IED-LACUNAS

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CURSO: Direito
DISCIPLINA:
PERÍODO MINISTRADO/SEMESTRE/ANO:
PROFESSOR:
Introdução ao direito
2º/2014
Juliano Vieira Alves
COLMATAÇÃO DAS LACUNAS
INTEGRAÇÃO DO DIREITO
Essa aula pode ser encontrada nos seguintes lugares
BETIOLI, Antonio Bento. Introdução ao direito: lições de propedêutica jurídica tridimensional.
São Paulo: Saraiva, 2014, p. 459
BOBBIO, Norberto. O positivismo jurídico: lições de filosofia do direito; compiladas por Nello Morra;
tradução e notas Márcio Pugliesi, Edson Bini, Carlos E. Rodrigues. São Paulo: Icone, 1995.
FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão, dominação. 6ª. ed.,
rev. e ampl., São Paulo: Atlas, 2012.
DIMOULIS, Dimitri. Manual de introdução ao estudo do direito. 2ª. ed., rev., atual. e ampl. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2007 – Lição 3 “Teoria da norma jurídica” – pp. 63/91.
DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito: introdução à teoria geral do
direito, à filosofia do direito, à sociologia jurídica e à lógica jurídica: norma jurídica e aplicação do
direito. 23ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
LARENZ, Karl. Metodologia da Ciência do Direito; tradução de José Lamego. 3ª. ed. Lisboa: Fundação
Calouste Gulbenkian, 1997 - II - PARTE SISTEMÁTICA: Capítulo V - MÉTODOS DE DESENVOLVIMENTO
JUDICIAL DO DIREITO.
NADER, Paulo. Introdução ao Estudo do direito. Rio de Janeiro: Forense, 2009 – Capítulo IX: “Norma
Jurídica” – pp. 83/96
NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Manual de introdução ao estudo do direito: com exercícios para sala de
aula e lições de casa. 9ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Introdução ao estudo do direito: primeiras linhas. 3ª. ed., 4. reimpr. São Paulo:
Atlas, 2010.
CF art. 5º, XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça
a direito
CPC - art. 126. O juiz não se exime de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou
obscuridade da lei. No julgamento da lide caber-lhe-á aplicar as normas legais; não as
havendo, recorrerá à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito.
LINDB - Art. 4º Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a
analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.
PRESSUPOSTOS



O ordenamento jurídico visto como sistema
Um cipoal de normas que não param de ser criadas
Inflação legislativa: sistema que se caracteriza pela onipresença/completude
Atualizado em 12.10.2014
1
Introdução do Direito – o problema das lacunas e a integração
Professor Juliano
Normas regulamentando todas as ações e comportamentos
O PRESSUPOSTO DA COMPLETUDE DO SISTEMA: A demonstração da inexistência das lacunas
diz respeito a duas teorias diversas (BOBBIO, 1995, p. 208):
1) A teoria do espaço jurídico vazio tem o seu maior expoente em Bergbohm e foi sustentada
na Itália principalmente por Santi Romano. Estes autores afirmam que não faz sentido falar de
lacunas do direito, porque, dado um fato qualquer, ou existe uma norma que o regule e,
neste caso, não há evidentemente lacuna alguma, ou não existe nenhuma norma que o
regule, e nem também neste caso se pode falar de lacuna, visto que o fato não regulado é
juridicamente irrelevante, porque pertence ao "espaço jurídico vazio" (isto é, ao espaço que
está além da esfera jurídica).
2) A teoria da norma geral exclusiva tem o seu maior expoente em Zitelmann e foi retomada
na Itália principalmente por Donati. Segundo este último autor, não existem fatos
juridicamente irrelevantes e não existem lacunas, porque cada norma jurídica particular que
submete a uma dada regulamentação certos atos é sempre acompanhada de uma segunda
norma implicitamente nela contida, a qual exclui da regulamentação da norma particular
todos os atos não previstos por esta última e os submete a uma regulamentação jurídica
antitética (por isto a segunda norma, é dita geral e exclusiva)
Ver o princípio da legalidade – art. 5º, II, CF
Em sentido análogo ao item 2: “...todo ordenamento qualifica como indiferente tudo que não
é obrigatório ou proibido, ou seja, o que não está juridicamente proibido é juridicamente
permitido” (FERRAZ JÚNIOR, 2012, p. 189)

É possível existir lacunas?
“O ordenamento jurídico é inevitavelmente lacunoso, porque o legislador não pode prever
todas as situações que se multiplicam na sociedade e, atualmente, o incrível e rápido avanço
tecnológico” (VENOSA, 2010, pp. 173-4)

“...por mais que as normas jurídicas – e os legisladores – queiram, elas não conseguem
acompanhar a dinâmica de transformação da realidade social. E, até ao contrário, a norma tem
entre suas funções a de ser estabilizadora da sociedade, o que contrasta com movimentos
contínuos de mudança” (NUNES, 2009, p. 296).
os casos que poderiam colocar o juiz em dificuldade (BOBBIO, 1995, p. 74):
a) obscuridade da lei: neste caso o juiz deve tornar clara, através da interpretação, a
disposição legislativa que parece obscura;
b) insuficiência da lei, no momento em que esta não resolve completamente um caso,
descurando a consideração de qualquer elemento: em tal caso o juiz deve completar o
disposto legislativo (integração da lei);
c) silêncio da lei, quando esta se cala sobre uma determinada questão (é o caso típico das
"lacunas", as quais, por outro lado, se verificam também no caso de insuficiência da lei): neste
caso o juiz deve suprir a lei, deduzindo de qualquer modo a regra para resolver a controvérsia
em exame.


Princípio norteador do intérprete está previsto no art. 4º da LINDB

Juízo de non liquet: quando a lei não oferece nenhuma regula decidendi.

