LÍLIA MAÍSE DE JORGE AVALIAÇÃO COGNITIVA DE INDIVÍDUOS

Propaganda
LÍLIA MAÍSE DE JORGE
AVALIAÇÃO COGNITIVA DE INDIVÍDUOS AUTISTAS:
INTELIGÊNCIA, ATENÇÃO E PERCEPÇÃO
ITATIBA
2010
i
LÍLIA MAÍSE DE JORGE
AVALIAÇÃO COGNITIVA DE INDIVÍDUOS AUTISTAS:
INTELIGÊNCIA, ATENÇÃO E PERCEPÇÃO
Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu
da Universidade São Francisco para obtenção do título de
Doutora em Psicologia.
ORIENTADORA: PROFA. DRA. Acácia Aparecida Angeli dos Santos
ITATIBA
2010
ii
155.454
J71a
Jorge, Lília Maíse de.
Avaliação cognitiva de indivíduos autistas: inteligência,
atenção e percepção / Lília Maíse de Jorge. -- Itatiba, 2010.
230 p.
Tese (doutorado) – Programa de Pós-Graduação
Stricto Sensu em Psicologia da Universidade São Francisco.
Orientação de: Acácia Aparecida Angeli dos Santos.
1. Autismo. 2. Avaliação cognitiva. 3. Avaliação
psicológica. 4. Funcionamento cognitivo. I. Santos, Acácia
Aparecida Angeli dos. II. Título.
Ficha catalográfica elaborada pelas bibliotecárias do Setor de
Processamento Técnico da Universidade São Francisco.
iii
iv
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho a algumas pessoas que fizeram e fazem parte da minha formação de
maneira tão especial, que eu não poderia deixar de lhes oferecer este produto, considerado
hoje o mais importante para mim.
Aos meus queridos pais (in memorian), ofereço o que eu sei que seria um orgulho para eles,
caso estivessem ainda aqui comigo. O sacrifício do investimento que vocês fizeram e o
cuidado que tiveram com a minha educação estão impressos, como forma de
agradecimento, em cada letra deste trabalho.
À minha querida professora e amiga Dra. Maria Júlia Ferreira Xavier Ribeiro, ofereço mais
esta produção, que continua sendo o reflexo daquilo que você fez por mim, um dia, e que
com palavras eu até tento, mas não consigo agradecer.
Ao professor Dr. Norberto Rodrigues (in memorian), grande incentivador do meu trabalho
e responsável por boa parte do meu conhecimento. Onde quer que você esteja, saiba que
tudo o que você me ensinou está sendo aplicado com cada criança que se coloca sob meus
cuidados.
v
AGRADECIMENTOS
Cinco anos de engajamento com um projeto que se transformou em tese de doutorado não
poderiam resultar em uma lista pequena de agradecimentos. Foram tantas as pessoas
envolvidas para a efetivação desta pesquisa que é possível vê-la como um quebra-cabeças,
cujas peças foram colocadas gradativamente por essas pessoas especiais, a fim de que o
todo fizesse sentido. O agradecimento que existe em meu coração eu gostaria que se
transformasse em bênçãos para cada um desses parceiros que se dispuseram a me ajudar na
concretização deste sonho.
À Professora Dra. Acácia Santos, minha orientadora, eu quero que receba acima de tudo a
minha gratidão eterna. Talvez a senhora não saiba o que significou para mim a sua ajuda, o
seu incentivo e a sua aposta na minha capacidade para completar este trabalho. Não fosse a
sua determinação, seu amparo e dedicação, eu não teria conseguido cumprir esta tarefa.
Foram muitos os percalços, mas a senhora não me deixou esmorecer e me deu diretrizes
corretas para a mudança de planos e para a adequação do trabalho àquilo que seria possível
fazer. Desde o início aceitou a minha proposta de investigar sobre autismo, mesmo não
sendo esta a sua área de pesquisa. Sempre atenta, enviava-me os artigos recentes sobre o
assunto e colocava-me a par de questões referentes ao tema. Na finalização do trabalho,
dedicou seu tempo de férias para me receber em sua casa e orientar-me naquilo que era
necessário fazer. Tenho muito orgulho da sua parceria neste trabalho e reverencio sua
competência profissional. Muito obrigada!
À Dra. Luciana Glazier, minha amiga do hemisfério norte, pessoa diferenciada e iluminada.
Quero agradecer por tudo o que você fez por mim, desde a escuta às minhas questões, o
oferecimento de ideias, de informações e de pesquisa de dados, até os incentivos, o
vi
acolhimento das reclamações, o compartilhamento de decepções diante das burocracias que
envolvem a execução de uma pesquisa. Agradeço também ao Charles e às babies por me
deixarem roubar um pouquinho da sua atenção, em momentos que foram muito importantes
para mim. Deus lhes pague!
À Dra. Rose Mattos, minha irmã de alma, agradeço a amizade sincera, os conselhos, as
sugestões sempre pertinentes e maduras ao longo do curso. Agradeço, sobretudo sua ajuda
ao término deste trabalho, oferecendo seu tempo precioso para me ajudar. Você bem sabe
que sem isso eu não conseguiria dar conta de tudo sozinha. Esse seu gesto está registrado
em mim, tanto em forma de aprendizado em relação a uma série de coisas, quanto em
forma de profundo agradecimento. Muita Luz para você, sempre!
À Professora Dra. Geraldina e ao Professor Dr. Burity, pelas aulas preciosas ministradas,
que me ajudaram a refletir muito sobre o compromisso que se deve ter com a ciência.
A todos os professores do Curso de Pós-graduação Stricto Sensu da Universidade São
Francisco, e em especial àqueles com quem mais tive contato: Prof. Fermino, Profa. Ana
Paula, Profa. Alessandra, Profa. Cristina e Prof. Ricardo, agradeço o acolhimento, o carinho
e o aprendizado. Ao Prof. Makilin, agradeço a boa vontade em me enviar um texto
referente ao assunto de minha tese.
Ao Dr. Rami Grossmann, autor da escala que utilizei neste estudo, agradeço por ter
permitido, de forma tão gentil, a tradução e o uso de seu instrumento na pesquisa.
Ao Centro de Pesquisa Bibliográfica da UNITAU, pela dedicação imensa no cumprimento
dos pedidos, pela boa vontade e pela rapidez na busca de tantos artigos solicitados,
prontamente enviados, com atitude de parceria na tarefa.
vii
À Sra. Mara Belloni e toda sua equipe de tradução, por terem feito com tanto carinho e
tanto profissionalismo as traduções das escalas e de todos os outros materiais solicitados.
Ao meu querido Prof. Johel Abdallah, pela disponibilidade em me ajudar com as revisões
gramáticais, mas principalmente por fazer isso de maneira descontraída, alegre, inteligente
e criativa.
Aos meus irmãos queridos, Célia, Rosa, Marilene, Paulo, Carminha e Jorginho, pelo apoio
constante e pela ajuda nos momentos difíceis. Ao meu querido cunhado Romualdo, sempre
disposto a ajudar-me, com suporte técnico, e ao meu afilhado e sobrinho Rodrigo, pela
ajuda na confecção dos gráficos.
Às minhas queridas Melzinha e Katita, que estiveram sempre presentes, de uma forma ou
de outra, nos momentos de introspecção e de reflexão sobre o trabalho.
Às minhas dedicadas funcionárias Severina, Conceição e Isabel, que fizeram todo o
possível para minimizar meus encargos, deixando-me mais livre para completar o trabalho.
Agradeço muito esse carinho, essa consideração, a torcida e a parceria.
À sempre amiga e irmã de alma Ana Maria Toledo Piza, pela dedicação imensa em
conseguir, tantas vezes, artigos e livros não encontrados no Brasil. Agradeço ao Sílvio
também por isso. Vocês são muito especiais para mim.
À querida afilhada Patrícia, pela ajuda inestimável no final do trabalho, quando o tempo já
parecia não suficiente para o que faltava fazer.
À querida Nanci e à Beatriz, agradeço a ajuda prestada na coleta de dados.
viii
À psicóloga Sílvia, pela amizade e pela disponibilidade em conseguir artigos referentes ao
tema, a fim de enriquecer meu trabalho.
Aos pais de todas as crianças e jovens participantes. Não tenho como agradecer a boa
vontade que vocês tiveram em permitir que seus filhos participassem desta pesquisa.
Encontrei em todos um desejo sincero de que este trabalho pudesse beneficiar outras tantas
crianças, que assim como seus filhos, precisam de ajuda e orientação na trajetória de suas
aprendizagens. A luta de vocês não é fácil, mas missões desse porte são para pessoas
especiais, diferenciadas, que conseguem amar até o infinito.
Às profissionais Lélia, Valéria, Rosana, Adélia, Nanci, Cláudia, Dejenane, Marcela e
Terezinha, pela ajuda na busca de crianças que pudessem participar da amostra da pesquisa.
Às instituições Paidós, GAIA, SINAPSE, APAE de São Sebastião, APAE de Maria da Fé,
APADEA, Acalento, por terem permitido que eu avaliasse crianças que estão sob seus
cuidados. Agradeço também o acolhimento tão carinhoso e aproveito para registrar minha
admiração pelo trabalho que vocês oferecem a essas crianças.
Às psicólogas dos participantes, por se disporem a colaborar, de forma tão gentil, com as
questões referentes à escala.
Às secretárias da Universidade São Francisco, agradeço a gentileza no trato, o sorriso
estampado no rosto, sempre, e a educação com a qual vocês sempre me atenderam.
Aos colegas do curso: José, Wilma, Ana Francisca, Ronei, Fabián, Silvana, Adriana,
Cláudia, Gleiber, Rossana e Renata, agradeço o convívio, as aprendizagens, a amizade e a
força. Especificamente, agradeço ao amigo José Montiel o envio de materiais que muito me
ajudaram na elaboração do texto.
ix
Em especial, agradeço ao meu pequeno Yago - a quem dedico muito do meu saber - a
participação não só nesta pesquisa quanto em minha vida, ciente que sou de que você tenta
compreender meu investimento oferecendo-me a alegria de vê-lo desenvolver-se bem, cada
vez mais. Isso é o maior incentivo para a busca constante de conhecimento. A seus pais,
todo o meu respeito, minha admiração e minha parceria.
Ao Dr. Francisco Assumpção, por ter me recebido gentilmente em seu espaço de trabalho e
ter me fornecido ideias para o início do projeto.
Ao Adriano, por ter feito com tanto carinho a edição das filmagens efetuadas na pesquisa; e
ao Flávio, por ter também se dedicado a fazer as adaptações e as impressões gráficas num
dos testes utilizados.
À Sra. Susan Dunn Weinberg e ao Dr. Rudmar Riesgo, por me ajudarem a compreender os
caminhos que nem sempre são os mais fáceis em pesquisa, e principalmente aqueles que
não devem ser seguidos.
x
RESUMO
Jorge, L. M. de. (2010). Avaliação Cognitiva de Indivíduos Autistas: Inteligência, atenção
e percepção. Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Psicologia, Universidade São
Francisco, Itatiba, São Paulo, 230 p.
Esta pesquisa teve como objetivo investigar o funcionamento cognitivo de indivíduos que
apresentam Transtornos do Espectro do Autismo, em tarefas que avaliam atenção visual
seletiva e alternada, em habilidade perceptomotora de cópia de formas, e em teste de
inteligência não-verbal que requer estratégias de raciocínio lógico e resolução de
problemas. Para tanto, contou com 28 participantes com idades entre 5 e 26 anos
(Média=11,62 e DP=5,68), sendo 25 do sexo masculino, provenientes de consultórios
particulares ou instituições especializadas, caracterizando a amostra como sendo clínica. Os
instrumentos utilizados foram a Pervasive Development Disorder Assessment Scale –
Screening Questionnary (PDDAS-SQ), para obtenção dos graus de comprometimento
autístico dos avaliados; o Teste de Inteligência Não-Verbal - terceira edição (TONI-3
Forma A); o Teste de Bender, corrigido pelo Sistema de Pontuação Gradual (B-SPG); um
Teste de Atenção por Cancelamento (TAC); e os Testes Motor e de Percepção, usados
como screenings no Bender-Gestalt II. A aplicação seguiu a proposta de adaptar
instrumentos, instruções e ambiente às necessidades dos participantes, adotando os
princípios de avaliação assistida, com mediações verbais e gestuais. O tratamento
estatístico foi feito com testes não-paramétricos, em função no número de participantes e da
heterogeneidade da amostra. Os resultados apontaram o grau moderado de
comprometimento autístico como o mais frequente no grupo avaliado. Evidências de
validade convergente-discriminante para a escala PDDAS-SQ mostraram correlação
negativa e significativa com o TAC em seletividade simples e alternância, mas não com
seletividade envolvendo velocidade de processamento; a correlação com o B-SPG e com o
TONI-3 foi fraca e não significativa, evidenciando que capacidade perceptomotora e
inteligência não estão relacionadas aos graus de comprometimento autístico. Aliás, as
performances no B-SPG foram comprometidas de um modo geral, nesta amostra, sendo
este um dado importante para o planejamento interventivo. Correlações entre o TAC, o BSPG e a pontuação total do TONI-3 foram significativas, exceto com a prova de
seletividade simples envolvendo velocidade de processamento, demonstrando que o fator
tempo interferiu no desempenho dos participantes. Os valores de QI do TONI-3, estimados
a partir da norma americana, variaram de 62 a 129 (Média=89,89 e DP=19,14). A
correlação desses valores com a idade foi negativa (rho=-0,52; p=0,005), sugerindo que os
QIs mais altos estão concentrados nas idades mais baixas. Esse dado tem implicações tanto
clínicas quanto educacionais e merecem reflexão.
Palavras-chave: autismo; funcionamento cognitivo; avaliação psicológica.
xi
ABSTRACT
Jorge, L. M. de. (2010). Cognitive Assessment of Autistic Individuals: Intelligence,
Attention and Perception. Doctorate Degree Program Stricto Sensu in Psychology,
Universidade São Francisco, Itatiba, São Paulo, 230 p.
