AJURIS ESCOLA SUPERIOR DA MAGISTRATURA CURSO DE PREPARAÇÃO À MAGISTRATURA JOSÉ EDUARDO AIDIKAITIS PREVIDELLI Dano moral indenizável decorrente de efetiva lesão do direito fundamental da personalidade Porto Alegre 2006 JOSÉ EDUARDO AIDIKAITIS PREVIDELLI Dano moral indenizável decorrente de efetiva lesão do direito fundamental da personalidade Monografia realizada em atendimento a requisito para obtenção do grau em cumprimento ao 3º nível do curso de Preparação à Magistratura, sob a orientação do Dr. Gilberto Schäfer Porto Alegre 2006 “Conheci um químico que, quando no seu laboratório destilava venenos, acordava as noites em sobressalto, recordando com pavor que um miligrama daquela substância bastava para matar um homem. Como poderá dormir tranqüilamente o juiz que sabe possuir, num alambique secreto, aquele tóxico subtil que se chama injustiça e do qual uma ligeira fuga pode bastar, não só para tirar a vida mas, o que é mais horrível, para dar a uma vida inteira indelével sabor amargo, que doçura alguma jamais poderá consolar?” (Piero Calamandrei) Ao magistrado, mestre, orientador e amigo Gilberto Schäfer, pelo apoio e incentivo durante todo o estudo na Ajuris, em especial durante a elaboração do presente e, principalmente, pelas grandes lições: de jurisdição e de vida. Agradeço ao mestres, colegas e amigos pelas lições, acompanhamento, incentivos e apoio durante todo o curso realizado, inclusive durante a elaboração da presente. E a todos os operadores do Direito que me serviram de modelo ao não se furtar de mergulhar na vida e no direito, a fim de solver os conflitos. RESUMO A presente monografia aborda o dano moral indenizável como o decorrente da efetiva lesão ao direito fundamental da personalidade, nas suas vertentes: intimidade, vida privada, honra e imagem. A análise se efetuará em dois momentos. O primeiro capítulo contará com duas partes: na primeira serão entabuladas considerações acerca do “dano” e suas forma de reparação; logo após será adentrado no dano moral propriamente dito, sob o enfoque da reparação civil. No capítulo subseqüente, igualmente bipartido, abordar-se-á, primeiramente, o direito fundamental da personalidade, com a conceituação, características, bem como a classificação e outros panoramas acerca dos direitos fundamentais insculpidos na Constituição Federal de 1988, precipuamente o da personalidade; e, por derradeiro, serão abordados os elementos da personalidade dispostos no inciso X do artigo 5º da Constituição Federal e espécies casuísticas de dano moral decorrente da sua lesão, principalmente com base na análise jurisprudencial. O estudo tem por escopo a análise da reparação decorrente de dano moral, à luz da disciplina do direito das obrigações em conjunto com o direito constitucional, discorrendo acerca do dano genericamente e das especificações dano de natureza moral, em especial e principalmente o direito fundamental da personalidade, através de estudo bibliográfico e jurisprudencial do tema. ABSTRACT Questa monografia aborda il danno morale indennizzabile come quello decorrente dall’effettiva lesione al diritto fondamentale della personalità, nelle sue vertenti: intimità, vita privata, onore e immagine. L’analisi si effettuerà in due momenti. Il primo capitolo avrà due parti: nella prima parte saranno intavolate le considerazioni sul “danno” e le sue forme di riparazione; poi si parlerà nel danno propriamente detto, sotto l’ottica della riparazione civile. Nel prossimo capitolo, anche questo bipartito, verrà abordato prima il diritto fondamentale della personalità con il concetto, le caratteristiche, così come la classifica e altri panorami dei diritti fondamentali incisi nella Costituzione Federale del 1988, precipuamente quello della personalità; e, per l’ultimo, verranno abordati gli elementi della personalità disposti nella Costituzione Federale, art. 5º, x e le specie casistiche del danno decorrente dalla sua lesione, principalmente con base nell’analisi giurisprudenziale. Lo studio ha come scopo l’analisi della riparazione decorrente dal danno morale, alla luce della disciplina del diritto privato (delle obbligazioni) insieme al diritto costituzionale, discorrendo sul danno genericamente e sulle specificazioni del danno di natura morale, in particolare e principalmente il diritto fondamentale della personalità, attraverso lo studio bibliográfico e giurisprudenziale del tema. SUMÁRIO INTRODUÇÃO.................................................................................................................. 11 1. REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS........................................................................ 14 1.1 Noções gerais da Reparação de Danos......................................................................... 14 1.1.1 Conceito de Dano.......................................................................................................14 1.1.2 Espécies de Reparação...............................................................................................15 1.1.2.1 Reparação por Danos Patrimoniais ou Materiais....................................................16 1.1.2.2 Reparação por Danos Morais..................................................................................17 1.1.3 Cumulação de danos morais e materiais....................................................................17 1.2 Dano Moral Indenizável............................................................................................... 19 1.2.1 Conceito de Dano Moral............................................................................................19 1.2.2 Fundamentos Positivos.............................................................................................. 21 1.2.2.1 Constituição Federal............................................................................................... 21 1.2.2.2 Código Civil Brasileiro........................................................................................... 27 1.2.2.2.1 Código Civil de 1916........................................................................................... 27 1.2.2.2.2. Código Civil de 2002.......................................................................................... 30 1.2.3. Prova do Dano Moral................................................................................................32 1.2.4. Requisitos Gerais e Específicos................................................................................ 36 1.2.4.1. Conduta do Agente................................................................................................ 37 1.2.4.2. Nexo de Causalidade..............................................................................................41 1.2.4.3. Lesão à direito de personalidade............................................................................44 2. DIREITO FUNDAMENTAL DA PERSONALIDADE E DANO MORAL.................46 2.1 Dos Direitos Fundamentais...........................................................................................46 2.1.1 Conceito de Direito Fundamental.............................................................................. 46 2.1.2 Características dos Direitos Fundamentais................................................................ 49 2.1.2.1 Historicidade........................................................................................................... 49 2.1.2.2 Universalidade........................................................................................................ 50 2.1.2.3 Limitabilidade......................................................................................................... 51 2.1.2.4 Concorrência........................................................................................................... 52 2.1.2.5 Irrenunciabilidade................................................................................................... 52 2.1.2.6 Inalienabilidade.......................................................................................................53 2.1.2.7 Imprescritibilidade.................................................................................................. 53 2.1.3 Classificação dos Direitos Fundamentais.................................................................. 53 2.1.4 Gerações ou Dimensões de Direitos Fundamentais...................................................54 2.1.5 Direito de Personalidade............................................................................................ 60 2.1.5.1 Conceito e conteúdo................................................................................................60 2.1.5.2 Natureza Jurídica.................................................................................................... 64 2.1.6 As restrições a direitos fundamentais........................................................................ 66 2.2 Elemento da Personalidade e Dano Moral....................................................................68 2.2.1 Intimidade.................................................................................................................. 68 2.2.1.1 Dano moral decorrente da exposição da intimidade............................................... 70 2.2.2 Vida Privada...............................................................................................................71 2.2.2.1 Dano moral decorrente da violação da vida privada...............................................72 2.2.3 Honra..........................................................................................................................74 2.2.3.1 Inscrição indevida nos cadastros de Restrição de Crédito...................................... 78 2.2.4. Imagem..................................................................................................................... 81 2.2.4.1 Dano moral decorrente do uso indevido da imagem.............................................. 82 CONCLUSÃO.................................................................................................................... 86 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................................... 89 INTRODUÇÃO A formulação do tema a ser desenvolvido na presente monografia jurídica, intitulada “Dano moral indenizável decorrente de efetiva lesão do direito fundamental da personalidade”, mais do que cumprir a uma exigência curricular, atenderá uma preferência pessoal, tendo em vista os trabalhos já desenvolvidos na área civil e processual civil. A presente monografia, ainda, terá por objetivo a construção de material científico para complementar os processos de aprendizagem realizados no âmbito acadêmico, bem como servir de base na prática forense. Como se sabe a vida em sociedade não raro provoca o entrechoque de direitos e de condutas, dos mais variados, com a possibilidade de interferência de um sujeito na esfera jurídica de outros, inclusive com a possibilidade de lesão a direitos deste. A solução para esse possível conflito, começou a viabilizar-se a medida que o lesado passou a buscar, através tutela jurisdicional, a reparação de seu direito ofendido. Bem assim, ainda há a possibilidade de reparação ao dano íntimo, causado pela lesão ao direito fundamental da personalidade. Todavia, no curso da prática forense dos tempos atuais, nota-se a busca da reparação por “danos morais”, de forma subsidiária a mais ampla variedade de ações, e até mesmo de situações do convívio humano. Com a preocupação de não possibilitar o enriquecimento sem justa causa, o instituto jurídico do dano moral deve ser profundamente analisado em conjunto com o direito constitucional, utilizando este como forma efetiva de indenização e mecanismo de supressão de condutas danosas. Assim pensando, chega-se às seguintes formulações: 1) O que é o dano moral no direito pátrio e quais seus fundamentos? 2) Em que momento as situações decorrentes da vida em sociedade passam a gerar o dever de indenizar por ofensa ao direito da personalidade? Na tentativa de encontrar respostas a essas formulações, desenvolver-se-á a presente monografia, aprofundando o estudo do Dano Moral, através de uma retrospectiva histórica e conceitual, por meio de uma explanação teórico-prática a respeito do assunto, sem, contudo, pretender esgotar a matéria. Aliás, tal explanação terá como fontes a pesquisa caracterizada como sendo do tipo descritivo e, fundamentam-se na investigação e interpretação de dados coletados, através de pesquisa bibliográfica - da legislação constitucional, civil e processual civil vigente, assim como de bibliografia nacional relacionada ao tema; em documentos eletrônicos, compreendendo artigos, paper’s e demais publicações, bem como a jurisprudência dos Tribunais de Justiça e Súmulas dos Tribunais Superiores; Nos limites desse tema, a presente monografia jurídica dividir-se-á em dois capítulos, com duas fases cada; no primeiro capítulo, serão trazidas à discussão as considerações iniciais acerca do “dano” e suas forma de reparação, individual ou cumulativamente. Na segunda parte deste capítulo, com a finalidade de adentrar no dano moral propriamente dito, será colacionada a exposição do conceito e fundamentos legais da reparação por lesão ao direito da personalidade, bem como seus requisitos, e a prova judicial necessária. Com relação ao direito fundamental da personalidade, tratará a primeira etapa do segundo capítulo de sua conceituação e características, bem como da classificação e outros elementos acerca dos direitos fundamentais presentes na Constituição Federal de 1988. Por derradeiro, a parte final do segundo capítulo, e não menos importante, tratará dos elementos da personalidade dispostos no inciso X do artigo 5º da Constituição Federal e espécies casuísticas de dano moral decorrente da sua lesão, principalmente com base na análise jurisprudencial. REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS 1.1 Noções gerais da Reparação de Danos 1.1.1 Conceito de Dano Segundo José de Aguiar Dias, a partir da definição de Hans Albrecht Fischer1, dano é o “prejuízo que alguém sofre, na sua alma, no seu corpo ou seus bens”, observando que na esfera jurídica do mesmo é delimitado “por sua condição de pena ou de dever de indenizar” por violação de direitos. Para Fabrício Matiello2, dano é “qualquer ato ou fato humano produtor de lesões a interesses alheios juridicamente protegidos”. Por sua vez Jorge Mossete Iturraspe3 define dano como: [...] É a diminuição de patrimônio ou detrimento a afeições legítimas. Todo ato que diminua ou cause menoscabo aos bens materiais ou imateriais, pode ser considerado dano. O dano é um mal, um desvalor ou contravalor, algo 1 FISCHER, Hans Albrecht. Reparação dos danos no direito civil, apud DIAS, José Aguiar. Obra citada, DIAS, José Aguiar. Da Responsabilidade Civil. 11ª ed. rev., atual. de acordo com o Código Civil de 2002, e aumentada por Rui Berford Dias. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 971. 2 MATIELLO, Fabrício Zamprogna. Dano Moral, dano material e reparação – 6ª ed. rev. e atual. Porto Alegre: Dora Luzzatto, 2006, p. 13. 3 ITURRASPE, Jorge Mosset, Responsabilidade Civil, apud SANTOS, Antonio Jeová. Dano Moral Indenizável – 4ª ed. rev., amp. e atual. de acordo com o novo código civil. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 74. que se padece com dor, posto que nos diminui e reduz; tira de nós algo que era nosso, do qual gozávamos ou nos aproveitávamos, que era nossa integralidade psíquica ou física, as possibilidades de acréscimo ou novas incorporações [...]” O conceito jurídico do dano encontra substrato no texto dos artigos 1864, 1875 e 1886 do vigente Código Civil (Lei 10.406 de 10/01/2002). Esses dispositivos traçam o contorno do instituto, mediante exposição do que é e do que não é um evento danoso. Da sua leitura pode-se concluir que o dano é o prejuízo causado a alguém por uma ação consciente, voluntária, ou omissão de um agente em violação de um direito, que pode constar de lei, de contrato ou de decisão judicial. Observa-se que de tal análise, ainda, transparecem todos os elementos da responsabilidade civil: ato do agente praticado em violação do direito; prejuízo para outrem; nexo de causalidade entre um e outro elemento. 1.1.2 Espécies de Reparação: A interesse do presente estudo, considera-se o dano como a interferência de um sujeito na esfera jurídica de outrem, provocando-lhe lesão das mais diversas ordens. Nesse sentido, desde logo se depreende que os danos e, por conseqüência suas reparações, podem ser classificados sob duas vertentes ou espécies de acordo com o bem jurídico lesado: os de origem material ou patrimonial e os morais. 4 Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. 5 Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. 6 Art. 188. Não constituem atos ilícitos: I - os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido; II - a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover perigo iminente. Parágrafo único. No caso do inciso II, o ato será legítimo somente quando as circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os limites do indispensável para a remoção do perigo. 1.1.2.1 Reparação por Danos Patrimoniais ou Materiais Segundo afirma Fabrício Matiello7, os danos de ordem puramente patrimoniais: Consubstanciam-se em fatos humanos que produzem lesões em interesses alheios juridicamente protegidos, com caráter exclusivamente material. Noutras palavras, a conduta afronta tão-somente direitos patrimoniais/materiais, sem alcançar interesses psíquicos, ou morais, do lesado Efetivamente, não há como deixar de analisar o dano patrimonial senão em relação de exclusão com o dano moral, e vice-versa, considerando que em ambos há a lesão ao bem jurídico de outro sujeito; em tais casos o conteúdo basilar da separação da conceituação o patrimônio lesado: os bens materiais ou o direito fundamental da personalidade. Em tal sentido, não será demais recordar a lição de Alfredo Minozzi 8, segundo a qual “la distinzione del danno in patromoniale ed non patrimoniale non si referisce al danno nella sua origine, ma al danno nei soui effetti.” 1.1.2.2 Reparação por Danos Morais 7 8 MATIELLO, Fabrício Zamprogna. Obra citada, p. 15. MINOZZI, Alfredo. apud CAHALI, Yussef Said. Dano Moral – 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998. p 19. A exemplo do que está sendo feito, cumpre aqui apontar breve conceito através de observância a contrário senso do dano material, ou seja, é o ato que lesa a carga subjetiva íntima da pessoa, consistente de seu direito de personalidade consagrado na Carta Maior. Acerca de tal dano, Matiello9 conceitua tal lesão como “fatos humanos que conduzem a lesões em interesses alheios, juridicamente protegidos, mas que atingem apenas a reserva psíquica do ofendido”. 1.1.3 Cumulação de danos morais e materiais Como observado por Humberto Theodoro Júnior10, ainda que já presente o reconhecimento da possibilidade de reparação de danos decorrentes à ofensa ao direito da personalidade – danos morais – antes do advento da Constituição Federal de 1988, os Tribunais mantinham entendimento predominante da impossibilidade de cumulação de indenização a tal título com indenização por danos materiais. Tal posicionamento possuía como alicerce o entendimento de que uma vez indenizada o lesado, quer a título de danos materiais, quer a título de danos morais, haveria já o “ressarcimento de todos os efeitos patrimoniais nocivos do ato ilícito já estaria, a vítima, suficientemente reparada”. Nesta senda, antigo acórdão do STF, ao interpretar o art. 1537 do Código Civil de 1916, chegou à conclusão de não ser indenizável o valor afetivo exclusivo: Nem sempre dano moral é ressarcível, não somente por se não poder darlhe valor econômico, por se não poder apreciá-lo em dinheiro, como ainda porque essa insuficiência dos nossos recursos abre a porta a especulações desonestas pelo manto nobilíssimo de sentimentos afetivos; no entanto, no caso de ferimentos que provoquem aleijões, no caso de valor afetivo coexistir com o moral, no caso de ofensa à honra, à dignidade e à liberdade, se indeniza o valor moral pela forma estabelecida pelo Código Civil. No 9 MATIELLO, Fabrício Zamprogna. Obra citada, p. 16. 