Maria Helena Diniz, ao comentar o art. 4º da LINDB, afirma: “O legislador, reconhecendo a
impossibilidade lógica de regulamentar todas as condutas, prescreve normas desse tipo com o
escopo de estabelecer a ‘plenitude do ordenamento’. E a proibição da denegação da justiça
pelo juiz pretende tão somente estabelecer tal completude” (DINIZ, 2012, p. 474).

2
Introdução do Direito – o problema das lacunas e a integração
Professor Juliano
DEFINIÇÃO

Existem casos não previstos na norma jurídica

Lacuna para Antonio Bento Betioli: "A lacuna pode ser definida como a ausência de lei que
permita resolver uma situação da vida social que reclama uma solução jurídica, ou como a
ausência de lei para um caso concreto. Por outras palavras, há lacuna quando um fato não foi
contemplado como pressuposto ou fato-tipo de uma norma, havendo então falta de uma
hipótese típica dentro da qual o fato se inclui como seu correspondente existencial concreto"
(BETIOLI, 2014, p. 459).

“A concepção do ordenamento como sistema dinâmico envolve, por fim, o problema de
saber se este tem a propriedade peculiar de qualificar normativamente todos os
comportamentos possíveis ou se, eventualmente, podem ocorrer condutas para as quais o
ordenamento não oferece qualificação” (FERRAZ JÚNIOR, 2012, p. 185).

A lacuna não é do sistema jurídico – é da norma: “As lacunas não estão no sistema jurídico,
mas nas normas jurídicas. Isto porque, através dos meios de integração, o intérprete colmata
as lacunas, preenche os vazios” (RIZZATTO NUNES, 2009, p. 296)
DISTINÇÃO RELEVANTE

INTEGRAÇÃO: trabalho mental do qual resulta a materialização do direito no caso concreto
diante de uma omissão da lei

INTERPRETAÇÃO: quando há norma prevendo o caso

INTEGRAÇÃO: não existe norma

Resumo:“...há interpretação, em sentido estrido, quando existe uma norma prevendo o
caso; recorre-se à ‘integração’ quando não existe essa norma explicita” (MONTORO, apud
VENOSA, 2010, p. 174)
A INEXISTÊNCIA DE NORMA É PRESSUPOSTO FUNDAMENTAL

"Dentro do sistema europeu-continental ou romano-germânico, não encontra respaldo
jurídico a transformação do legalmente previsto unicamente com base em considerações de
lege ferenda. Muito menos, com recurso à analogia como se esta pudesse revogar expresso
texto legal" Voto do Ministro Felix Fischer no REsp nº 1.106.223/RS.

Por meio dos métodos de integração, o intérprete colmata as lacunas e preenche os vazios

ESPÉCIE DE LACUNAS
Voluntárias
Involuntária
A inexistência é proposital pelo legislador: é a conveniência
de que o legislador deixou um espaço de liberdade ao Juiz
(BETIOLI, 2014, p. 459)
O legislador simplesmente não previu a situação: consiste
na “limitada capacidade de previsão do legislador”
(BETIOLI, 2014, p. 459)
TRÊS COISAS IMPORTANTES:
1) SOBRE A EFETIVA EXISTÊNCIA DA LACUNA

A maior questão diz respeito à efetiva existência de uma lacuna - esse é o pressuposto do
raciocínio do aplicador do direito de acordo com os princípios a seguir lançados

“...a lacuna não aparece para o hermeneuta, como uma evidência, mas exige
demonstração” (FERRAZ JUNIOR, 2012, p. 276)

A integração pressupõe “que o intérprete haja lançado mão de todas as regras de
interpretação à sua disposição, e ainda assim não tenha conseguido detectar norma jurídica
aplicável ao caso que ele está examinando” (NUNES, 2009, p. 297)
3
Introdução do Direito – o problema das lacunas e a integração
Professor Juliano

Ver a decisão do Ministro Carlos Britto no capítulo da analogia abaixo
2) DOS LIMITES DA COLMATAÇÃO

“Nem sempre, uma vez constatada a lacuna, será possível o seu preenchimento pelo
intérprete, pois há limites, no ordenamento, para essa atividade integradora, imposta pelo
próprio legislador” (VENOSA, 2010, p. 175)