This study seeks to investigate the cognitive functioning of individuals who suffer from
Autistic Spectrum Disorders in tasks that evaluate selective and alternating visual attention,
in perceptual motor ability to copy designs, and in non-verbal intelligence tests that require
logical reasoning strategies and problem solving. There were 28 participants aged between
5 and 26 years (Average=11.62 and SD=5.68), with 25 males, all from private clinics or
specialized institutions, characterizing the sample as clinical. The instruments utilized were
the Pervasive Development Disorder Assessment Scale – Screening Questionnaire
(PDDAS-SQ), to obtain the degree of autistic handicap of the subjects evaluated; the Test
of Nonverbal Intelligence – third edition (TONI-3 Form A); the Bender Test, corrected by
the Gradual Scoring System (B-SPG); an Attention Cancellation Test (ACT); and the
Motor and Perception Tests, utilized as screenings in Bender-Gestalt II. The application
followed the proposal of adapting the instruments, instructions, and environment to the
needs of the participants, even adopting the principles of assisted evaluation, with verbal
and gesture prompting. The statistical analysis was carried out with non-parametric tests,
due to the number of participants and to the heterogeneity of the sample. The results
showed that the most frequent degree of autistic hindrance was moderate within the
assessed group. Evidences of converging-discriminating validity for the PDDAS-SQ scale
showed negative and significative correlation with the ACT in simple selectivity and
alternation, but not with selectivity involving processing speed; the correlation with the BSPG and the TONI-3 was weak and non-significative, evidencing that the perceptual motor
ability and intelligence are not related to the degree of autistic handicap. Moreover, the
performances in the B-SPG were generally hampered in this sample, which is an important
data for the intervention planning. Correlations among the ACT, the B-SPG and the total
score of TONI-3 were significative, except for the simple stimulation selectivity task
involving processing speed, showing that the time factor had interfered with the
participant´s performance. The TONI-3’s IQ values, estimated based on the American
standard, varied from 62 to 129 (Average=89.89 and SD=19.14). The correlation of these
values with age was negative (rho=-0.52; p=0.005), suggesting that the higher IQs are
concentrated in the lower ages. This data has both clinical and educational implications,
and need some consideration.
Key-words: autism; cognitive functioning; psychological assessment.
xii
RESUMEN
Jorge, L. M. de. (2010). Evaluación Cognitiva de Individuos Autistas: Inteligencia,
atención y percepción Programa de Postgrado Stricto Sensu en Psicología, Universidade
São Francisco, Itatiba, São Paulo, 230 p.
El objetivo de esta investigación ha sido el estudio del funcionamiento cognitivo de
individuos que presentan Trastornos del Espectro del Autismo en tareas evaluadoras de la
atención visual selectiva y alternada, en habilidad perceptomotora de copia de formas y en
prueba de inteligencia no verbal que requiere estrategias de raciocinio y resolución de
problemas. Para tanto, ha contado con 28 participantes con edades entre 5 y 26 años
(Promedio+11,62 y DP+5,68), siendo 25 del sexo masculino, procedentes de consultorios
particulares o instituciones especializadas, caracterizando la muestra como clínica. Los
instrumentos empleados han sido la Pervasive Development Disorder Assessment Scale –
Screening Questionnary (PDDAS-SQ), para la obtención de los grados de
comprometimiento autístico de los evaluados; la Prueba de Inteligencia No-Verbal – tercera
edición (TONI-3 Forma A); la Prueba de Bender, corregida por el Sistema de Puntuación
Gradual (B-SPG); una Prueba de Atención por Cancelación (TAC); y las Pruebas Motor y
de Percepción, empleados como screenings en la versión estadounidense del BenderGestalt II. La aplicación ha seguido la propuesta de adaptación de instrumentos y ambiente
a las necesidades de los participantes al adoptar, aún, los principios de evaluación asistida,
con mediciones verbales y gestuales. El tratamiento estadístico ha sido hecho con pruebas
no paramétricas, en función del número de participantes y de la heterogeneidad de la
muestra. Los resultados han demostrado el grado de comprometimiento autístico como el
más frecuente en el grupo evaluado. Evidencias de validez convergente-discriminante para
la escala PDDAS-SQ han demostrado una correlación negativa y significativa con el TAC
en selectividad simple y alternancia, pero no con selectividad que involucre velocidad de
procesamiento; la correlación con el B-SPG y con el TONI-3 ha sido débil y no
significativa, evidenciando que capacidad perceptomotora e inteligencia no se relacionan
con los grados de comprometimiento autístico. Además, los desempeños en el B-SPG se
han comprometido de una forma general, en esta muestra, siendo este un dato importante
para el planeamiento interventivo. Correlaciones entre el TAC, el B-SPG y la puntuación
total del TONI-3 han sido significativas, salvo con la prueba de selectividad simple
involucrando velocidad de procesamiento, al demostrar que el factor tiempo ha interferido
en el desempeño de los participantes. Los valores de CI del TONI-3, estimados desde la
norma norteamericana, han variado de 62 hasta 129 (Promedio=89,89 y DP=19,14). La
correlación de dichos valores con la edad ha sido negativa (rho=-0,52; p=0,005), al sugerir
que los CIs más altos se concentran en las edades más bajas. El citado dato tiene
implicaciones tanto clínicas como educacionales y merecen reflexión.
Palabras-clave: autismo; funcionamiento cognitivo; evaluación psicológica.
xiii
SUMÁRIO
LISTA DE FIGURAS ...................................................................................................................... xv
LISTA DE TABELAS .................................................................................................................... xvi
APRESENTAÇÃO .......................................................................................................................... 19
CAPÍTULO 1 AUTISMO .............................................................................................................. 27
1.1 PANORAMA HISTÓRICO .......................................................................................................... 27
1.2. TEORIAS PSICOLÓGICAS COGNITIVAS PARA A EXPLICAÇÃO DO AUTISMO ............................ 37
1.2.1. Teoria da Mente ou Mindblindness ................................................................ 39
1.2.2. Teoria da Coerência Central ....................................................................................... 42
1.2.3. Teoria das Funções Executivas .................................................................................. 44
1.2.4. Teoria da Empatia / Sistematização e Teoria do Cérebro Extremamente Masculino 47
1.2.5. Teoria Magnocelular .................................................................................................. 49
1.2.6. Sistema de Neurônios Espelho ................................................................................... 51
1.3. CONCLUSÃO DO CAPÍTULO.................................................................................................... 53
CAPÍTULO 2 ATENÇÃO E PERCEPÇÃO .............................................................................. 57
2.1. COMPREENDENDO OS PROCESSOS DE ATENÇÃO ................................................................... 57
2.2. ESTUDOS SOBRE A ATENÇÃO VISUAL EM AUTISTAS ...... ...................................................... 62
2.3. COMPREENDENDO OS PROCESSOS PERCEPTUAIS .................................................................. 65
2.4. ESTUDOS SOBRE A PERCEPÇÃO VISUAL EM AUTISTAS .......................................................... 68
2.5. CONCLUSÃO DO CAPÍTULO.................................................................................................... 73
CAPÍTULO 3 INTELIGÊNCIA ................................................................................................... 75
3.1. O HISTÓRICO DA MEDIDA DA INTELIGÊNCIA ......................................................................... 76
3.2. PSICOLOGIA COGNITIVA E OS ASPECTOS OPERACIONAIS DA INTELIGÊNCIA..........................83
3.3. AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA E O USO DOS TESTES DE INTELIGÊNCIA ...................................... 88
3.4. AVALIAÇÃO DA INTELIGÊNCIA EM INDIVÍDUOS AUTISTAS ................................................... 92
xiv
CONCLUSÃO DOS CAPÍTULOS E DEFINIÇÃO DOS OBJETIVOS DA PESQUISA ....... 103
MÉTODO....................................................................................................................................... 107
PARTICIPANTES .......................................................................................................................... 107
MATERIAIS ................................................................................................................................. 111
PROCEDIMENTO ......................................................................................................................... 121
RESULTADOS ............................................................................................................................. 137
DISCUSSÕES ................................................................................................................................ 177
CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................................................ 207
REFERÊNCIAS ............................................................................................................................ 215
ANEXOS ....................................................................................................................................... 227
ANEXO A Critérios diagnósticos para o Transtorno Autista.....................................227
ANEXO B Critérios diagnósticos para o Transtorno de Asperger.............................228
ANEXO C Carta de Autorização................................................................................229
ANEXO D Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.........................................230
xv
LISTA DE FIGURAS
Figura 1. Relações hierárquicas entre estados gerais e seletivos de atenção. ...................... 58
Figura 2. Distribuição de frequências do B-SPG para esta amostra.................................. 158
Figura 3. Distribuição das frequências da pontuação total no TONI-3. ............................ 166
Figura 4. Frequência da pontuação dos dados do TONI-3 convertidos em QI de
acordo com a norma americana..........................................................................167
Figura 5. Classificação dos QIs obtidos no TONI-3 segundo normas americanas. .......... 167
xvi
LISTA DE TABELAS
Tabela 1. Autismo e Teoria da Mente ao longo do desenvolvimento. .................................. 41
Tabela 2. Resumo do tratamento estatístico dos dados coletados na pesquisa.................... 133
Tabela 3. Frequência dos participantes em cada nível classificatório da escala
PDDAS-SQ........................... .............................................................................. 137
Tabela 4. Conversão da pontuação das subescalas em níveis classificatórios .................... 138
Tabela 5. Correlações entre as classificações das subescalas do PDDAS-SQ e delas
com a classificação geral..................................................................................... 139
Tabela 6. Frequências da nova forma de pontuação e da pontuação original do
PDDAS-SQ. ........................................................................................................ 140
Tabela 7. Correlação das pontuações parciais de cada subescala com o total geral,
nas duas pontuações. ........................................................................................... 141
Tabela 8. Correlações entre os itens de cada subescala e seus respectivos itens gerais. ..... 143
Tabela 9. Correlação de cada item da subescala Interação Social com seu total parcial
e com o total geral da escala. .............................................................................. 144
Tabela 10. Correlação de cada item da subescala Fala e Linguagem com seu total parcial
e com o total geral da escala. ............................................................................ 145
Tabela 11. Correlação de cada item da subescala Jogo Simbólico com seu total parcial
e com o total geral da escala. ............................................................................ 146
Tabela 12. Correlação do item geral da subescala de Comportamento com o total geral
da escala. ........................................................................................................... 147
Tabela 13. Correlação entre os pareceres dos profissionais e as classificações aferidas
na escala, segundo as pontuações original e nova............................................. 147
Tabela 14. Estatísticas descritivas referentes ao Teste de Atenção por Cancelamento ....... 150
xvii
Tabela 15. Correlações entre as três partes do Teste de Atenção por Cancelamento.......... 151
Tabela 16. Diferenças de média da varredura visual em relação à Parte 1 do TAC. .......... 152
Tabela 17. Comparação de médias dos ranks na classificação do PDDAS-SQ em relação
às Partes 1, 2 e 3 do teste de Atenção por Cancelamento. ................................ 154
Tabela 18. Estatísticas descritivas referentes aos Testes Motor e de Percepção
(Screenings) ...................................................................................................... 155
Tabela 19. Correlações entre os Screenings e as Partes 1, 2 e 3 do TAC ........................... 156
Tabela 20. Diferenças de média da varredura visual em relação aos Testes de Percepção
e Motor. ............................................................................................................. 157
Tabela 21. Estatísticas descritivas dos participantes com idade de 10 anos e acima de 10 anos. ....159
Tabela 22. Diferença de média entre os participantes de 10 anos e acima de 10 anos,
em relação à norma prevista para esta idade. .................................................... 159
Tabela 23. Frequências e porcentagens de acerto por figura do B-SPG. ............................ 160
Tabela 24. Comparação, por faixa etária, do desempenho nas figuras do
B-SPG classificadas por nível de dificuldade. .................................................. 161
Tabela 25. Pontuações médias no B-SPG, por figura e por idade, comparativas às
médias da população normativa. ....................................................................... 162
Tabela 26. Correlação entre o B-SPG e as Partes 1, 2 e 3 do TAC. .................................... 163
Tabela 27. Diferença de média dos quartis do Teste Motor em relação ao B-SPG. ........... 164
Tabela 28. Diferença de média dos quartis do Teste de Percepção em relação ao B-SPG. 164
Tabela 29. Diferença de média das varreduras visuais em relação ao B-SPG. ................... 164
Tabela 30. Diferença de média da habilidade em lógica, em relação ao TONI-3.. ............. 168
Tabela 31. Correlação entre o desempenho total no TONI-3 e suas pranchas com
diferentes formatos. ........................................................................................... 169
xviii
Tabela 32. Diferença de média das classificações do PDDAS-SQ em relação ao
TONI-3. ............................................................................................................. 170
Tabela 33. Comparação de médias, por grau de comprometimento, do desempenho
no TONI-3.. ....................................................................................................... 170
Tabela 34. Diferença de média entre os participantes de alto e baixo funcionamento
no TONI-3. ........................................................................................................ 170
Tabela 35. Correlações entre os QIs obtidos com o TONI-3 e as Partes 1, 2 e 3 do TAC. . 171
Tabela 36. Correlações entre a pontuação geral do TONI-3 e as Partes 1, 2 e 3 do TAC. . 171
Tabela 37. Diferença de média entre os tipos de varredura e o desempenho no TONI-3. .. 172
19
APRESENTAÇÃO
O conceito de autismo tem sofrido inúmeras modificações ao longo do tempo. Em
função disso muitos estudos têm surgido, na tentativa de explicar aspectos desse transtorno
que ainda estão mal compreendidos ou pouco esclarecidos. A começar do processo
diagnóstico, o autismo assumiu variabilidade muito grande de manifestações clínicas, e isso
tem dificultado o consenso entre os profissionais, culminando, é claro, em prejuízos para as
ações interventivas (Gadia, Tuchman & Rotta, 2004). O termo Transtornos do Espectro do
Autismo (ou TEA) vem sendo utilizado pelos estudiosos no assunto como uma forma de
comportar essas variações sintomatológicas, que podem também assumir graus
diferenciados de gravidade.
Do ponto de vista psicológico, a compreensão do desenvolvimento atípico que esses
indivíduos apresentam só se torna possível mediante uma avaliação minuciosa, completa,
contendo dados sobre a capacidade cognitiva, adaptativa e funcional dessa população
(Ibarra & Pereira,1999; Klin, Chawarska, Rubin & Volkmar, 2006). Essa tarefa requer dos
profissionais, por um lado, o conhecimento aprofundado do assunto, e, por outro lado, o
domínio de instrumentos que possam fornecer dados importantes para o norteamento da
intervenção. No entanto, no Brasil, esse processo ainda caminha de forma lenta, pois não há
instrumentos específicos de avaliação de autismo disponibilizados para uso clínico.
Em virtude de minha prática terapêutica, dedicada em grande parte a crianças
autistas, com acompanhamento de todas as questões que envolvem essa patologia, suas
manifestações e seu processo diagnóstico, procedi ao mapeamento de escalas de avaliação
desse transtorno como proposta para a dissertação de mestrado, concluída em 2003. Dos
artigos analisados na dissertação, apenas um se referia à validação de um instrumento no
20
Brasil – a Escala de Avaliação de Traços Autísticos – ATA (Assumpção Jr., Kuczynski,
Gabriel & Rocca, 1999). Os demais faziam referência ao uso de vários instrumentos, dentre
eles, escalas já consagradas na caracterização do autismo, como a Childhood Autism Rating
Scale (CARS) e a Autism Diagnostic Interview – Revised (ADI-R), muitas vezes utilizadas
em conjunto com testes clássicos de avaliação de inteligência (Jorge, 2003). Essas duas
escalas já contam, hoje, com estudos de validação brasileiros (Aguiar, 2005; Pereira, 2007),
porém ainda não chegaram às mãos dos profissionais clínicos ou institucionais, que
continuam recebendo crianças enquadradas no espectro, sem condições de maior
detalhamento dos casos.