10 THEODORO JR, Humberto. Dano Moral, São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2001. caso de morte de filho menor não se indeniza o dano moral se ele não contribuía em nada para o sustento da casa.11 Em contraponto, operou-se evolução no entendimento doutrinário e jurisprudencial acerca do tema, de maneira que se encontra defendida pela doutrina e jurisprudência dos Tribunais Superiores12 a reparação integral dos danos havidos, sendo reparado o dano material e, cumulativamente, indenizada a lesão ao direito personalíssimo atingido. Aliás, vale transcrever o entendimento colacionado por Humberto Theodoro Júnior13, emanado da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça: Se há um dano material e outro moral; que podem existir autonomamente, se ambos dão margem a indenização, não se percebe porque isso não deva ocorrer quando os dois se tenham como presentes, ainda que oriundos do mesmo fato. De determinado ato ilícito decorrendo lesão material, esta haverá de ser indenizada. Se apenas de natureza moral, igualmente devido o ressarcimento. Quando reunidas, a reparação há de referir-se a ambas. Não há porque cingir-se a uma delas, deixando a outra sem indenização” (Resp 6.852-RS e Resp 4.235, Rel. Mini, Eduardo Ribeiro, in Lex-JSTJ, 29/190). Cumpre salientar que tais entendimentos culminaram com a edição da Súmula nº 37 em 12/03/1992, consagrando que “são cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundas do mesmo fato”, sedimentando assim o posicionamento das Cortes pátrias. 1.2 Dano Moral Indenizável 11 Supremo Tribunal Federal. 2a Turma. Ementa: Dano moral. Valor afetivo exclusivo. Indenização. Inadmissibilidade. Inteligência do art. 1.537 do Código Civil. RE 12.039. Relator: Lafayette de Andrada. Data do julgamento: 6.8.1948. RT 244/629 12 DANOS MATERIAIS E MORAIS - CUMULAÇÃO - POSSIBILIDADE - SÚMULA Nº 37 DO STJ. A condenação em danos materiais e morais encontra suporte na jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça, já solidificada no enunciado da Súmula nº 37: "São cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundas do mesmo fato." Recurso improvido. (REsp 193944 / RN ; Recurso Especial 1998/0081499-0. Rel. Min. Garcia Vieira – Terceira Turma. DJ 29.03.1999 p. 110). 13 THEODORO JR, Humberto. Obra citada, p. 05 1.2.1 Conceito de Dano Moral Desde a Constituição de 1988 que se passou a fazer distinção entre o dano patrimonial e o extrapatrimonial, ou moral. Todavia não há na legislação um conceito expresso do dano moral. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça14 e dos demais tribunais do país15 tem reconhecido a existência de dano moral nas situações em que o ato ilícito do agente causa à vítima: dor, sofrimento, angústia; ou, violação aos direitos personalíssimos como o da honra, imagem, privacidade própria e das comunicações. Para o Professor Yussef Said Cahali, dano moral: É a privação ou diminuição daqueles bens que têm um valor precípuo na vida do homem e que são a paz, a tranqüilidade de espírito, a liberdade individual, a integridade individual, a integridade física, a honra e os demais sagrados afetos, classificando-se desse modo, em dano que afeta a parte social do patrimônio moral (honra, reputação, etc.) e dano que molesta a parte afetiva do patrimônio moral (dor, tristeza, saudade, etc.), dano moral que provoca direta ou indiretamente dano patrimonial (cicatriz deformante, etc.) e dano moral puro (dor, tristeza, etc.) 16. 14 Processual civil. Ação civil pública. Dano ambiental. Dano moral coletivo. Necessária vinculação do dano moral à noção de dor, de sofrimento psíquico, de caráter individual. Incompatibilidade com a noção de transindividualidade (indeterminabilidade do sujeito passivo e indivisibilidade da ofensa e da reparação). Recurso especial improvido. (REsp 598281 / MG ; Recurso Especial. 2003/0178629-9 Rel. Ministro Teori Albino Zavascki. Primeira Turma, DJ 01.06.2006 p. 147). (grifei). 15 AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL. O dano material deve ser cabalmente comprovado, sendo possível postergar para liquidação apenas o quantum indenizatório, e não assim o reconhecimento da ocorrência do próprio prejuízo. Simples incômodos da vida moderna não traduzem ofensa a direito de personalidade, este sim passível de indenização. No caso de vício de qualidade no produto, inexiste previsão legal no Código de Defesa do Consumidor para restituição de quantia em dobro. Descabe o prequestionamento, posto que o magistrado não é obrigado a responder a toda e qualquer indagação de ordem legal formulada pelo recorrente. Não retroage o Código Civil Brasileiro de 2003 para incidência de juros de mora. Apelação desprovida e provido o recurso adesivo. Decisão unânime. (Apelação Cível Nº 70010626687, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Alberto Schreiner Pestana, Julgado em 30/06/2005) (grifei). 16 CAHALI, Yussef Said. Obra citada, p. 20. No mesmo sentido, em brilhante lição, manifesta-se o grande jurista luso, Professor Inocêncio Galvão Telles: Dano moral se trata de prejuízos que não atingem em si o patrimônio, não o fazendo diminuir nem frustrando o seu acréscimo. O patrimônio não é afectado: nem passa a valer menos nem deixa de valer mais. Há a ofensa de bens de caráter imaterial - desprovidos de conteúdo econômico, insusceptíveis verdadeiramente de avaliação em dinheiro. São bens como a integridade física, a saúde, a correção estética, a liberdade, a reputação. A ofensa objectiva desses bens tem, em regra, um reflexo subjectivo na vítima, traduzido na dor ou sofrimento, de natureza física ou de natureza moral. Violam-se direitos ou interesses materiais, como se se pratica uma lesão corporal ou um atentado à honra: em primeira linha causam-se danos não patrimoniais, v.g., os ferimentos ou a diminuição da reputação, mas em segunda linha podem também causar-se danos patrimoniais, v.g., as despesas de tratamento ou a perda de emprego17. 1.2.2 Fundamentos Positivos 1.2.2.1 Constituição Federal Ao observar o alicerce constitucional do dever de reparar, se faz mister, num primeiro momento, observar a própria estrutura da Carta Política de 1988. 17 TELLES, Inocêncio Galvão. Direito das Obrigações, Coimbra Editora, 6ª edição, p. 375. De início, é preciso verificar a carga normativa do Preâmbulo18 da Constituição e sua integração com o restante do texto. Na lição de Antônio Jeová Santos: […] o preâmbulo da Constituição não pode ser ignorado por que pretende verificar a pessoa em sua integralidade. O estudo do dano moral e, por conseqüência, do dano à pessoa (à Luz da Constituição) não pode prescindir do preâmbulo. É lá que o constituinte resolveu arrolar todo o programa que visa a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos19. Desta forma, conclui-se que o preâmbulo não pode apresentar contradição com o corpo do texto constitucional, eis que transmite os elementos básicos de interpretação e não simples fórmula retórica do legislador. Conquanto não tenha valor de direito positivo propriamente dito, o preâmbulo assume especial importância ao intérprete, porque introduz os elementos causais que vão direcionar o trabalho de interpretação e de integração da letra constitucional. Nesse mesmo sentido leciona Alexandre de Moraes20, sustentando que, “apesar de não fazer parte do texto constitucional propriamente dito e, conseqüentemente, não conter normas constitucionais de valor jurídico autônomo, o preâmbulo não é juridicamente irrelevante, uma vez que deve ser observado como elemento de interpretação e integração dos diversos artigos que lhe seguem”, inclusive apontando como nota de rodapé o julgamento da Adin nº 2.076/AC – Rel. Min. Carlos Velloso (decisão: 15-08-2002. Informativo 227), onde foi afirmada a ausência de força normativa do preâmbulo constitucional. 18 Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. 19 SANTOS, Antônio Jeová. Obra citada, p. 34. 20 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 15ª ed. São Paulo: Atlas, 2004, p. 51. Ainda, tal dispositivo evidencia a completa pretensão do constituinte: o personalismo, em oposição ao exacerbado patrimonialismo. Aqui vale o ser humano como ente único e não intercambiável. Transposto o preâmbulo, portal da Constituição Federal e linha base desta análise, há que ser observado o Princípio Fundamental da Dignidade da Pessoa Humana, insculpido no art. 1º da Carta Maior. Com efeito, é no artigo 1º da Constituição Federal de 1988 que se encontra, no constitucionalismo moderno, a existência de uma norma fundamental de defesa dos direitos fundamentais. Os termos “dignidade” e “pessoa humana” devem ser analisados sob o prisma integrativo, pois, sozinhos, não representam a magnitude expressa pelo legislador constitucional. Alexandre de Moraes21 ensina que a dignidade da pessoa humana é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida, trazendo a concepção ao respeito pelas pessoas constituintes de uma sociedade. Ainda vale observar a preciosa lição do Professor Ingo Wolfgang Sarlet, ao sustentar que “[…] a dignidade da pessoa humana – continua, talvez mais do que nunca, a ocupar um lugar central no pensamento filosófico, político e jurídico, do que dá conta a sua já referida qualificação como valor fundamental da ordem jurídica […]” 22. E prossegue o aludido doutrinador23, que define a dignidade da pessoa humana: Assim sendo, temos por dignidade da pessoa humana que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho 21 Moraes, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. Ed. Atlas – 2003. 2ª Ed. p.128. 22 SARLET, Ingo Wolfgang, Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constituição de 1988, Livraria do Advogado, Porto Alegre, 2006, p. 38 23 SARLET, Ingo Wolfgang, Obra citada, p. 60. degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos. Por tal esteira, prossegue Jeová Santos24 que da dignidade, da autonomia e da inviolabilidade da pessoa extraímos a idéia de que o homem é portador em si mesmo de um valor moral intransferível e inalienável, que lhe foi atribuído pelo puro fato de ser um homem, quaisquer que sejam suas qualidades individuais, ainda que se trate de um criminoso, de um fugitivo ou de um réu. Conclui o respeitável autor que: desta maneira, o homem não pode ser reduzido a coisa, a objeto, como no período escravocrata. Daí, o respeito a todos os direitos da personalidade. Em havendo violação, o dano moral há que ser ressarcível de forma mais completa possível, a fim de impedir que o infrator continue em sua faina violadora de direitos alheios. Embora longa, cabe registrar aqui a fundamentação apresentada pelo Min. Luiz Fux, relator do Recurso Especial nº 612108/PR25, ao analisar, inicialmente, o Princípio Fundamental da Dignidade da Pessoa Humana: À luz das cláusulas pétreas constitucionais, é juridicamente sustentável assentar que a proteção da dignidade da pessoa humana perdura enquanto subsiste a República Federativa, posto seu fundamento. Consectariamente, não há falar em prescrição de ação que visa implementar um dos pilares da República, máxime porque a Constituição não estipulou lapso prescricional ao direito de agir correspondente ao direito inalienável à dignidade. Outrossim, a Lei 9.140/95, que criou as ações correspondentes às violações à dignidade humana perpetradas em período de supressão das liberdades públicas, previu a ação condenatória no art. 14, sem estipular-lhe prazo prescricional, por isso que a lex specialis convive com a lex generalis , 24 25 SANTOS, Antônio Jeová. Obra citada, p. 43 REsp 612108 / PR ; Recurso Especial 2003/0210878-7, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 02/09/2004, DJ 03.11.2004 p. 147 sendo incabível qualquer aplicação analógica do Código Civil no afã de superar a reparação de atentados aos direitos fundamentais da pessoa humana, como sói ser a dignidade retratada no respeito à integridade física do ser humano. Adjuntem-se à lei interna, as inúmeras convenções internacionais firmadas pelo Brasil, a começar pela Declaração Universal da ONU, e demais convenções específicas sobre a tortura, tais como a Convenção contra a Tortura adotada pela Assembléia Geral da ONU, a Conveção Interamericana contra a Tortura, concluída em Cartagena, e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica). Prosseguindo em sua fundamentação, o Ministro relator dispôs acerca da proteção à Dignidade da Pessoa Humana e o dever de reparar por danos morais em razão de sua violação, no caso em tela, tratando-se de sepultamento de familiar sem as devidas práticas ou alertas à família, gerando, por conseguinte, impar sentimento negativo aos mesmos: A dignidade humana violentada, in casu, decorreu do sepultamento do irmão da parte, realizado sem qualquer comunicação à família ou assentamento do óbito, gerando aflição ao autor e demais familiares, os quais desconheciam o paradeiro e destino do irmão e filho, gerando suspeitas de que, por motivos políticos, poderia estar sendo torturadorevelando flagrante atentado ao mais elementar dos direitos humanos, os quais, segundo os tratadistas, são inatos, universais, absolutos, inalienáveis e imprescritíveis . A exigibillidade a qualquer tempo dos consectários às violações dos direitos humanos decorre do princípio de que o reconhecimento da dignidade humana é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz, razão por que a Declaração Universal inaugura seu regramento superior estabelecendo no art. 1º que "todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos". Deflui da Constituição federal que a dignidade da pessoa humana é premissa inarredável de qualquer sistema de direito que afirme a existência, no seu corpo de normas, dos denominados direitos fundamentais e os efetive em nome da promessa da inafastabilidade da jurisdição, marcando a relação umbilical entre os direitos humanos e o direito processual. Ex positis , dou parcial provimento ao recurso especial interposto pela União, apenas, para afastar a indenização de despesas de guarda do túmulo, mantida a indenização pelo dano moral, repartindo-se o valor da indenização, na liquidação de sentença, na forma do art. 10 da Lei nº 9.140/95”. Nesta esteira, afigura-se pertinente a lição de Eroulths Cortiano Junior 26 no sentido que de que: A dignidade da pessoa humana é o centro de sua personalidade, e portanto merece a maior proteção possível. Aliás, a conjugação personalidadedignidade é tão forte que boa parte dos autores que tratam do tema referemse diretamente à proteção da dignidade do homem. Esta ligação é, assim, indissolúvel. Finalmente, é forçosa a análise do art. 5º 27 da CF/88, com a devida ênfase ao inciso X 28. Acerca de tal dispositivo, inicialmente, observa-se que, segundo ensina Yussef Cahali 29: […] a Constituição de 1988 apenas elevou à condição de garantia dos direitos individuais a reparabilidade dos danos morais, pois esta já estava latente na sistemática legal anterior; não sendo aceitável, assim, pretenderse que a reparação dos danos dessa natureza somente seria devida se verificados posteriormente à referida Constituição. Ainda vale consignar que, apesar da interpretação gramatical sugerir que se trata de cláusula taxativa de bens tutelados, cuja violação é passível de indenização por danos morais, a interpretação conferida ao dano moral, depois da CF/88, considera aquela entidade de forma ampla. Nesta senda, conforme defendido por Antônio Jeová Santos30: O direito à vida privada, à honra e à imagem são apenas alguns dos dados da personalidade. Rica e proteiforme, a lei não pode abarcar todos os 26 CORTIANO JUNIOR, Eroulths. Alguns apontamentos sobre os chamados direitos da personalidade. In: Fachin, Luiz Edson (Coord.); Eroulths Cortiano Junior [at al.]. Repensando fundamentos do direito civil brasileiro. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 42. 27 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: 28 inc. X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. 29 CAHALI, Yussef Said. Obra citada, p. 53. 30 SANTOS, Antônio Jeová. Obra citada, p. 66. aspectos da personalidade. Hoje, por exemplo, fala-se em direito à identidade pessoal, sem que nenhum dispositivo da Constituição tenha articulado claramente sobre esse direito, que na visão de Fernandez Sessarego ( El daño a la persona na Código Civil, p. 113), é o prejuízo causado ao conjunto de atributos e características que permitem individualizar a pessoa em sociedade. Identidade pessoal é tudo aquilo que faz com que cada qual seja um mesmo e não outro. Esse entrelaçamento de características da personalidade de cada qual se projeta para o mundo exterior, se fenomenaliza, e permite aos demais conhecerem a pessoa, a certa pessoa em sua mesmidade, no que ela é enquanto específico ser humano. Aliás, a própria Constituição Federal, no § 2º do art. 5º já resolve o celeuma, ao dispor que “os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados […]”. Desta forma afigura-se hábil a conclusão de que o rol insculpido no inciso supra referido é meramente exemplificativo, sendo abarcada pela Carta Maior a possibilidade mais ampla o possível de indenização por danos morais decorrentes de lesão à personalidade do sujeito, em consonância com análise da Constituição, principalmente de sua interpretação conforme o preâmbulo. 1.2.2.2 Código Civil Brasileiro Seguindo-se a devida hierarquia legislativa, faz-se mister a análise da previsão de reparação de danos à luz da Carta Civil. 1.2.2.2.1 Código Civil de 1916 À época, quando vigia o Código Civil de 1916, dizia Agostinho Alvim31: Em doutrina pura, quase ninguém sustenta hoje a irreparabilidade dos danos morais. É assim que a obrigação de reparar tais danos vai se impondo às legislações, mais ousadamente aqui, mais timidamente ali, já se admitindo a reparação, como regra, já, somente, nos casos expressamente previstos. E ressalvava, ainda: “O sentimento de justiça impulsiona no sentido de admitir-se a indenização por dano moral; mas, a dificuldade da aplicação da teoria aos casos ocorrentes faz retroceder”32. Todavia, o mesmo autor33 alertava, outrossim: O nosso legislador não inseriu no Código uma regra sobre dano moral, nem mesmo, como certos Códigos, para conceder a indenização em casos previstos. Nenhuma norma de caráter geral. No art. 1543 prevê-se um caso. Outros dispositivos há, de caráter casuístico, melhor direi, discutíveis. Mas, ainda mesmo que se enxerguem casos de indenização por dano moral em várias disposições, nenhuma generalização é possível, donde, o mais que se pode conceber, é que o Código se filiou à doutrina dos casos previstos em lei. Parte da doutrina contestava essa posição, argumentando que o próprio caput do art. 76 do Código Civil de 1916 afirmava textualmente: “Para propor, ou contestar uma ação, é necessário ter legítimo interesse econômico, ou moral”. Ao omitir-se sobre o tema, o Código Civil revogado provocou calorosa discussão acerca da reparabilidade dos danos morais, havendo, contra a possibilidade de reparação por dano não patrimonial, argumentos que variavam desde a alegação de “impossibilidade de uma rigorosa avaliação pecuniária do dano moral, passando pela imoralidade da compensação da dor com dinheiro e chegando ao perigo de enriquecimento sem causa” 34. 31 ALVIM, Agostinho. Da inexecução das obrigações e suas conseqüências. São Paulo: Saraiva, 1980. p. 220221. 32 ALVIM, Agostinho. Obra citada, p. 224. 33 ALVIM, Agostinho. Obra citada, p. 221. 34 VARELA, Antunes. Direito das obrigações. Rio de Janeiro: Forense, 1977. Até então, o lesado poderia ir buscar algum tipo de reparação na legislação anterior, que, embora esparsa e nem sempre clara, permite, ainda hoje, o embasamento na sustentação do pedido indenizatório. Portanto, será suficiente lembrar, além do comentado art. 76 do Código Civil, que legitimava a ação, os artigos 84 do Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei 4417, de 27.8.1962)35 e 53 da Lei de Imprensa (Lei 5250/67)36. Também das hipóteses casuísticas estampadas no Código Civil Brasileiro de 1916, a exemplo dos artigos 1.53737, 1.53838, 1.54339, 1.54840, 1.54941 e 1.55042, tornou-se permitido induzir a existência no sistema jurídico pátrio de um princípio geral de reparabilidade do dano moral. O berço desse princípio, entretanto, é a exegese literal do art. 15943 daquele Codex, cuja aplicação não se encontra restrita aos danos patrimoniais. Apesar de a positivação da reparabilidade do dano moral ter recebido, em nosso sistema jurídico, inspiração na construção doutrinária e pretoriana, não se pode deixar de valorá-la como conquista em termos de direitos e garantias fundamentais, conforme já observado no título antecessor. 