portanto, existem casos que o preenchimento é vedado pelo legislador: é a limitação à
atividade integradora: lacunas no ordenamento penal, por exemplo – trata-se da tipicidade
cerrada: a norma limita taxativamente os casos de incidência
EXEMPLO: Na ADPF 54/DF, a parte autora, Confederação Nacional dos Trabalhadores da Saúde –
CNTS, sustenta que a interpretação dos arts. 124, 126 e 128, I e II, do Código Penal, que leva à proibição
da antecipação do parto, por motivos terapêuticos, no caso de fetos anencefálicos, viola os preceitos
fundamentais abrigados nos arts. 1º, IV (princípio dignidade da pessoa humana), 5º, II (princípios da
legalidade e autonomia da vontade humana), 6º, caput, e 196 (direito à saúde), todos da Carta da
República.
"Por todo o exposto, e considerando, especialmente, que a autora, ao requerer ao Supremo
Tribunal Federal que interprete extensivamente duas hipóteses restritivas de direito, em verdade
pretende que a Corte elabore uma norma abstrata autorizadora do aborto dito terapêutico nos casos
de suposta anencefalia fetal, em outras palavras, que usurpe a competência privativa do Congresso
Nacional para criar, na espécie, outra causa de exclusão de punibilidade ou, o que é ainda pior, mais
uma causa de exclusão de ilicitude, julgo improcedente o pedido" - VOTO DO MINISTRO RICARDO
LEWANDOWSKI na ADPF 54/DF julgada em 12.04.2012.
RECURSO ESPECIAL. PENAL. FURTO QUALIFICADO. APLICAÇÃO ANALÓGICA DA MAJORANTE DO ROUBO
COM CONCURSO DE AGENTES À HIPÓTESE DE FURTO. IMPOSSIBILIDADE. REDUÇÃO DA PENA PELA
TENTATIVA. CRITÉRIO. ITER CRIMINIS. FASE INICIAL DE EXECUÇÃO DO DELITO.
I - A qualificadora do §4º do art. 155 do CP não se confunde, em seus efeitos, com a majorante do §2º
do art. 157 do mesmo Codex (Precedentes). A analogia pressupõe, para o seu uso, uma lacuna
involuntária (art. 4º da LINDB)" – REsp 1106223/RS, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA,
julgado em 08/09/2009, DJe 13/10/2009
Furto qualificado
§4º - A pena é de reclusão de dois a oito anos, e multa, se o crime é cometido:
I - com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa;
II - com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza;
III - com emprego de chave falsa;
IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas.
Roubo
§2º - A pena aumenta-se de um terço até metade:
I - se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma;
II - se há o concurso de duas ou mais pessoas;
III - se a vítima está em serviço de transporte de valores e o agente conhece tal circunstância.
IV - se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou
para o exterior;
V - se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade.
Retratam os autos que os recorridos Marcos Juliano de Oliveira e Rodinaldo Augusto Michel foram
condenados como incursos nas sanções do art. 155, § 4º, inciso IV, c⁄c o art. 14, inciso II, ambos do
Código Penal, à pena de 01 (um) ano e 04 (quatro) meses de reclusão, em regime aberto e ao
pagamento de 10 (dez) dias-multa. A pena privativa de liberdade foi substituída por restritiva de
direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade. Irresignada, apelou a defesa. O e.
Tribunal de origem deu parcial provimento ao recurso, em v. acórdão cuja ementa restou assim
definida: "Tentativa de furto qualificado. Existência e autoria da subtração em concurso de agentes
comprovada. Desistência voluntária não caracterizada. Condenação mantida. Na visão da Câmara, ao
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Introdução do Direito – o problema das lacunas e a integração
Professor Juliano
furto qualificado pelo concurso de agentes, é de ser aplicada, em respeito aos princípios da
proporcionalidade e da isonomia, a fração de aumento de pena prevista ao roubo majorado pela
mesma circunstância. Penas redimensionadas. Impossibilidade de afastamento da sanção pecuniária
regularmente cominada em lei. Apelos defensivos parcialmente providos. Unânime." (fl. 218) Daí o
presente apelo nobre, no qual alega o recorrente, a par de dissídio jurisprudencial, negativa de vigência
aos arts. 155, § 4º, inciso IV e 14, parágrafo único, ambos do Código Penal. Em primeiro lugar, afirma
que ao furto qualificado pelo concurso de agentes não se aplica analogicamente a pena do furto
simples em conjunto com a majorante do art. 157, § 2º, inciso II, do CP. – Link
3) O ATO INTEGRADOR É SINGULAR E O PREENCHIMENTO DA LACUNA É SEMPRE PARA O
CASO

“...nenhum meio integrador gera, por si, um efeito generalizante” (FERRAZ JUNIOR, 2012,
p. 282)

todas as vezes que o juiz se depara com aquele caso, o processo de argumentação deve
ser repetido

somente o legislador supre a lacuna Nunca o intérprete elimina definitivamente a lacuna

“...O intérprete a preenche [a lacuna] no caso, mas ela continua a subsistir, exigindo, em
cada vez, novos procedimentos de integração. De outro modo, a hipótese do legislador
racional teria de admitir uma insuportável proliferação de normas gerais, em detrimento da
coerência,” (FERRAZ JUNIOR, 2012, p. 282)

“...a decisão judicial nem ao menos elimina as lacunas e os conflitos. O juiz, ao aplicar a um
caso não previsto a analogia, o costume e os princípios gerais do direito, não fecha a lacuna
através de uma construção judicial, na qual substitui o legislador. Entendemos que a
integração de uma lacuna não se situa no plano legislativo, nem tampouco é uma delegação
legislativa ao juiz; ela não cria novas normas jurídicas gerais, mas individuais, ou, na expressão
de Betti, máximas de decisão, que só poderão ascender à categoria de normas jurídicas gerais
tão somente em virtude de um subsequente processo de recepção e absorção dessa normas
por uma lei ou jurisprudência, uma vez que as sumulas dos Tribunais são tidas, por alguns
autores, como normas gerais” (DINIZ, 2012, p. 475).
EXEMPLO:
SÚMULA Nº 187 DO STF: "A responsabilidade contratual do transportador, pelo acidente com o
passageiro, não é elidida por culpa de terceiro, contra o qual tem ação regressiva" - Data de
Aprovação: Sessão Plenária de 13/12/1963
CÓDIGO CIVL 2002: art. 735. A responsabilidade contratual do transportador por acidente com o
passageiro não é elidida por culpa de terceiro, contra o qual tem ação regressiva.
O CASO DA NORMA SINGULAR



A norma singular serve para atingir uma utilidade especial indo contra o princípio geral
Ela abre exceções para certos casos
Se faz para estes, não pode ser utilizado para outros casos
INTEGRAÇÃO CONTRA LEGEM