No que se refere ao funcionamento cognitivo, a dispersão dos casos enquadrados
hoje no espectro, torna também difícil a tarefa de determinar qual instrumento usar com
cada indivíduo e quais investigações são mais adequadas para permitir um delineamento
mais preciso para as intervenções. A literatura tem descrito desabilidades cognitivas
diversas ocorrendo nessa população, desde as que se encontram num nível mais sensorial,
relacionadas à captação e processamento básico de estímulos (Wing, 2001; Frith, 2003;
Rapin, 2009), até as de ordem mais superior que integram processos complexos (Goldstein
& Ozonoff, 2009). Atenção e percepção têm sido temas de destaque em pesquisas que
visam à caracterização cognitiva atípica dos autistas, mas sua avaliação clínica ainda carece
de estruturação. Algumas pesquisas mencionam a necessidade de os indivíduos avaliados
serem de alto funcionamento para poderem se submeter a esse tipo de investigação
(Williams, Goldstein & Minshew, 2006). A determinação do grau de funcionalidade do
indivíduo autista, no entanto, deve ser feita por meio de avaliação intelectual, e este é um
outro aspecto polêmico em estudos desse transtorno.
A inteligência, termo este proveniente do latim intelligere, que significa entender ou
compreender (Wasserman & Tulsky, 2005), tem sido descrita como comprometida na
21
maioria dos autistas (Gauderer, 1997; Sigman & Capps, 2000; Schwartzman, 2003).
Posicionamentos mais recentes, no entanto, têm discutido as limitações existentes no uso
clínico de instrumentos de avaliação da pessoa autista, por exemplo, as escalas Wechsler,
que contêm subtestes verbais aos quais muitos não conseguem responder (Mottron, 2006;
Klinger, O’Kelley & Mussey, 2009). Com isso, o conhecimento da real capacidade
intelectual desses indivíduos encontra-se ainda impreciso, em parte devido às dificuldades
em graus variados que eles apresentam nas áreas da comunicação, interação social
recíproca, imaginação e comportamento, comprometendo de forma mais ou menos ampla
sua capacidade adaptativa ao meio; e, em outra parte, pela dificuldade na escolha de testes
mais adequados e formas de avaliação que não coloquem esses indivíduos em
desvantagem, mas que permitam uma compreensão consistente de sua funcionalidade
cognitiva.
Escolher instrumentos de avaliação intelectual requer do profissional psicólogo
atualização constante em relação às pesquisas que dão aos testes a credibilidade de uso,
assim como em relação às teorias que embasam sua estruturação. Vale lembrar que há
praticamente um século, a Psicologia conta com estudos de investigação da inteligência
iniciando
com
uma
abordagem
psicométrica
ou
diferencial,
seguida
pela
desenvolvimentista, pela cognitivista e pela neurobiológica, cada qual focalizando um
aspecto da relação entre o homem e sua capacidade de dominar os estímulos do ambiente,
garantindo a sua adaptação ao meio (Almeida, Roazzi & Spinillo,1989; Carneiro &
Ferreira, 1992; Flores-Mendoza & Nascimento, 2001; Lemos, 2006). O aperfeiçoamento
desses estudos, sobretudo da abordagem psicométrica e da psicologia cognitiva vem
oferecendo à área de avaliação da inteligência reflexões que permitem unir o uso adequado
dos testes, a competência do avaliador e o funcionamento cognitivo do indivíduo avaliado
(Almeida & Primi, 2010)
22
Considerando todas essas questões, nesta pesquisa buscou-se selecionar um
conjunto de testes para avaliar o funcionamento cognitivo de autistas, instrumentos estes de
uso comum na prática clínica psicológica, com condições de aplicabilidade que pudessem
considerar as particularidades desses indivíduos, evidenciando os aspectos da cognição
selecionados para investigação, a saber: inteligência, atenção e capacidade perceptomotora.
Juntamente com esses instrumentos foi utilizada uma escala para avaliação do grau de
comprometimento autístico dos participantes, para a qual buscaram-se evidências de
validade.
Acredito que este trabalho possa contribuir para compreensão mais aprofundada do
comportamento de indivíduos autistas, auxiliando instituições especializadas e profissionais
da área clínica a se munirem de instrumentos de avaliação e de diretrizes avaliativas que
acompanhem as necessidades especiais dessa clientela. Que este estudo possa servir,
também, de incentivo a outros pesquisadores, no sentido de ampliação do conhecimento das
patologias infantis, valendo-se do uso ou mesmo da construção de instrumentos
diversificados que atendam às nuanças das necessidades especiais.
Os tópicos que compõem este trabalho contam, inicialmente, com uma revisão de
literatura dividida em três capítulos. No capítulo 1, após uma introdução explicativa do
autismo em seus aspectos conceituais e etiológicos, estão descritas pormenorizadamente as
principais e atuais teorias cognitivas que vêm tentando explicar esse transtorno. No capítulo
2, a atenção e a percepção são conceituadas, seguidas de alguns estudos efetuados com
autistas, avaliando neles esses aspectos. No capítulo 3, o construto inteligência é abordado,
primeiramente de maneira histórica, no que se refere às concepções dos estudiosos sobre a
forma de avaliá-la; depois disso, segue um breve comentário sobre avaliação psicológica,
definindo a avaliação assistida ou dinâmica como a adotada nesta pesquisa; por fim, são
descritos alguns estudos acerca da avaliação intelectual no autismo. Na sequência estão os
23
objetivos desta pesquisa e o método, com a descrição dos participantes, dos instrumentos
propostos, dos procedimentos de coleta de dados, de correção e de análise desses dados.
Em seguida, são expostos os resultados, com breves análises. Os comentários mais
específicos foram reservados para um tópico separado de discussões, e o texto encerra com
as considerações finais. As referências e os anexos fecham formalmente o trabalho.
À frente de cada tópico estão servindo de divisórias algumas aquarelas pintadas pelo
artista plástico Ricardo Montenegro. O que inspirou a execução desses desenhos foi um
comentário feito por um docente da Universidade São Francisco, Prof. Dr. Fermino
Fernandes Sisto, por ocasião da qualificação deste trabalho. Ele disse que, certa vez, um
professor seu, Dr. Carlos Funari Prósperi, havia descrito o indivíduo autista como um
novelo de lã, em que ambas as pontas estavam voltadas para dentro, tornando-se difícil seu
des-enrolar. Essa ideia foi repassada ao artista, que idealizou uma sequência de imagens
vislumbrando a possibilidade de des-envolvimento desse ser. E esse é o meu desejo para
todas as crianças autistas.
24
25
26
27
CAPÍTULO 1 AUTISMO
1.1. Panorama Histórico
Autismus é um termo alemão derivado da palavra grega autós que significa si
mesmo ou self, e do sufixo ismos, que indica ação ou estado. Foi usado inicialmente pelo
psiquiatra suíço Eugen Bleuler, em 1911, para descrever uma tendência patológica de
isolamento do ambiente, observada em esquizofrênicos (Goldstein & Ozonoff, 2009).
Posteriormente, foi reutilizado por Kanner, em 1943, para descrever um sintoma presente
em 11 crianças por ele avaliadas desde 1938 (Rocha, 1997). Esse sintoma passou a ser o
definidor de um quadro composto por um conjunto de características específicas, o qual foi
denominado de Autismo Infantil Precoce (Antonucci, 1993).
Alguns dos aspectos mais importantes descritos por Kanner (1971), e que até hoje
estão presentes na caracterização do autismo referem-se a dificuldades com a linguagem
expressiva (ecolalia, ecolalia tardia, compreensão literal dos termos, restringir-se a dizer
nomes), memória excelente, resistência a mudanças no ambiente, reação de pânico diante
de ruídos fortes e ausência do olhar para o rosto do interlocutor. Esse mesmo autor, já
naquela época, observou detalhes atípicos sobre a capacidade intelectual dessas crianças
dizendo que elas eram capazes de manter relações inteligentes com objetos que não
ameaçavam seu fechamento, ou isolamento. Mencionou também não conseguirem
responder ao teste de Binet ou a outros semelhantes, que continham provas verbais1,
justificando acessibilidade limitada deles a tais baterias, mas podiam responder bem às
pranchas de encaixe de Seguin, que se constituíam numa prova de execução (Kanner 1971;
Rocha, 1997). Outra observação feita por Kanner foi a de que as crianças eram capazes de
1
Esse detalhe das provas verbais é menção feita pela tradutora francesa aos estudos de Kanner, conforme
descrito em Rocha (1997).
28
olhar para fotos de animais ou de pessoas, mas não para o rosto das próprias pessoas, e
buscou esclarecer isso com a hipótese de que talvez as fotos, sendo estáticas, não lhes
causassem perturbação.
A partir de então, muitos estudos têm sido desenvolvidos no intuito de explicar
melhor o quadro de autismo, cuja descrição já passou por várias alterações, principalmente
em relação à etiologia, antigamente considerada psicogênica. Hoje, o autismo é
reconhecido como uma desordem neurológica de causa ainda imprecisa, cujos estudos
caminham
para
explicações
genéticas
ou
neurobiológicas,
de
um
lado,
e
(neuro)psicológicas, de outro (Araújo, 2000). De acordo com o DSM-IV-TR (APA, 2002),
o Autismo, ou Transtorno Autista, encontra-se inserido nos Transtornos Globais do
Desenvolvimento (TGD), anteriormente denominados de Transtornos Invasivos do
Desenvolvimento (TID). Assenta-se num tripé de sintomas, ou numa tríade autística, termo
esse cunhado por Wing e Gould desde 1979, que pode ser explicado por: dificuldades na
interação social recíproca, dificuldades na comunicação verbal e não-verbal, movimentos
repetitivos e padrões restritos de interesse, com atividades estereotipadas. Os critérios
diagnósticos contidos no DSM-IV-TR (APA, 2002) para classificação do indivíduo neste
transtorno encontram-se descritos no Anexo A.
Gadia, Tuchman e Rotta (2004) fizeram uma revisão nos estudos sobre o autismo e
outros Transtornos Globais do Desenvolvimento, no sentido de atualizar o conhecimento
acerca dos achados neurobiológicos dessa patologia, considerada a terceira desordem mais
comum do desenvolvimento. Avanços em estudos neuroanatômicos e de neuroimagem têm
ocorrido, mas os achados não são consistentes o suficiente, ou específicos para o autismo.
Anormalidades cerebelares são as mais frequentemente descritas para o quadro, e
justificariam dificuldades diversas nesse transtorno, inclusive em funções cognitivas
superiores.
29
A esse respeito, Akshoomoff (2005) comenta estudos, tanto os seus quanto os de
colegas da área, fundamentados na neurociência cognitiva, que vêm sendo conduzidos com
o intuito de mostrar que o cerebelo cumpre um papel importante, não apenas no controle
motor, mas em funções cognitivas como a atenção. A fundamentação é de que o cerebelo
atua nas funções antecipatórias, ou seja, para a predição sobre sequências de eventos, que
por sua vez são necessárias em tarefas que envolvem regulação da atenção. Mais
especificamente, o cerebelo é responsável pela aprendizagem das relações preditivas sobre
os eventos, preparando o sistema neural em situações que são análogas; portanto, é
necessário para trajetos sensoriais rápidos, o que explica, assim, sua ativação em tarefas de
atenção.
Os estudos descritos por Akshoomoff (2005) mostram que lesões cerebelares
conduzem a dificuldades de os sujeitos responderem rapidamente à alternância (shift
attention) e à focalização da atenção (focus attention). Há uma lentidão na orientação da
atenção. Segundo essa autora, autistas também apresentam dificuldades em responder a um
estímulo emitido rapidamente, mas são capazes de responder normalmente, se tiverem mais
tempo para executar a tarefa. Se as anormalidades cerebelares ocorrerem desde o início do
desenvolvimento da criança, suas funções de atenção estarão comprometidas precocemente,
prejudicando também o desenvolvimento das funções sociais e linguísticas. Akshoomoff
pontua que a falha na antecipação poderia explicar a dificuldade dos autistas em lidar com
o inesperado, mantendo-os em mesmices.
Do ponto de vista genético, apesar de ainda não estar oficializado um marcador
biológico para o diagnóstico efetivo de autismo, existe a divulgação de estudos recentes
acerca de um comprometimento no cromossomo 5, mais especificamente no gene CDH10,
que se mostrou ativo no córtex frontal em desenvolvimento, podendo ser responsável pelos
problemas na linguagem, no julgamento social e em raciocínios complexos, comuns aos
30
autistas (FAPESP, 2009). Porém, assim como este, muitos outros estudos genéticos já vêm
sendo desenvolvidos, inclusive no Brasil, no Centro de Estudos do Genoma Humano, com
investigações de três genes de susceptibilidade ao autismo (CEGH, 2009). Cavalheira,
Vergani e Brunoni (2004) já haviam comentado sobre a existência de mais de 10 genes
relacionados a esse transtorno, considerando que provavelmente não houvesse apenas um
padrão hereditário, mas uma interação entre múltiplos genes, haja vista a variedade no
fenótipo autista, com manifestações mais ou menos acentuadas dos comprometimentos
característicos do quadro.
Sendo assim, a realidade do processo avaliativo do autismo, na prática clínica, ainda
conta com uma decisão pautada no histórico evolutivo do indivíduo, em observações
comportamentais e em investigações clínicas específicas, tanto na área médica, quanto na
área psicológica. Essa decisão tem como referência os critérios diagnósticos contidos no
DSM-IV-TR (APA, 2002) ou no CID10 (OMS, 1993), mas ainda acarreta dificuldades de
consenso, visto que o autismo hoje se desdobra em um espectro e comporta associações
desse quadro com outras patologias infantis (Machado & cols., 2003; Gadia, Tuchman &
Rotta, 2004). Os quadros que apresentam índices de maior associação com o autismo são a
síndrome de Martin Bell (ou X-frágil) e a esclerose tuberosa (Trevarthen, Aitken, Papouli
& Robarts, 1998). Além disso, o vírus da rubéola e outros como o citomegalovírus, também
podem ser encontrados em casos de autismo, assim como alterações metabólicas
relacionadas a fenilcetonúria (Diez-Cuervo & Martos, 1989).
Esclarecendo a questão do espectro, cabe aqui comentar que esse termo surgiu em
decorrência da divulgação de uma pesquisa epidemiológica feita por Wing e Gould, em
1979, a partir da qual houve a sugestão de que o autismo fosse considerado um continuum
de sintomas, por terem, as autoras, encontrado grande diversidade de manifestações clínicas
na população avaliada. Atrelado a isso, em 1981, Wing resgatou um estudo de Hans
31
Asperger, que havia sido publicado em língua alemã, em 1944. Esse estudo fazia alusão a
um quadro denominado por ele de psicopatologia autística, contendo a descrição de
crianças com características parecidas com as mencionadas por Kanner, em 1943, mas
algumas com melhores condições cognitivas. Esse documento foi traduzido por Frith, na
Inglaterra, em 1991 (Goldstein & Ozonoff, 2009).
