organização.
A alta administração define as estratégias e os rumos
gerais a serem seguidos pela organização como um
todo, ficando com a média gerência as atividades de
mediação entre a alta direção e as outras áreas da
organização e também a implementação das diretrizes
e a coordenação dos diversos subsistemas. A figura
2.6 apresenta um modelo dos cinco componentes
básicos, posicionados de acordo com sua atuação na
estrutura.
cni
e té
ort
Sup
Média gerência
o
orte rativ
Sup inist
adm
co
Alta
administração
Núcleo técnico
Fig. 2.6 – Os cinco componentes básicos de Mintzberg (adaptado de Mintzberg,
2003 e Daft, 2008)
Apesar de a figura 2.6 apresentar os elementos
separadamente, na prática eles encontram-se interligados
e com atividades sobrepostas. Assim, nada impede que um
diretor atue também no suporte técnico, dividindo sua
expertise técnica e, ainda, auxiliando o suporte administrativo
na seleção de um novo executivo. A tabela 2.1, por sua vez,
apresenta algumas posições típicas relacionadas a cada
29
Unidade I
componente básico em uma empresa fabril (baseado em
Mintzberg, 2003).
Componente
Membros e unidades
Alta administração
Conselho de diretoria
Presidência
Comissão executiva
Diretoria
Núcleo técnico
Encarregados
Operadores
Montadores
Vendedores
Despachantes
Suporte técnico
Planejamento estratégico
Controladoria
Treinamento
Pesquisa operacional
Programação da produção
Estudo de trabalho
Apoio técnico
Suporte administrativo
Assessoria jurídica
Relações públicas
Relações industriais
Pesquisa e desenvolvimento
Preços
Folha de pagamento
Portaria e recepção
Restaurante
Média gerência
Supervisor de operações
Supervisor de marketing
Gerentes de fábrica
Gerentes de vendas regionais
Gerentes de vendas locais
Supervisores
Tabela 2.1 - Exemplos de membros e unidades de empresa fabril (baseado em
Mintzberg, 2003)
Com os fundamentos definidos – os mecanismos de
coordenação e os componentes básicos da organização –,
podemos estudar e analisar a fundo as soluções usualmente
utilizadas para o problema básico da coordenação das atividades,
ou seja, que configurações permitem os melhores resultados,
respeitando-se as particularidades e contingências de cada
organização.
30
ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS
A realidade brasileira: delegação
de autoridade e terminologia
Enquanto a delegação de autoridade é imprescindível
e unânime, a terminologia empregada no Brasil para
classificar os estratos de autoridade não é homogênea.
Há empresas que usam os termos supervisão ou
supervisor para os níveis hierárquicos intermediários.
Outros preferem gerente. Há ainda aqueles que adotam
os dois termos para cargos com níveis de autoridade
distintos. Em geral, o supervisor está hierarquicamente
acima do gerente. Em alguns casos, porém, como em
departamentos de engenharia de grandes empresas,
um gerente pode se reportar ao diretor e ter como
subordinados supervisores mecânicos ou supervisores
eletricistas, por exemplo.
Fonte: Robbins (2007)
EXERCÍCIO
1) Em qual componente você se encaixa?7
O teste que vem logo abaixo, e segue a linha do
autoconhecimento, pretende avaliar sua aptidão para a
administração. Certamente não representa um rigoroso teste
psicológico, mas pode sugerir tendências ou habilidades e
competências a serem desenvolvidas.
Na lista apresentada na sequência, você encontrará
afirmações de natureza geral. Provavelmente discordará de
algumas e concordará com outras. Indique, conforme a escala,
em que medida você concorda ou discorda delas fazendo
um círculo no número da coluna à direita que representa sua
opinião.
7
Exercício proposto em Sobral & Peci (2008).
31
Unidade I
1
Discordo
totalmente
2
3
4
5
6
7
Discordo
Discordo
Neutro Concordo Concordo Concordo
bastante ligeiramente
ligeiramente bastante totalmente
1. Em geral, tenho uma atitude positiva em relação
àqueles que possuem uma posição de autoridade
sobre mim (pais, professores, chefes etc.).
1 2 3 4 5
6 7
2. Gosto de competir e de ganhar, tanto
individualmente como com o meu grupo de
trabalho.
1 2 3 4 5
6 7
3. Gosto de dizer aos outros o que devem fazer
e não tenho problemas em impor sanções para
reforçar minhas diretrizes.
1 2 3 4 5
6 7
4. Gosto de ser ativo, assertivo e de proteger os
integrantes de meu grupo de trabalho.
1 2 3 4 5
6 7
5. Gosto de me destacar no meu grupo ou equipe e
não me sinto bem quando passo despercebido.
1 2 3 4 5
6 7
6. Estou disposto a realizar atividades e tarefas
repetitivas para alcançar meus objetivos.
1 2 3 4 5
6 7
7. De modo geral, aceito e procuro seguir as
diretrizes daqueles que têm autoridade sobre mim
(pais, professores, chefes etc.).
1 2 3 4 5
6 7
8. Vejo a competição como uma forma de
motivação para revelar o que tenho de melhor.
1 2 3 4 5
6 7
9. Gosto de assumir a liderança de meu grupo ou
equipe.
1 2 3 4 5
6 7
10. Gosto de assumir a defesa de minhas opiniões e
daquilo em que acredito
1 2 3 4 5
6 7
11. Gosto de me comportar de forma que me
permita ter visibilidade perante os outros.
1 2 3 4 5
6 7
12. Reconheço que a rotina e a ordem são aspectos
importantes no ambiente de trabalho.
1 2 3 4 5
6 7
Resolução do exercício:
Nem todas as pessoas estão aptas e motivadas a desempenhar
funções de administração. Esse questionário mede as seis
dimensões de personalidade consideradas determinantes para
explicar o desempenho de cargos gerenciais, especialmente em
grandes organizações. As dimensões referidas são:
• atitude favorável perante a autoridade (afirmações 1 e 7);
32
ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS
• desejo de competir (afirmações 2 e 8);
• desejo de exercer poder (afirmações 3 e 9);
• assertividade (afirmações 4 e 10);
• desejo de alcançar uma posição de destaque (afirmações
5 e 11);
• disposição para desempenhar
(afirmações 6 e 12).
tarefas
repetitivas
Para determinar o seu resultado, basta adicionar o valor
correspondente a cada uma das respostas. A pontuação do teste
variará entre 12 e 84. Uma pontuação entre 12 e 36 significa
que a pessoa tem reduzida aptidão administrativa; entre 38 e
58, aptidão moderada; e entre 60 e 84, aptidão elevada.
Esse teste tem como objetivo ajudar a perceber até que
ponto uma pessoa se sentirá confortável ao realizar atividades
administrativas. No entanto, esse instrumento enfatiza as
tarefas associadas à administração de organizações grandes
e burocráticas. Um resultado de fraca ou moderada aptidão
poderá ser um indicador de que a pessoa tem predisposição
maior para gerir uma pequena empresa, uma empresa orgânica
ou para desenvolver iniciativas empreendedoras.
33
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