É um controle da integração de forma institucional – ex: proíbe-se o costume contra legem
O CASO DOS JUROS NO CONTRATO BANCÁRIO: Na hipótese de o contrato prever a incidência de
juros remuneratórios, porém sem lhe precisar o montante, está correta a decisão que considera nula
tal cláusula porque fica ao exclusivo arbítrio da instituição financeira o preenchimento de seu
5
Introdução do Direito – o problema das lacunas e a integração
Professor Juliano
conteúdo. A fixação dos juros, porém, não deve ficar adstrita ao limite de 12% ao ano, mas deve ser
feita segundo a média de mercado nas operações da espécie. Preenchimento do conteúdo da cláusula
de acordo com os usos e costumes, e com o princípio da boa fé (arts. 112 e 113 do CC/02) – Resp
715894/PR, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 26/04/2006.
Entretanto: “...nem sempre a jurisprudência é infensa à aplicação do costume contra
legem e ao preenchimento, dessa forma, de lacunas axiológicas. Como também é possível o
uso de princípios gerais do direito e da equidade nesses casos. A recomendação que resta,
então, como forma de controle, é a de que sejam usados estes meios com extrema cautela”
(FERRAZ JUNIOR, 2012, p. 283)

ANTIGO EXEMPLO trazido por Maria Helena Diniz: o caso do cheque pós-datado. “A função natural do
cheque é ser um meio de pagamento à vista. Se emitido sem fundos em poder do Banco sacado, ficará o
que o emitiu sujeito à sanção penal. Entretanto, muitas pessoas vêm reiterada e initerruptamente
emitindo-o não como uma mera ordem de pagamento, mas como garantia de dívida, para desconto
futuro, na convicção de que esse procedimento não constitui um crime. Tal costume de emitir cheque
pós-datado, baseado em hábito da época, realizado constante e uniformemente e na convicção de que
se trata de uma norma de Direito Civil, como se se tratasse de um sucedâneo de uma letra de câmbio
ou de uma promessa de pagamento, faz com que o magistrado se utilize dessa norma consuetudinária
como fonte supletiva da lei, declarando a inexistência do crime" (DINIZ, Maria Helena. As lacunas no
direito. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1981, p. 175).
Súmula Nº 370 do STJ - Enunciado: “Caracteriza dano moral a apresentação antecipada de cheque prédatado” – 16.02.2009.
Lei do Cheque (Lei nº 7.357/1985), art. 32: “O cheque é pagável à vista. Considera-se não-estrita
qualquer menção em contrário”.
Esses limites à integração são inventados pelo pensamento dogmático
Permite controlar a decidibilidade de conflitos não regulados expressamente pelo
legislador de forma positiva

Esse estreitamento está baseado em valores de certeza e segurança

Limitação do campo de atuação do intérprete


MEIOS DE INTEGRAÇÃO
REITERANDO

O preenchimento da lacuna não proíbe a constatação em novos casos

Somente o legislador pode eliminar, definitivamente

Uma sentença judicial somente preenche a lacuna para o caso concreto

Ela não desaparece do sistema e deve ser preenchida a cada novo e sucessivo caso e
circunstância

“Quando se refere aos meios de integralização, a doutrina fala em analogia, costumes,
equidade, princípios gerais de direito, indução amplificadora, interpretação extensiva, etc. A
distinção entre eles nem sempre é precisa, ora chamando-se de analogia o que para uns é
interpretação extensiva e vice-versa, ora reconhecendo-se como equidade, o que para outros
é princípio geral do direito” (FERRAZ JUNIOR, 2012, p. 276)

“Integração é o meio através do qual o intérprete colmata a lacuna encontrada” (RIZZATO,
2009, p. 297)

PRESSUPOSTO: o intérprete esgotou as regras de interpretação à disposição e não
encontrou norma aplicável
6
Introdução do Direito – o problema das lacunas e a integração
Professor Juliano
ANALOGIA
Uma norma estabelecida para determinados facti species aplicados à conduta para a qual
não há norma – existe entre os suportes fáticos uma semelhança

Casos que são essencialmente iguais nos aspectos importantes e desiguais nos secundários

“...aplicações de disposições legais positivadas a casos não totalmente conformes e não
regulados expressamente, mas que podem ser submetidos às ‘ideias fundamentais’ daquelas
disposições” (FERRAZ JUNIOR, 2012, p. 277)

"Entendemos por analogia a transposição de uma regra, dada na lei para a hipótese legal
(A), ou para várias hipóteses semelhantes, numa outra hipótese B, não regulada na lei,
«semelhante» àquela. A transposição funda-se em que, devido à sua semelhança, ambas as
hipóteses legais hão-de ser identicamente valoradas nos aspectos decisivos para a valoração
legal; quer dizer, funda-se na exigência da justiça de tratar igualmente aquilo que é igual"
(LARENZ, 1997, pp. 540/541)

Indicada como modelo a ser utilizado pelo intérprete no preenchimento da lacuna

A base é outra norma jurídica não feita para o caso examinado

O que é caso semelhante?

“Analogia é (...) a passagem de um caso particular para outro particular, sem a necessidade
de generalização” (RIZZATO, 2009, p. 298)

é um movimento mental de lógica: a analogia faz a passagem de um particular para outro
particular

DEDUÇÃO: geral
particular

INDUÇÃO: particular
geral

Isto é o que difere a analogia da dedução ou da indução

Das premissas à conclusão, faz-se uma passagem no mesmo nível: do geral para o geral ou
do particular para o particular – nunca de um nível para outro

Se 2+2=4 e 3+1=4, então 2+2=3+1

Ocorre que, na prática, o juízo empírico, a constatação da semelhança exige valoração

A força persuasiva do uso da analogia depende da capacidade do intérprete argumentar: a
semelhança possui fundamento no próprio sistema, no ordenamento jurídico, etc

Essa imprecisão do raciocínio e a sua dependência de juízos empíricos é o que impedem a
analogia no Direito Penal, exceto se for para beneficiar o réu: a analogia in bonam partem

Qual o fundamento do uso da analogia para o direito?