O Transtorno de Asperger foi, então, incorporado aos Transtornos Invasivos do
Desenvolvimento, quase que para responder à necessidade de se classificar casos
identificados como um autismo leve, com comportamento próximo ao normal, conforme
esclarece Frith (2007). A ausência de falhas severas na linguagem e de falhas relacionadas
ao desenvolvimento intelectual marcaram a diferença desse transtorno com o autismo
clássico. As dificuldades na interação social desses indivíduos, no entanto, colocaram-nos
(e ainda são assim classificados por alguns autores) como tendo autismo de alto
funcionamento. Frith (2007) comenta, ainda, que a confusão existente na diferenciação
entre autismo clássico e Asperger conduz a um posicionamento que tende a vê-los como
variantes de um mesmo transtorno do desenvolvimento, sendo o Asperger considerado,
pelos clínicos, como aquele autista que tem fala fluente e inteligência superior. No entanto,
ele encontra-se diferenciado do Transtorno Autista no DSM-IV-TR, e os critérios
diagnósticos hoje utilizados por esse sistema, para classificá-lo, encontram-se descritos no
Anexo B.
Na mesma época em que o documento de Asperger foi traduzido, Happé e Frith
(1991) teceram crítica sobre o termo Pervasive Developmental Disorder (PDD) ou
Transtornos Invasivos do Desenvolvimento (TID) e propuseram o termo Autistic Spectrum
Disorder (ASD), traduzido no Brasil para Transtornos do Espectro do Autismo ou do
Espectro Autístico (TEA). O conceito de ASD ou TEA, sendo mais amplo, comporta a
noção de que existe um conjunto de condições psicológicas, tais como: dificuldades na
32
interação social e comunicativa, interesses restritos e comportamentos estereotipados (ou
seja, a tríade autística), que se combinam de forma a se manifestarem mais intensamente
em alguns indivíduos (comprometimento severo) do que em outros (comprometimento
leve). Apesar de esses quadros pertencerem ao conjunto de Transtornos Globais do
Desenvolvimento (TGD), de acordo com o DSM-IV-TR, apenas o Transtorno Autista, o
Transtorno de Asperger e os Transtornos Globais do Desenvolvimento – Sem Outra
Especificação (TGD-SOE) se enquadrariam no espectro, sendo que o mais comum de
ocorrer é o TGD-SOE (Mercadante, Gaag & Schwartzman, 2006). Isso evidencia a
singularidade de cada autista e, consequentemente, a dificuldade diagnóstica encontrada
pelos clínicos.
Assim, certamente, apresentam-se problemas referentes à epidemiologia, visto que
há três décadas a prevalência era de quatro autistas para 10.000 pessoas, proporção esta
adotada por muito tempo em vários países. Mais recentemente, em 2003, um estudo
realizado pelo Centro de Controle de Doenças, em Atlanta, registrou a prevalência de 3,4 a
cada 1.000 crianças. As crianças desse estudo apresentavam Transtorno Autista, TGD-SOE
ou Transtorno de Asperger, e 68% tinham problemas cognitivos (sem especificação). A
proporção por sexo variou entre 3:1 e 4:1 (meninos para meninas) em crianças com QI
maior ou igual 50, e diminuiu conforme decresceu o QI (Trevathan & Shinnar, 2009).
Rapin e Tuckman (2009) esclarecem algumas confusões sobre o diagnóstico dos
Transtornos do Espectro do Autismo. Eles dizem que o autismo é uma síndrome e não uma
doença no sentido médico, pois não apresenta uma etiologia específica. Sendo assim, o
autismo chamado de sindrômico ou secundário é aquele que comporta comorbidades, ou
seja, doenças definidas – como a esclerose tuberosa, a síndrome do X-frágil – em presença
de autismo. O autismo idiopático ou primário refere-se aos quadros em que a etiologia não
é conhecida, ou não está clara, até o momento. Acrescentam a esse comentário que as
33
classificações do DSM ou do CID definem transtornos, e não doenças; as classificações são
comportamentais, mas pretendem ser categóricas, precisas nos critérios de exclusão. Porém,
na prática isso não ocorre porque os prejuízos do autismo são qualitativos e a quantificação
de sintomas não consegue dar conta da diferenciação que existe nos quadros. Então, os
subtipos desses sistemas classificatórios acabam comportando gravidades diversas nas
disfunções. Para esses autores, os indivíduos com TEA enquadram-se numa curva
gaussiana, e os autistas mais típicos estão no centro dessa distribuição.
Baron-Cohen (2008), ao questionar o termo Autism Spectrum Disorder (ASD),
oferece ainda um outro olhar sobre a gravidade das disfunções. Ele diz preferir a
denominação Autism Spectrum Condition (ASC), porque um subgrupo de autistas,
considerados de alto funcionamento cognitivo, apesar de serem diferentes na forma de
pensar e perceber o mundo, não necessariamente apresentam um transtorno global. Em
relação aos termos alto funcionamento ou baixo funcionamento, Gilberg (2005) já havia
esclarecido que essas qualificações deveriam ser dadas à pessoa, e não ao autismo, ou seja,
o indivíduo considerado de alto funcionamento poderia ter bom QI, boa compreensão
verbal ou boa expressão da fala, mas ter o autismo tão grave quanto um indivíduo de baixo
funcionamento.
Nessa explicação, ele demonstra associar o alto funcionamento à capacidade
intelectual e ao desenvolvimento da linguagem. Porém não explica qual o limite da
capacidade intelectual para tal divisão. Baron-Cohen (2008) comenta que a maioria dos
clínicos considera o QI de 70 (2 DPs) como um limite entre os dois níveis, mas posicionase dizendo que ele prefere o limite de 85 (1 DP), justificando que isso tem impacto sobre as
diretrizes educacionais. Propõe uma hierarquia na qual a Síndrome de Asperger tem QI
acima de 85 e não apresenta falhas na linguagem; autismo de alto funcionamento também
tem QI acima de 85, mas tem falhas na linguagem; acrescenta uma categoria de autismo de
34
médio funcionamento, que tem QI entre 71 e 84, com ou sem falhas na linguagem; e, por
último, o autismo de baixo funcionamento, com QI abaixo de 70, podendo também ter ou
não falhas na linguagem.
Essa associação de nível intelectual à linguagem também é compartilhada por
Mottron (2006), mas ele alerta que ocorrem transformações ao longo do desenvolvimento
do autista, nas quais vários traços que aparecem em determinada fase podem não mais estar
presentes em outra fase. Isso tem importância para o diagnóstico, que não deve ser estático.
Aliás, para ele, o que pode ser chamado de curso natural do autismo deve ser, não apenas
integrado ao processo diagnóstico e à avaliação de autistas, mas também considerado na
intervenção terapêutica.
A respeito da linguagem, cabe aqui salientar que as dificuldades dos autistas, nessa
área, estão vinculadas a uma falha nas habilidades sociocomunicativas que normalmente se
desenvolvem no final do primeiro ano de vida. A atenção compartilhada é uma dessas
habilidades, e tem funcionado como um marcador precoce para a detecção de quadros
relacionados ao espectro do autismo, sendo considerada um pré-requisito para o
desenvolvimento da linguagem. Refere-se ao direcionamento da atenção da criança a um
parceiro comunicativo, com a intenção de mostrar, pedir algo, ou atender a um pedido de
compartilhamento do outro. Promove, assim, a compreensão da intenção comunicativa do
interlocutor, assumindo papel fundamental no desenvolvimento, não apenas das habilidades
relacionadas à comunicação, como também das habilidades sociais (Menezes &
Perissinoto, 2008; Sousa-Morato & Fernandes, 2009).
Outros aspectos que interferem na linguagem dos autistas, por serem também falhos
no seu desenvolvimento precoce, são a imaginação e a capacidade simbólica, que trazem
prejuízos, tanto no desenvolvimento sócio-interativo, quanto no desenvolvimento cognitivo
desses indivíduos (Tamanaha, Chiari, Perissinoto & Pedromônico, 2006). Vista dessa
35
forma, é preciso refletir que a linguagem não pode ser considerada, no autismo, fora do
contexto comunicativo e interativo.
Retomando e finalizando as questões referentes ao processo diagnóstico, é preciso
salientar o papel das escalas de avaliação de autismo como instrumentos complementares
aos critérios contidos nos sistemas classificatórios CID-10 ou DSM-IV-TR. Dentre as mais
conhecidas citam-se a Childhood Autism Rating Scale (CARS), a Autism Behavior
Checklist (ABC) e a Autistic Diagnostic Interview – Revised (ADI-R), tanto para a prática
clínica quanto para pesquisas na área (Trevarthen & cols., 1998; Martos, 2002; Gadia,
Tuchman & Rotta, 2004). Instrumentos como esses cumprem o papel de oferecer o grau de
comprometimento, ou a caracterização mais aprofundada do comportamento do indivíduo
autista, nas áreas afetadas por este transtorno, para esclarecimento diagnóstico, orientação à
intervenção ou avaliação do processo interventivo. São, portanto, de extrema necessidade
para uso clínico. Sampedro (2006) defende a necessidade do uso das escalas, tanto para os
pais compreenderem o comportamento que seu filho vem manifestando, quanto para os
profissionais conhecerem melhor o indivíduo que irão ajudar e, assim determinarem, com
precisão as estratégias de intervenção para cada caso.
Atualmente, o número de escalas disponíveis para avaliação das condições autísticas
tem crescido muito, no intuito de atender às necessidades cada vez maiores dessa condição
que se desdobrou em um espectro. O mapeamento de escalas na base de dados PsychInfo,
efetuado por Jorge (2003), apontou, no período de 1997 a 2001, o aparecimento de 31
escalas de avaliação de autismo utilizadas em estudos de vários países, muitas delas
fazendo parte de um conjunto de investigações, como exemplos, a Autism Diagnostic
Observational Schedule (ADOS), a Autism Diagnostic Observational Schedule- Generic
(ADOS-G) e a Pre-Linguistic Autism Diagnostic Observational Schedule (PL-ADOS).
36
As escalas mais utilizadas que apareceram no estudo de Jorge (2003) também são
mencionadas, no estudo de Sampedro (2006), como as mais conhecidas internacionalmente.
Esta última autora, com base nas etapas de avaliação seguidas pela Academia Americana de
Pediatria e pela Academia Americana de Neurologia, desde o ano 2000, sugere para um
primeiro nível de investigação, escalas de sondagem evolutiva rotineira, como as Escalas
Bayley do Desenvolvimento Infantil. Sugere, também, um screening específico para
autismo, como o Checklist for Autism in Toddlers (CHAT). Num segundo nível de
investigação, mais voltado para o diagnóstico e a avaliação propriamente ditos, ela cita as
escalas ADI-R, ADOS e CARS como as mais apropriadas, além da Leiter-R, para uma
avaliação intelectual. A respeito da investigação intelectual de autistas, Sampedro salienta
que a Leiter é uma escala recomendada para avaliar essa população porque é um
instrumento não-verbal, tanto nas instruções, por meio de demonstrações e gestos, quanto
na resposta exigida pela criança, que pode ser por sinais ou por colocação de lâminas em
locais adequados.
Baron-Cohen (2008), co-autor do screening já citado, CHAT, instrumento utilizado
para triagem de traços autísticos em crianças de um ano e meio de idade, já apresenta as
versões Q-CHAT e M-CHAT, mais atualizadas, além do Autism Spectrum Quotient (AQ),
com versões para uso em crianças e em adolescentes. Goldstein e Naglieri também
apresentam uma nova escala, a Autism Rating Scale (ARS), que contém uma versão
screening, com 15 itens, usada para programas de prevenção. Segundo a crença desses
autores, por estar baseada no DSM-IV-TR, essa escala pode facilitar o processo diagnóstico
diferencial entre Transtorno Autista, Transtorno de Asperger e TGD-SOE (Naglieri &
Chambers, 2009). A Pervasive Developmental Disorder Assessment Scale / Screening
Questionary (PDDAS/SQ), escala utilizada no presente estudo, foi elaborada por
Grossmann, em 2004, seguindo também os critérios diagnósticos do DSM-IV. Visa
37
oferecer, a partir da pontuação de seus 48 itens, o grau de comprometimento autístico em
que o indivíduo avaliado se encontra. Abrange igualmente o Transtorno Autista, o de
Asperger e o TGD-SOE, dos Transtornos Globais do Desenvolvimento.
Avaliar um indivíduo autista requer do profissional, portanto, conhecimento amplo
sobre o desenvolvimento infantil típico e sobre as características que compõem essa
síndrome, esmiuçadas nas escalas de avaliação; além de sensibilidade para compreender as
necessidades de cada criança e de sua família. Os arranjos decorrentes da profundidade com
que a tríade autística se manifesta em cada indivíduo determinam as possibilidades de
avaliação e de intervenção nos casos particulares (Tulimoschi, 2003). A compreensão
detalhada do comportamento autista requer, no entanto, que se vá mais além das descrições
dos sintomas básicos do transtorno e se busque entender as capacidades e as limitações
inerentes a esse quadro, bem como os seus mecanismos subjacentes (Sigman & Capps,
2000). Para essa compreensão, a Teoria Cognitiva tem proposto subteorias que tentam
esclarecer o funcionamento cognitivo desses indivíduos.
1.2. Teorias Psicológicas Cognitivas para a explicação do autismo
Algumas teorias cognitivas têm trazido propostas importantes para a compreensão
das defasagens na cognição dos autistas, e ainda não existe uma única que explique o
autismo por completo; cada uma delas tenta esclarecer aspectos diferentes do
funcionamento cognitivo e comportamental presentes nesse transtorno. Para Baron-Cohen
(2008), as teorias psicológicas deveriam explicar os traços autísticos em todos os
indivíduos do espectro, e não apenas em alguns, além de deverem se integrar às teorias
neurobiológicas. Por essa razão, ele descreve os pontos positivos e as falhas de cada
proposta teórica sugerindo formas de sedimentá-las, conforme será descrito nos subitens
específicos.
38
Antes da apresentação dessas teorias, porém, é válido mencionar que falhas na
percepção e na linguagem, ou seja, déficits cognitivos, passaram a ser consideradas
aspectos fundamentais no estudo do autismo a partir da década de 1970 (Wing, 2002),
iniciando-se a busca de causas neurogênicas e não mais psicogências. Desde aquela década,
o olhar sobre as etapas de desenvolvimento cognitivo vem tentando justificar o
comportamento falho do autista no processamento das informações para aquisição de
conhecimento ou para adaptabilidade ao mundo. Scheuer e Andrade (2007) comentam
essas etapas de desenvolvimento cognitivo explicando as interconexões das falhas presentes
no comportamento dos autistas, numa sequência de desabilidades, quais sejam: alterações
sensório-perceptivas, problemas na representação mental, problemas na simbolização ou no
jogo simbólico (imaginação, intencionalidade), dificuldade em transformar objetos internos
em pensamento (manipular, criar e recriar), déficits na linguagem e na comunicação,
dificuldade na formação de conceitos e na compreensão de como e por que os fatos
ocorrem (contextualização social). Essa hierarquia para aquisição de conhecimento é
indiscutível em desenvolvimento infantil e sugere que as dificuldades primárias,
sensoperceptivas, determinam uma relação inicial dos autistas com o mundo, voltada muito
mais para os objetos concretos, físicos, do que para o abstrato. Autistas não desenvolvem
representação operacional, ou seja, manipulação de símbolos para formar conceitos. Não
há, portanto, abstração da informação, e as aprendizagens se tornam mais mecânicas,
rígidas, sem flexibilidade.