35 “Art. 84 – Na estimação do dano moral o juiz terá em conta notadamente a posição social ou política do ofendido, a situação econômica do ofensor, a intensidade do ânimo de ofender, a gravidade e a repercussão das ofensas.”. 36 “Art. 53 – No arbitramento da indenização em reparação por dano moral o juiz terá em conta notadamente [...]”. 37 Art. 1.537. A indenização, no caso de homicídio, consiste: I - no pagamento das despesas com o tratamento da vítima, seu funeral e o luto da família; II - na prestação de alimentos às pessoas a quem o defunto os devia. 38 Art. 1.538. No caso de ferimento ou outra ofensa à saúde, o ofensor indenizará o ofendido das despesas do tratamento e dos lucros cessantes até o fim da convalescença, além de lhe pagar a importância da multa no grau médio da pena criminal correspondente. § 1o Esta soma será duplicada, se do ferimento resultar aleijão ou deformidade. § 2o Se o ofendido, aleijado ou deformado, for mulher solteira ou viúva, ainda capaz de casar, a indenização consistirá em dotá-la, segundo as posses do ofensor, as circunstâncias do ofendido e a gravidade do defeito. 39 Art. 1.543. Para se restituir o equivalente, quando não exista a própria coisa (art. 1.541), estimar-se-á ela pelo seu preço ordinário e pelo de afeição, contanto que este não se avantaje àquele. 40 Art. 1.548. A mulher agravada em sua honra tem direito a exigir do ofensor, se este não puder ou não quiser reparar o mal pelo casamento, um dote correspondente à sua própria condição e estado: I - se, virgem e menor, for deflorada. II - se, mulher honesta, for violentada, ou aterrada por ameaças. III - se for seduzida com promessas de casamento. IV - se for raptada. 41 Art. 1.549. Nos demais crimes de violência sexual, ou ultraje ao pudor, arbitrar-se-á judicialmente a indenização. 42 Art. 1.550. A indenização por ofensa à liberdade pessoal consistirá no pagamento das perdas e danos que sobrevierem ao ofendido, e no de uma soma calculada nos termos do parágrafo único do art. 1.547. 43 Art. 159. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano. 1.2.2.2.2 Código Civil de 2002 Desta forma, o Código Civil vigente, promulgado à luz da garantias da CF/88 e com a pacificação doutrinária e jurisprudencial de reparabilidade do dano moral, acolheu integralmente as disposições prescritas na Carta Maior. O art. 186 veio a estabelecer que “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. (Grifei). Por conseqüência, a cláusula geral do dever de indenizar do Código Civil vigente, adotou a teoria da culpa, dispondo, no art. 927 que “aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. Em consonância com o mandamento constitucional, a Carta Civil agasalha a possibilidade de reparação pecuniária da ofensa praticada contra o direito da personalidade, inclusive consagrando a proteção ao direito da personalidade em seu texto. Inicialmente, já pode ser observada a manifesta preocupação do legislador com o direito da personalidade, seguindo-se o espírito da Constituição com a inserção do Capítulo II (Dos Direitos da Personalidade), sem equiparação no revogado Código. Já na abertura de dito capítulo, nos artigos 11 44 e 12 45 , é manifestada a proteção à personalidade em relação ao próprio indivíduo que, em regra não pode limitar seu próprio direito (art. 11) e contra terceiros onde, além de garantida a cessação da lesão, já há a previsão da reparação pelos danos sofridos. Ainda vale observar que o vigente Código Civil, em seu art. 2146, sem precedente no CC16, onde se consagra a proteção ao direito da personalidade na sua vertente “vida privada”, estabelece a garantia de que o julgador deverá adotar as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato lesivo a tal direito. Em relação ao dispositivo supra, Maria Cláudia Cachapuz47 afirma: O pioneirismo que se reconhece na norma constante no artigo 21 do novo Código diz respeito, especialmente, a este destaque conferido à adoção de um princípio de exclusividade em relação àquilo que concerne à privacidade do indivíduo. Isto porque, diferentemente da previsão anterior dos artigos 159 e 160 do Código Civil brasileiro de 1916, que tratam dos atos ilícitos, não trabalha o atual código com a tutela jurídica da privacidade a partir da noção de responsabilidade civil – como ainda faz o art. 5°, inc. X, da C.F. -, mas busca definir a proteção legislativa pela autonomia de tratar o tema da privacidade de forma exclusiva.48 44 Art. 11. Com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária. 45 Art. 12. Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei. Parágrafo único. Em se tratando de morto, terá legitimação para requerer a medida prevista neste artigo o cônjuge sobrevivente, ou qualquer parente em linha reta, ou colateral até o quarto grau. 46 Art. 21. A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma. 47 CACHAPUZ, Maria Cláudia. A proteção à intimidade e à vida privada no novo código civil: Análise dos arts. 21 e 187. Revista do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul, Porto Alegre: TC-RS, v. 22, n. 37, p. 324-338, 2005. 48 No mesmo sentido: CACHAPUZ, Maria Cláudia. Intimidade e vida privada no novo código civil brasileiro: uma leitura orientada no discurso jurídico. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2006. 303 p. ISBN 8575253484. Como observado, o art. 21 do NCC traz à lume a tutela inibitória no âmbito da vida privada, de forma específica, ou seja, fora da cláusula de tutela inibitória genérica insculpida no 46149 do Código de Processo Civil50. O Código Civil vigente, nas palavras de Cláudio Ari Mello 51 “recolheu alguns direitos ‘especiais’ da personalidade: os direitos à incolumidade física (arts. 13 52 e 15 53), ao nome (art. 16 54), à imagem, à honra, à intimidade (art. 20 55) e à privacidade (art. 21)”. Da mesma forma, consagrou a proteção de um direito geral da personalidade, nos moldes do caput do art. 1256. 1.2.3 Prova do Dano Moral Outro aspecto de essencial relevância no estudo do instituto da reparação moral é relativo à prova do dano, questão na qual diverge a doutrina pátria. 49 Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento. 50 Acerca do tema, ARENHART, Sérgio Cruz. A tutela inibitória da Vida Privada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000 (Coleção temas atuais de direito processual civil, v. 2). 51 MELLO, Cláudio Ari. Contribuição para uma teoria híbrida dos direitos da personalidade. In: SARLET, Ingo Wolfgang (Org.); MELLO, Cláudio Ari. [at al.]. O Novo Código Civil e a Constituição. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003, P. 85. 52 Art. 13. Salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes. Parágrafo único. O ato previsto neste artigo será admitido para fins de transplante, na forma estabelecida em lei especial. 53 Art. 15. Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica. 54 Art. 16. Toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o sobrenome. 55 Art. 20. Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais. Parágrafo único. Em se tratando de morto ou de ausente, são partes legítimas para requerer essa proteção o cônjuge, os ascendentes ou os descendentes. 56 Art. 12. Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei. Há os que, de um lado, conforme esclarece Cahali57, defendem o posicionamento de que a regra geral a ser observada, no plano do dano moral, exige a prova não só de sua ocorrência, mas, também, de sua repercussão moral. De outro lado, majoritária corrente abraçada por Bittar58 aponta a responsabilização como decorrente do simples fato da violação, ao fundamento precípuo de que: [...] verificado o evento danoso, surge, ipso facto, a necessidade de reparação, uma vez presentes os pressupostos do direito, haja vista que a constatação do alcance do dano constitui fenômeno claramente perceptível a qualquer um, porquanto diga respeito à essencialidade do homem. Na lição de Sérgio Cavalieri Filho59 sobre o tema: [...] por se tratar de algo imaterial ou ideal a prova do dano moral não pode ser feita através dos mesmos meios utilizados para a comprovação do dano material. Seria uma demasia, algo até impossível exigir que a vitima comprove a dor, a tristeza ou a humilhação através de depoimentos, documentos ou perícia; não teria ela como demonstrar o descrédito, o repúdio ou o desprestígio através dos meios probatórios tradicionais, o que acabaria por ensejar o retorno à fase da irreparabilidade do dano moral em razão de fatores instrumentais. [...] Em outras palavras, o dano moral existe in re ipsa; deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo, de tal modo que, provada a ofensa, ipso facto está demonstrado o dano moral à guisa de uma presunção natural, uma presunção hominis ou facti que decorre das regras de experiência comum. No mesmo sentido é o entendimento já esposado pelo Superior Tribunal de Justiça 57 60 . Assim, entende-se que a sistemática adotada pelo nosso ordenamento jurídico Obra citada, p. 703. 58 BITTAR, Carlos Alberto. Reparação civil por danos morais. 3. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999. p.214-218 59 60 FILHO, Sérgio Cavalieri Filho. Programa de Responsabilidade Civil, 2ª ed, 2000, p.79/80 A concepção atual da doutrina orienta-se no sentido de que a esponsabilização do agente causador do dano moral opera-se por força do simples fato da violação (danum in re ipsa). Verificado o evento danoso, surge a necessidade da reparação, não havendo que se cogitar da prova do prejuízo, se presentes os pressupostos legais para que haja a responsabilidade civil (nexo de causalidade) (STJ , 4ª Turma, Resp. nº. 23.575-DF, Rel. Min. César Asfor Rocha, j. 09.06.1997.) prescreve que a prova de dano moral autônomo ou puro, isto é, desvinculado ao dano material, se satisfaz com a demonstração da ocorrência do ato ilícito, que originou a ofensa extrapatrimonial. Noutros termos, a força probante do ato ilícito gera presunção juris tantum61 de ocorrência de danos morais. Como visto, os prejuízos extrapatrimoniais suportados pela vítima independem de prova material para emergir o direito à reparação moral, bastando a comprovação da prática antijurídica perpetrada pelo ofensor. A proposição ventilada recebe a chancela do Superior Tribunal de Justiça, ao decidir que "Estando comprovado o fato não é preciso a prova do dano moral” 62, bem como "Em se tratando de direito à imagem, a obrigação da reparação decorre do próprio uso indevido do direito personalissímo, não havendo que se cogitar de prova da existência de prejuízo ou dano” 63. Acerca da questão vale observar que STJ, analisando o Recurso Especial nº 79768964, em voto de lavra do Ministro Jorge Scartezzini, em questão acerca de danos morais em decorrência de saques irregulares efetivados em conta corrente de mutuário, sustentou que: 61 Presunção juris tantum é aquela estabelecida pela lei, mas que se admite prova do contrário. [nota do autor da presente monografia]. 62 STJ, AGA 250722/SP, j. 19/11/1999, 3ª Turma, r. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ 07/02/2000, p. 163 63 STJ, REsp. 45305/SP, j. 02/09/1999, 4ª Turma, r. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 25/10/1999, p. 83 64 A decisão está assim ementada: Decisão CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. SAQUES IRREGULARES EFETUADOS EM CONTA CORRENTE. DANOS MATERIAIS RECONHECIDOS. DANOS MORAIS. OCORRÊNCIA. VALOR INDENIZATÓRIO DEVIDO. FIXAÇÃO. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. REEXAME DOS ELEMENTOS PROBATÓRIOS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 07/STJ. 1. Tendo o Tribunal a quo examinado, fundamentadamente, todas as questões suscitadas pelo recorrente, tanto em sede de apelação como em embargos (fls. 141/144, 167/169), não há falar na ocorrência de omissão e, pois, de ofensa ao art. 535, II, do CPC. 2. No pleito em questão, os saques irregulares efetuados na conta corrente do autor acarretaram situação evidente de constrangimento para o correntista (que, como reconhece, expressamente, o Tribunal "perdeu quase todo o seu dinheiro que tinha em sua conta corrente"), caracterizando, por isso, ato ilícito, passível de indenização a título de danos morais. Segundo precedentes desta Corte, em casos como este, o dever de indenizar prescinde da demonstração objetiva do abalo moral sofrido, exigindo-se como prova apenas o fato ensejador do dano, ou seja, os saques indevidos por culpa da instituição ora recorrida: "a exigência de prova do dano moral se satisfaz com a comprovação do fato que gerou a dor, o sofrimento, sentimentos íntimos que o ensejam". Precedentes. 3. Com o fito de assegurar ao lesado justa reparação, sem incorrer em enriquecimento ilícito, fixo o valor indenizatório por danos morais em R$ 3.000,00 (três mil reais). 4. A pretensão do recorrente no sentido de que seja reconhecida a litigância de máfé implicaria o revolvimento de elementos probatórios analisados nas instâncias ordinárias, e sobre os quais o Tribunal a quo fundamentou sua decisão. Incidência da Súmula 07, desta Corte. 5. Recurso parcialmente conhecido e, nesta parte, provido. (REsp 797689 / MT ; Recurso Especial. 2005/0189396-6. Min. Rel. Jorge Scartezzini, 4ª Turma, DJ 11.09.2006 p. 305). a exemplo do que ocorre com a inscrição indevida em registros de proteção ao crédito, ou de devolução injustificada de cheque, tenho que , no caso em questão, os saques irregulares efetivados na conta corrente do autor acarretaram situação evidente de constrangimento para o correntista ( que, como reconhece, expressamente, o Tribunal "perdeu quase todo o dinheiro que tinha em sua conta corrente") caracterizando, por isso, ato ilícito passível de indenização a título de danos morais. Em casos como este, portanto, segundo os precedentes desta Corte, o dever de indenizar prescinde da demonstração objetiva do abalo moral sofrido, porquanto decorre da experiência comum, exigindo-se como prova apenas o fato ensejador do dano dano, ou seja, os saques indevidos por culpa da instituição financeira. (Grifei). Não obstante a esta questão da prova do dano moral, ora suscitada, há um aspecto processual alusivo a tal dano, que merece especial destaque. Os padecimentos morais, para que sejam indenizáveis, devem constar expressamente descritos na petição inicial, a fim de levá-los ao conhecimento do Estado-juiz, sob pena de afastamento da verba indenizatória pugnada. Em suma, o autor da ação indenizatória por danos morais deve levar ao conhecimento do magistrado da causa o substrato necessário para margear o ressarcimento, a fim de que seja devidamente instaurado o Contraditório, permitindo que o requerido exerça seu constitucional direito à ampla defesa. Nesse sentido, não cabe ressarcimento a meras conjecturas e fantasias, devendo o dano moral existir e ser descrito em sua essência para sobejar o direito à indenização. Convém observar que algumas espécies de danos morais, como os decorrentes da inscrição indevida nos cadastros de órgãos restritivos de crédito, são considerada in re ipsa65, ou seja, é dispensada a comprovação do dano, limitando-se à necessidade de prova da conduta do agente. Nesta senda, vale observar parte a fundamentação na decisão de lavra do Des. Carlos Alberto Alvaro de Oliveira, RELATOR DA APELAÇÃO CÍVEL N° 7000476062566, que 65 66 "de que a coisa fala por si mesma" [tradução do autor da presente monografia]. A decisão está assim ementada: Responsabilidade civil. Dano moral. Protesto indevido de título. Prova do dano in re ipsa. O dano moral, como prática atentatória aos direitos da personalidade, traduz-se num sentimento de pesar íntimo da pessoa ofendida, capaz de gerar-lhe alterações psíquicas ou prejuízos à parte social ou afetiva de seu patrimônio moral. A prova se satisfaz com o protesto de título. Danos morais que devem ser reparados considerados a conduta ilícita, a natureza da lesão e o porte econômico das partes. Quantum indenizatório condenou financeira ao pagamento de danos morais em decorrência de inscrição indevida em órgão de restrição de crédito: Ocorre que o dano moral, como prática atentatória aos direitos da personalidade, traduz-se num sentimento de pesar íntimo da pessoa ofendida, capaz de gerar-lhe alterações psíquicas ou prejuízos à parte social ou afetiva de seu patrimônio moral. Nessas condições, torna-se a meu ver difícil, senão mesmo impossível, em certos casos, a prova do dano, de modo que me filio à corrente que considera estar o dano moral in re ipsa, dispensada a sua demonstração em juízo. E prosseguiu o julgador: Claro está, como bem acentua Antônio Chaves (Tratado de Direito Civil, vol. III, 3a. ed., São Paulo, RT, 1985, p. 637), que não será todo e qualquer melindre, toda suscetibilidade exacerbada, toda exaltação do amor próprio, pretensamente ferido, que merecerá ressarcimento. De minimis non curat praetor, já ressaltavam as fontes romanas. Necessário se mostra para o acolhimento do pedido de indenização, repito, apenas a prova da ilicitude da conduta do agente e da relativa gravidade da lesão suportada pela vítima, ilicitude essa evidenciada no presente litígio. 1.2.4 Requisitos Gerais e Específicos Inicialmente, em face da sistemática do presente estudo, como já anteriormente observado, é enfocado o dano moral decorrente do ato ilícito, à luz da teoria subjetiva, sem, todavia, sustentar-se a limitação do dever de reparar a tais situações. reduzido. A verba honorária constitui capítulo acessório da sentença. Assim, provido total o parcialmente o recurso, a condenação em honorários devem ser impostas pelo órgão "ad quem". Manutenção da sucumbência recíproca, a despeito da orientação jurisprudencial deste órgão sobre o tema, ante a inexistência de inconformidade por parte do autor. Apelação do réu provida em parte, prejudicado o recurso adesivo. (Apelação Cível nº 70004760625, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Alberto Álvaro de Oliveira, Julgado em 18/12/2002) Quanto aos requisitos do dever de indenizar o dano moral, observa-se que estes são os requisitos gerais da responsabilidade civil, insculpidos no Código Civil, ao que se agrega a lesão específica. 1.2.4.1 Conduta do Agente O primeiro elemento a ser analisado a fim de aferir o dever de reparar é a conduta do agente. Como é sabido, o dano, cujo conceito já foi analisado anteriormente, dever ser proveniente de ação ou omissão voluntária do agente. Se a atuação ou omissão desastrosa do agente é deliberadamente procurada, voluntariamente alcançada, diz-se que houve culpa lato sensu, ou seja, dolo. Dolo é, portanto, o propósito de causar dano a outrem. É a infração consciente do dever preexistente. Se, todavia, o prejuízo causado à vítima deriva de comportamento omissivo ou comissivo adjetivado como negligente, imprudente ou imperito do agente, houve culpa stricto sensu, também denominada como culpa aquiliana. O Juízo de reprovação próprio da culpa pode, pois, revestir-se de intensidade variável, correspondendo à clássica divisão da culpa em dolo e negligência, abrangendo esta última, hoje, a imprudência e a imperícia. Em qualquer de suas modalidades, entretanto, a culpa implica a violação de um dever de diligência, ou em outras palavras, a violação do dever de previsão de certos fatos ilícitos e de adoção de medidas capazes de evitá-los. Como bem observado por Carlos Roberto Gonçalves67: 67 Gonçalves, Carlos Roberto. Direito das obrigações: parte especial, vol. 6, tomo II: responsabilidade civil. São Paulo: Saraiva, 2001 (Coleção sinopses jurídicas), p. 51. O Código Civil, entretanto, não faz nenhuma distinção entre dolo e culpa, nem entre os graus de culpa, para fins de reparação do dano. Tenha o agente agido com dolo ou culpa levíssima, existirá sempre a obrigação de indenizar, obrigação esta que será calculada exclusivamente sobre a extensão do dano. Em outras palavras, mede-se a indenização pela extensão do dano e não pelo grau de culpa, com algumas poucas exceções, como nos casos regidos pela Lei de Imprensa, por exemplo. Adotou o legislador a norma romana, segundo a qual a culpa, ainda que levíssima, obriga a indenizar. No entanto, impende observar que, no que pese não haver distinção, quando ao dever de reparar, entre dolo e culpa, o próprio Código Civil Brasileiro, no § único de seu art. 94468, sem comparativo no revogado Código, já estabelece que a culpa em si apresenta diversos graus e, por conseqüência, reprovabilidades diferentes. Quanto à definição desta culpa, vale observar a importante lição de Rui Stoco69: A culpa, genericamente entendida é, pois, fundo animador do ato ilícito, da injúria, ofensa ou má conduta imputável. Nessa figura encontram-se dois elementos: o objetivo, expressado na iliciedade, e o subjetivo, do mau procedimento imputável. A doutrina também se refere à culpa in concreto, aquela examinada na conduta específica sob exame, e a culpa in abstrato, aquela conduta de transgressão avaliada pelo padrão do “homem médio”. Em muitas situações, a jurisprudência considera a chamada culpa presumida. Em algumas situações concretas, de evidência patente, provar a culpa é totalmente despiciendo. Na hipótese de culpa presumida, carreadas pela jurisprudência, há a inversão do ônus da prova: cabe ao réu provar que não agiu com culpa. A culpa presumida, contudo, não se confunde com a responsabilidade objetiva, embora possa dela se aproximar bastante. 68 Art. 944. A indenização mede-se pela extensão do dano. Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, eqüitativamente, a indenização. 69 STOCCO, Rui apud VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Responsabilidade Civil. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 2003 (Coleção direito civil; v. 4), p. 23. Nesta senda, vale observar, a exemplo desta situação, o já pacificado entendimento jurisprudencial de que, nos acidentes de trânsito, há presunção de culpa daquele que colide na traseira de outro veículo, como é o caso do voto de lavra do ilustre Dr. Eugênio Facchini Neto, no julgamento do Recursal Cível nº 71000908178 ao dispor que “Como é sabido, há uma presunção hominis70 de responsabilidade de quem colide por trás” 71. No caso supra referido, observa-se que, embora inexista a responsabilidade objetiva do condutor do veículo, há a construção efetuada no âmbito da jurisprudência já sedimentada, no sentido de que se presume – relativamente – culpado aquele que colide na traseira de outro veículo. Assim resta ao mesmo a comprovação de ausência de culpa, havendo, portanto a inversão do ônus da prova. No mesmo sentido, vale observar a presunção de culpa em desfavor do dono ou detentor do animal, presunção esta que decorre do expresso no art. 936 do CCB72, visualizada em decisão igualmente de lavra do Dr. Eugênio Facchini Neto, ementada da seguinte forma: Responsabilidade civil. Fato de animal. Culpa presumida do dono ou detentor, apenas afastável pela comprovação de culpa exclusiva da vítima ou força maior. Inocorrência no caso concreto. Danos materiais indenizáveis. Recurso desprovido. (Recurso Cível nº 71000835504, Terceira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais - JEC, Relator: Eugênio Facchini Neto, Julgado em 06/06/2006) (Grifei) No caso, segundo as palavras do relator, “nesse passo, milita em favor do autor a presunção de culpa em desfavor do dono ou detentor do animal, a qual somente pode ser afastada se comprovada culpa da vítima ou força maior”. Ora, afigura-se, assim, mais um válido exemplo de presunção juris tantum de culpa. 70 Como já observado, Sérgio Cavalieri Filho sustenta que a presunção hominis ou facti é aquela que decorre das regras de experiência comum. Pode-se sustentar que tal presunção não resulta da lei, fundando-se, porém, na experiência da vida, que permite ao juiz firmar a própria convicção 71 A decisão está assim ementada: Acidente de trânsito. Desembarque de passageiro. Colisão por trás. Culpa presumida daquele que abalroa por trás. Presunção relativa, não elidida pela prova produzida. Responsabilidade do réu pelo evento. Sentença de procedência mantida. Recurso desprovido. (Recurso Cível Nº 71000908178, Terceira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais - JEC, Relator: Eugênio Facchini Neto, Julgado em 15/08/2006) (Grifei) 72 Art. 936. O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar culpa da vítima ou força maior. Dentre diversas classificações, pode-se dividir a culpa em: in committendo ou in faciendo, in omittendo, in eligendo, in vigilando e in custodiendo. Tem-se a culpa in committendo ou in faciendo quando o agente pratica um ato positivo, isto é, com imprudência. Mas se ele cometer uma abstenção, ou seja, for negligente, a culpa será in omittendo, como, por exemplo, um professor de natação que, por estar distraído, não socorre o aluno, deixando-o morrer afogado. Contudo, a omissão só poderá ser considerada causa jurídica do dano se houver existência do dever de praticar o ato não cumprido e certeza ou grande probabilidade do fato omitido ter impedido a produção do evento danoso. Já a culpa in eligendo advém da má escolha daquele em quem se confia a prática de um ato ou o adimplemento da obrigação, como p. ex.: admitir ou manter a seu serviço empregado não habilitado legalmente ou sem aptidões requeridas. Esta modalidade encontrava previsão no art. 1521, inc. III do CC de 1916, sendo recepcionado pelo art. 932, inc. III do atual CC e na Súmula 341 do STF. A culpa in vigilando é aquela que decorre da falta de atenção com o procedimento de outrem, cujo ato ilícito o responsável deve pagar, como p. ex.: a ausência de fiscalização do patrão, quer relativamente aos seus empregados, quer à coisa. É a hipótese de empresa de transportes que permite a saída de ônibus sem freios, o qual origina acidentes. É o que se observa no art. 1521, incs. I e II do CC16 e nos incisos I e II do art. 932 do atual código civil. E, por fim, a culpa in custodiendo é aquela que advém da falta de cautela ou atenção em relação a uma pessoa, animal ou objeto, sob os cuidados do agente. Tal modalidade possui presunção iuris tantum de culpa. No direito brasileiro, em regra, presumem-se culpados os representantes legais por seus representados; o patrão pelos danos causados por seus empregados; os donos ou detentores de animais pelos prejuízos causados por esses a terceiros; o proprietário do edifício ou construção pelos danos resultantes da ruína. 1.2.4.2 Nexo de Causalidade O último elemento a ser analisado é o nexo de causalidade, que representa a relação de causa e efeito entre a ação ou omissão, e o dano73. Para Carlos Roberto Gonçalves74, o nexo de causalidade pode ser assim conceituado: É a relação de causa e feito entre a ação ou omissão do agente e o dano verificado. Vem expressa no verbo "causar", utilizado no art. 159. Sem ela, não existe a obrigação de indenizar. Se houve o dano, mas a sua causa não está relacionada com o comportamento do agente, inexiste a relação de causalidade e também a obrigação de indenizar. Orlando Gomes, em sua obra "Obrigações", leciona: "para o ato ilícito ser fonte da obrigação de indenizar é preciso uma relação de causa e efeito entre o ao (fato) e o dano. A essa relação chama-se nexo causal" 75. Nesse diapasão, elegem-se as palavras de Demongue: "É preciso estar certo que, sem este fato, o dano não teria ocorrido. Assim, não basta que uma pessoa tenha contravindo a certas regras; é preciso que sem esta contravenção, o dano não ocorreria" 76. Assim, a responsabilidade civil não pode existir sem esta relação de causalidade entre o dano e a ação que o provocou. Portanto, um dano só produzirá responsabilidade quando tem por causa uma falta cometida ou um risco legalmente sancionado77. No mesmo sentido se manifestaram Sílvio de Salvo Venosa78, que afirma: O conceito de nexo causal ou relação de causalidade deriva de leis naturais. É o liame que une a conduta do agente ao dano. É por meio do 73 MONTENEGRO, Antônio Lindebergh C. Responsabilidade Civil, p. 23. 74 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. São Paulo: Saraiva, 1995. 75 GOMES, Orlando. Obrigações. 14 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 273. 76 DEMONGUE {s. referências}. Apud PEREIRA, Caio Mário. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Forense, 1999., p.75. V.III. 77 ALVIM, Agostinho. Da inexecução. {s.ed.}. {s. editora}. {s. l.} {s. d.}, p. 324. Apud GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil, p. 384. 78 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: contratos em espécie e responsabilidade civil. São Paulo: Atlas, 2001., p. 517. exame da relação causal que concluímos quem foi o causador do dano. Trata-se de elemento indispensável. A responsabilidade objetiva dispensa a culpa, mas nunca dispensarão nexo causal. Se a vítima que experimentou um dano, não identificar o nexo causal que leva o ato danoso ao responsável, não há como ser ressarcida. E Maria Helena Diniz79: O vínculo entre o prejuízo e a ação designa-se nexo causal, de modo que o fato lesivo deverá ser oriundo da ação, diretamente ou como sua conseqüência previsível. Tal nexo representa, portanto, uma relação necessária entre o evento danoso e a ação que o produziu, de tal sorte que esta é considerada como sua causa. Todavia, não será necessário que o dano resulte apenas imediatamente do fato que o produziu. Bastará que se verifique que o dano não ocorreria se o fato não tivesse acontecido. Este poderá não ser a causa imediata, mas, se for condição para a produção do dano, o agente responderá pela conseqüência. O que se constata quanto ao nexo de causalidade, é a dificuldade em determiná-lo, devido a duas questões: a dificuldade de sua prova e a identificação do fato que constitui a verdadeira causa do dano, pois nem sempre se tem condições de apontar qual a causa direta do fato.80 Com relação a essas dificuldades encontradas para precisar a existência do nexo de causalidade, surgiram algumas teorias, dentre elas a teoria da equivalência de condições ou da condição sine qua nom, a teoria da causalidade adequada e a teoria dos danos diretos e imediatos. Entretanto, a teoria adotada pelo nosso Código Civil, foi a do dano direto e imediato, essa expressa no art. 1.06081: Ainda que da inexecução resulte o dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela imediato. 79 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, 16 ed. São Paulo: Saraiva, 2002. v.7., .p. 92. 80 STOCCO, Rui. Responsabilidade Civil e sua interpretação jurisprudencial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p. 50. 81 GONÇALVES, Carlos Roberto. Ob. cit, p.385-388. Segundo afirma Marcelo Lima de Oliveira a respeito da teoria dos danos diretos e imediatos, "o causador do dano, portanto, responde somente pelos danos causados necessariamente por sua ação; pelos danos causados por suas causas estranhas, respondem seus respectivos agentes" 82. São palavras de Bonvicini, citado por Antônio Lindeberg Montenegro 83 , acerca da referida teoria: Na teoria da causalidade imediata somente a causa imediata assume relevância jurídica na aferição do dano. A sua conceituação exige uma precisa distinção entre causa e condição a fim de permitir separar o próximo remoto. O momento exato da violação do direito apresenta-se por igual, relevante para o efeito de determinar se houve ou não interrupção do nexo causal, de tal modo que o autor da primeira causa seja liberado. Ainda é necessário ressaltar que existem alguns fatos os quais que interferem na exteriorização do nexo causal, excluindo-se a responsabilidade do agente. Estes, se comprovados, excluem o direito da vítima ao ressarcimento, livrando o agente causador do dano da sua responsabilidade. Os principais fatores são: o estado de necessidade, a legítima defesa, a culpa da vítima, o fato de terceiro, a cláusula de não indenizar e o caso fortuito ou força maior 84. Assim, para que o dano seja indenizável, ou seja, para que haja a reparação do dano por parte de seu agente causador, torna-se imprescindível os seguintes requisitos: diminuição ou destruição de um bem jurídico, patrimonial ou moral, pertencente a uma pessoa, a efetividade ou certeza de um dano, a causalidade, a subsistência de um dano, a legitimidade da vítima em pleitear o dano e a ausência das excludentes de responsabilidade 85. 82 OLIVEIRA, Marcelo Leal de Lima. Responsabilidade Civil Odontológica, p.174. 83 BONVICINI, {s. obra}. {s. ed.}. {s. l.}. {s. editora}. {s. d.}, p. 865. V. III. apud MONTENEGRO, Antonio Lindenberg C.. Responsabilidade Civil, p.341. 84 GONÇALVES, Carlos Roberto. Ob. cit., p. 389. 85 DINIZ, Maria Helena. Ob. cit, p. 58-61. 1.2.4.3 Lesão ao direito de personalidade A questão do “dano”, já foi abordada no primeiro capítulo do presente estudo. Em sua obra Danni morali contrattuali, Damartello86, aponta os elementos caracterizadores do dano moral, como a privação ou diminuição daqueles bens que têm um valor precípuo na vida do homem e que são a paz, a tranqüilidade de espírito, a liberdade individual, a integridade física, a honra e os demais sagrados afetos, classificando-os em dano que afeta a parte social do patrimônio moral (honra, reputação etc.), dano que molesta a parte afetiva do patrimônio moral (dor, tristeza, saudade etc.); dano moral que provoca direta ou indiretamente dano patrimonial (cicatriz deformante etc.), e dano moral puro (dor, tristeza etc.). Por tal caminho, os direitos da personalidade são direitos subjetivos natos que se irradiam em, pelo menos, três grandes direções. Primeiro, procura tutelar a integridade física da pessoa; de igual forma, também se preocupa com o aspecto moral da pessoa humana; por fim, protege as expressões do intelecto humano, portanto, preocupa-se com o aspecto intelectual da pessoa, vale dizer, com a proteção da produção artística, literária, científica. É preciso se ter presente que toda lesão à personalidade, é considerada como de natureza moral. Do ponto de vista físico, os direitos da personalidade preocupam-se com a vida e com a integridade física da pessoa. Assim, qualquer dano à vida, enquanto fenômeno biopsíquico complexo, ou ao corpo humano são vistos como afronta a direito da personalidade e, portanto, indenizável. Vale observar, igualmente, decisão do Egrégio STJ, acerca do tema: Civil. Responsabilidade civil. Lei de imprensa. Notícia jornalística. Abuso do direito de narrar. Assertiva constante do aresto recorrido. Impossibilidade de reexame nesta instância. Matéria probatória. Enunciado n. 7 da súmula/stj. Dano moral. Demonstração de prejuízo. Desnecessidade. Violação de direito. Responsabilidade tarifada. Dolo do jornal. Inaplicabilidade. Não-recepção pela constituição de 1988. Precedentes. Recurso desacolhido. I - Tendo constado do aresto que o jornal que publicou a matéria ofensiva à honra da vítima abusou do direito 86 Damartello. Rivista di Diritto Civile. apud Stoco, Rui, Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial. p. 674. de narrar os fatos, não há como reexaminar a hipótese nesta instância, por envolver análise das provas, vedada nos termos do enunciado n. 7 da Súmula/STJ. II - Dispensa-se a prova de prejuízo para demonstrar a ofensa ao moral humano, já que o dano moral, tido como lesão à personalidade, ao âmago e à honra da pessoa, por vez é de difícil constatação, haja vista os reflexos atingirem parte muito própria do indivíduo - o seu interior. De qualquer forma, a indenização não surge somente nos casos de prejuízo, mas também pela violação de um direito. […] (REsp 85019 / RJ ; Recurso Especial 1996/0000726-8. Rel. Min. Salvio de Figueiredo Teixeira. 4ª Turma. DJ 18.12.1998 p. 358) (Grifei). Procurar-se-á analisar mais detalhadamente a questão do direito fundamental da personalidade no próximo capítulo deste estudo. DIREITO FUNDAMENTAL DA PERSONALIDADE E DANO MORAL 2.1 Dos Direitos Fundamentais 2.1.1 Conceito de Direito Fundamental Podem-se conceituar os direitos fundamentais como conjunto de prerrogativas e instituições que, em cada momento histórico, concretizam as exigências da liberdade, igualdade e dignidade entre os seres humanos. São núcleos invioláveis de uma sociedade política, sem os quais essa tende a perecer. Para Rodrigo César Rebello Pinho87, “direitos fundamentais são os considerados indispensáveis à pessoa humana, necessários para assegurar a todos uma existência digna, livre e igual”. A definição desses direitos denominados de fundamentais envolve diferentes aspectos. Numa acepção material, podemos afirmar que eles dizem respeito aos direitos básicos que o indivíduo, natural e universalmente, possui em face do Estado. Depois, em acepção formal, os direitos são considerados fundamentais quando o direito vigente em um país assim os qualifica, normalmente estabelecendo certas garantias para que estes direitos sejam respeitados por todos. Todavia, para José Afonso da Silva 88: a ampliação e transformação dos direitos fundamentais do homem no envolver histórico dificulta definir-lhes um conceito sintético e preciso. Aumenta essa dificuldade a circunstância de se empregarem várias expressões para designá-los, tais como: direitos naturais, direitos humanos, direitos do homem, direitos individuais, direitos públicos subjetivos, liberdades fundamentais, liberdades públicas e direitos fundamentais do homem. Tendo em vista a profusão de termos utilizados, em consonância com a preciosa lição do mestre supra referido, quando se fala sobre direitos fundamentais, causando uma certa confusão de significados, importante se faz apresentar algumas definições nesta seara. Direitos fundamentais, em sua acepção formal, são aqueles direitos básicos do indivíduo e do cidadão, reconhecidos pelo direito positivo do Estado, que exige deste ou uma abstenção ou uma atuação no sentido de garanti-los. No Brasil, essa expressão engloba vários direitos, tais como: os individuais, os coletivos, os difusos, os sociais, os nacionais e os políticos. 87 PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais, 2a edição, Saraiva, São Paulo, pág. 60. 88 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 18ª ed. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 179. Por sua vez, os direitos naturais seriam aqueles direitos inerentes à natureza do indivíduo enquanto ser humano, e, portanto, se estendem à toda humanidade, em todos os lugares, sem limitação temporal. Em que pese haver sustentação de que estes direitos se baseariam no conceito de direito natural, os quais não necessitariam serem criados pelo direito positivo, mas tão somente serem reconhecidos e declarados, em razão de serem verdadeiros direitos humanos, José Afonso89 diz que “não se aceita mais com tanta facilidade a tese de que tais direitos sejam naturais, provenientes da razão humana ou da natureza das coisas”. Aliás, prossegue o aludido mestre que “são direitos positivos, que encontram seu fundamento e conteúdo nas relações sociais materiais em cada momento histórico”. Já os direitos do cidadão consistem em expressão que abarca dois tipos de direitos: os direitos naturais, aqueles inerentes à própria existência humana; e os direitos civis, que pertencem ao ser humano enquanto participante de uma coletividade social civil. Finalmente, os direitos políticos constituem-se naqueles direitos decorrentes da cidadania, subdividindo-se em direitos políticos positivos e negativos. Os primeiros concedem ao cidadão o poder de participar da vida política do país por meio de diferentes formas: o voto, o plebiscito, o referendo, a iniciativa popular de leis e por meio da propositura de ação popular. Os direitos políticos negativos, por seu turno, permitem ao cidadão candidatar-se e ser votado nas eleições para cargos públicos, representando o povo, também conhecidos como direito de elegibilidade. Não obstante todas essas conceituações, segundo professado pela doutrina90: a expressão direitos fundamentais é a mais precisa. Primeiro, pela sua abrangência. O vocábulo direito serve para indicar tanto a situação em que se pretende a defesa do cidadão perante o Estado como os interesses jurídicos de caráter social, político ou difuso protegidos pela Constituição. De outro lado, o termo fundamental destaca a imprescindibilidade desses direitos à condição humana. 89 90 Obra citada, p. 180. ARAÚJO, Luiz Alberto David e Vidal Serrano Nunes Junior. Curso de Direito Constitucional, 5a edição, pág. 80. Ainda vale observar que o Professor Ingo Sarlet 91 , aponta como um dos critérios ou formas de distinguir a terminologia “direitos fundamentais” da “diretos humanos”, a consideração de que a primeira é utilizada “para aqueles direitos do ser humano reconhecidos e positivados na esfera do direito constitucional positivo” enquanto que a segundo se aplica aos “documentos de direito internacional, por referir-se àquelas posições jurídicas que se reconhecem ao ser humano como tal, independente de sua vinculação com determinada ordem constitucional”. 2.1.2 Características dos Direitos Fundamentais No tocante às características dos direitos fundamentais, verifica-se que a doutrina é bastante rica na diversidade de características apresentadas92, em consonância com cada doutrinador. Por tal razão, por questão de didática é imperiosa a opção por uma divisão, sendo que no presente estudo adota-se a classificação apresentada por José Afonso da Silva93. 2.1.2.1 Historicidade A formação e consolidação desses direitos ocorrem dentro de uma cadeia histórico-evolutiva. E nesse sentido Celso Ribeiro Bastos94: 91 SARLET, Ingo Wolfgang. Os Direitos Fundamentais, a Reforma do Judiciário e os Tratados Internacionais de Direitos Humanos: notas em torno dos 2º e 3º do art. 5º da Constituição de 1988. Revista da AJURIS, Porto Alegre: AJURIS, v. 33, n. 102, p. 177-208, jun./2006. 92 Alexandre de Moraes, por exemplo, apresente como características: Imprescritibilidade, Irrenunciabilidade, Relatividade, Universalidade, Complementariedade e Inter-relacionados. 93 94 SILVA, José Afonso. Obra citada. BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 22ª edição, São Paulo: Editora Saraiva, 2001, página 174. “O que é importante analisar é a formação histórica dessas liberdades. A sua significação exata não pode ser apreendida senão avaliando-se o lento processo pelo qual se deu a sua aquisição. É que no início dominava a ilimitação do poder estatal. Mesmo nas sociedades que se governaram por um princípio democrático, as liberdades públicas, tal como as entendemos hoje, não existiam, mesmo porque a idéia de indivíduo, enquanto algo diferente da sociedade que o envolve, foi uma lenta aquisição da humanidade”. Segundo José Afonso da Silva95, verifica-se que os direitos fundamentais: são históricos como qualquer outro. Nascem, modificam-se e desaparecem. Eles apareceram com a revolução burguesa e evoluem, ampliam-se com o decorrer dos tempos. Sua historicidade rechaça toda fundamentação baseada no direito natural, na essência do homem ou na natureza das coisas. 2.1.2.2 Universalidade Os direitos fundamentais são direitos universais na medida em que se dirigem a todos os humanos. Veja-se, por exemplo, as Declarações de Direitos do Bom Povo da Virgínia (1776)96 e do Homem e do Cidadão (1789)97. Ambos os documentos referem-se ao homem como detentor de certos direitos de sua natureza, sendo aplicados, portanto, a todo e qualquer ser humano, daí seu caráter universal. 95 SILVA, José Afonso da. Obra citada, p. 185. 96 Declaração do Bom Povo da Virgínia: I – Que todos os homens são, por natureza, igualmente livres e independentes, e têm certos direitos inatos, dos quais, quando entram em estado de sociedade, não podem ser por qualquer acordo privar ou despojar seus pósteros e que são: o gozo da vida e da liberdade com os meios de adquirir e possuir a propriedade e de buscar e obter a felicidade e segurança. 97 Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão: Art. 1º. Os homens nascem e são livres e iguais em direitos. As distinções sociais só podem fundamentar-se na utilidade comum. Tanto é assim que J. A. Gonzáles Casanova98, citado por Celso Bastos, afirma que: Estas declarações têm em comum seu caráter declarativo ou de proclamação prévia a toda regulamentação legal. Puramente, o que se declarava ou proclamava era o caráter natural ou fundamentalmente humano de certos direitos. Estes direitos naturais seriam uma crença religiosa ou filosófica que viria a outorgar e a justificar um conhecido e secular direito à resistência contra a tirania ou a renúncia ao pacto ReiReinado quando o primeiro o violasse, ao não respeitar os direitos fundamentais dos súditos. Passa a ser expressão de direitos muito concretos e de reivindicações políticas específicas, as Declarações citadas adotaram uma formulação abstrata, geral e universalista, própria da filosofia do Iluminismo. 2.1.2.3 Limitabilidade Os direitos fundamentais são relativos, uns em relação aos outros, devendo-se buscar a harmonização. Novamente capta-se da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão a validade desta característica para se identificar os direitos fundamentais, com a análise dos artigos 4º 99 e 5º 100. Constata-se, pelo exame, que o limite do exercício dos direitos fundamentais encontra-se justamente na possibilidade de exercício dos mesmos direitos pelo próximo e enquanto não constituam agressão à sociedade. É por isso que, no caso do exercício legítimo 98 Texto Original: “Estas Declaraciones tenían en común su carácter declarativo o de proclamación previa a toda regulación legal. En puridad, lo que se declaraba o proclamaba era el carácter natural o fundamentalmente humano de ciertos derechos. Estos derechos naturales serían una creencia religiosa o filosófica que vendria a otorgar autoridad y a justificar um n conocido y secular derecho a la resistencia contra la tirania o a la denuncia del pacto Rey-Reino cuando el primero la violara al no respetar los derechos fundamentales de los súbditos. Pese a ser expressión de derechos muy concretos y de reivindicaciones política específicas, las Declaraciones citadas adoptaron una formulación abstracta, general y universalista, própia de la filosofia racionalista de la Ilustración”. BASTOS, Celso Ribeiro. Obra citada, página 175. 99 Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão: Art. 4º. A liberdade consiste em poder fazer tudo que não prejudique o próximo: assim, o exercício dos direitos naturais de cada homem não tem por limites senão aqueles que asseguram aos outros membros da sociedade o gozo dos mesmos direitos. Estes limites apenas podem ser determinados pela lei. 100 Art. 5º. A lei não proíbe senão as ações nocivas à sociedade. Tudo que não é vedado pela lei não pode ser obstado e ninguém pode ser constrangido a fazer o que ela não ordene. de direitos contrapostos, a recomendação é de que a harmonização se dê pela cedência recíproca, em que cada um dos titulares reduzem suas esferas jurídicas, de maneira a não anular completamente a sua própria esfera e a do outro. 2.1.2.4 Concorrência Também observa-se que tais direitos podem ser cumulados, ou seja, um só titular pode manter em sua pessoa inúmeros direitos fundamentais. Sendo assim, a Constituição e as leis devem encontrar um ponto de convergência e equilíbrio para assegurar, em diferentes normas, a proteção de diversos direitos fundamentais exercidos por um só titular num só ato. 2.1.2.5 Irrenunciabilidade Ainda que titular de direito fundamental, o indivíduo não pode dispor desses. Ora, essa é uma característica evidente, por tudo o que já foi exposto, porque são direitos decorrentes da própria natureza de ser humano e, por isso, são realidades inseparáveis. Os direitos fundamentais são identificáveis por meio de suas características. Assim, presentes todos esses caracteres, é de se reconhecer o direito como sendo fundamental. Segundo ensina José Afonso da Silva 101 “Não se renunciam direitos fundamentais. Alguns deles podem até não ser exercidos, pode-se deixar de exercê-los, mas não se admite sejam renunciados”. 101 SILVA, José Afonso da. Obra citada, p. 185. 2.1.2.6 Inalienabilidade Prosseguindo a lição do mestre José Afonso, os direitos fundamentais, não possuem conteúdo econômico-patrimonial, motivo pelo qual são intransferíveis e inegociáveis. Ainda, nas palavras do aludido autor102 “Se a ordem constitucional os confere a todos, deles não se pode desfazer, porque são indisponíveis”. 2.1.2.7 Imprescritibilidade Os direitos fundamentais não se perdem pelo decurso de prazo. Eles são permanentes. Para José Afonso da Silva103: [...] nunca deixam de ser exigíveis. Pois prescrição é um instituto jurídico que somente atinge, coarctando, a exigibilidade dos direitos de caráter patrimonial, não a exigibilidade de direitos personalíssimos, ainda que não individualistas, como é o caso. Se são sempre exercíveis e exercidos, não há intercorrência temporal de não exercício que fundamente a perda da exigibilidade pela prescrição. 2.1.3 Classificação dos Direitos Fundamentais 102 SILVA, José Afonso da. Obra citada, p. 185. 103 Idem Os direitos fundamentais podem ser classificados em direitos de defesa (direitos “negativos”) e direitos em direitos a prestações (direitos “positivos”). Os direitos fundamentais como direitos de defesa são aqueles objetos de uma não intervenção na esfera de proteção da norma de direito fundamental por parte do Estado ou de particulares. Por isso é que são chamados direitos “negativos”. Os direitos fundamentais a uma prestação por parte do titular do direito fundamental subdividem-se em direito a prestações em sentido amplo e direito a prestações em sentido estrito. O direito a prestações em sentido amplo refere-se a toda e qualquer tipo de atuação positiva do Estado que não seja vinculada a sua atuação no sentido social. Estão vinculadas à sua atuação como Estado Democrático de Direito. O direito a prestações, em sentido estrito, divide-se em direito originário a prestações, que são os direitos subjetivos do cidadão fundados diretamente na constituição, e direito derivado a prestações, que são os direitos subjetivos do cidadão fundados em um sistema de normas infraconstitucionais e/ou no sistema de políticas públicas. 2.1.4 Gerações ou Dimensões de Direitos Fundamentais O reconhecimento e a proteção dos direitos fundamentais do homem no mundo alcançou o seu estágio atual de uma forma lenta e gradual, passando por várias fases. Estas etapas da evolução desses direitos são chamadas de gerações, pois foram construídas em diferentes momentos históricos. Os direitos fundamentais de primeira dimensão, contemporâneos do liberalismo político, surgem, no século XVII, como resposta ao absolutismo monárquico e objetivavam proteger o homem na sua esfera individual contra a interferência abusiva do Estado. São direitos de cunho meramente negativo, que visam garantir as liberdades públicas. A primeira geração dos direitos fundamentais, então, corresponderia àqueles direitos básicos dos indivíduos relacionados a sua liberdade - aos direitos individuais considerada em seus vários aspectos. Negavam o Estado no seu poder de interferir nas liberdades individuais, por que este era visto como inimigo para o homem. Tais direitos cuidam da proteção das liberdades públicas, ou seja, os direitos individuais - civis e políticos compreendidos como aqueles inerentes ao homem e que devem ser respeitados por todos os Estados, como o direito à liberdade, à vida, à propriedade, à manifestação, à expressão, ao voto, entre outros. Esta geração encerra os postulados dos cidadãos em face da atuação do poder público, buscando controlar e limitar os desmandos do governante, de modo que este respeite as liberdades individuais da pessoa humana. Os direitos relativos a esta primeira geração significariam, portanto, uma limitação do poder público, um não fazer do Estado. Significam uma prestação negativa em relação ao indivíduo, ou seja, um não-fazer do Estado, em prol do cidadão. Como afirma Alexandre de Moraes 104 , “essas idéias encontravam um ponto fundamental em comum, a necessidade de limitação e controle dos abusos de poder do próprio Estado e de suas autoridades constituídas e a consagração dos princípios básicos da igualdade e da legalidade como regentes do Estado moderno e contemporâneo”. A natureza do comportamento perante o Estado serviu de critério distintivo entre as gerações, eis que os de primeira geração exigiam do Estado abstenções (prestações negativas), enquanto os de segunda exigem uma prestação positiva. A segunda geração, por sua vez, fundada no ideário da igualdade, significa uma exigência ao poder público no sentido de que este atue em favor do cidadão, e não mais para deixar de fazer alguma coisa. Esta necessidade de prestação positiva do Estado corresponderia aos chamados direitos sociais dos cidadãos, direitos não mais considerados individualmente, mas de caráter econômico e social, com o objetivo de garantir à sociedade melhores condições de vida. Significam uma prestação positiva, um fazer do Estado em prol dos menos favorecidos pela ordem social e econômica. 104 MORAES, Alexandre. Direitos Humanos Fundamentais. Ed. Atlas, São Paulo, 2000, 3ª ed, p. 19. Após a 1ª Guerra Mundial, o regime político liberal, caracterizado pela mínima intervenção estatal, entrou em crise. A sociedade passou a exigir um Estado mais atuante, clamando a substituição da Constituição, antes apenas garantista, por uma constituição dirigente, que estabelecessem normas instituidoras de programas governamentais. Surge o Estado do Bem Estar Social. Nesse contexto, surgiram os direitos fundamentais de segunda dimensão, denominados de direitos sociais, econômicos e culturais. Esta geração de direitos guarda estreito vínculo com as condições de trabalho da população, que, com a evolução do capitalismo, se viu necessitada de regular e garantir as novas relações de trabalho, postulando, portanto, salário mínimo digno, limitação das horas de trabalho, aposentadoria, seguro social, férias remuneradas etc. São exemplos destes direitos: direito à saúde, ao trabalho, a assistência social, a educação, liberdade de sindicalização, direito de greve, direito a férias e ao repouso semanal remunerado. E, ainda, a terceira geração, que corresponderia ao terceiro elemento preconizado na Revolução Francesa, a fraternidade, representa a evolução dos direitos fundamentais para alcançar e proteger aqueles direitos decorrentes de uma sociedade já modernamente organizada que se encontra envolvida em relações de diversas naturezas, especialmente aquelas relativas à industrialização e densa urbanização. Nesta situação, outros direitos precisavam ser garantidos, além daqueles normalmente protegidos, uma vez que essas novas relações devem ser consideradas coletivamente. São novos direitos decorrentes de uma sociedade de massas. Por tais razões, ainda são chamados de solidariedade ou fraternidade, voltados para a proteção da coletividade. Nesta terceira geração de direitos fundamentais, pode-se mencionar: o direito ao desenvolvimento, o direito à paz, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, o direito à comunicação, os direitos dos consumidores e vários outros direitos especialmente aqueles relacionados a grupos de pessoas mais vulneráveis (a criança, o idoso, o deficiente físico etc.). Observa-se que os direitos fundamentais até então assegurados, tinham como destinatário o homem, enquanto indivíduo. Já os direitos fundamentais de Terceira Dimensão têm como traço característico o fato de não mais estarem centrados no homem individualmente considerado, mas sim na coletividade. Surgem os direitos coletivos e difusos. Por derradeiro, há uma quarta geração de direitos fundamentais, identificada por vários autores, encabeçados por Paulo Bonavides105, que decorreria da atual globalização desses direitos, tais como a democracia, o direito à informação e ao pluralismo. Os seus defensores argumentam que os direitos fundamentais precisam acompanhar a globalização que, pondo fim as fronteiras geográficas entre os países, exigem sua universalização. O homem não pode mais ser visto “em cada Estado”, mas como entidade universal. Se não há mais fronteiras para as relações políticas, econômicas e sociais é preciso que também não haja fronteiras para os direitos fundamentais. Entretanto, é preciso ressaltar que essa universalização não pode ser instrumento de imposição ou superação de culturas e de minorias. São reputados como direitos de quarta geração o direito a democracia, o direito a informação e o direito ao pluralismo. Vale observar que, embora se fale em gerações, não existe qualquer relação de hierarquia entre estes direitos, mesmo porque todos interagem entre si, de nada servindo um sem a existência dos outros. Esta nomenclatura adveio apenas em decorrência do tempo de surgimento, na eterna e constante busca do homem por mais proteção e mais garantias, com o objetivo de alcançar uma sociedade mais justa, igualitária e fraterna, como defendia Noberto Bobbio 106. 105 106 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. São Paulo: Malheiros, 1999, p.524-526. BOBBIO, Noberto. A Era dos Direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992. 217 p. Tradução de Nelson Coutinho. Por isto, a mais moderna doutrina107 defende o emprego do termo dimensões no lugar de gerações, que onde "não se justifica apenas pelo preciosismo de que as gerações anteriores não desaparecem com o surgimento das mais novas" 108. Tal questão surge pelo fato de os direitos gestados numa geração terem ganhado outra dimensão com o surgimento de uma geração sucessiva. Dessa forma, os direitos da geração posterior se transformam em pressupostos para a compreensão e realização dos direitos da geração anterior. A doutrina faz também a distinção entre as dimensões objetiva e subjetiva dos direitos fundamentais. Por dimensão objetiva entende-se que eles não são meramente direitos subjetivos públicos do cidadão. Em sede de direitos fundamentais, há um complexo de prestações heterogêneas. Nesse sentido, a dimensão objetiva dispõe que os direitos fundamentais expressam uma ordem de valores objetiva, isto é, objetivada na constituição. Em outras palavras, eles saem da ordem axiológica para integrar a ordem objetiva do texto constitucional – os valores se transformam em normas positivadas no sistema constitucional (“ordem de valores objetivados na CR”). Disso decorrem efeitos jurídicos relevantes à ordem jurídica pátria, dentre outros: a) eficácia irradiante dos direitos fundamentais: os valores expressados pelas normas de direitos fundamentais devem impregnar toda a ordem jurídica, devendo a interpretação jurídica do ordenamento legal levar em conta os direitos fundamentais. Surge a idéia de interpretação conforme a constituição, interpretação conforme os direitos fundamentais; 107 Entre outros: GUERRA FILHO, Willis Santiago. Introdução ao Direito Processual Constitucional. Porto Alegre: Síntese, 1999, p. 26; SARLET, Ingo Wolfgand. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998, p. 47; BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 7ª ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 524/525. 108 GUERRA FILHO, Willis Santiago. Obra citada, p. 13. b) função protetiva dos direitos fundamentais: ao Estado incube o dever de proteção dos direitos fundamentais. Em cada norma de direito fundamental há uma norma impositiva, isto é, vinculante aos entes estatais de proteger os direitos fundamentais. Corolários: b.1) proibição de excesso por parte do Estado; b.2) proibição de insuficiência onde o Estado deve alcançar um padrão mínimo de suficiência e satisfação dos direitos fundamentais do cidadão; b.3) obrigação de o Estado tutelar os direitos fundamentais. Nesse sentido, são apreciáveis os ensinamentos de Professor Ingo Wolfgang Sarlet 109: [...] ficando consignado que os direitos fundamentais não se limitam à função precípua de serem direitos subjetivos de defesa do indivíduo contra atos do poder público, mas que, além disso, constituem decisões valorativas de natureza jurídico-objetiva da Constituição, com eficácia em todo o ordenamento jurídico e que fornecem diretrizes para os órgãos legislativos, judiciários e executivos. Em outras palavras, de acordo com o que consignou Pérez Luño, os direitos fundamentais passaram a apresentar-se no âmbito da ordem constitucional como um conjunto de valores objetivos básicos e fins diretivos da ação positiva dos poderes públicos, e não apenas garantias negativas dos interesses individuais, entendimento este, aliás, consagrado pela jurisprudência do Tribunal Constitucional espanhol praticamente desde o início de sua profícua judicatura. Por dimensão subjetiva dos direitos fundamentais entende-se que eles são direitos subjetivos públicos do cidadão. Nesse sentido, eles podem ser exigidos pelo indivíduo contra o particular ou o próprio Estado, inclusive na esfera judicial para sua satisfação. 