É o princípio geral de que o direito deve conferir soluções semelhantes a casos
semelhantes

"Assim corno a justificação da analogia radica no imperativo de justiça de tratar
igualmente os casos iguais segundo o ponto de vista valorativo decisivo, também a justificação
da redução teleológica radica no imperativo de justiça de tratar desigualmente o que é
desigual, quer dizer, de proceder às diferenciações requeridas pela valoração" (LARENZ, 1997,
p. 556)

LACUNA LEGAL – COLMATAÇÃO – ANALOGIA – REQUISITOS – A partir da parêmia latina UBI aedem
ratio, ibi idem jus1 pode-se afirmar que a analogia, como processo visando a colmatação de lacuna
legal, tem como pressuposto a concorrência de três requisitos, ou seja:
1º) que a questão sob apreço não tenha sido objeto de norma jurídica específica;
2º) que exista no ordenamento jurídico preceito legal regulando situação que apresente ponto de
contato, identidade ou semelhança ou relação de coincidência, no tocante a aspecto relevante e
essencial das situações fáticas envolvidas; e
1
Onde houver a mesma razão, o direito deve ser o mesmo.
7
Introdução do Direito – o problema das lacunas e a integração
Professor Juliano
3º) que o aspecto comum tenha sido o elemento central na aplicação analógica. A ausência de
qualquer destes requisitos torna impraticável a invocação analógica da norma jurídica em face da
ruptura do nexo de semelhança por diversidade de razão - TRT 9ª R. – Proc. 19801-2001-004-09-00-4 –
(01435-2004) – Relª Juíza Sueli Gil El Rafihi – DJPR 23.01.2004
Por este motivo é que a semelhança deve ser demonstrada na ótica dos efeitos jurídicos
EXEMPLO 1

DECISÃO2 do ministro Carlos Britto reconhecendo a ausência de normas sobre
audiência pública no STF
Ante a saliente importância da matéria que subjaz a esta ação direta de
inconstitucionalidade, designei audiência pública para o depoimento de pessoas com reconhecida
autoridade e experiência no tema (§ 1º do art. 9º da Lei nº 9.868/99). Na mesma oportunidade,
determinei a intimação do autor, dos requeridos e dos interessados para que apresentassem a relação e
a qualificação dos especialistas a ser pessoalmente ouvidos.
2. Pois bem, como fiz questão de realçar na decisão de fls. 448/449, “a audiência
pública, além de subsidiar os Ministros deste Supremo Tribunal Federal, também possibilitará u’a maior
participação da sociedade civil no enfrentamento da controvérsia constitucional, o que certamente
legitimará ainda mais a decisão a ser tomada pelo Plenário desta nossa colenda Corte”. Sem embargo, e
conquanto haja previsão legal para a designação desse tipo de audiência pública (§ 1º do art. 9º da Lei
nº 9.868/99), não há, no âmbito desta nossa Corte de Justiça, norma regimental dispondo sobre o
procedimento a ser especificamente observado.
3. Diante dessa carência normativa, cumpre-me aceder a um parâmetro objetivo
do procedimento de oitiva dos expertos sobre a matéria de fato da presente ação. E esse parâmetro não
é outro senão o Regimento Interno da Câmara dos Deputados, no qual se encontram dispositivos que
tratam da realização, justamente, de audiências públicas (arts. 255 usque 258 do RI/CD). Logo, são esses
os textos normativos de que me valerei para presidir os trabalhos da audiência pública a que me propus.
Audiência coletiva, realce-se, prestigiada pela própria Constituição Federal em mais de uma passagem,
como verbi gratia, o inciso II do § 2º do art. 58, cuja dicção é esta:
“Art. 58. O Congresso Nacional e suas Casas terão comissões
permanentes e temporárias, constituídas na forma e com as atribuições
previstas no respectivo regimento ou no ato de que resultar sua criação.
(...)
§ 2º. Às comissões, em razão da matéria de sua competência, cabe:
(...)
II – realizar audiências públicas com entidades da sociedade civil;
(...)”
4. Esse o quadro, fixo para o dia 20.04.2007, das 09h às 12h e das 15h às 19h, no
auditório da 1ª Turma deste Supremo Tribunal Federal, a realização da audiência pública já designada às
fls. 448/449...
A noticiada lacuna normativa somente veio a ser colmatada através da Emenda
Regimental nº 29, de 18.02.2009, publicado no Diário de Justiça Eletrônico, n.35, de
20.02.2009, a qual acrescentou dispositivos ao Regimento Interno do Supremo Tribunal
Federal quanto à realização de audiências públicas.

EXEMPLO 2

Analogia com a Lei nº 9.096/1995 – Lei dos partidos políticos – Art. 7º, §1º3 - "Entidade de
classe de âmbito nacional (art. 103, IX, da Constituição Federal). Não é entidade de classe de
2
ADI 3.510, Rel. Min. Carlos Britto, decisão monocrática proferida em 16.03.07, DJ de 30.03.07.
“Só é admitido o registro do estatuto de partido político que tenha caráter nacional, considerando-se
como tal aquele que comprove o apoiamento de eleitores correspondente a, pelo menos, meio por cento
dos votos dados na última eleição geral para a Câmara dos Deputados, não computados os votos em
3
8
Introdução do Direito – o problema das lacunas e a integração
Professor Juliano
âmbito nacional, para os efeitos do inciso IX do art. 103 da Constituição, a que só reúne
empresas sediadas no mesmo estado, nem a que congrega outras de apenas quatro estados
da Federação." (ADI 386, Rel. Min. Sydney Sanches, julgamento em 4-4-91, DJ de 28-6-91)