A constatação dessas falhas no desenvolvimento cognitivo conduziu a estudos
sobre: a capacidade de representar e metarrepresentar, explicados pela Teoria da Mente
(ToM); a capacidade de estabelecer uma coesão das informações coletadas, explicadas pela
Teoria da Coerência Central; e, a capacidade de organizar o pensamento de forma a garantir
o sucesso em atividades cognitivas complexas, explicada pelas Funções Executivas (Happé,
39
1997; Araújo, 2000; Bosa, 2001). Essas têm sido as três teorias cognitivas mais conhecidas
para explicação do autismo, mas em seu trabalho mais recente Baron-Cohen (2008)
acrescentou duas: a Teoria da Empatia/Sistematização e a Teoria Magnocelular. O
conhecimento aprofundado dessas explicações é particularmente importante para a
compreensão do funcionamento do indivíduo autista em tarefas cognitivas diversas,
sobretudo em testes que medem a capacidade intelectual. Por essa razão, tais teorias serão
descritas nos próximos tópicos, de forma mais detalhada, seguidas de uma abordagem,
também recente, pautada em estudos neurobiológicos.
1.2.1. Teoria da Mente ou Mindblindness
A Teoria da Mente é um termo utilizado para descrever uma capacidade que habilita
as crianças, desde os primeiros anos de vida, a compreender, tanto em si quanto nos outros,
estados mentais como crenças e desejos, valendo-se dessa informação para predizer ou
explicar os comportamentos (Dias, 1993; Roazzi & Santana, 1999; Domingues & Maluf,
2008). Trata-se de um refinamento no sistema representacional do qual a criança se vale
para re-apresentar as experiências vividas, em nível mental. Inicialmente ela representa o
mundo de forma direta, ou primária; a partir da brincadeira do faz-de-conta, ela
gradativamente ativa a imaginação, compreendendo a intencionalidade ou os estados
mentais das pessoas, e passa a metarrepresentar (Sperb & Carraro, 2008). De acordo com
Baron-Cohen (2008) a Teoria da Mente, além de explicar e predizer o comportamento dos
outros, é também usada para identificar as intenções das pessoas por meio de seus gestos e
de sua fala.
Experimentos vêm sendo conduzidos em busca de explicações mais específicas para
as questões de representação e metarrepresentação estudadas na Teoria da Mente (Dias,
Roazzi, O`Brian & Braine, 2002; Sperb & Maluf, 2008). Esses estudos trazem importantes
40
contribuições nas áreas da linguagem e das relações sociais, tornando-se um meio rico de
investigações em autismo. No entanto, por ser uma área de investigação recente, ainda está
sob vários questionamentos, inclusive acerca do ponto de vista inatista ou ambientalista
para a explicação da gênese dessa Teoria (Roazzi & Santana, 1999; Jou & Sperb, 1999).
Além disso, há considerações dos cognitivistas acerca do papel da memória e da atenção
nas mudanças desenvolvimentais da compreensão da mente; da possibilidade de um
fracasso na resposta ser devido a uma dificuldade mais ampla no processamento da
informação e não especificamente na capacidade de compreender os estados mentais; e no
fato de as interferências de aspectos linguísticos relacionados à instrução gerarem respostas
inadequadas das crianças, em relação, sobretudo, a tarefas de falsa crença2 (Jou & Sperb,
1999).
Numa pesquisa feita com crianças brasileiras, Baldini e Assumpção Jr. (2002)
analisaram o uso da Teoria da Mente por autistas e por deficientes mentais, no intuito de
encontrar diferenças nas respostas desses dois grupos especiais em tarefas de falsa crença.
O estudo contou com três grupos, e um deles era de crianças típicas. Foram aplicados dois
testes, visto que no primeiro foi preciso usar dramatização com pessoas reais, para que os
autistas pudessem compreendê-lo. No segundo houve dramatização com objetos concretos,
mas a compreensão foi difícil por parte dos autistas. Os grupos de crianças típicas e de
síndrome de Down não tiveram problemas com a compreensão da tarefa, e entenderam as
instruções a partir das figuras apresentadas. O grupo de autistas mostrou-se bem mais
prejudicado que o de deficiência mental (Síndrome de Down), mas ambos tiveram
2
A mais conhecida investigação sobre falsa crença chama-se “teste de Sally e Anne”, planejado originalmente
por Wimmer e Perner, em 1983. Consiste em apresentar à criança uma cena, na qual uma boneca denominada
Sally guarda uma bolinha de gude em sua cesta. Enquanto sai para passear, uma outra boneca, chamada Anne,
retira a bolinha da cesta de Sally e a coloca em uma caixa. Quando Sally volta para brincar com a bolinha,
pergunta-se à criança: “Onde Sally irá procurar sua bola?”. Baron-Cohen et al. (1985) reproduziram esta
tarefa e constataram que, a partir de quatro anos, as crianças já têm condições de responder que Sally irá
procurar a bolinha na cesta, pois já conseguem atribuir estados mentais ou crenças aos outros.
41
performances abaixo do que é esperado para o desenvolvimento normal. Os autores
apontam a possibilidade de que a compreensão de falsas crenças possa estar relacionada a
habilidades cognitivas semelhantes às requisitadas em testes de inteligência verbal.
Alguns comportamentos emitidos por crianças autistas podem evidenciar a falha no
desenvolvimento da Teoria da Mente, conforme descreve Baron-Cohen (2008). A Tabela 1
sumariza esses comportamentos, a idade em que normalmente ocorrem no desenvolvimento
típico, as manifestações observadas nos autistas e alguns recursos utilizados para detectar
essas falhas. Trata-se de um resumo, apenas para situar as falhas autísticas na idade típica e
verificar os prejuízos sociais que elas acarretam.
Tabela 1. Autismo e Teoria da Mente ao longo do desenvolvimento
Dados extraídos do texto de Baron-Cohen (2008).
Comportamento
Idade
Falhas nos autistas
Investigação
Joint attention (atenção
compartilhada)
1 ano e 2
meses
Apontam pouco, olham pouco para o
rosto do outro e não seguem o olhar da
outra pessoa.
Por meio do CHAT
Pretend play (faz-de-conta)
Aos 2
anos
Limitam-se a descrever cenas fictícias
de filme.
Por meio do CHAT
Compreensão intuitiva
rápida, apreendida no
convívio social.
Aos 3
anos
Não apresentam essa compreensão
intuitiva em seu desenvolvimento
natural, isto é, não percebem que, se
alguém olha para dentro de uma caixa,
por exemplo, pode saber o que tem lá
dentro. Precisam aprender.
Seeing Leads to
Knowing Test: (quem
sabe o que está na
caixa?)
Falsas Crenças e Decepção
Aos 4
anos
Acreditam que aquilo que lhes é dito é
verdade. Captam detalhes físicos dos
fatos, mas não mensagens ou inferências
implícitas. São mais lentos para
compreender decepção.
Sally – Anne False
Believe Test
Olhar para o rosto e prestar
atenção àquilo que o outro
está fazendo.
Branca de Neve
Tarefas complexas de ToM
(de segunda ordem)
Aos 6
anos
Falham em compreender falsas crenças
sobrepostas. Ex: Sally vê, pelo buraco
da fechadura, onde Anne escondeu a
bolinha.
Sally-Anne False
Believe Test implementado
Reconhecimento e
interpretação de expressões
faciais
Aos 9
anos
Mesmo as com Asperger têm
dificuldade em reconhecer as expressões
faciais das pessoas.
Reading the Mind in
the Eyes (child
version)
42
Esse mesmo autor aponta como fator favorável à ToM o fato de que ela justifica as
dificuldades sociais e de comunicação, tanto do autista quanto do Asperger, podendo ter
aplicabilidade em todas as manifestações do espectro. Como limitações, ele salienta que a
empatia implica não apenas ler a mente, mas também dar respostas a tais situações, tarefa
também difícil para o autista. Além disso, a ToM também não explica as áreas não-sociais
afetadas no autismo. Porém, a Teoria da Empatia / Sistematização, que será descrita mais
adiante, vem complementar essas duas limitações.
1.2.2. Teoria da Coerência Central
Um outro conjunto de estudos, apoiado pela teoria cognitiva, que tenta explicar
tanto os déficits quanto as capacidades do autista, e que tem seus experimentos planejados
mais especificamente em tarefas não-verbais e de reconhecimento visual, é a Teoria da
Coerência Central, apoiada na teoria da Gestalt. O termo coerência central é descrito por
Shah e Frith (1993) como sendo uma capacidade de integração de informações diversas
(impressões de detalhe) para se construir um todo, com significado mais amplo (impressões
de conjunto). De acordo com Happé (1997), esta teoria explicaria, ao mesmo tempo, a
dificuldade de reconhecimento de expressões faciais por parte dos autistas, bem como sua
facilidade para construção de desenhos lineares com blocos individuais, como os do
subteste de Cubos das escalas Wechsler.
De fato, uma característica atribuída aos autistas é a de que eles possuem
dificuldade no reconhecimento de expressões faciais (Schwartzman, 2003), o que lhes
compromete a compreensão da comunicação não-verbal por meio de gestos que ocorre
normalmente entre as pessoas. Num estudo desenvolvido por Assumpção Jr., Sprovieri,
Kuczynski e Farinha (1999), quatro figuras com expressões faciais diferentes foram
apresentadas a 30 crianças autistas e a 51 crianças normais. A tarefa era a de observar as
43
figuras e dizer o que a menina do cartão estava sentindo. O desempenho das crianças
autistas foi significativamente inferior ao de crianças normais, e os autores destacam as
falhas na linguagem expressiva que os autistas apresentam, não somente na função
pragmática verbal, mas também na gestual.
No que diz respeito à tarefa de Cubos das escalas, Wechsler, Shah e Frith (1993)
realizaram uma pesquisa, que se tornou referência, avaliando 20 autistas, 33 indivíduos
normais e 12 sujeitos com retardo mental moderado. Os estímulos eram oito modelos de
desenhos de arranjos dos cubos, tanto completos quanto segmentados, rotados ou não,
contendo ou não linhas oblíquas. O grupo de autistas demonstrou ter mais habilidade que os
outros grupos para a reprodução das figuras com desenhos não segmentados. Frith (2003)
comenta de uma manipulação posterior desse experimento, salientando que, quando os
desenhos foram previamente segmentados, as crianças não-autistas melhoraram
significativamente sua performance, ao passo que, para os autistas o efeito foi muito
pequeno. A questão considerada nessa tarefa é a de que as crianças, de um modo geral,
aprendem a controlar a força coesiva central gradativamente, conforme lhes são dados
passos iniciais para a compreensão da segmentação do desenho completo; os autistas não se
valem dessa aprendizagem, mantendo a idéia de fragmentação. Frith explica que coerência
central é uma força que une ou mantém juntas várias informações. Força na coerência
central dificulta a visão de detalhe (é ver a floresta, e não as árvores), e fraqueza na
coerência central dificulta ver o todo (é ver as árvores, e não a floresta). Essa força pode
mudar ao longo do tempo e se modificar em diferentes domínios de interesse, mas nos
autistas ela pode nunca ser obtida.
Por meio desta teoria poderiam ser explicadas, então, as ilhas de habilidade em
alguns autistas, ou seja, excelente atenção a detalhe, memória para detalhes e habilidades
em um tópico específico, presentes em alguns indivíduos do espectro. Focalizar um detalhe
44
de uma cena é uma capacidade de atenção, vista como superior em autistas, se comparados
com grupo típico. Em tarefas como a do Children’s or Adult Embedded Figures Test, em
que é requerido encontrar uma determinada figura num desenho mais complexo, os autistas
apresentam desempenho mais rápido. No Navon Test (Letra A escrita por Hs) e no
Homographs Test (pares de sentenças contendo homógrafos não homófonos), o
desempenho dos autistas se dá no sentido de focalizar o detalhe (a letra H), a palavra
isolada (confundindo-se na pronúncia), e não o todo, demonstrando percepção mais
limitada do contexto e mais focada no detalhe (Baron-Cohen, 2008).
Como crítica a essa teoria, Baron-Cohen (2008) aponta que ela também não explica
as características de todos os indivíduos do espectro, pois alguns Aspergers podem se sair
bem nesses testes. Além disso, ela deveria deixar claro qual o real nível de dificuldade de
integração os autistas teriam. Como sugestão, ele propõe que a teoria se associe à teoria da
Conectividade (uma teoria neurobiológica), que propõe que os indivíduos do espectro do
autismo teriam uma superconectividade em pequenas extensões, ou seja, células nervosas
fazendo pequenas conexões locais no cérebro. Ele sugere também a associação desta teoria
com a evidência da hipersensibilidade sensorial do autista, já que estes são hábeis em
detectar mudanças sonoras, nos sabores, e em tarefas de busca visual.
1.2.3. Teoria das Funções Executivas
Seguindo as contribuições da teoria cognitiva para a compreensão de algumas
características do autismo encontram-se alguns estudos envolvendo funções executivas.
Similaridades entre o comportamento de indivíduos autistas e o de lesionados frontais
levaram autores como Pennington e Ozonoff, em 1996, a tentar compreender o autismo sob
a ótica das disfunções executivas, baseados naquilo que chamaram de metáfora frontal
(Cabarcos & Simarro, 2002).
45
Função executiva, segundo Zuddas e cols. (2005) é um termo guarda-chuva que
abarca funções como: planejamento, memória de trabalho, controle de impulsos, inibição,
flexibilidade mental, iniciação e monitoramento das ações. De acordo com Frith (2003), as
habilidades executivas não são necessárias em atividades comuns como andar e comer, mas
são requeridas quando é preciso mudar de plano, tomar decisões, fazer várias tarefas ao
mesmo tempo ou inibir respostas impulsivas inapropriadas. Por essa razão, o autismo tem
sido associado a déficits nas funções executivas, e os fatores mais prejudicados são o
planejamento das ações (ou a habilidade de gerar novas idéias) e a atenção alternada (ou a
capacidade de alternar tarefas, ser flexível, mudar a regra, como no Wisconsin Cards Test),
o que explicaria o comportamento repetitivo, perseverativo ou estereotipado do autista,
visto ele não conseguir planejar novas ações nem mudar o foco de atenção (Frith, 2003;
Baron-Cohen, 2008).
Baron-Cohen (2008) critica a evidência limitada desta teoria, afirmando que ela
também falha em explicar o comportamento de todos os autistas do espectro, uma vez que
Aspergers podem se sair bem em tarefas como a Torre de Londres, por exemplo. No
entanto, Frith (2003) comenta que os testes têm mostrado que nem todas as pessoas com
lesão no lobo frontal apresentam problemas em todas as funções executivas, sendo isso
também válido para o autismo. Como sugestão, Baron-Cohen associaria esta teoria com a
Teoria do Monotropismo, a qual postula que um cérebro típico pode focalizar duas ou mais
tarefas simultaneamente, ao passo que em Autismo ou em Asperger a atenção se dirige a
apenas um foco.
Um estudo sobre o processamento da informação, realizado por Ring e cols. (1999)
utilizou a Ressonância Magnética Funcional (fMRI) em sujeitos com e sem autismo, para
investigar se haveria diferença na ativação de regiões do cérebro durante a performance dos
indivíduos na Tarefa de Figuras Embutidas (Embedded Figures Task). Os resultados
46
mostraram que muitas regiões foram ativadas de maneira similar em ambos os grupos, mas
o grupo de indivíduos normais apresentou maior ativação em áreas do córtex pré-frontal, e
o grupo de autistas apresentou maior ativação em regiões têmporo-occipitais ventrais. Para
os autores, esses dados sugerem que os grupos valem-se de estratégias cognitivas
diferenciadas, ou seja, o grupo de normais utiliza sistemas da memória de trabalho,
enquanto os autistas utilizam sistemas visuais para análise dos objetos.
A afirmação anterior pareceu muito categórica, e reflexões importantes em relação a
isso, talvez mais esclarecedoras, possam ser retiradas do depoimento de Grandin (1996),
uma autista norte-americana que diz pensar em imagens e considera as palavras como uma
segunda língua. Em seu relato, ela conta que pensar visualmente permitiu-lhe construir um
sistema de imaginação que a ajudou em seu trabalho de projetista de equipamentos
pecuários. Completa sua fala dizendo que os autistas tendem a ser hábeis em padrões
visuais espaciais, em detrimento de execuções verbais, mas não coloca isso se contrapondo
a uma outra habilidade. Ela descreve seu pensamento, dizendo:
My imagination works like the computer graphics programs that created the lifelike
dinosaurs in Jurassic Park. […] I don’t need a fancy graphics program that can
produce three-dimensional design simulations. I can do it better and faster in my
head. (p. 21)3
Todos esses comprometimentos, juntamente com as habilidades manifestadas pelos
autistas, sugerem que mais teorias devam ser exploradas no sentido de tentar compreender
aspectos específicos do comportamento autístico, bem como mais investigações devam ser
feitas para comprovação de hipóteses provenientes desses estudos. Pensamento verbal,
pensamento imagético e potencial intelectual em indivíduos autistas são assuntos que ainda
3
Tradução da autora: Minha imaginação trabalha como o programa gráfico de computador que criou o
dinossauro ao natural no Jurassic Park [...] Eu não preciso de um programa gráfico que possa produzir
simulações de projetos em terceira dimensão. Eu posso fazê-lo melhor e mais rápido em minha cabeça.
47
necessitam ser investigados profundamente. Se a habilidade básica de lidar com as
informações provenientes do meio pode se desenvolver no plano verbal e no plano das
imagens, de forma conjunta ou interdependente, e o quanto esses fatores interferem ou são
influenciados pelo comportamento social de um indivíduo são questões relevantes para se
considerar numa avaliação cognitiva de crianças autistas.
1.2.4. Teoria da Empatia / Sistematização e Teoria do Cérebro Extremamente
Masculino
De acordo com Baron-Cohen (2008) esta teoria explica não apenas as dificuldades
sociais e de comunicação do autismo, mas também a grande maioria das características
presentes em quadros de autismo e Transtorno de Asperger. Esse autor divide o conceito de
empatia em empatia cognitiva, que comporta a ideia de Teoria da Mente, ou seja,
reconhecer os estados mentais em si e nos outros, e empatia emocional que seria uma
reação apropriada aos sentimentos e pensamentos das pessoas. Contudo, ele deixa claro que
o que caracteriza realmente o Transtorno do Espectro do Autismo não é a ausência de
empatia, mas a discrepância entre empatia e sistematização.
Por sistematização entende-se a capacidade de analisar, explorar, ou até mesmo
construir um sistema qualquer, que pode ser do tipo numérico, mecânico, motor, natural,
abstrato ou social, entre outros. Todos esses sistemas têm regras, e sistematizar significa
tentar identificar as regras subjacentes a eles, perceber suas regularidades (Baron-Cohen,
2004; 2008). Porém, por meio da sistematização é possível compreender e prever apenas a
natureza das coisas, mas não de pessoas. Isso se dá pela empatia, pois a sistematização não
se aplica na interação social rotineira, do dia a dia (Baron-Cohen, 2004).
Esta teoria possui muitas vantagens, e uma delas é a de ser bifatorial, ou seja, por
um lado o baixo escore em empatia explica as dificuldades em comunicação social, e, por
48
outro lado, o alto escore em sistematização explica os interesses específicos, os
comportamentos repetitivos e a resistência a mudanças, com manutenção das mesmices.
Para um sistematizador, tudo precisa ser previsível, e as coisas só podem mudar aos
poucos, uma de cada vez (Baron-Cohen, 2004).
Diferentemente das teorias da Coerência Central e das Funções Executivas, esta
proposta vê os comportamentos repetitivos e os interesses específicos do autista como o
resultado de um comportamento inteligente, ou seja, capaz de fazer análise minuciosa de
um sistema, observando todas as suas variáveis e não fazendo generalizações precoces.
Então, nessa visão positiva, considera a sistematização como um estilo cognitivo, cuja
característica principal é a excelente atenção a detalhes, visto que cada parte de um sistema
tem uma regra funcional (Baron-Cohen, 2008).
Uma proposta mais ampliada desta teoria, para os autistas, é denominada de Teoria
do Cérebro Extremamente Masculino, a qual foi inicialmente proposta por Asperger, em
sua tese publicada em 1944, segundo Baron-Cohen (2004; 2008), e agora vem sendo
estudada e explicada por este último autor desde o final da década passada. Como
explicação do modelo, Baron-Cohen descreve cinco tipos possíveis de cérebro encontrados
a partir das dimensões Empatia (E) e Sistematização (S), já comentadas.
O Tipo E corresponde a empatia maior que sistematização, ou E > S; o tipo S
corresponde a sistematização maior que empatia, ou S > E; o tipo B é a condição
balanceada entre E e S, ou seja, E = S; o tipo E extremo refere-se a E bem maior que S,
representado por E > > S e ainda sem o reconhecimento de nenhum grupo nessa categoria;
e, por fim, o tipo S extremo, ou S > > E, no qual a sistematização aparece de forma bem
mais acentuada que a empatia, tem aqui os autistas como representantes. Como evidência
dessa discrepância entre S e E o autor comenta sobre o baixo desempenho em tarefas de
empatia e alto desempenho em tarefas de sistematização, por parte dos autistas e dos
49
Aspergers, em tarefas usadas por ele, dentre as quais o Quociente de Empatia (QE), o
Quociente de Sistematização (QS) e o Quociente do Espectro do Autismo (QA).
1.2.5. Teoria Magnocelular
Trata-se de uma teoria atual para explicação do autismo que o considera como uma
disfunção específica na via magnocelular (M) do sistema visual, responsável pelo
processamento do movimento, ainda que a via parvocelular (P), responsável pelo
processamento da forma, esteja intacta. Segundo Baron-Cohen (2008), alguns dos estudos
relacionados a esta teoria mostram que os autistas são mais lentos para detectar mudanças
no campo visual quando lhe são mostradas várias figuras rapidamente, e a percepção do
movimento depende das conexões efetuadas pela via magnoceleular. Esta teoria tem seu
valor no sentido de unir teoria psicológica com neurológica, abrindo novos caminhos para
pesquisa.
McCleery, Allman, Carver e Dobkins (2007) conduziram um estudo no qual
avaliaram 13 crianças de seis meses de idade, consideradas de risco para TEA em função de
terem irmãos mais velhos autistas. Usaram estímulos visuais que verificavam, tanto a via
magnocelular, quanto a via parvocelular do sistema visual primário. Em comparação com
um grupo controle de 26 crianças sem histórico familiar de autismo, constataram que a via
P era idêntica nos dois grupos, mas a M estava mais comprometida no grupo de risco. Os
autores concluem que o autismo pode estar associado a uma disfunção na via M no começo
de vida, e isso pode ser diagnosticado precocemente em crianças. Segundo eles, a via M
desenvolve-se cedo, e qualquer anormalidade nela pode se desdobrar em um conjunto de
outras anormalidades posteriores, inclusive no processamento facial. Tal processamento
tem origem na via visual M que se projeta para a amigdala, que é uma estrutura do sistema
límbico relacionada, dentre outros fatores, às expressões faciais das emoções.
50
Milne (2005), estudiosa no assunto, explica mais detalhadamente essa questão,
inclusive assumindo que a dificuldade na detecção dos movimentos visuais não está
presente em todos os autistas, havendo necessidade de mais estudos na área. Ela esclarece
que as duas vias paralelas, magnocelular e parvocelular, são especializadas respectivamente
pela percepção do movimento e percepção da forma, e que estão separadas anatômica e
funcionalmente. Os neurônios magnocelulares respondem preferencialmente aos estímulos
de frequência espacial mais baixa e temporal mais alta, como o movimento e a luz piscante;
já os parvocelulares respondem a estímulos de frequência espacial mais alta e temporal
mais baixa, como os estímulos estáticos. Ela também compartilha da hipótese de que a
percepção do movimento esteja comprometida em TEA, decorrente de anormalidades no
sistema magnocelular (em nível subcortical) e no feixe dorsal (em nível cortical), visto que
esse feixe recebe apenas input do sistema M, enquanto o feixe ventral recebe input de
ambos os sistemas M e P.
Algumas críticas a essa teoria têm sido feitas porque a proposta de que o problema
do autismo seja puramente visual não explica a hipersensibilidade em outras áreas
sensoriais, como a auditiva ou a olfativa, por exemplo; outro fator é o que, se os autistas
não processassem os estímulos visuais em movimento, não estariam tão ligados a esses
estímulos quando pequenos; além disso, as anormalidades magnocelulares também podem
estar presentes em casos de dislexia e não só em autismo (Baron-Cohen, 2008). Milne
(2005) já comentava, no entanto, que, apesar de esse comprometimento aparecer também
em outros quadros clínicos, em TEA ele se apresenta de forma generalizada para vários
tipos de movimento, dentre os quais a coerência do movimento, o movimento de rotação, o
movimento biológico (percepção de movimentos animados, como caminhar, saltar, nadar).
Nos outros quadros, o comprometimento é mais restrito à detecção de coerência de
movimento. Os estudos devem seguir verificando, além de outros fatores, se há relação
51
entre esse comprometimento e os sintomas de severidade em TEA, e se ele pode impactar
nas habilidades cognitivas.
Ramus (2005) discute essa questão à luz de dois modelos: o de múltiplos fatores de
risco e o de marcador não-específico. No primeiro modelo, o déficit na percepção do
movimento seria um forte fator de risco para TEA, mas não o único, contando com a
possibilidade de combinações com outros fatores também importantes. TEA seria visto
como tendo múltiplos sintomas, mas não sistemáticos. No segundo modelo, acrescenta-se o
fato de que associar um sintoma a um transtorno não obrigatoriamente coloca esse sintoma
como sendo a causa do transtorno. É possível haver similaridades entre dois transtornos e
marcadores não-específicos comuns a eles, como a dislexia e o autismo, por exemplo.
Uma outra abordagem, mais relacionada à neurobiologia, vem também despontando
nas pesquisas sobre autismo, ajudando a fundamentar neurologicamente a questão da
dificuldade no estabelecimento da empatia pelos indivíduos autistas. Trata-se dos estudos
sobre o sistema de neurônios espelho, que devem aqui ser apresentados para finalizar esse
conjunto de informações que tentam explicar o que ocorre com um cérebro tão atípico.
1.2. 6. Sistema de Neurônios Espelho
O estudo sobre neurônios espelho teve início em 1996, na Universidade de Parma,
Itália, com os pesquisadores Gallese, Fogassi e Rizzolatti. A partir de observações feitas
por esses neurofisiologistas (especificamente focalizadas na área F5 do córtex motor de
macacos, área essa associada aos movimentos entre mão e boca), foi percebido que os
mesmos neurônios que disparavam, quando os macacos executavam a ação de pegar algo e
conduzir à boca, também disparavam quando os macacos viam os pesquisadores levando
alimento à boca, como se eles próprios estivessem pegando o alimento para comer. Este
experimento abriu as portas para que investigações mais detalhadas fossem feitas
52
considerando a possibilidade de neurônios espelho também reagirem a som e a situações
inacabadas que contivessem pistas da ação anteriormente executada (Kohler & cols., 2002).
Foi possível concluir que essa classe de neurônios (dividida em vários tipos como:
neurônios espelho audiovisuais, neurônios espelho de pegar etc.) justificaria a compreensão
das ações dos outros, ou seja, esses neurônios específicos serviriam para sinalizar o
significado do ato.
O sistema de neurônios espelho em humanos é formado por uma rede cortical
constituída pela parte rostral do lobo parietal inferior e pelo setor caudal do giro frontal
inferior, além das partes adjacentes do córtex pré-motor (Gallese, Keysers & Rizzolatti,
2004). Estudos valendo-se da monitoração por meio de Tomografia de Emissão de
Pósitrons (PET), da atividade neuronal de voluntários que observavam diversas ações de
preensão, também registraram ativação de neurônios espelho no sulco superior temporal, no
lobo parietal inferior e no giro inferior frontal, áreas que correspondem ao córtex pré-motor
ventral dos macacos, incluindo F5 (Rizzolatti, Fogassi & Gallese, 2006).
Noutro estudo, valendo-se de Imagens por Ressonância Magnética Funcional
(fMRI) em humanos, os autores concluíram que o sistema de neurônios espelho tem
função, não apenas de fornecer um mecanismo de reconhecimento das ações, mas também
constitui-se num sistema neural capaz de codificar as intenções dos outros (Iacoboni &
cols., 2005). Esse espelhamento pode ter surgido mais tarde, na linha da evolução
filogenética, para subsidiar o aprendizado com base na observação de habilidades
cognitivas sofisticadas (Rizzolatti, Fogassi & Gallese, 2006).
Gallese, Keysers e Rizzolatti (2004) propõem que o mesmo mecanismo de
espelhamento que permite a compreensão das ações do outro, por meio de observação,
também permite a compreensão das emoções do outro, sendo essa a base neural da
cognição social. A observação da ação ou da emoção de alguém, por exemplo, o desagrado
53
manifestado na expressão facial, ativa uma rede neuronal de áreas parietais e pré-motoras
para a ação, e de parte da ínsula para a expressão de desagrado, como se o próprio
observador estivesse agindo ou sentindo aquilo. Segundo os autores “...the understanding of
basic aspects of social cognition depends on activation of neural structures normally
involved in our own personally experienced actions or emotions. By means of this
activation, a bridge is created between others and ourselves. (p. 400)4
Com base nesses pressupostos, Ramachandran e Oberman (2006) consideram que
deficiências na capacidade de espelhamento podem explicar o comportamento de autistas,
pois os neurônios espelho estão associados a aptidões como empatia e percepção de
intenções alheias. Isso significa que os neurônios espelho (ou as redes neurais de que fazem
parte) permitem às pessoas determinar as intenções dos outros, por meio da simulação
mental das ações deles. Ao observar um estímulo social, representações internas são
evocadas no observador, como se ele próprio estivesse experienciando uma emoção similar.
Isso é chamado de simulação incorporada (embodied simulation), de acordo com Gallese
(2007). Os neurônios espelho capacitam os seres humanos a interpretar intenções não
somente simples, mas complexas, nas ações dos outros. Regiões como o córtex insular e o
córtex cingulado contêm neurônios espelho e estão diretamente envolvidas nas
demonstrações de empatia (Ramachandran & Oberman, 2006).
1.3. Conclusão do capítulo
Apesar de existir o reconhecimento do avanço nas investigações ao longo de todos
esses anos, desde o autismo de Kanner aos Transtornos do Espectro do Autismo, sabe-se
que o mundo interno do indivíduo autista ainda é um enigma. Esses estudos evidenciaram o
4
Tradução da autora: “...a compreensão dos aspectos básicos da cognição social depende da ativação de
estruturas neurais normalmente envolvidas nas nossas próprias ações ou em emoções experimentadas
pessoalmente. Por meio dessa ativação, a ponte é criada entre os outros e nós”.
54
quanto é complexo esse transtorno e o quanto é necessário que as teorias cognitivas, aliadas
aos estudos neurológicos, avancem na busca da compreensão do funcionamento adaptativo
desses indivíduos. Saber como eles apreendem os estímulos do ambiente, como processam
essa informação, almejando um dia compreender o porquê de eles darem respostas tão
discrepantes de seus pares típicos é um desafio para os profissionais interessados no
assunto.
Num texto recente, informativo sobre questões que envolvem características
diversas do autismo, Rapin (2009) consegue reunir uma série de sintomas referentes às
respostas sensoperceptivas desses indivíduos, sintomas que já vêm sendo descritos na
literatura a respeito, mas que merecem reflexão acerca da heterogeneidade com que eles se
apresentam. Essa autora chama a atenção para o fato de que a forma como os autistas
reagem aos estímulos sensoriais é, na verdade, a grande delatora do problema, mas essa
forma é extremamente variada, de indivíduo para indivíduo, no sentido de que uma
determinada modalidade sensorial pode estar afetada em um autista, e não em outro. Ao
mesmo tempo, uma reação exagerada a um determinado estímulo (por exemplo, auditivo)
pode ocorrer em um dado momento, mas logo depois gerar resposta de indiferença no
mesmo indivíduo. Sobre as respostas atípicas do autista aos estímulos ambientais, Rapin
(2009) comenta que as implicações estão no processamento sensorial, ou seja, na
percepção, na atenção seletiva, na memória de curto prazo e na alocação dos recursos
cognitivos.
Dentre os problemas sensoriais que aparecem desde cedo em crianças autistas, e que
por isso servem de alerta para pais e profissionais de que existe um padrão de
comportamento que está fugindo da normalidade, citam-se: os olhares desviantes,
prolongados; falta de resposta a sons; auto-agressão; hiper ou hipossensibilidade tátil;
cheirar a comida antes de prová-la, além de ser seletivo com os alimentos; cheirar pessoas;
55
lamber as mãos ou objetos; ter limiar baixo para náuseas, quando giram; ter baixo limiar
para dor (Wing, 2001; Frith, 2007; Rapin, 2009). Considerando apenas o sistema visual, a
forma atípica com a qual eles lidam com essas informações talvez seja mais intrigante,
porque a esquiva do contato ocular, a fixação em objetos que giram, a inclinação da cabeça
formando ângulos incomuns ocorrem juntamente com as habilidades para processar
detalhes de cenas visuais complexas e com uma memória visual espacial excelente (Rapin,
2009).
Gikovate, já em 1999, baseou-se nos sintomas de que autistas são indiferentes a
determinados estímulos, prestam atenção em algum objeto que escolhem e olham muito
tempo para um mesmo objeto (por exemplo, um barbante ou uma folhinha), para salientar a
questão da dificuldade de processamento atencional que esses indivíduos têm. Seu estudo
foi teórico, mas ela retoma investigações experimentais feitas com autistas desde a década
de 1970 até a década de 1990, que já mencionavam a superseletividade manifestada por
esses indivíduos frente a estímulos de diferentes modalidades, e a dificuldade em atenção
alternada apresentada por eles também.
Essas informações são fundamentais para a proposta da presente pesquisa e
conduzem à especulação dos processos de atenção e percepção que fazem parte do próximo
capítulo. Buscou-se compreender como têm sido estudados esses processos psicológicos, à
luz da Neurociência Cognitiva, e como eles têm sido investigados com indivíduos autistas.
56
57
CAPÍTULO 2 ATENÇÃO E PERCEPÇÃO
2.1. Compreendendo os processos de atenção
A atenção, de acordo com Sternberg (2000, p.78) “é o fenômeno pelo qual
processamos ativamente uma quantidade limitada de informações do enorme montante de
informações disponíveis através dos nossos sentidos, de nossas memórias armazenadas e de
outros processos cognitivos”. Ela tem sido foco de estudo desde os primórdios da
Psicologia. Gazzaniga, Ivry e Mangum (2006) citam um trecho escrito por William James,
no século XIX, e comentam o quanto essa informação, oferecida há tanto tempo contém
dados sobre funções da atenção estudadas hoje em dia, como a focalização, a seletividade e
a sustentação. Segue o texto:
Todo mundo sabe o que é atenção. Vai tomando conta da mente, de forma clara e
viva, e para aquele que assim não se encontra, vários objetos ou raciocínios parecem
simultaneamente possíveis. Focalização, concentração da consciência são sua
essência. Isso implica a retirada de algumas coisas de forma a lidar efetivamente
com outras, e é uma condição que é oposta ao estado confuso, aturdido, dispersivo.
(Gazzaniga, Ivry & Mangum, 2006, p.263)
Em meados do século passado, Luria (1979) divulgou seus estudos sobre a
organização funcional da atividade mental, e descreveu a atenção como sendo a base sobre
a qual se organizam os processos mentais, salientando seu caráter de direcionalidade e
seletividade. Atualmente, a Psicologia Cognitiva vem estudando os processos da atenção
ampliando o conhecimento sobre sua estrutura, vista como dinâmica, e propõe um modelo
hierárquico para os comportamentos atentivos, que partem dos estados globais, como o
sono e a vigília, aos estados seletivos. Um esboço desse modelo pode ser visto na Figura 1.
58
Acordado
Adormecido
Estados
gerais
Desatento (estado
sonolento, relaxado)
Atento
(estado de alerta)
Ignora estímulos
irrelevantes
Presta atenção a
estímulos relevantes
Estados
seletivos
Figura 1. Relações hierárquicas entre estados gerais e seletivos de atenção.
Fonte: adaptado de Gazzaniga, Ivry e Mangum (2006) e Lima (2005).
O estado de alerta permite a ativação do organismo, mas são os estados seletivos
que organizam a interação desse organismo com o ambiente, garantindo sua adaptação às
situações. Por ser uma capacidade cognitiva multidimensional que funciona como prérequisito para que habilidades cognitivas complexas possam ocorrer (Ostrosky-Solís &
Gutiérrez, 2006), a atenção vem sendo classificada de formas variadas, cada uma
focalizando um aspecto diferente de suas manifestações.
De acordo com sua natureza ou origem, pode ser classificada como voluntária ou
involuntária. A atenção voluntária, ou endógena, como o próprio termo propõe, é a
habilidade que comporta a intencionalidade de prestar atenção em alguma coisa. Envolve a
seleção ativa do indivíduo sobre uma atividade e, por isso, está associada à motivação, a
interesses, expectativas (Gazzaniga, Ivry & Mangum, 2006; Dalgalarrondo, 2008). A
atenção involuntária, reflexa ou endógena é suscitada por estímulos ambientais
inesperados; está ligada à reação de orientação, em que o indivíduo precisa movimentar a
cabeça e os olhos para ser capaz de processar a informação (Lima, 2005; Gazzaniga, Ivry &
Mangum, 2006).
59
A forma como a atenção é operacionalizada, permite que seja classificada em
atenção seletiva, atenção sustentada, atenção alternada e atenção dividida (Lima, 2005;
Nahas & Xavier, 2005). Por atenção seletiva, compreende-se a capacidade do indivíduo
para selecionar alguns estímulos ignorando outros. Segundo Dalgalarrondo (2008), ela
resume a qualidade mais importante dos processos de atenção, a seletividade. A atenção
seletiva requer monitoramento dos vários canais de informação para que a tarefa seja
executada. Já a atenção sustentada é a capacidade de manter o foco de atenção em um
estímulo ou em uma sequência de estímulos durante um tempo suficiente para que uma
tarefa seja desempenhada. Atenção alternada é a capacidade de alternar o foco de atenção,
isto é, desfocalizar um estímulo para focalizar outro. Implica, portanto, flexibilidade mental
e controle da informação que será focada seletivamente (Ostrosky-Solís & Gutiérrez,
2006). Por fim, a atenção dividida é a capacidade de desempenhar duas tarefas
simultaneamente. Ostrosky-Solís e Gutiérrez (2006) enfatizam o parecer de outros autores
sobre esse tipo de atenção, que a colocam como hierarquicamente acima das outras
mencionadas, sendo a mais complexa, porém a mais vulnerável.
Sternberg (2008) propõe uma terminologia um pouco diferente da citada
anteriormente, considerando as funções da atenção. Ele as classifica em vigilância ou
detecção de sinais, busca, atenção seletiva e atenção dividida. Vigilância refere-se à
identificação de um estímulo específico, esperado; manter-se em vigilância é esperar um
estímulo aparecer, portanto envolve focalização e sustentação da atenção (Lezak, Howieson
& Loring, 2004). Busca é a procura ativa por estímulos predeterminados. Quanto à atenção
seletiva e à dividida, estas não diferem do que já foi conceituado.
Em relação ao foco sobre o qual a atenção se detém, ela pode ser chamada de
percepção seletiva ou de cognição seletiva. Percepção seletiva refere-se ao foco da atenção
no ambiente externo, e cognição seletiva é o termo atribuído quando o foco da atenção está
60
nos processos mentais, como memória, pensamentos, recordações, cálculos (Lima, 2005).
Esta classificação é vista por Dalgalarrondo (2008) como sendo relativa à direção da
atenção, e ele usa os termos atenção externa e atenção interna em vez de percepção e
cognição seletiva. Esse mesmo autor propõe mais uma classificação da atenção em relação
à amplitude, dividindo-a em focal e dispersa. A atenção é focal quando “se mantém
concentrada sobre um campo determinado e relativamente delimitado e restrito da
consciência”; e é dispersa quando “não se concentra em um campo determinado,
espalhando-se de modo menos delimitado” (Dalgalarrondo, 2008, p.103).
Dentre os vários instrumentos que têm sido usados na prática neuropsicológica em
avaliação da atenção, destaca-se o Teste de Cancelamento, que será o único aqui
comentado por ser este o tipo de instrumento utilizado, na presente pesquisa, para avaliação
da atenção. De acordo com Lezak, Howieson e Loring (2004), este teste se enquadra como
sendo de percepção visual, e os autores justificam que as funções atencionais e perceptuais
estão separadas apenas teoricamente, pois trabalham juntas. Segundo eles, o teste investiga,
quando cronometrado, a seletividade visual e a velocidade de processamento; além disso,
pode avaliar a capacidade para atenção sustentada, a precisão na varredura visual, a
ativação e a inibição de respostas. Normalmente, seu formato consiste em uma série de
linhas, nas quais estão distribuídos, aleatoriamente, estímulos-alvo. O examinando deve
assinalar, com um lápis, todos os estímulos-alvo encontrados, e a pontuação é feita sobre
erros por omissões e erros por acréscimos. Esses autores mencionam a possibilidade de
uma tarefa desse tipo se tornar mais complexa, determinando-se, por exemplo, que a busca
deva ser feita sobre dois estímulos-alvo em vez de apenas um.
O Teste d2 (Brickenkamp, 2000), utilizado para avaliar atenção concentrada, é um
tipo de teste de cancelamento com busca de três estímulos-alvo. Nele, a pontuação é feita
sobre um total de itens examinados (resultado bruto), um total de erros (omissões e
61
acréscimos), um total de acertos (resultado líquido), porcentagem de erros, distribuição de
erros e amplitude de oscilação. Há tabelas normativas brasileiras para a conversão desses
resultados em percentil, por idade, de nove a 52 anos. O resultado bruto indica a rapidez de
desempenho no teste, mas a porcentagem de erro indica a precisão; a amplitude de
oscilação mostra a variação no ritmo de trabalho e a capacidade de concentração.
Wasserman e Lawhorn (2003) ressaltam que, nos testes de cancelamento, a
dificuldade na tarefa pode variar de acordo com alguns fatores, como a ordem mais
estruturada ou mais aleatória dos estímulos-alvo, o tamanho do campo visual de busca e o
tipo de estímulo-alvo utilizado, ou seja, letras, dígitos ou figuras abstratas. Normalmente,
este tipo de teste tem instruções breves. Outro comentário desses autores refere-se à
possibilidade de se observar, em testes por cancelamento, a síndrome da negligência
hemiatencional, que ocorre quando os erros por omissão são sensivelmente maiores no
campo esquerdo do examinando do que no campo direito. Esse fato, assim como o de
lentidão generalizada, tem implicações neurológicas que precisam ser investigadas.
Quanto à anotação da busca do estímulo em relação ao tempo, Wasserman e
Lawhorn (2003) citam uma recomendação de Mesulam que se resume em fazer uma
codificação por cor, ou seja, com lápis coloridos que vão sendo oferecidos ao examinando
após um número determinado de alvos marcados, ou após um tempo estabelecido. Outra
forma de anotar o processo de busca é desenhar a trajetória das marcas feitas pelo
examinando. Eles dizem que adolescentes e adultos normais costumam ter uma conduta
sistemática, planejando a busca, começando sempre da esquerda para a direita ou de cima
para baixo, se a distribuição dos estímulos-alvo na folha for aleatória. Afirmam que
crianças com menos de oito ou nove anos normalmente fazem varredura (scanning) e
marcam os alvos aleatoriamente, numa sequência que não é sistemática.
62
Como vantagens dos testes de cancelamento, citam-se a rapidez com que ele pode
ser aplicado e o uso simples de lápis e papel na sua execução, o que dispensa sofisticação
de equipamentos. Como desvantagem, ele se mostra um teste limitado para avaliar atenção
sustentada, até mesmo pelo seu curto tempo de aplicação (Wasserman & Lawhorn, 2003).
O teste de cancelamento escolhido nesta pesquisa incorpora as vantagens acima citadas,
além de ser composto por três partes que avaliam a seletividade simples, complexa e a
alternância da atenção (Montiel & Capovilla, 2007), aspectos estes vistos como mais
comprometidos em indivíduos autistas.
2.2. Estudos sobre a atenção visual em autistas
Especificamente sobre atenção visual, os estudos têm buscado investigar a
seletividade e a alternância desse processo, por serem estes os fatores mais relacionados
com as respostas sensoriais que esses indivíduos manifestam, ou seja, fixação no detalhe e
inflexibilidade para mudança de foco (Gikovate, 1999). De acordo com um estudo de
revisão, de Barthold e Egel (2001), já na década de 1970, Lovaas teria usado o termo
superseletividade do estímulo (stimulus overselectivity) para descrever o comportamento de
crianças autistas, a partir de um experimento no qual elas foram treinadas em tarefas de
discriminação de estímulos complexos. Elas deveriam acionar uma alavanca quando três
estímulos diferentes (luz, som e toque) aparecessem ao mesmo tempo. Em condição de
testagem posterior, os estímulos lhes eram apresentados separadamente. Os resultados
mostraram que as crianças acionaram a alavanca diante de apenas uma modalidade, e a
explicação foi a de que, na fase de treinamento, eles tendiam a responder para apenas um
dos três estímulos.
Nos estudos subsequentes revistos por Barthold e Egel (2001), inclusive alguns do
próprio Lovaas, foi encontrado que crianças com QI mais baixo apresentavam tendência a
63
superseletividade, mais do que as de QI alto. Além disso, também foi encontrado que a
superseletividade estaria mais ligada ao nível de desenvolvimento, independentemente do
diagnóstico. A dimensão do estímulo foi um outro fator visto como variável que afetava
tarefas visuais de discriminação. É preciso refletir sobre o fato de que ao mesmo tempo em
que as pesquisas cresceram na consideração das variáveis que poderiam interferir nas
respostas observadas, o autismo da década de 1970 também foi se modificando enquanto
grupo clínico, tornando-se mais heterogêneo. As pesquisam foram acompanhando os
achados neurológicos.
Courchesne e cols. (1994) avaliaram oito autistas com idade média de 13,9 anos,
sem comorbidades, comparados com pacientes que tinham lesões cerebelares e com
indivíduos normais. Os resultados indicaram que, tanto os indivíduos com autismo, quanto
os pacientes com lesão, apresentaram dificuldade em alternar rapidamente a atenção entre
as modalidades sensoriais de visão e audição. No entanto, quando ambos os grupos tiveram
mais tempo para execução da tarefa, não se diferenciaram, de forma significativa, do grupo
de indivíduos normais.
Um outro estudo sobre atenção foi realizado por Goldstein, Johnson e Minshew
(2001) no qual 103 autistas de alto funcionamento (QI verbal e total ≥ 70) foram
comparados com 103 indivíduos normais. Os autistas foram considerados de alto
funcionamento, por descrição clínica. Foram excluídos os casos de comorbidade. A bateria
de testes escolhida avaliava vários componentes da atenção, como focalização, sustentação
e alternância. Quase todos os testes tinham componente psicomotor. Os autores concluíram
que as maiores diferenças entre os grupos ocorreram nas medidas que requeriam alternância
(ou flexibilidade cognitiva) e rapidez psicomotora, mas não em vigilância. Porém, afirmam
que os problemas na atenção alternada, que caracterizam o autismo, não estariam ligados a
uma alternância perceptual elementar, mas à que envolve conceitualização, habilidades
64
executivas e monitoramento de novas informações. Eles usaram o Teste de Wisconsin, para
avaliação da atenção alternada.
Williams,
Goldstein
e
Minshew
(2006)
usaram
uma
extensa
bateria
neuropsicológica para avaliar 56 crianças com autismo (46 do sexo masculino e 10 do sexo
feminino), com idade entre oito e 15 anos, todos de alto funcionamento, com QI acima de
80. Foram assim escolhidos para que pudessem cooperar com a testagem. Havia grupo
controle de 56 crianças típicas. Dentre os vários instrumentos utilizados, os específicos para
atenção foram o Digit Span do WISC-III, o Continuous Performance Test (CPT) e o Teste
de Cancelamento de Números. De acordo com os resultados, não houve diferença entre o
grupo de autistas e o grupo controle, nas questões relacionadas à atenção.
Num enfoque também neuropsicológico, Orsati, Schwartzman, Brunoni, Mecca e
Macedo (2008) avaliaram 10 crianças e jovens com Transtornos Invasivos do
Desenvolvimento (TID, de acordo como DSM-IV), criteriosamente diagnosticados, todos
do sexo masculino, com idade entre oito e 19 anos. O grupo controle era de
desenvolvimento típico. Duas tarefas, a de Sacada Preditiva e de Anti-Sacada, foram
utilizadas por meio de rastreamento ocular. Os resultados mostraram que os participantes
da pesquisa tiveram dificuldade na regulação da atenção, na preparação para a resposta e na
inibição de respostas, mas não tiveram dificuldade de predição (antecipação do
aparecimento do estímulo).
Todos esses estudos sobre a atenção revelam detalhes importantes desse processo
em indivíduos autistas, detalhes estes focalizados e verificados de maneira diferenciada, ao
longo do tempo. Da mesma forma, a percepção vem sendo estudada como aspecto
fundamental para a compreensão do autismo. Os próximos tópicos abordarão esse assunto.
65
2.3. Compreendendo os processos perceptuais
Percepção é “o processamento, a organização e a interpretação dos sinais sensoriais
que resultam em uma representação interna do estímulo” (Gazzaniga & Heatherton, 2005,
p. 147). Ela passa por três fases, que se resumem na recepção do estímulo físico, na
transformação (transdução) desse estímulo em um código elétrico ou impulso neural, e no
processamento desse código no cérebro, resultando em uma experiência psicológica. As
duas primeiras fases são consideradas como sensação, e a terceira, essencialmente como
percepção. Trata-se, portanto, de um processo ativo e complexo. Em relação à percepção
visual, especificamente, seu início se dá no lobo occipital (Gazzaniga & Heatherton, 2005).
De acordo com Gazzaniga, Ivry e Mangum (2006), a primeira área do córtex em que
ocorre o processamento visual da informação é denominada de área visual primária (ou
V1). Essa área recebe aferências do núcleo geniculado lateral (NGL) do tálamo, que, por
sua vez, recebe as aferências diretas dos axônios do trato óptico (células ganglionares). O
NGL é formado por seis camadas de células, sendo as duas inferiores formadas por células
grandes, que dão origem ao sistema magnocelular (M), e as outras quatro superiores são
formadas por células pequenas, que dão origem ao sistema parvocelular (P-grumos e Pintergrumos). Esses sistemas se projetam no córtex e determinam vias pelas quais os
estímulos visuais são reconhecidos pelo cérebro. Essas vias comprovam a especificidade
das áreas visuais, fortalecendo a hipótese de que a percepção visual é um processo analítico
em que cada área visual elabora uma parte da informação, integrando-a para que a
percepção possa ser reconhecida. A via M, por exemplo, é insensível à cor, mas sensível à
direção, ao movimento e à velocidade do movimento; a via P-grumos é sensível ao
contraste e à cor, enquanto a via P-intergrumos é sensível à orientação e à localização.
As vias magno e parvocelulares saem do lobo occipital, formando dois feixes de
fibras ou fascículos. O feixe longitudinal inferior segue uma rota ventral (com input M e P)
66
projetada no lobo temporal, e aí se dá a percepção de reconhecimento do objeto, ou o que é
o estímulo (a forma do objeto), bem como a codificação de relações espaciais entre
subpartes de cenas. O feixe longitudinal superior segue rota dorsal (com input apenas da via
M), tendo a maioria de suas terminações no lobo parietal, onde ocorre a percepção espacial,
ou onde está o estímulo, responsável, portanto, pela localização e pelo planejamento de
ações para os objetos. Esse dado torna-se ainda mais interessante quando se constata que,
nos neurônios do lobo temporal, os campos receptivos abrangem somente a fóvea central,
permitindo o reconhecimento preciso de objetos, ao passo que os neurônios do lobo parietal
respondem a estímulos apresentados em várias partes do campo visual, permitindo a
percepção de um estímulo que chega inesperadamente ao campo da visão, portanto não
seletivo (Dakin & Frith, 2005; Gazzaniga, Ivry & Mangum, 2006).
A percepção visual da forma parece ser a mais importante para o reconhecimento
dos objetos. Desenvolve-se desde idade precoce, no indivíduo, mas como isso ocorre
exatamente no córtex, ainda não está totalmente compreendida, segundo Gazzaniga &
Heatherton (2005). Num estudo de Dakin e Frith (2005), os autores consideram que o
córtex visual primário (V1) responde a processamento local, e que se comunica com várias
áreas vizinhas; a região V2 responde a ângulos entre linhas; a área V4 prefere atributos de
formas complexas (cantos), respondendo a objetos como faces; já a região V5 (ou TM em
humanos) responde a movimentos globais, complexos. A esse respeito, os autores
comentam que definir processamento local e global não é fácil, mas, grosso modo, estrutura
local requer atividade de neurônios isolados, enquanto estrutura global requer atividade
coordenada de muitos neurônios.
Estudos usando tarefas de busca visual foram desenvolvidos para tentar
compreender os problemas de percepção enfrentados pelas pessoas. Nessas tarefas, objetos
são apresentados numa tela, e a busca pelo alvo deve ser feita sob duas condições, a de
67
característica e a de conjunção. Na condição característica, o objeto-alvo é diferente de
vários outros por uma única dimensão, por exemplo, cor. Na condição conjunção, o objetoalvo é composto por duas ou mais dimensões, por exemplo, cor e forma. Características dos
estímulos, como brilho, orientação, movimento, profundidade, determinam maior ou menor
facilidade na busca visual (Gazzaniga, Ivry & Mangum, 2006).
Um aspecto interessante estudado é o efeito da isoluminância (mesmo brilho entre
as partes que formam o estímulo), pois ela faz com que se perca a noção de profundidade e
a informação do movimento, na percepção do estímulo (Gazzaniga, Ivry & Mangum,
2006). Acerca ainda das buscas por característica e conjunção, Gazzaniga e Heatherton
(2005) comentam os estudos de Treisman, constatando que a busca por característica é préatencional, pois o estímulo se destaca imediatamente (pop-out); já na busca por conjunção,
a atenção é exigida, ajudando a integrar as características para que haja percepção correta
do objeto (ligação).
Um olhar mais psicológico sobre a percepção, guiado pelos princípios da Gestalt,
favoreceu a compreensão de como as informações sobre as características dos objetos são
organizadas pelo cérebro. Uma das formulações mais conhecidas dessa abordagem é a de
que o todo é maior do que a soma de suas partes, e, em função disso, a percepção das
formas tende à busca de um equilíbrio, para que haja entendimento do que foi percebido
(Arnheim, 1980). De acordo com o princípio da proximidade, quanto mais próximas as
figuras estão, maior a probabilidade de elas serem agrupadas e vistas como um conjunto
unificado. O princípio da similaridade considera que há a tendência de agrupar figuras que
se parecem em cor, forma e orientação. O princípio de fechamento ou closura (ou clausura)
refere-se à tendência de se completar figuras que têm lacunas, ou falhas, para que ganhem
regularidade. No princípio da sequência ou boa continuidade, os elementos ganham um
sentido, uma direção, dando a ideia de continuidade, sem quebras na trajetória. Por fim, o
68
princípio da simetria implica tendência a se destacarem as figuras que guardam relação
simétrica (Gazzaniga & Heatherton, 2005; Filho, 2000).
O Teste Gestáltico Visomotor de Bender, como o próprio nome sugere, foi
construído apoiado nos princípios da Gestalt, e será aqui comentado por ser um dos
instrumentos escolhidos, nesta pesquisa, para avaliar autistas. Essa escolha se deu pelo fato
de que a intenção deste estudo não era o de avaliar um ou outro aspecto específico da
percepção, considerados falhos no autismo, mas investigar a organização perceptiva desses
indivíduos. Seu uso numa amostra clínica de autistas parece adequado, por ser um teste
com instrução curta e objetiva, e ser composto por figuras não coloridas, sobre as quais é
possível observar a distorção da forma, de acordo com o sistema brasileiro vigente de
correção adotado. Os nove cartões que compõem o teste são em cor branca com figuras
desenhadas em preto, formadas por linhas retas, curvas, curvas sinuosas, ângulos, pontos e
círculos pequenos.
Na prática neuropsicológica há uma série de testes disponíveis para avaliar a
percepção visual, mas a maioria deles, de acordo com Lezak, Howieson e Loring (2004),
testa também outras funções, como atenção, orientação espacial e memória. Sendo o
Bender um teste que combina percepção e resposta motora, ele é qualificado como teste de
construção (Lezak, Howieson & Loring, 2004). Wasserman e Lawhorn (2003) comentam
que o Teste de Bender também evidencia habilidades executivas de organização e
planejamento (das figuras). Seguem os estudos sobre percepção visual e sobre o Bender,
em autismo.
2.4. Estudos sobre a percepção visual em autistas
A compreensão dos processos cognitivos da percepção visual em autistas vem se
organizando a partir de estudos que, ora complementam ou corroboram os postulados
69
anteriores, ora contestam o que vem sendo proposto. Trata-se, portanto, de um
conhecimento ainda não consensual, mas com dados que sugerem exploração necessária e
promissora à compreensão das alterações observadas nesse transtorno. A esse respeito, as
considerações têm sido direcionadas à percepção da face, percepção do detalhe e do todo, e
percepção do movimento, relacionando os achados com o que vem sendo discutido acerca
dos sistemas magnocelular e parvocelular no processamento visual do estímulo. Os estudos
vêm tentando, por meio de realização de tarefas com monitoramento de imagem, subsidiar
os comportamentos alterados dos autistas com evidências neurofisiológicas.
O processamento visual local tem sido avaliado por meio de tarefas que envolvem
desenhos de blocos, figuras embutidas, orientação e busca de característica e de conjunção
em estímulos. O processamento global é avaliado por meio de letras hierárquicas e
contornos de linhas, com alta e com baixa frequência espacial. Nos estudos em que as
tarefas residem na percepção de coerência do movimento, o observador deve perceber ou
discriminar se existem pontos com movimento coerente, ou seja, movendo-se numa mesma
direção, em meio a pontos com movimentos aleatórios (Dakin & Frith, 2005).
A fim de verificar a existência de uma base neural para os déficits no processamento
do movimento relatados em autismo, Spencer e cols. (2000) conduziram um estudo
composto por duas tarefas, uma verificando os limiares de coerência da forma e outra, os da
coerência
do
movimento,
relacionados
aos
feixes
corticais
ventral
e
dorsal,
respectivamente. Os resultados mostraram que os limiares de coerência do movimento
estão mais altos nos autistas do que no grupo controle, e que os limiares de coerência da
forma não registraram diferenças significativas entre os grupos. