Carta Mensal Opus Gestão de Recursos

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Publicação Mensal, Maio 2016
Carta Mensal Opus Gestão de Recursos
Conjuntura Macroeconômica – por José Marcio Camargo
•Professor do Departamento de Economia da PUC/Rio. Sócio e economista chefe da Opus Gestão de Recursos.
Diante do aperto das condições financeiras mundiais, gerado pelo início do
processo de normalização da política monetária nos Estados Unidos em
dezembro de 2015, o Federal Reserve (Fed) decidiu manter a taxa básica de
juros do país inalterada desde então. Durante esses seis meses, à medida
que os indicadores econômicos mostravam sinais de melhora (crescimento
do PIB, redução do desemprego e inflação aproximando-se da meta de 2,0%
ao ano), um número cada vez maior de diretores do Federal Reserve passou
a manifestar desconforto com o nível “excessivamente” baixo das taxas de
juros, em claro desacordo com a posição da presidente da instituição, Janet
Yellen.
A ata da última reunião do FOMC, assim como as declarações recentes de
Yellen indicam que a resistência a um novo aumento da Fed Funds parece
estar chegando ao fim. Com isso, aumentou significativamente a
probabilidade de que a próxima elevação ocorra nas reuniões de junho ou
julho de 2016, o que pressionaria as taxas de juros e o valor do dólar,
principalmente perante o euro e as moedas emergentes. A grande dúvida é
como irão reagir os mercados financeiros diante de novo aumento da taxa
de juros nos Estados Unidos (caso ele efetivamente ocorra).
Com a valorização do dólar e os sinais de desaceleração da economia, o
Banco Central da China (PBoC) intensificou o processo de desvalorização do
yuan perante o dólar, o que, a nosso ver, indica dois objetivos. Primeiro,
evitar que a desvalorização das moedas asiáticas, que deverá acompanhar a
valorização do dólar, gere valorização do yuan perante os principais
competidores externos do país. Segundo, sinalizar a dificuldade do governo
chinês em implementar as reformas indispensáveis para evitar a tendência à
desaceleração da atividade e à estagnação da economia no longo prazo.
A desaceleração da economia chinesa decorre do excesso de
investimentos, da má alocação de capitais e do excesso de endividamento
das empresas, resultado da política anticíclica adotada pelo governo em
resposta à crise financeira de 2008/2009. Aumentar a participação do
consumo, diminuir o endividamento e a capacidade ociosa, via fechamento
de empresas mais endividadas e menos produtivas (empresas estatais, em
geral), será fundamental para evitar que o processo de desaceleração se
intensifique e se transforme em estagnação com deflação, como ocorreu
com a economia japonesa desde o início dos anos noventa. O problema é
que as resistências políticas parecem estar dominando o cenário, o que
deixa a desvalorização cambial como único instrumento capaz de evitar a
desaceleração, sem tornar ainda mais graves os desequilíbrios descritos.
Uma importante restrição que irá dificultar a tentativa de manter a taxa de
câmbio chinesa alinhada aos movimentos das moedas asiáticas é a forte
tendência à fuga de capitais desde meados de 2015. Ainda que tal tendência
tenha arrefecido desde janeiro, ela está longe de desaparecer e, com a
expectativa de desvalorização do yuan, poderá retornar com intensidade.
Finalmente, um fator adicional de risco no cenário internacional é o
plebiscito no Reino Unido (23/06) sobre a permanência, ou não, do país na
União Europeia. Um resultado negativo (contra a permanência) deverá gerar
desvalorização da libra e do euro perante o dólar, e irá introduzir um fator
desestabilizador da União Europeia. Ao criar um precedente, poderá
incentivar outros países a seguirem na mesma direção, dependendo das
concessões a serem feitas ao Reino Unido após a saída da União Europeia.
Tal cenário teria o efeito de reforçar as tendências recessivas e
deflacionárias já existentes. As pesquisas têm mostrado um pequeno
favoritismo pela permanência, mas a diferença entre o sim e o não é muito
pequena para dar segurança aos investidores.
No Brasil, a discussão sobre o impeachment da presidente Dilma Rousseff
e a posse do novo governo provisório dominaram o cenário. A abertura do
processo no Senado, aprovada por 55 votos (o que seria suficiente para
destituir a presidente), bem como a posse do novo governo não trouxeram
tranquilidade. A composição da nova equipe econômica foi um ponto
bastante positivo, mas as turbulências políticas começam a preocupar. A
queda de dois ministros em menos de 30 dias, em decorrência de
declarações referentes à operação Lava-jato gravadas clandestinamente e
divulgadas logo após a posse dos mesmos, certamente não ajudou a dar
tranquilidade aos investidores.
De um lado, existe a percepção de que as turbulências políticas poderão
dificultar bastante a aprovação das reformas impopulares, mas
indispensáveis para recolocar a economia brasileira nos trilhos, como a
reforma da previdência, o projeto de limite dos gastos públicos etc. De
outro, alguns agentes começam até mesmo a recear a possibilidade de que o
impeachment não seja definitivamente aprovado, com o consequente
retorno da presidente ao cargo, o que, pelo menos neste momento, nos
parece muito pouca provável. A questão é que, com tal ambiente político, e
com a cúpula do PMDB no Senado ameaçada pela possibilidade do
aparecimento de novas gravações que venham a comprometê-la ainda mais,
a confiança dos investidores fica altamente abalada. O movimento dos
preços dos ativos financeiros desde a posse do novo presidente
(desvalorização do real perante o dólar e queda dos preços das ações)
reflete toda essa perplexidade diante da cena política.
A proposta do limite de crescimento dos gastos públicos atrelado à
inflação passada foi recebida com otimismo cauteloso pelos investidores.
Por um lado, força a manutenção do gasto público constante em termos
reais, caso a inflação permaneça constante ao longo do tempo. Nesse caso,
sempre que o PIB tiver crescimento real, a relação dívida/PIB tende a cair.
Entretanto, caso a inflação mostre trajetória de queda, os gastos são
reajustados pela inflação passada e o PIB segue a inflação presente,
causando pressão sobre a relação dívida/PIB. Por outro lado, a proposta
gera um aumento do gasto como proporção do PIB quando a economia está
em recessão, como nos últimos dois anos. Finalmente, com hipóteses
realistas quanto a inflação e crescimento, seria mantida a trajetória de
crescimento da relação dívida/PIB pelo menos até 2024, quando atingiria
níveis muito próximos a 100%, algo bastante arriscado. Tudo considerado, o
consenso é que as medidas anunciadas são um bom começo, a aprovação da
DRU foi um ganho importante, mas a aprovação dos aumentos dos
funcionários públicos, que irá significar um aumento de gastos da ordem de
R$ 60 bilhões, vai em direção contrária ao ajuste fiscal necessário. Em suma,
algo mais consistente será necessário para acalmar totalmente os
investidores.
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