EXEMPLO 3
O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI 4.277 e da ADPF 132, ambas da Relatoria do Ministro
Ayres Britto, Sessão de 05/05/2011, consolidou o entendimento segundo o qual a união entre pessoas
do mesmo sexo merece ter a aplicação das mesmas regras e consequências válidas para a união
heteroafetiva.
Antes dessa decisão, eram muito comuns decisões desse tipo:
PROCESSO CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE UNIÃO HOMOAFETIVA. PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO
JUIZ. OFENSA NÃO CARACTERIZADA AO ARTIGO 132, DO CPC. POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO.
ARTIGOS 1º DA LEI 9.278/96 E 1.723 E 1.724 DO CÓDIGO CIVIL. ALEGAÇÃO DE LACUNA LEGISLATIVA.
POSSIBILIDADE DE EMPREGO DA ANALOGIA COMO MÉTODO INTEGRATIVO.
2. O entendimento assente nesta Corte, quanto a possibilidade jurídica do pedido, corresponde a
inexistência de vedação explícita no ordenamento jurídico para o ajuizamento da demanda proposta.
3. A despeito da controvérsia em relação à matéria de fundo, o fato é que, para a hipótese em apreço,
onde se pretende a declaração de união homoafetiva, não existe vedação legal para o prosseguimento
do feito.
4. Os dispositivos legais limitam-se a estabelecer a possibilidade de união estável entre homem e
mulher, dês que preencham as condições impostas pela lei, quais sejam, convivência pública, duradoura
e contínua, sem, contudo, proibir a união entre dois homens ou duas mulheres. Poderia o legislador,
caso desejasse, utilizar expressão restritiva, de modo a impedir que a união entre pessoas de idêntico
sexo ficasse definitivamente excluída da abrangência legal. Contudo, assim não procedeu.
5. É possível, portanto, que o magistrado de primeiro grau entenda existir lacuna legislativa, uma vez
que a matéria, conquanto derive de situação fática conhecida de todos, ainda não foi expressamente
regulada.
6. Ao julgador é vedado eximir-se de prestar jurisdição sob o argumento de ausência de previsão legal.
Admite-se, se for o caso, a integração mediante o uso da analogia, a fim de alcançar casos não
expressamente contemplados, mas cuja essência coincida com outros tratados pelo legislador (REsp
820.475/RJ, Rel. Ministro ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO, Rel. p/ Acórdão Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO,
QUARTA TURMA, julgado em 02/09/2008, DJe 06/10/2008)
EXEMPLO 4
PROCESSO CIVIL - ADMINISTRATIVO - TAXA DE OCUPAÇÃO DE TERRENOS DE MARINHA - DIREITO
PATRIMONIAL - PRAZO PRESCRICIONAL - ART. 177, CC/16 - LEIS 9.636/98, 9.821/99, MP 152 E 10.852/04
- DECRETO-LEI 20.910/32 - ANALOGIA - EXISTÊNCIA DE NORMAS DE DIREITO PÚBLICO - PRINCÍPIO DA
SIMETRIA - APLICAÇÃO.
1. Os terrenos de marinha são bens públicos que diferem da propriedade comum por se destinarem
historicamente à defesa territorial e atualmente à proteção do meio ambiente costeiro, cuja ocupação
mediante o pagamento de taxas e laudêmio decorre de uma relação de Direito administrativo entre a
União e o particular.
2. Fixada a natureza do regime jurídico da taxa de ocupação, aplicam-se-lhe os prazos decadencial e
prescricional previstos nas normas de Direito Público, já que no processo integrativo o intérprete deve
buscar, prioritariamente, no próprio Sistema de Direito Público as normas aplicáveis por analogia.
3. Existência de norma jurídica de Direito Público idônea a suprir a lacuna normativa: art. 1º do Decretolei n. 20.910/32 para o prazo de cobrança executiva. Princípio da simetria. Inaplicabilidade do art. 177
do CC/16, nos termos do art. 2038, § 2º, do CC/02.
4. Aplicação do prazo quinquenal de prescrição até o advento da Lei n. 9.363/98 (REsp 1044320/PE, Rel.
Ministra ELIANA CALMON, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24/06/2009, DJe 17/08/2009)
branco e os nulos, distribuídos por um terço, ou mais, dos Estados, com um mínimo de um décimo por
cento do eleitorado que haja votado em cada um deles”.
9
Introdução do Direito – o problema das lacunas e a integração
Professor Juliano
EXEMPLO 5 – A INAPLICABILIDADE DA ANALOGIA
ADMINISTRATIVO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – ASSOCIAÇÃO DAS PIONEIRAS SOCIAIS - SELEÇÃO DE
SERVIDORES – RESERVA DE VAGAS A DEFICIENTES FÍSICOS – NECESSIDADE DE EXPRESSA DISPOSIÇÃO
NOS EDITAIS PARA SELEÇÃO DE PESSOAL – APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE.
1. A partir do art. 7º, XXXI, da CF/88, o legislador estabeleceu a Política Nacional para Integração da
Pessoa Portadora de Deficiência, que envolve os setores público e privado (Lei 7.853/89, Lei 8.213/91 e
Decreto 3.298/99).
2. A Associação das Pioneiras Sociais - APS, administradora da Rede Sarah de Hospitais do Aparelho
Locomotor, é pessoa jurídica de direito privado, sem fins lucrativos e de interesse social, autorizada pela
Lei 8.246/91 e instituída pelo Decreto 371/91 (Serviço Social Autônomo).
3. A Lei 8.246/91 e o Decreto 371/91 previu que a contratação de pessoal pela APS ocorresse através de
seleção pública com etapas eliminatória, classificatória e de treinamento, observadas as peculiaridades
de cada categoria profissional. O fato de o legislador não ter feito menção, nessas leis, quanto à cota de
deficientes físicos, não significa que houve lacuna na lei, à vista da existência de lei especial tratando da
matéria.
4. Inaplicabilidade do princípio da analogia (art. 4º da LINDB), pela supremacia do princípio da
especialidade (art. 2º, § 2º, da LINDB) (REsp 871.787/DF, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA
TURMA, julgado em 28/10/2008, DJe 27/11/2008)
PRINCÍPIOS GERAIS DE DIREITO
Reminiscência do direito natural – “os princípios gerais de direito são, em última instância,
uma regra de convivência” (VENOSA, 2010, p. 137)

O intérprete busca o pensamento mais elevado da cultura jurídica

Ele busca a orientação geral do pensamento jurídico

Definições: princípios que servem de fundamento e informam o direito positivo de cada
povo

Normas jurídicas universais ditadas pela razão

“Por ser um instrumento tão amplo e com tamanha profundidade, sua utilização é árdua
para o julgador, pois requer vivência e traquejo com conceitos abstratos e concretos do
Direito, além de elevado nível cultural” (VENOSA, 2010, p. 138)

constituem uma espécie de paredes-mestras ou pilares fundamentais do ordenamento
jurídico positivo

retirados de sucessivas abstrações da ciência jurídica

CF: dignidade humana, função social da propriedade, igualdade perante a lei, nullum
crimem nulla poena sine lege

CC/2002: interesse social do contrato, boa-fé objetiva

Ideias fundamentais e informadoras da organização jurídica do Estado

Não são elementos do repertório do sistema, mas fazem parte das suas regras estruturais

Dizem respeito à relação entre as normas do sistema e confere coesão ao sistema

É premissa do raciocínio

Mencionada de forma indefinida

“...os princípios gerais, em sua forma indefinida, compõem a estrutura do sistema, não seu
repertório. São regras de coesão que constituem as relações entre as normas como um todo”
(FERRAZ JUNIOR, 2008, p. 213)

o aplicador encontra os princípios por meio da interpretação das normas escritas

eles revelam que o ordenamento se fundamenta em orientações gerais: correspondem à
ideologia política, às opções e valores dos legisladores

10
Introdução do Direito – o problema das lacunas e a integração
Professor Juliano
A EVOLUÇÃO DO DIREITO PARA PAULO BONAVIDES
Passagem dos princípios da especulação metafísica e abstrata para o campo concreto e positivo do
direito
Transição crucial da ordem jusprivatista (sua antiga inserção nos Códigos) para a órbita juspublicista
(seu ingresso nas Constituições)
Suspensão da distinção entre princípios e normas
Deslocamento dos princípios da esfera da jusfilosofia para o domínio da Ciência Jurídica
Proclamação de sua normatividade
Perda de seu caráter programático
Reconhecimento definitivo de sua positividade e concretude por obra sobretudo das Constituições
Total hegemonia e proeminência dos princípios
em diversas vezes, portanto, os princípios são enunciados expressamente na fonte escrita
art. 1º a 4º da CF

art. 3º e 21 do CP

em caso de omissão, esses princípios norteiam o aplicador e permite solucionar a questão
de acordo com os valores e o “espírito” do ordenamento jurídico

as linhas mestras do ordenamento jurídico

Se o intérprete não consegue preencher a lacuna com a analogia (não há casos
semelhantes normatizados), ele lança mão dos Princípios Gerais do Direito para a colmatação

É o penúltimo reduto para retirar a resposta para o problema da lacuna

Problemas

Valores e objetivos contraditórios

Liberdade empresarial e redução das desigualdades sociais

Ordem pública e liberdade do indivíduo

Nem sempre é possível encontrar um único princípio que regulamente determinada
questão para aplicá-lo sem causar controvérsias

São vagos e imprecisos: permitem diversas interpretações

Não garantem a aplicação do direito de acordo com as exigências de segurança jurídica

FUNDAMENTAÇÃO: Reabilitação da argumentação jurídica

Duas características básicas: abstração e generalidade

Art. 6º, direito à moradia

Colisão de dois ou mais princípios – art. 170 CF

A ADPF – preceito fundamental

O descumprimento de princípios do ordenamento jurídico abre a possibilidade de uma
ação específica

Aproximam-se as normas jurídicas e os valores MORAIS, ÉTICOS, POLÍTICOS HUMANOS
que permeiam a sociedade

DIREITO NATURAL: “O jusnaturalismo reconhece a existência de um sistema de normas de
conduta diverso daquele ditado pelo Estado. Estas normas compõem um direito natural,
metafísico, extra-histórico, eterno imutável, que encontra em si mesmo seu fundamento de
validade, posto que anterior e superior ao Direito Positivo. Posiciona-se lógica e eticamente
acima do direito posto pelo legislador, impondo-lhe limites que, caso ultrapassado pelas leis
dos homens, gravam-na de ilegitimidade”4.


“Do artigo 3º nos vem luz suficiente ao agasalho de uma ação afirmativa, a percepção de que a
única maneira de corrigir desigualdades é colocar o peso da lei, com a imperatividade que ela deve ter
em um mercado desequilibrado, a favor daquele que é discriminado, tratado de modo desigual. Nesse
preceito, são considerados como objetivos fundamentais de nossa República: primeiro, construir –
SANTIAGO, Marcus Firmino. “Dos códigos para as constituições: breve discussão sobre os princípios
gerais do direito e a nova hermenêutica jurídica”. Revista de Direito Constitucional e internacional. Ano
16. nº 16. jul.-set. 2008, pp.226/227.
4
11
Introdução do Direito – o problema das lacunas e a integração
Professor Juliano
prestem atenção a esse verbo – uma sociedade livre, justa e solidária; segundo, garantir o
desenvolvimento nacional – novamente temos aqui o verbo a conduzir não a atitude simplesmente
estática, mas a posição ativa; erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais
e regionais; e, por último, no que interessa, promover o bem de todos, sem preconceitos de origem,
raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
Pode-se dizer, sem receio de equívoco, que se passou de uma igualização estática, meramente
negativa, no que se proibia a discriminação, para uma igualização eficaz, dinâmica, já que os verbos
‘construir’, ‘garantir’, ‘erradicar’ e ‘promover’ implicam mudança de óptica, ao denotar ‘ação’. Não
basta não discriminar. É preciso viabilizar – e a Carta da República oferece base para fazê-lo – as
mesmas oportunidades. Há de ter-se como página virada o sistema simplesmente principiológico. A
postura deve ser, acima de tudo, afirmativa. Que fim almejam esses dois artigos da Carta Federal,
senão a transformação social, com o objetivo de erradicar a pobreza, uma das maneiras de
discriminação, visando, acima de tudo, ao bem de todos, e não apenas daqueles nascidos em berços de
ouro?” - voto do ministro Marco Aurélio no julgamento da ADPF nº 186, em que o STF considerou
constitucional a adoção de política de cotas na Universidade de Brasília (UnB).
EQUIDADE
Última forma de preenchimento da lacuna
“...sentimento do justo concreto, em harmonia com as circunstancias e adequado ao caso
(...) é o recurso a uma espécie de intuição no concreto, das exigências da justiça enquanto
igualdade proporcional” (FERRAZ JUNIOR, 2012, p. 281)