2.1.5 Direito de Personalidade 2.1.5.1 Conceito e conteúdo 109 SARLET, Ingo Wolfgang – A eficácia dos direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. Inicialmente, observa-se que a jurisprudência pátria tem buscado associar o dano moral como aquele decorrente da lesão ao direito da personalidade, ainda que pouco tenha enfrentado a conceituação de tal questão. Assim, vale observar, por exemplo, a decisão de lavra do insigne Dr. Eduardo Kraemer, analisando a questão de supostos danos morais em decorrência de apontamento indevido de título de crédito. Nesse julgamento, visualiza-se a correta análise de “ausência do próprio dano moral eis não se perceber qualquer agressão à direito de personalidade” 110 , todavia, não é enfrentado, talvez por se ter como despiciendo, o significado e alcance da personalidade. Desta forma, faz-se mister a conceituação de tal direito fundamental, para se aferir a relevante lesão a tal direito, ou seja, para concluir-se pela reparação dos danos, é necessária a existência de relevante lesão a esse conjunto de direitos, somente alcançada com o estudo da própria noção de personalidade. A exemplo de tal questão, verifica-se que o inadimplemento da relação contratual não possui o condão de, per se, ensejar a reparação por danos morais, eis que “só restarão configurados quando demonstrada a efetiva lesão a qualquer dos atributos da personalidade, não se encaixando nesta acepção eventual frustração ou incômodo decorrente do desfazimento dos negócios” 111. 110 A decisão está assim ementada: DANO MORAL. NÃO OCORRÊNCIA. Dois motivos levam a impossibilidade de caracterização do dano moral alegado. A primeira diz respeito a ausência do próprio dano moral eis não se perceber qualquer agressão à direito de personalidade. A segunda razão da impossibilidade de caracterização diz respeito com as inúmeras outras anotações de falta de cumprimento do avençado. Inexiste crédito a ser preservado. Recurso provido. (Recurso Cível Nº 71000965632, Segunda Turma Recursal Cível, Turmas Recursais - JEC, Relator: Eduardo Kraemer, Julgado em 07/06/2006) (grifei). 111 Nesse sentido, vale observar aresto de decisão paradigmática acerca do tema: Consumidor. Compra de automóvel em revenda. Desfazimento do negócio sob a alegação de que o motor fora alterado sem prévia autorização do Detran, o que impossibilitou a transferência do veículo para o adquirente. Distrato concretizado, com devolução do preço e do automóvel. Ressarcimento dos gastos com melhorias no veículo. Recurso do autor para tentar obter a condenação da ré ao pagamento de cláusula penal não pactuada, além de Danos Morais. Em se tratando de contrato verbal, sem previsão de imposição de cláusula penal, descabe a imposição de penalidade pelo desfazimento do negócio. Danos morais inocorrentes, porquanto a mera responsabilidade contratual, salvo situações excepcionais, não gera indenização por ofensa à personalidade. O que se configura são meros transtornos decorrentes da frustração quanto às expectativas do negócio, não ultrapassando a seara do aborrecimento, incapaz de ensejar indenização por danos morais. Sentença mantida. Recurso desprovido. (Recurso Cível Nº 71000667139, Terceira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais - JEC, Relator: Eugênio Facchini Neto, Julgado em 28/06/2005). Todavia, no exame do caso concreto, em especial à luz do direito da personalidade, caberá reparação por danos morais “se os efeitos do inadimplemento contratual, por sua natureza ou gravidade, exorbitarem o aborrecimento normalmente decorrente de uma perda patrimonial e também repercutirem na esfera da dignidade da vítima” 112. Assim, inicialmente pode-se sustentar que a personalidade é a capacidade abstrata para possuir direitos e contrair obrigações na ordem civil. É indissociável da pessoa humana, ainda que os positivistas mais ortodoxos tenham querido vê-la como simples decorrência jurídico-normativa 113 . Afirma-se neste ponto a visão jusnaturalista de que tais direitos são atinentes à própria natureza humana, ocupando posição supra-estatal114, sendo que a positivação vem apenas a garanti-los, dotando-os de coercitividade. Mister é lembrar que no Direito Romano os escravos não eram considerados pessoas, donde concluímos que neste sistema nem todos os seres humanos eram sujeitos dos direitos hoje tutelados como inerentes a esta condição. A legitimidade para o exercício de direitos encontra-se disciplinada no artigo 9º do Código Civil, e não se confunde com a personalidade, cujo início se dá com o nascimento com vida (representado pela primeira respiração do recém-nato). Sua duração coincide com a da vida humana, extingüindo-se com a morte, natural ou presumida (i.e., a ausência). Os direitos da personalidade são inerentes à pessoa humana, cuja individualização faz-se mediante a constatação de seus nome, estado e domicílio. Como disse o mestre Pontes de Miranda 115: Com a teoria dos direitos de personalidade, começou, para o mundo, nova manhã do direito. A princípio, obscura, esgarçando-se em direitos sem 112 DIREITO, Carlos Alberto Menezes e FILHO, Sérgio Cavalieri. Comentários ao Novo Código Civil, Vol. XIII. Rio de Janeiro: Forense, p. 104 113 Diz-nos Kelsen: “a pessoa física (natural) como sujeito de deveres e direitos não é o ser humano cuja conduta é o conteúdo desses deveres ou desses direitos, mas que a pessoa física (natural) é apenas a personificação desses deveres e direitos. (...) a pessoa física é a personificação de um conjunto de normas jurídicas que, por constituir deveres e direitos contendo a conduta de um mesmo ser humano, regula a conduta deste ser”. KELSEN, Hans. Teoria geral do direito e do Estado. São Paulo, Martins Fontes, 1995. 114 Afirma o eminente professor Caio Mário: “O princípio constitucional da igualdade perante a lei é a definição do conceito geral da personalidade como atributo natural da pessoa humana (...)”. PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil, vol.1. Rio de Janeiro, Forense, 1997, p. 153. 115 PONTES DE MIRANDA, F. C. Direitos de personalidade. Tratado de direito privado. Rio de Janeiro: Borsoi, 1954-1969. Tomo 7, livro 1, p. 6. nitidez, com certa construtividade de protoplasma, como lhe argüiu Karl Gareis (...), mas já permitindo a Bluntschli, em 1853, nela fundar o direito de autor, teve a servi-la dezenas de escritores que acuradamente procuraram definir os “direitos da personalidade”, em discussão e material assoberbantes [...]. A despeito disso, em razão da complexidade advinda da natureza intangível de tais direitos, não se obteve uma precisão conceitual e tipológica que esgote todas as controvérsias ainda existentes. Não é possível encontrar na doutrina definição que explique de maneira definitiva sua natureza. Entre os estudiosos pátrios, o Prof. Limongi França define tais direitos como “(...) faculdades jurídicas cujo objeto são os diversos aspectos da própria pessoa do sujeito, bem assim as suas emanações e prolongamentos.” 116 O Prof. Orlando Gomes, ao estudar o tema, desloca a questão da conceituação para o objeto desses direitos, dizendo: Reclama, assim, a definição do direito de personalidade o alargamento do conceito de bem, que lhe reconheça significação diversa do que se lhe atribui em Economia. Em direito, toda utilidade, material ou não, que incide na faculdade de agir do sujeito, constitui um bem, podendo figurar como objeto de relação jurídica, porque sua noção é histórica e não naturalística (...) Nada impede, em conseqüência, que certas qualidades, atributos, expressões ou projeções da personalidade sejam tuteladas no ordenamento jurídico como objeto de direito de natureza especial.117 Para o Prof. Carlos Alberto Bittar os direitos da personalidade devem ser compreendidos como: a) os próprios da pessoa em si (ou originários), existentes por sua natureza, como ente humano, com o nascimento; b) e os referentes às suas projeções para o mundo exterior (a pessoa como ente moral e social, ou seja, em seu relacionamento com a sociedade).118 116 FRANÇA, Limongi. Direitos privados de personalidade: subsídios para a sua especificação e sistematização. Revista dos tribunais, São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 55, n. 370, ago. 1966, p. 08. 117 GOMES, Orlando. Direitos de personalidade. Revista forense, Rio de Janeiro: Forense, ano 62, n. 216, out.nov.-dez. 1966, p. 06. 118 BITTAR, Carlos Alberto. Os direitos da personalidade. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2003, p. 11. Já Pontes de Miranda os conceitua como “todos os direitos necessários à realização da personalidade, à sua inserção nas relações jurídicas. O primeiro deles é o da personalidade em si mesma (...)” 119, distinguindo, portanto, um direito da personalidade como tal, ou seja, o direito que tem a pessoa de adquirir a própria personalidade – surgindo como sujeito de direitos e obrigações no âmbito jurídico –, de outros direitos da personalidade, que caracterizam a ontologia desta após o reconhecimento estatal. Podemos definir estes direitos como aqueles “atinentes à utilização e disponibilidade de certos atributos inatos ao indivíduo, como projeções biopsíquicas integrativas da pessoa humana, constituindo-se em objetos (bens jurídicos), assegurados e disciplinados pela ordem jurídica imperante” 120 . Ou, consoante Gierke, “aqueles que garantem ao sujeito o domínio de uma parte da própria esfera da personalidade” 121 . Trata- se, assim, de direitos cujo objeto são bens jurídicos que se convertem em projeções físicas ou psíquicas da pessoa humana, por determinação legal que os individualiza para lhes dispensar proteção 122 . Desta forma, não se há de confundir o objeto - as projeções que merecem tutela jurídica - com a personalidade. Os direitos da personalidade reputam-se direitos subjetivos privados nãopatrimoniais. De fato, visam a proteger a pessoa em face de todos os demais particulares, sendo oponíveis erga omnes. São necessários, essenciais ao resguardo da dignidade humana, portanto, universais, absolutos, imprescritíveis, intransmissíveis, impenhoráveis e vitalícios. 2.1.5.2 Natureza Jurídica Ao se tratar da natureza jurídica dos direitos da personalidade cabe, primeiramente, determinar se estes podem ser considerados direitos subjetivos. 119 PONTES DE MIRANDA, F. C . Obra citada. p. 13. 120 LOPES, Serpa. Curso de Direito Civil. Rio de Janeiro, Freitas Bastos S. A., 1989, p.205. 121 Gierke apud GOMES, Orlando. Introdução ao direito civil. Rio de Janeiro, Forense, 1983, p.130. 122 GOMES, Orlando. Op. cit., p.131. Os positivistas, como De Cupis e Tobeñas, consideram que devam ser incluídos como direitos de personalidade apenas os reconhecidos pelo Estado, que lhes fornece força jurídica. Argumentam que todos os direitos subjetivos derivam do ordenamento positivo, resultando em sua delimitação pelo Estado em cada caso. 123 Já os jusnaturalistas, como Limongi França, salientam o caráter inato desses direitos 124 . Estes nascem com o indivíduo, e cabe ao direito positivo apenas o seu reconhecimento. Provém de direito supra-estatal, não sendo possível ao Estado negar o seu reconhecimento sem transgredir a própria natureza humana. Esta é a posição predominantemente aceita pelos doutrinadores, e a que mais se coaduna com o desenvolvimento do pensamento jurídico moderno. O Prof. Limongi França 125 os considera direitos de natureza híbrida, já que inseridos entre as liberdades públicas constitucionais (por exemplo, C.F./88, art. 5º, inc. V e X), tutelados pelo direito penal (exemplo: CP, arts. 121, 138, 139, 140, 211, 212, etc.) e também protegidos na esfera civil. Dessa forma, são os bens da personalidade verdadeiros direitos subjetivos, inatos e híbridos, sendo direitos de natureza privada, quando encarados como dever geral de abstenção entre particulares, e direitos públicos, inseridos nas Cartas Políticas como liberdades públicas, quando considerados nas relações entre o Estado e o indivíduo. Estabelecem a própria essência da personalidade, garantindo uma esfera de individualidade sem a qual a própria pessoa se desnatura. Ademais, ao Estado é imposto o reconhecimento e a positivação desses direitos, dotando-os de eficácia sancionatória, sem o que, a despeito de sua existência, poderiam tornar-se ineficazes. Segundo José Afonso da Silva126, “[…] Não são normas de valor supraconstitucional ou de natureza supra-estatal, como querem Duguit e Pontes de Miranda, embora sejam cada vez mais de dimensão internacional […]” 123 Idem, ibidem, p. 05. 124 FRANÇA, Limongi Obra citada, p. 09. 125 FRANÇA, Limongi Obra citada, p. 08. 126 SILVA, José Afonso da. Obra citada, p. 183-184. E o referido mestre prossegue, dizendo que se tratam de normas de direito constitucional, já que se apresentam no corpo do texto constitucional ou sejam parte de “simples declaração solenemente estabelecida pelo poder constituinte”, tendo sua origem e alicerce na soberania popular. 2.1.6 As restrições a direitos fundamentais Impera observar que, com o fito de delinear e apontar qual afetação ao direito da personalidade, enquanto direito fundamental gera o dano moral indenizável, deve-se igualmente apontar até qual ponto estes direitos fundamentais são absolutos. Consabidamente a vida em sociedade gera percalços nas relações entre os sujeitos de direito e mesmo nas relações mais simples pode haver a influência de um na esfera de patrimônio jurídico de outro, mediante o que é de ser perquirido acerca do absolutismo do direito fundamental e como se solucionam tais situações. Luís Roberto Barroso127 já observou que as colisões surgem em virtude de duas razões: […] (i) complexidade e o pluralismo das sociedades modernas levam ao abrigo da Constituição valores e interesses diversos, que eventualmente entram em choque; e (ii) sendo os direitos fundamentais expressos, freqüentemente, sob a forma de princípios, sujeitam-se […] à concorrência com outros princípios e à aplicabilidade no limite possível, à vista de circunstâncias fáticas e jurídicas. 127 BARROSO, Luís Roberto. Colisão entre liberdade de expressão e direitos da personalidade. Critérios de ponderação. Interpretação constitucionalmente adequada do Código Civil e da Lei de Imprensa. Revista Trimestral de Direito Civil, Rio de Janeiro: Padma, v. 4, n. 16, out.- dez./2003, p.64. Ora, pela própria dedução lógica já pode ser depreendido que os direitos, quaisquer que sejam, não podem ser absolutos, sendo passíveis de restrições, cabendo ao estudioso observar em quais situações, a fim de concluir pela ocorrência do dano moral ou não. Desta forma, como restrição deve-se entender qualquer ação ou omissão que afete desvantajosamente o conteúdo de um direito fundamental, reduzindo, eliminando ou dificultando “a vias de acesso ao bem nele protegido e as possibilidades de sua fruição por parte dos titulares reais ou potenciais do direito fundamental”, bem como enfraquecendo “deveres e obrigações, em sentido lato, que da necessidade da sua garantia e promoção resultam para o Estado” 128. Jairo Gilberto Schäfer129 define como restrição a direito fundamental como “[…] a limitação ou diminuição do âmbito material de incidência da norma concessiva, tornando mais estreito o núcleo protegido pelo dispositivo constitucional, interferindo diretamente no conteúdo do direito fundamental que a norma visa proteger”. Faz-se necessário observar que a doutrina130 sustenta que a estrutura do direito fundamental pode ser delineada através de uma circunferência externa chamada de limite imanente ou âmbito de proteção, possuindo dentro de si uma circunferência menor chamada de núcleo essencial ou núcleo duro. A primeira circunferência diria respeito ao que o direito protege, ao que se descobre com base no texto e através de interpretações teleológica e sistemática. O núcleo essencial, por seu turno, seria aquilo sem o que o direito não existe, que não pode ser restringido, justificando uma tutela de proteção mais intensa. Vale assinalar, ainda, a propósito do tema, que a restrição ao direito fundamental pode ocorrer, com base na ponderação, tanto pelo operador do direito no caso 128 NOVAIS, Jorge Reis. As Restrições aos Direitos Fundamentais Não Expressamente Autorizadas pela Constituição. Coimbra: Coimbra Editora, 2003, p. 157. 129 SCHÄFER, Jair Gilberto. Direitos Fundamentais: Proteção e Restrições. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001, p. 61. 130 Ana Paula de Barcellos, embora tratando de princípios fundamentais, traça raciocínio análogo in BARCELLOS, A. P. Alguns parâmetros normativos para a ponderação constitucional. In BARROSO, Luís Roberto. A nova interpretação constitucional – ponderação, direitos fundamentais e relações privadas. Renovar: Rio de Janeiro: 2003. pp. 62-63. concreto como pelo legislador, de uma forma mais abstrata, não sendo o campo dos direitos fundamentais um campo refratário a intervenções legislativas. Prosseguindo na lição de Jairo Gilberto Schäfer131, as restrições podem ser classificadas de duas formas: a) restrições stricto sensu: restrições expressas na própria norma constitucional ou veiculadas através de lei infraconstitucional mediante autorização da Constituição; b) restrições imanentes: restrições que, embora não estajam expressamente descritas na Constituição, decorrem da idéia de sistema constitucional, os denominados limites imanentes aos direitos fundamentais. Com base na estrutura dos direitos fundamentais supramencionada, verifica-se que é aceitável, em determinadas hipóteses, restrição a tais direitos, atendidos os seguintes pressupostos: (1) ocorrer no âmbito do limite imanente do direito fundamental, desde que amparada por um outro valor prestigiado constitucionalmente; (2) tratar-se de matéria sob reserva de lei, não podendo ato administrativo normativo restringir direitos fundamentais; (3) respeitar ao princípio da proporcionalidade, nos três cânones em que o mesmo se desdobra (adequação ou idoneidade, necessidade ou exigibilidade e proporcionalidade em sentido estrito); (4) por fim, não pode atingir o núcleo essencial do direito fundamental. 2.2 Elemento da Personalidade e Dano Moral 2.2.1 Intimidade Em que pese a interligação inerente entre os conceitos de intimidade e privacidade, a maioria dos autores entende existir distinção entre intimidade e vida privada. Neste sentido, o autor Manoel Gonçalves Ferreira Filho132 ressalta que: 131 132 SCHÄFER, Jair Gilberto. Obra citada, pp. 61-62. FILHO, Manoel Gonçalves Ferreira. Comentários à Constituição Brasileira de 1988, 2. ed. São Paulo, Saraiva, 1997.p.35 os conceitos constitucionais de intimidade e vida privada apresentam grande interligação, podendo porém ser diferenciados por meio da menor amplitude do primeiro que se encontra no âmbito de incidência do segundo. Assim, o conceito de intimidade relaciona-se às relações subjetivas e de trato íntimo da pessoa humana, suas relações familiares e de amizade, enquanto o conceito de vida privada envolve todos os relacionamentos da pessoa, inclusive os objetivos, tais como relações comerciais, de trabalho, de estudo, etc. Ora, tanto há a manifestação de diferenças entre tais direitos – o da privacidade e o da intimidade – que a própria Carta Política alberga a diferença entre ambos, constando no rol do inciso X do art. 5º a separação da intimidade de outras manifestações da privacidade. Neste passo impera a busca pela conceituação de separadamente de tais direitos. Prosseguindo na lição de José Afonso da Silva133: “Segundo René Ariel Dotti, a intimidade se caracteriza como ‘a esfera secreta da vida do indivíduo na qual este tem o poder legal de evitar os demais’, o que é semelhante ao conceito de Adriano de Cupis que devine a intimidade (riservatezza) como o modo de ser da pessoa que consiste na exclusão do conhecimento de outrem de quanto se refira à pessoa mesma. Outra definição da intimidade foi bem observada pelo professor Tércio Sampaio Ferraz134: A intimidade é o âmbito do exclusivo que alguém reserva para si, sem nenhuma repercussão social, nem mesmo ao alcance da sua vida privada que, por mais isolada que seja, é sempre um viver entre os outros (na família, no trabalho, no lazer comum). Não há um conceito absoluto de intimidade, embora se possa dizer que o seu atributo básico é o estar só, não exclui o segredo e a autonomia. Neste termos, é possível identificá-la: o diário íntimo, o segredo sob juramento, as próprias convicções, as situações indevassáveis de pudor pessoal, o segredo íntimo cuja mínima publicidade constrange 133 134 SILVA , José Afonso da. Obra citada, p. 208. FERRAZ, Tércio Sampaio. Sigilo de dados: direito à privacidade e os limites à função fiscalizadora do Estado. Revista da Faculdade de Direito de São Paulo, 1993. 2.2.1.1 Dano moral decorrente da exposição da intimidade Acerca da violação de tal esfera do direito da personalidade, vale observar a fundamentação esposada no julgamento do Recurso Especial nº 506437/SP, de lavra do Min. Fernando Gonçalves 135 , onde foi apreciada o dever de indenizar decorrente de publicação equivocada de endereço residencial, equivocadamente, nas páginas amarelas de lista telefônica, ofertando serviços de “massagens”, in verbis: O anúncio erroneamente veiculado representa inequívoco dano, diante da violação ao direito à intimidade da recorrente, que teve publicado seu endereço e telefone residenciais de forma indevida. O direito à intimidade é espécie do gênero "direitos da personalidade" sendo compreendidos como "direitos considerados essenciais à pessoa humana, que a doutrina moderna preconiza e disciplina, a fim de resguardar a sua dignidade" (GOMES, Orlando. Introdução ao direito civil . 18ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 141), de cunho extrapatrimonial. Não se dispensa inteligência superior para verificação do constrangimento e incômodo a que a recorrente esteve exposta, com a publicação (sem autorização) de anúncio mal formulado contendo um nome feminino em uma seção de "massagens" de uma lista telefônica. Em se tratando de direito à intimidade, a obrigação da reparação decorre da própria violação do direito personalíssimo, não havendo de cogitar-se da prova da existência do dano No caso em testilha, verifica-se que a autora da demanda foi erroneamente colocada em situação que expôs seu âmbito de intimidade, na medida em que seu telefone 135 A decisão está assim ementada: RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. VIOLAÇÃO. DIREITOS DA PERSONALIDADE. INTIMIDADE. VEICULAÇÃO. LISTA TELEFÔNICA. ANÚNCIO COMERCIAL EQUIVOCADO. SERVIÇOS DE MASSAGEM. 1. A conduta da prestadora de serviços telefônicos caracterizada pela veiculação não autorizada e equivocada de anúncio comercial na seção de serviços de massagens, viola a intimidade da pessoa humana ao publicar telefone e endereço residenciais. 2. No sistema jurídico atual, não se cogita da prova acerca da existência de dano decorrente da violação aos direitos da personalidade, dentre eles a intimidade, imagem, honra e reputação, já que, na espécie, o dano é presumido pela simples violação ao bem jurídico tutelado. 3. Recurso especial parcialmente conhecido e provido. (REsp 506437/SP; Recurso Especial 2003/0045107-6. Min. Rel. Fernando Gonçalves, Quarta Turma, DJ 06.10.2003 p. 280). residencial foi publicado em meio de comunicação de grande circulação - lista telefônica – como “massagista”. Nesta senda verifica-se que a lesão à intimidade se evidenciou quando a exposição se deu através do telefone residencial da autora da ação, eis que expôs o seu lar, que pode ser bem considerado como o reduto certo de sua intimidade. Assim, restou evidenciada a lesão indenizável ante a exposição indevida da intimidade. 2.2.2 Vida Privada Como já observado anteriormente, no que pese a interligação estreita, não há que se confundir intimidade com vida privada. A vida privada do indivíduo diz respeito a situações de opção pessoal, mas que podem ser limitados e solicitados por terceiros. Também abrange situações que envolvam aspectos onde, de alguma forma, não se admitiria qualquer publicidade ao seu redor, seja na suas relações de trabalho, familiares ou setores da comunidade. A vida privada é definida pelo professor René Ariel Dotti136 da seguinte forma: abrange todos os aspectos que por qualquer razão não gostaríamos de ver cair no domínio público; é tudo aquilo que não deve ser objeto do direito à informação nem da curiosidade moderna que, para tanto, conta com aparelho altamente sofisticados. Novamente é oportuna a definição dada pelo professor Tércio Sampaio Ferraz137 a respeito da vida privada. 136 DOTTI, René Ariel. Proteção da vida privada e liberdade de informação. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1980. 137 FERRAZ, Tércio Sampaio. Obra citada. A vida privada pode envolver, pois, situações de opção pessoal (como a escolha do regime de bens no casamento), mas que, em certos momentos, podem requerer a comunicação a terceiros (na aquisição, por exemplo, de um imóvel). Por aí ela difere da intimidade, que não experimenta esta forma de repercussão. Finalmente, ainda vale consignar a lição de José Afonso da Silva138 que afirma: Parte da constatação de que a vida das pessoas compreende dois aspectos: um voltado para o exterior e outro para o interior. A vida exterior, que envolve a pessoa nas relações sociais e nas atividades públicas, pode ser objeto das pesquisas e divulgações de terceiros, porque é pública. A vida interior, que se debruça sobre a mesma pessoa, sobre os membros de sua família, sobre seus amigos, é a que integra o conceito de vida privada, inviolável nos termos da Constituição. 2.2.2.1 Dano moral decorrente da violação da vida privada Acerca da ingerência sobre a vida privada, bem como sobre a intimidade, verifica-se em especial a oposição da liberdade de imprensa e do direito ao segredo da vida privada, ambos assegurados pela Constituição Federal - a primeira no art. 5º, IV, IX e XIV, e no art. 220; o segundo no art. 5º, X. A exemplo desta questão, verifica-se a situação em tela na demanda movida por Hélio Brito da Silva em face da Empresa Jornalística Santa Marta Ltda, quando esta veiculou reportagens nas quais o nome do recorrente foi associado a vocábulo tido por ofensivo, colhido de boletins policiais de ocorrência. 138 SILVA, José Afonso da. Obra citada, p. 211. Para o STJ 139, ficou evidenciado que a recorrida, ao reproduzir na manchete do jornal o cognome - “apelido” - do autor, atitude que redundou em manifesto proveito econômico, feriu o direito do recorrente ao segredo de sua vida privada, divulgando desnecessariamente o “apelido” repugnado, portanto atuou com abuso de direito, exsurgindo como conseqüência o ferimento ao direito de todo cidadão de manter a vida privada distante do escrutínio público. Segundo entendimento esposado pelo julgador, “a notícia da orientação sexual de determinada pessoa, por si só, não enseja reparação indenizatória, mas, no presente processo, não há dúvidas sobre a indevida agressão ao segredo da vida privada do recorrente porque o cognome do recorrente foi divulgado por toda área de circulação do jornal, além da cidade onde mora”. Ainda é de ser considerada a questão onde o uso da imagem, indevidamente, que per se já enseja o dano moral, e pode também ferir o direito de personalidade insculpido no art. 5º, inc. X da Carta Política, consubstanciado na ingerência sobre vida privada do indivíduo do indivíduo, conforme decisões já esposadas pelo Superior Tribunal de Justiça140. Igualmente impera observar a lição de Yussef Said Cahali 141 , reproduzindo os ensinamentos de Adriano de Cupis, no sentido de ser limitado o direito ao resguardo da vida privada no que pertine às pessoas com notoriedade, que não podem obstacularizar a publicação de sua própria imagem ou a divulgação de acontecimentos da sua vida, em face da preponderância do interesse público sobre o privado, observando que “o povo, assim como 139 A decisão está assim ementada: Direito civil. Indenização por danos morais. Publicação em jornal. Reprodução de cognome relatado em boletim de ocorrências. Liberdade de imprensa. Violação do direito ao segredo da vida privada. Abuso de direito. - A simples reprodução, por empresa jornalística, de informações constantes na denúncia feita pelo Ministério Público ou no boletim policial de ocorrência consiste em exercício do direito de informar. - Na espécie, contudo, a empresa jornalística, ao reproduzir na manchete do jornal o cognome – "apelido" – do autor, com manifesto proveito econômico, feriu o direito dele ao segredo da vida privada, e atuou com abuso de direito, motivo pelo qual deve reparar os conseqüentes danos morais. Recurso especial provido. (REsp 613374/MG; Recurso Especial 2003/0217163-0. Min. Rel. Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJ 12.09.2005 p. 321). 140 Processual civil. Administrativo. Responsabilidade civil do estado. Imagem. Uso indevido. Dano moral. Indenização. Cabimento. 1. Ingerência na vida privada, sem a devida autorização da pessoa, consiste em violar direito de privacidade. 2. Cabe indenização por dano moral pelo uso indevido da imagem que, por se tratar de direito personalíssimo que garante ao indivíduo a prerrogativa de objetar sua exposição, no que se refere à sua privacidade. 3. Recurso especial do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro provido e recurso especial de Daniel Faria Loureiro parcialmente provido. (REsp 440150 / RJ ; RECURSO ESPECIAL 2002/0060956-7, Min. Rel. FRANCISCO PEÇANHA MARTINS, Segunda Turma, DJ 06.06.2005 p. 250). 141 CAHALI, Yussef Said. Obra citada, p.633-634. tem interesse em conhecer a imagem dos homens célebres, também aspira a conhecer o curso e os passos da sua vida, as suas ações e as suas conquistas; e, de fato, só através de tal conhecimento pode formar-se um juízo de seu valor”. Tal mestre ressalta que é legítima a exposição em nome da arte, mas ilícita a exposição romanceada ou dramatizada, eis que desnecessárias para a satisfação do interesse público, qual seja, a obtenção das informações acerca da pessoa pública. Em tal sentido, o REsp 625106142, já em sua ementa, observa que, como já assinalado pelo TJRJ: a limitação do direito de informar, em prestígio a honra e imagem dos indivíduos, sofre uma mitigação quando se trata de pessoa pública, já que esta condição traz para a coletividade o legítimo interesse de conhecer sobre sua vida privada. Porém, este direito mais abrangente concedido aos órgãos de imprensa tem que obedecer a duas condições básicas, sendo a primeira tratar-se de pessoa pública, e a segunda ser a notícia verdadeira. 2.2.3 Honra A honra traz, no seu bojo ontológico, uma noção polimorfa e mutável. Perpassa pelos vários setores da atividade do homem, enfocado isoladamente ou como elemento interferente na sociedade. Fala-se, então, em honra civil, cabente a todo cidadão; em honra política, que favorece o eleitor na situação de candidato ou no exercício de proselitismo partidário; em honra comercial, granjeada com a prática honesta e competente de atividade mercantil ou industrial; em honra profissional, lastreada no longo e eficiente exercício de uma função ou na dignidade que essa proporciona; e em honra artística, verificada através do desempenho, talentoso e sensível, de qualquer das artes. São as indigitadas modalidades, como tantas outras aqui não mencionadas, variações da honra objetiva (a ser tratada adiante). Apresenta a honra, ainda, um atributo proteiforme, porquanto muda de significação à medida que o tempo decorre, e de região para 142 REsp 625106, Min. Rel. Carlos Alberto Menezes Direito - Terceira Turma. DJ 23.06.2005. região. Não é, pois, um conceito hermético e imutável. Pode ser delineado em seus traços gerais e adaptado de acordo com as circunstâncias vertentes em cada caso. Por via de conseqüência, é igualmente amplo o rol de atos atentatórios a que está sujeita143. Mesmo em face do alargado delineamento conceitual que o instituto da honra comporta, pode-se perfeitamente divisar uma bipartição, de interesse prático e didático, em honra individual e honra coletiva. Honra individual consiste no complexo valorativo intrínseco e extrínseco de todo ser humano. Intrínseco, quando os valores pessoais percutem apenas no âmago do indivíduo; e extrínseco, quando tais valores se espargem no meio circundante. A par da honra individual, vislumbra-se a honra coletiva, como expressão de reputação, dignidade ou decoro de um grupo, numericamente determinado ou não, de pessoas ligadas entre si por liames de variada natureza como o profissional, o social, o religioso, o racial etc. Assim é que qualquer ofensa ou ato atentatório à honra coletiva dá ensejo à reparação dos danos materiais e morais144, uma vez que há necessidade de tutelar-se a projeção da categoria ou classe lesionada no respectivo âmbito de atuação. Acerca da questão da honra coletiva, vale observar o caso esposado na ação civil pública proposta pelo Ministério Público Federal contra Paulo G. S. Corrêa e Orlando Macedo Fernandes & Cia Ltda, na qual foi pedida a condenação dos requeridos ao pagamento de indenização por danos morais, em decorrência de publicações no semanário Jornal Cassino, que induziu e incitou a discriminação e o preconceito de etnia indígena. Na apelação cível da aludida ação civil pública, que levou o n° 2003.71.01.001937−0 145, a Rel. Vânia Hack de Almeida, observou que: 143 Segundo Domingos Sávio Brandão Lima “os ataques à honra podem concentrar-se na atribuição ou divulgação de defeitos físicos ou mentais, enfermidades ou doenças, vícios ou conduta imoral, carência ou deficiências culturais, indignidades profissionais ou incompetências científicas ou meras palavras, gestos ou atitudes destinadas a menosprezar ou ferir”. (LIMA, Domingos Sávio Brandão - Injúria grave, em "Enciclopédia Saraiva do Direito", v. 44, p. 258). 144 O dilatado conceito de dano moral, formulado por Limongi França, corrobora tal ilação: “dano moral é aquele que, direta ou indiretamente, a pessoa, física ou jurídica, bem como a coletividade, sofre no aspecto não econômico de seu patrimônio” (FRANÇA, Rubens Limongi. Reparação do dano moral, em Revista dos Tribunais nº 631/29, p. 31). 145 A decisão está assim ementada: ação civil pública. Ofensas contra comunidade indígena. Dano moral coletivo. Majoração. 1. Tendo restado demonstrada a discriminação e o preconceito praticados pelos réus contra grupo indígena Kaingang, é devida indenização por danos moral. É o que se verifica no caso dos autos. Por natureza, trata−se de um ilícito, cujos efeitos atingiram a comunidade indígena. Mensurado individualmente, não daria ensejo à indenização pela pouca importância na esfera de cada membro da comunidade. Contudo, na sua generalidade, leva à sua reparação aos olhos da sociedade. Aliás, segundo Carlos Alberto Bittar Filho146 o dano moral coletivo pode ser definido como "[…]. a injusta lesão da esfera moral de uma dada comunidade, ou seja, é a violação antijurídica de um determinado círculo de valores coletivos". Para ao depois arrematar: "Quando se fala em dano moral coletivo, está-se fazendo menção ao fato de que o patrimônio valorativo de uma certa comunidade (maior ou menor), idealmente considerado, foi agredido de maneira absolutamente injustificável do ponto de vista jurídico: quer isso dizer, em última instância, que se feriu a própria cultura, em seu aspecto imaterial". Buscando o conceito de honra, vale observar os lançados conceitos que fundamentaram a Apelação Cível nº 3.059/91, julgada em 19/11/2001, no TJRJ, tendo por Relator o Des Carlos Alberto Menezes Direito. Embora longo, impõe-se a transcrição do trecho, para facilitar o pleno entendimento aqui baseado: Para os Mazeaud a questão não é nova, pois que o sentimento de honra, que constitui um dos elementos do patrimônio moral, já era conhecido desde tempos muito antigos, sendo que na época da vingança privada, os agravos à honra eram reprimidos mais severamente do que os danos materiais. Os redatores do projeto franco-italiano de obrigações e contratos, por exemplo, cuidaram do dano moral no artigo 85, estipulando que o juiz pode fixar indenização à vítima em caso de lesão corporal, de atentado à sua honra, à sua reputação, ou àquela de sua família, à sua liberdade pessoal, à violação de seu domicílio ou de um segredo que interesse à vítima manter (cf. Mazeaud et Mazeaud, Traité théorique et pratique de la responsabilité civile, p. 4. ed., 1947, v. 1, n. 293 e 297; no mesmo sentido, H. Lalou, Traité pratique de la responsabilité civile, 4. ed., 1949, n. 149). […] 2. O dano moral coletivo tem lugar nas hipóteses onde exista um ato ilícito que, tomado individualmente, tem pouca relevância para cada pessoa; mas, frente à coletividade, assume proporções que afrontam o senso comum. 3. Indenização por danos morais majorada para R$ 20.000,00, a ser suportada de forma solidária por ambos os réus desta ação. (TRF4, AC 2003.71.01.001937-0, Terceira Turma, Relator Vânia Hack de Almeida, publicado em 30/08/2006) 146 BITTAR FILHO, Carlos Alberto. Do dano moral coletivo no atual contexto jurídico brasileiro, Revista de Direito do Consumidor, v. 12, p. 55 apud. MELO, Nehemias Domingos de. Dano moral coletivo nas relações de consumo. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 380, 22 jul. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5462>. Acesso em: 09 out. 2006. Pontes de Miranda afirma, sem meias palavras, que o homem "com os direitos de personalidade, tem a honra como algo essencial à vida, tal como ele a entende: a ofensa à honra pode ferir, por exemplo, o direito de liberdade e o direito de velar a própria intimidade; mas a honra é o entendimento da dignidade humana, conforme o grupo social em que se vive, o sentimento de altura, dentro de cada um dos homens". (Tratado de direito privado, Borsoi, t. LIII, §§ 5.509 e 5.510, t. 26, § 3.108). […] E José Cretella Junior, tratando da honra, reproduz lição de Gian Domenico Pisapia, para o qual "no conceito genérico de honra inclui-se a honra, em sentido específico, consistente no conjunto dos dotes morais, e o decoro, consistente no conjunto dos dotes físicos, intelectuais e sociais. Estes dois conceitos podem entender-se sob duplo aspecto. No sentido subjetivo, a honra e o decoro identificam-se com o sentimento que cada um tem da própria dignidade moral, intelectual, física ou social. Em sentido objetivo, a honra e o decoro identificam-se com a estima e a opinião que os outros têm de uma pessoa, constituindo sua reputação. O sentimento pessoal da honra e do decoro pode ser lesado, pois, com fatos de imediato percebidos pela pessoa, independentemente do reflexo que possam ter na opinião dos outros, isto é, com ofensas pronunciadas perante o sujeito passivo; a reputação, ao contrário, pode ocorrer somente com a divulgação para outros de ofensas que a diminuam" (Comentários à Constituição de 1988, Rio de Janeiro: FU, 1989, v. 1, p. 258). […] Assim, entende a Corte que o apelante deve ser indenizado pelo dano moral que sofreu em decorrência do ato ilícito positivo das apeladas, violador do inciso X do artigo 5º da CF. Finalmente, vale ser observada outra lição de José Afonso da Silva147 que conceitua honra como: […] o conjunto de qualidades que caracterizam a dignidade da pessoa, o respeito dos concidadãos, o bom nome, a reputação. É o direito fundamental da pessoa resguardar essas qualidades. A pessoa tem o direito de preservar a própria dignidade – adverte Adriano de Cupis – mesmo fictícia, até contra ataques da verdade, pois aquilo que é contrário á dignidade da pessoa deve permanecer um segredo dela própria. Esse segredo entre no campo da privacidade, da vida privada, e é aqui onde o direito à honra se cruza com o direito à privacidade. 2.2.3.1 Inscrição indevida nos cadastros de Restrição de Crédito 147 SILVA, José Afonso da Silva. Obra citada, p. 212. Na sociedade atual, verifica-se a corrente prática de abertura de crediários e confecção de carnês com o fito de pagar as mais diversas mercadorias compradas mediante prestações. Igualmente comum, verifica-se a inadimplência dos compradores e sua conseqüente inscrição nos órgão de restrição de crédito. Nestes casos, o apontamento de título ou o aludido cadastro afiguram-se como exercício regular de direito por parte do credor, nos moldes do art do CPC e posição jurisprudencial, onde vale observar a fundamentação da decisão da Apelação Cível nº 70002395002148, de lavra do Des. Clarindo Favretto, do TSRS: Do exame dos autos infere-se que o registro negativo nos cadastros do SERASA do nome da apelante não fora ilegal, ou, pelo menos, não fora suficientemente comprovada a sua ilegalidade, porquanto fora motivado pelo inadimplemento, em três oportunidades, de obrigação assumida por força de contratos de LIS Portfolio, firmado com o Banco réu. Ao inscrever a apelada no banco de dados do órgão do controle do crédito, o Banco o fez amparado no exercício regular de um direito a ele reservado. Não se pode imputar, à toda evidência, ao Banco réu a culpa pelo registro negativo, porquanto fora a própria autora quem dera causa aos fatos. Todavia, há que ser considerada a hipótese do cadastramento ser indevido ou até mesmo abusivo, como não é raro acontecer, sendo que: o injusto ou indevido apontamento no cadastro de ‘maus pagadores’ do nome de qualquer pessoa que tenha natural sensibilidade aos rumores resultantes de um abalo de crédito, produz nessa pessoa uma reação psíquica de profunda amargura e vergonha, que lhe acarreta sofrimento e lhe afeta a dignidade. Essa dor é o dano moral indenizável, e carece de demonstração, pois emerge do agravo na forma latente, sofrendo-a 148 A decisão está assim ementada: Responsabilidade civil. Dano moral. Registro negativo nos cadastros do SERASA. Ilegalidade do ato não demonstrada. Fato constitutivo do direito invocado pela autora não comprovado. Exercício regular de um direito do banco. Compete a autora fazer prova do fato constitutivo do seu direito, pena de insucesso na sua pretensão, conforme inteligência do artigo 333 do CPC. Descabe indenização por dano moral se não demonstrada, sequer, uma causa da ilicitude do ato de registro nos cadastros do SPC, mas demonstrado, ao contrario, ter o banco agido no exercício regular de um direito seu, ante o inadimplemento de obrigação contratual. Sentença confirmada. (Apelação Cível Nº 70002395002, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Clarindo Favretto, Julgado em 01/11/2001) qualquer um que tenha o mínimo de respeito e apreço por sua dignidade e honradez 149. Ora, afigura-se palpavelmente a lesão à honra do indivíduo, a medida em que causa sofrimento e lesão à sua honra e reputação, ou seja, ao valor honra sob o enfoque coletivo, enquanto direito fundamental da personalidade, conforme estudado anteriormente, tanto que tal situação já encontra é pacificada na jurisprudência, como, por exemplo, nos casos das Apelações Cíveis nos 70016134702 150 e 70014856447 151 , ambas do Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Bom exemplo de tal situação, no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, é a argumentação expendida na decisão do Recurso Especial nº 705688152, de lavra do Min. Jorge Scartezzini, veja-se: 149 JTJ 170/35 150 A decisão está assim ementada: APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INSCRIÇÃO INDEVIDA. QUANTUM INDENIZATÓRIO REDUZIDO. 1. DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO. Evidenciada a ilicitude do ato praticado pela demandada, que lançou o nome do autor no SPC, por dívida oriunda de terminais de telefonia instalados sem a sua anuência, causando lesão a sua honra e reputação, caracterizado está o dano moral puro, exsurgindo, daí, o dever de indenizar. Condenação mantida. […] APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. (Apelação Cível Nº 70016134702, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Paulo Roberto Lessa Franz, Julgado em 17/08/2006) 151 APELAÇÃO CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. DÍVIDA PAGA. INSCRIÇÃO NO SPC/SERASA. MANUTENÇÃO. QUANTUM INDENIZATÓRIO. PREQUESTIONAMENTO. A indevida inscrição ou manutenção no SPC gera direito à indenização por dano moral, independentemente da prova objetiva do abalo à honra e à reputação, sofrida pelo autor, que se permite, na hipótese, presumir, gerando direito a ressarcimento que deve, de outro lado, ser fixado sem excessos, evitando-se enriquecimento sem causa da parte atingida pelo ato ilícito. Impossibilidade de utilização do salário mínimo como critério de correção monetária. Inconstitucionalidade declarada pelo STF. NEGARAM PROVIMENTO AO APELO. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70014856447, Décima Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Alexandre Mussoi Moreira, Julgado em 29/06/2006) 152 A decisão está assim ementada: RESPONSABILIDADE CIVIL - EXTRAVIO DE TALÃO DE CHEQUES SÚMULA 7/STJ. - DANOS MORAIS - QUANTUM – REDUÇÃO 1. A questão atinente à ocorrência do dano e ao nexo de causalidade refoge ao âmbito do recurso especial, porquanto importaria em reexame fático, obstado pelo enunciado da Súmula 7/STJ. O Tribunal a quo entendeu que restou comprovado "o nexo causal entre o ato (furto do talonário) e o dano causado ao autor (vários constrangimentos e transtornos, especialmente a inclusão no SPC e a negativa de concessão de crédito, como muito bem descritos na sentença)". 2. Precedentes desta Corte, a propósito da responsabilidade civil da instituição bancária decorrente do extravio de talões de cheques: REsp 684.150/RS, REsp 126.819/GO, REsp 241.771/SP. 3. O dano moral decorre do próprio ato lesivo de inscrição indevida junto aos órgãos de proteção ao crédito, "independentemente da prova objetiva do abalo à honra e à reputação sofrida pelos autores, que se permite, na hipótese, facilmente presumir, gerando direito à ressarcimento" (Cf. REsps nsº: 110.091/MG; 323.356/SC; 165.727/DF) 4. Recurso especial conhecido em parte e parcialmente provido para reduzir o valor indenizatório a um patamar mais adequado à espécie. (REsp 705688/RS; Recurso Especial 2004/0167015-1. Min. Rel. Jorge Scartezzini, Quarta Turma, DJ 14.11.2005 p. 340) Não procede, tampouco, a afirmação de ausência de danos, porquanto a simples inscrição indevida do nome do recorrido no cadastro de devedores já é suficiente para gerar dano reparável. De fato, consoante jurisprudência firmada nesta Corte, o dano moral decorre do próprio ato lesivo de inscrição indevida junto aos órgãos de proteção ao crédito, "independentemente da prova objetiva do abalo à honra e à reputação sofrida pelos autores, que se permite, na hipótese, facilmente presumir, gerando direito à ressarcimento" (Cf. REsps nsº: 110.091/MG, Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, DJ. 28.08.00; 196.824, Rel. Min. César Asfor Rocha, DJ. 02.08.99; 323.356/SC, Rel. Min Antônio de Pádua Ribeiro , DJ. 11.06.2002; 165.727/DF, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira DJ 21.09.98.) 2.2.4 Imagem É importante destacar que o direito à imagem é um direito autônomo153, pois embora possa ser conexo a outros bens, como a intimidade, a identidade, a honra, não constitui parte integrante desses. Com efeito, é possível ofender-se a imagem sem atingir a intimidade e a honra. Ademais, o direito à imagem possui uma característica particular, qual seja a disponibilidade. Dessa forma, se do interesse do indivíduo, pode ele explorar a própria imagem. Entretanto, outrem não poderá dispor da imagem alheia, sem a devida autorização. O direito à imagem reveste-se de características comuns aos direitos da personalidade, sendo inalienável, impenhorável, absoluto, imprescritível, irrenunciável e intransmissível, vez que não pode se dissociar de seu titular. Contudo, apresenta uma peculiaridade: a disponibilidade, isto é, a possibilidade de o indivíduo usar livremente a sua própria imagem ou impedir que outros a utilizem. 153 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: parte geral. v.1. São Paulo: Saraiva, 2003, p.171 Segundo a lição de Otávio Piva154 “a imagem da pessoa constitui uma forma do direito à intimidade e adquire principal importância a partir da invenção da fotografia e sua conseqüente publicação nos meios de imprensa”. No mesmo sentido, segundo Aurélio Buarque de Holanda Ferreira155, imagem “é aquilo que evoca uma determinada coisa, por ter com ela relação simbólica; símbolo”. Dessa forma, compreende-se por “imagem” não apenas a representação física da pessoa, mas todos os caracteres que a evocam. 2.2.4.1 Dano moral decorrente do uso indevido da imagem Para que se perpetre a lesão ao direito fundamental em tela, basta a utilização indevida da imagem de outrem, sem a devida autorização – mediante paga ou não – com ou sem caráter ofensivo ao titular de tal direito. Explico, a imagem divulgada do sujeito não carece afigurar-se como vexatória ou imprópria, bem como não necessita que se adentre no âmbito da intimidade ou da vida privada do mesmo, como, por exemplo, a coleta de imagem de casal mantendo relações sexuais, bastando para ensejar a indenização o simples uso indevido da imagem, ainda que tenha sido veiculada imagem “positiva”, como exercício de benemerência ou serviços comunitários. Cumpre observar que o uso indevido da imagem de um sujeito é passível de ensejar indenização por danos materiais – como no caso de uso comercial da imagem – cumulada com o dano moral, ante a simples utilização indevida da imagem. 154 PIVA. Otávio. Comentários ao artigo 5º.da Constituição Federal de 1988. 2ª ed. Porto Alegre: Sagra Luzzatto, 2000, p. 25. 155 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. 1ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, p. 742. Coaduna com tal posicionamento a explicação de José Afonso156 sustentando que: a inviolabilidade da imagem da pessoa consiste na tutela do aspecto físico, como é perceptível visivelmente, segundo Adriano de Cupis, que acrescenta: ‘Essa reserva pessoal, no que tange ao aspecto físico – que, de resto, reflete também na personalidade moral do indivíduo -, satisfaz uma exigência espiritual de isolamento, uma necessidade eminentemente moral. É a seguinte a fundamentação do ilustre Ministro Carlos Velloso no julgamento do RE 215.984-RJ, que, mesmo longa, vai transcrita como segue: Destaco do parecer da Procuradoria-Geral da República, às fls. 211/216, lavrado pela ilustre Subprocuradora-Geral, Dra. Helenita Caiado de Acioli: (...) 3. No caso, parecem pertinentes as razões da irresignação. 4. A Constituição Federal assegura no art. 5º, inciso X, a inviolabilidade da imagem das pessoas e a indenização pelos danos materiais e morais decorrentes de sua violação. 5. Não se trata, evidentemente, de discutir aqui a cumulatividade do dano material com o dano moral, questão superada com o atual texto constitucional, nem de reexame de fatos ou provas, mas sim, definir o sentido e o alcance da norma maior, garantidora do direito de imagem e de reparação no caso de sua violação, uma vez que o acórdão recorrido entendeu que a publicação de fotografias da recorrente, por não ofender a sua reputação, não gerava reparação por danos morais. […] 7. O eminente Ministro Rafael Mayer ao relatar o RE 95.872, mesmo antes da nova Constituição, já afirmava: 'O dever de indenizar decorre da simples utilização de um direito personalíssimo, o da imagem' (in Jurisprudência Brasileira, vol. 95, p. 95)' 8. Na hipótese sub judice a recorrente, artista consagrada, teve sua fotografia publicada sem o seu expresso consentimento ou contratação, em violação à norma constitucional, que protege e garante o direito à própria imagem (CF/88, art. 5º, X). Sem dúvida, a imagem da atriz é um produto que lhe pertence e foi obtido ao longo de sua carreira, compõe seu patrimônio econômico e, não poderá ser utilizado sem a sua anuência, ou contrato, principalmente em revistas, com evidente cunho publicitário. Daí o constrangimento e o sentimento de revolta e indignação da recorrente a caracterizar o dano moral. 9. O dano moral envolve conceito inerente ao sentimento, sendo desnecessário que ofenda a reputação, como equivocadamente entendeu o v. 156 SILVA, José Afonso da. Obra citada, p. 212. acórdão recorrido. Existe, sim, uma agressão moral, se considerada a imagem como um dos direitos da personalidade, a ser compensada satisfatoriamente. […] - A publicação desautorizada de imagem exclusivamente destinada a certa revista, em veículo diverso do pretendido, atinge a honorabilidade da pessoa exposta, na medida em que experimenta o vexame de descumprir contrato em que se obrigou à exclusividade das fotos. - A publicação de imagem sem a exclusividade necessária ou em produto jornalístico que não é próprio para o contexto, acarreta a depreciação da imagem e, em razão de tal depreciação, a proprietária da imagem experimenta dor e sofrimento.' (REsp nº 270.730-RJ, Rel. emin. Ministra Nancy Andrighi, in DJ de 07.5.01) 12. Destarte, sobressai na exegese do art. 5º, inciso X da Constituição de 1988, que o uso de fotografia sem autorização, no caso em apreço, gera não só o dever de reparar por danos materiais, como o de compensar por danos morais, considerando que são cumuláveis as duas indenizações, por violação ao direito de imagem, independentemente de ser afetada ou não a reputação da vítima. […] (fls. 212/216) Correto o parecer. O acórdão recorrido entendeu indevida a reparação por dano moral ao fundamento de que a recorrente não teria sofrido "nenhum abalo em sua reputação ou constrangimento moral pelo uso indevido das fotografias" (fl. 153). Todavia, a Constituição é expressa: "são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação" (C.F., art. 5º, X). É dizer, a Constituição não exige a ocorrência de ofensa à reputação na reparação do dano moral. Na verdade, o Tribunal a quo emprestou ao dano moral caráter restritivo, o que não se coaduna com a forma como a Constituição o trata, no inc. X do art. 5º. O que precisa ser dito é que, de regra, a publicação da fotografia de alguém, com intuito comercial ou não, causa desconforto, aborrecimento ou constrangimento ao fotografado, não importando o tamanho desse desconforto, desse aborrecimento ou desse constrangimento. Desde que ele exista, há o dano moral, que deve ser reparado, manda a Constituição (art. 5º, X). […] No que toca à publicação de fotografias, sem o consentimento do fotografado, doutrina e jurisprudência são no sentido da ocorrência de dano moral que deve ser reparado. Leciona Yussef Said Cahali que, "em linha de princípio, a utilização de imagem constitui direito exclusivo e personalíssimo, inerente à reserva de governo sobre a própria pessoa, quer para dispor, como para impedir a liberação a terceiros, mediante paga ou não; a violação desse direito dá ensejo à correspondente indenização, seja perpetrada com intuito de propaganda lucrativa, seja para difamar". E acrescenta: "sob tal aspecto, é válido dizer-se, com Demongue, que 'le fait d'exposer le portrait d'une personne contre sa volonté peut donner lieu à indemnité'." E vai o ilustre autor ao caso específico: "Do mesmo modo, afirma-se, em reiterada jurisprudência, ser indenizável o dano causado pela reprodução não consentida da imagem da pessoa em material publicitário ou de natureza promocional de atividade especulativa" (Yussef Said Cahali, "Dano Moral", Ed. Rev. dos Tribs., 2ª ed., 1998, págs. 549 e 551). Resta bem ilustrado, entre os demais fundamentos, que “a Constituição não exige a ocorrência de ofensa à reputação na reparação do dano moral”, ou seja, a lesão ao direito de imagem não necessita estar comungada com lesão à honra, ou qualquer outro direito fundamental, como já esposado em diversas decisões da aludida Corte, como, por exemplo, no julgamento do Recurso Especial nº 267529/RJ, Min. Rel. Sálvio de Figueiredo Teixeira, Quarta Turma, DJ 18.12.2000 p. 208 157. 157 A decisão está assim ementada: Direito à imagem. Corretor de seguros. Nome e foto. Utilização sem autorização. Proveito econômico. Direitos patrimonial e extrapatrimonial. Locupletamento. Dano. Prova. Desnecessidade. Enunciado n. 7 da súmula/stj. Indenização. Quantum. Redução. Circunstâncias da causa. Honorários. Condenação. Art. 21, cpc. Precedentes. Recurso provido parcialmente. I - O direito à imagem reveste-se de duplo conteúdo: moral, porque direito de personalidade; patrimonial, porque assentado no princípio segundo o qual a ninguém é lícito locupletar-se à custa alheia. II - A utilização da imagem de cidadão, com fins econômicos, sem a sua devida autorização, constitui locupletamento indevido, ensejando a indenização. III - O direito à imagem qualifica-se como direito de personalidade, extrapatrimonial, de caráter personalíssimo, por proteger o interesse que tem a pessoa de opor-se à divulgação dessa imagem, em circunstâncias concernentes à sua vida privada IV - Em se tratando de direito à imagem, a obrigação da reparação decorre do próprio uso indevido do direito personalíssimo, não havendo de cogitar-se da prova da existência de prejuízo ou dano. O dano é a própria utilização indevida da imagem, não sendo necessária a demonstração do prejuízo material ou moral. V - A indenização deve ser fixada em termos razoáveis, não se justificando que a reparação venha a constituir-se em enriquecimento sem causa, com manifestos abusos e exageros, devendo o arbitramento operarse com moderação, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso. VI - Diante dos fatos da causa, tem-se por exacerbada a indenização arbitrada na origem. VII Calculados os honorários sobre a condenação, a redução devida pela sucumbência parcial resta considerada. VIII - No recurso especial não é permitido o reexame de provas, a teor do enunciado n. 7 da súmula/STJ. CONCLUSÃO A Constituição Federal de 1988 consagrou o dever de reparar integralmente o dano moral e a jurisprudência pátria tem buscado a constante associação do dano moral à efetiva lesão ao direito da personalidade. Todavia, no que pese tal associação, averiguou-se que as decisões acerca da questão, em geral, não apresentam a análise da violação de tal direito fundamental, quando da aferição do dever de indenizar. A partir de tal constatação, construiu-se a presente monografia. Observou-se que o dano moral pode ser considerado como aquela lesão que efetivamente atinge a carga patrimonial imaterial do sujeito de direitos, em especial o conjunto de direitos que constituem a personalidade deste, tendo como fundamentos legais para a reparação, primordialmente a Constituição Federal de 1988, com ênfase no preâmbulo, artigos 1º e 5º, bem como o Código Civil de 2002 e seu antecessor de 1916. Analisando os direitos fundamentais, entendidos como os núcleos invioláveis de uma sociedade, verificaram-se suas características, dimensões ou gerações e classificações, com a finalidade de analisar o direito da personalidade. Superadas as análises iniciais sobre o direito da personalidade, da análise das esferas da personalidade constantes no inc. X do art. 5º da Constituição – intimidade, vida privada, honra e imagem – foi aferido a amplitude de cada uma delas e a reparabilidade das suas lesões. Neste sentido, a intimidade pôde ser entendida como o como a esfera mais restrita do ser humano, de acesso “exclusivo” de seu titular, decorrendo o dever de reparar da a intromissão ou exposição de tal círculo de direitos e valores pessoais. Por sua vez, a vida privada foi definida com base na oposição à vida pública, representado um conjunto de valores pessoais mais amplos do que a intimidade, e por isso passível de repercussão no âmbito público, em conformidade com a necessidade gerada pela situação. Tal esfera da personalidade apresentou grande contato e limitações, principalmente quando defrontada com o direito fundamental da liberdade de imprensa, devendo para a apreciação do dano moral, nestes casos, a precípua análise sob o enfoque da proporcionalidade. Por foi entendido como o “complexo valorativo intrínseco e extrínseco de todo ser humano”, bem como a “expressão de reputação, dignidade ou decoro de um grupo”. Neste caso, são passíveis de indenização por dano moral, todos os atos atentatórios contra a dignidade da pessoa, o respeito dos concidadãos, o bom nome, a reputação, por exemplo. Finalmente, observou-se o direito da personalidade consubstanciado no direito à imagem. Tal direito apresentou como característica mais marcante a possibilidade de disposição e até exploração comercial de tal atributo. Em tal circunstância, o dever de reparar decorre tão-somente do uso indevido ou não autorizado da imagem, com ou sem fim lucrativo, independentemente de tal utilização ferir outro atributo da personalidade, tal como a intimidade ou a vida privada. Assim, verificou-se que o dano moral somente será efetivo quando a conduta do agente lesionar o direito da personalidade ou, em hipótese de conflito de direitos, a conduta não atingir o núcleo essencial de tal direito, em qualquer das suas esferas: intimidade, vida privada, honra ou imagem. Por tais razões, conclui-se que se deve analisar a questão do dano moral sob o mais amplo enfoque concedido pela disciplina do constitucional, à luz dos direitos fundamentais, a fim de evitar caráter de locupletamento ilícito, e ao mesmo tempo contemplar a reparação do dano havido, em seu duplo caráter: reparador e pedagógico. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALVIM, Agostinho. Da inexecução das obrigações e suas conseqüências. São Paulo: Saraiva, 1980. ARAÚJO, Luiz Alberto David e Vidal Serrano Nunes Junior. Curso de Direito Constitucional, 5a edição. BARCELLOS, Ana Paula de. Alguns parâmetros normativos para a ponderação constitucional. In BARROSO, Luís Roberto. A nova interpretação constitucional – ponderação, direitos fundamentais e relações privadas. Renovar: Rio de Janeiro: 2003. BARROSO, Luís Roberto. Colisão entre liberdade de expressão e direitos da personalidade. Critérios de ponderação. Interpretação constitucionalmente adequada do Código Civil e da Lei de Imprensa. 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