FOCO: ORIGEM, CONCEITOS FUNDAMENTAIS, PROBLEMAS E TEMAS RELEVANTES DA ECONOMIA – PARTE II Economia [email protected] Fauzi T Jorge “Ninguém viu dois cães procederem a uma troca equitativa e deliberada de ossos. Nunca se viu um animal tentando dizer a outro, através de seus gestos e gritos naturais, que certa coisa é ou não sua ou que pretende trocar uma coisa por outra”, Adam Smith em “A riqueza das nações” Smith escrevia acerca de “uma certa propensão da natureza humana [...]; a propensão para negociar, barganhar e trocar uma coisa por outra”. A troca – a compra e venda – está no âmago de uma sociedade de mercado como a descrita por ele. Economia [email protected] Fauzi T Jorge O comércio existiu como importante acessório da sociedade desde épocas remotas, mas o impulso fundamental no sentido da produção, ou a alocação básica de recursos entre diferentes usos, ou a distribuição de bens entre classes sociais, estava largamente divorciado do processo de comercialização. Ou seja, os mercados da Antiguidade não eram o meio pelo qual essas sociedades resolviam seus problemas econômicos básicos. Entre a aparência ilusoriamente contemporânea de muitos mercados, o passado distante e a realidade da nossa economia de mercado contemporânea, há uma distância imensa que a sociedade levaria muitos séculos a percorrer. Economia [email protected] Fauzi T Jorge É preciso entender como as sociedades do passado resolveram, efetivamente, seus problemas econômicos, para que se possa entender com clareza o que está envolvido na evolução da sociedade de mercado que é o nosso próprio ambiente. Um primeiro aspecto: o fundamento sociedades antigas. agrícola das As sociedades econômicas da antiguidade tinham numerosas características em comum, as quais contrastam profundamente com as de modernas economias de mercado. Dentre elas, se destacam: Economia [email protected] Fauzi T Jorge a) Tinham como base uma agricultura camponesa; b) Suas cidades eram – do ponto de vista econômico – centros parasitários de consumo, não centros ativos de produção; c) A escravatura era uma forma comum e muito importante de trabalho; d) Produziam excedentes muito consideráveis. Economia [email protected] Fauzi T Jorge Em consequência, nas sociedades econômicas da antiguidade, verificamos que o aspecto econômico da vida está subordinado ao aspecto político. O sacerdote, o guerreiro e o estadista eram superiores ao mercador ou negociante; a riqueza acompanhava o poder, não – como nas sociedades de mercado que virão depois – o inverso. Economia [email protected] Fauzi T Jorge A vida econômica medieval emergiu da desorganização catastrófica que se seguiu ao declínio da lei e da ordem romanas. Caracterizou-se por uma forma única de organização chamada sistema senhorial, na qual: Os senhores locais eram os centros do poder político, militar, econômico e social. Economia A maioria dos camponeses estava vinculada, como servos, a determinado senhor, para quem era obrigada a trabalhar e a quem devia mãode-obra e impostos ou tributos [email protected] A segurança física em relação a bandoleiros ou outros senhores era fornecida pelo senhor a que o servo estava vinculado, assim como certa segurança econômica em épocas de crise. Fauzi T Jorge O sistema senhorial, sobretudo em seus primeiros tempos (séculos IV a X), era um sistema econômico estático, no qual os pagamentos monetários desempenhavam papel apenas secundário. A auto-suficiência era o principal objetivo e a mais notável característica do senhorio. Lado a lado com o senhorio, havia a vida econômica das cidades. Lá, as trocas monetárias sempre desempenharam papel mais importante, assim como a organização de uma vida econômica mais ativa na instituição de feiras. Economia [email protected] Fauzi T Jorge A corporação era a principal forma de organização da produção nas vilas e cidades. As corporações eram muito diferentes das empresas dos tempos modernos, na medida em que desencorajavam a concorrência e a busca do lucro, e procuravam impor regras gerais aos métodos de produção, salários, práticas de comercialização etc. Durante toda a época medieval, a Igreja – a principal organização social do período – suspeitou da atividade de compra e venda. Em parte, isso refletia a aversão pelas práticas de exploração da época e, em parte, era consequência de um antigo desprezo pelo ganho de dinheiro e, especialmente, pelo empréstimo de dinheiro (usura). Os líderes religiosos da época preocupavam-se a respeito dos preços “justos” e não admitiam que a compra e a venda nãoregulamentadas dessem origem a preços justos. Economia [email protected] Fauzi T Jorge Três mudanças profundas e generalizadas seriam necessárias para converter a sociedade medieval numa sociedade de mercado: Uma nova atitude em relação ao ganho de dinheiro como atividade legítima teria de substituir a suspeita medieval em relação à busca de lucro Economia A teia de monetarização teria de se expandir para além de seus estreitos confins – ou seja, a compra e a venda teriam de controlar a produção de todas as mercadorias e o desempenho de quase todas as tarefas. [email protected] O fluxo de “demanda” e “oferta” teria de assumir a direção da atividade econômica, retirando-a das prescrições dos senhores feudais e dos usos e costumes. Fauzi T Jorge Questões para reflexão 1. A Bíblia tem numerosas referências hostis ao ganho de dinheiro – “é mais fácil um camelo passar pelo fundo de uma agulha do que rico entrar no reino de Deus”. Como se explica essa antiga antipatia da Igreja pela riqueza? A religião ainda desconfia hoje do ganho de dinheiro? Por quê? 2. A ideia de um preço “justo” (ou de um salário “justo”) ainda prevalece em nossa própria sociedade? Que se entende usualmente por esses termos? Você considera essas ideias incompatíveis com um sistema de mercado? 3. O sistema feudal persistiu por cerca de mil anos. Por que acha que a mudança demorou tanto a chegar? Economia [email protected] Fauzi T Jorge