“Equidade é a forma de manifestação de justiça que tem o condão de atenuar, amenizar,
dignificar a regra jurídica” (VENOSA, 2010, P. 140)

É a justiça ao caso concreto – ARISTÓTELES

A regra jurídica, na sua natureza generalista, pode não atender a ideais de justiça em casos
concretos

Justiça aplicável ao caso concreto

Trabalho de abrandamento da norma ao caso concreto

CPC 127: impede que o juiz se transforme em legislador

CC/2002: 415, 479, 738, 928, parágrafo único, 944, 953, parágrafo único

Modo de avaliação do ato interpretado mais amplo

Exige-se uma aplicação justa para o caso concreto

“Equidade é, assim, uma colmatação justa da falha do ordenamento jurídico” (RIZZATO,
2009, p. 299)

exemplos do uso da equidade. Pode-se (FERRAZ JUNIOR, 2012, p. 281):


A) expandir uma obrigação, criando-se deveres adicionais não previstos expressamente em
um contrato ou da Lei
B) limitar o exercício de direitos para prevenir abusos
C) criar regras para situações novas e não previstas na lei antiga
de qualquer modo, a equidade está limitada ao particular – não possui preocupação
generalizante: “Não gera, assim, uma compulsão para que outros casos, semelhantes, sejam
interpretados e decididos do mesmo modo (FERRAZ JUNIOR, 2012, p. 281)

a equidade deve “...ser entendida mais como um método de interpretação e integração do
que como método criativo do direito (VENOSA, 2010, p. 142)

12
Introdução do Direito – o problema das lacunas e a integração
Professor Juliano
Conclui-se com Bigotte Chorão (2000: 105) que a temperança e o cometimento
integram o raciocínio da equidade:
“a equidade não é indício de uma sintomatologia patológica, mas, ao contrário,
manifestação fisiológica de saúde jurídica, precisamente, um complemento exigido pela
universalidade da lei e um meio necessário para ajustar a ordenação jurídica, na medida do
possível, às circunstâncias mutáveis da vida social. A melhor doutrina procura conjugar
equilibradamente as exigências da norma (justo legal) e do caso (justo concreto) e
encontrar, enfim a justa via médica entre o normativismo abstrato e o decisionismo
casuístico”.
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Introdução do Direito – o problema das lacunas e a integração
Professor Juliano
ANEXOS
A QUESTÃO DO DIREITO ALTERNATIVO
Decisão proferida pelo juiz Rafael Gonçalves de Paula nos autos nº 124/03 - 3ª Vara Criminal da
Comarca de Palmas/TO:
DECISÃO
Trata-se de auto de prisão em flagrante de Saul Rodrigues Rocha e Hagamenon
Rodrigues Rocha, que foram detidos em virtude do suposto furto de duas (2) melancias. Instado a se
manifestar, o Sr. Promotor de Justiça opinou pela manutenção dos indiciados na prisão.
Para conceder a liberdade aos indiciados, eu poderia invocar inúmeros
fundamentos: os ensinamentos de Jesus Cristo, Buda e Ghandi, o Direito Natural, o princípio da
insignificância ou bagatela, o princípio da intervenção mínima, os princípios do chamado Direito
alternativo, o furto famélico, a injustiça da prisão de um lavrador e de um auxiliar de serviços gerais em
contraposição à liberdade dos engravatados que sonegam milhões dos cofres públicos, o risco de se
colocar os indiciados na Universidade do Crime (o sistema penitenciário nacional),...
Poderia sustentar que duas melancias não enriquecem nem empobrecem ninguém.
Poderia aproveitar para fazer um discurso contra a situação econômica brasileira,
que mantém 95% da população sobrevivendo com o mínimo necessário.
Poderia brandir minha ira contra os neo-liberais, o consenso de Washington, a
cartilha demagógica da esquerda, a utopia do socialismo, a colonização europeia,....
Poderia dizer que George Bush joga bilhões de dólares em bombas na cabeça dos
iraquianos, enquanto bilhões de seres humanos passam fome pela Terra – e aí, cadê a Justiça nesse
mundo?
Poderia mesmo admitir minha mediocridade por não saber argumentar diante de
tamanha obviedade.
Tantas são as possibilidades que ousarei agir em total desprezo às normas técnicas:
não vou apontar nenhum desses fundamentos como razão de decidir.
Simplesmente mandarei soltar os indiciados.
Quem quiser que escolha o motivo.
Expeçam-se os alvarás. Intimem-se
Palmas – TO, 05 de setembro de 2003.
Rafael Gonçalves de Paula
Juiz de Direito
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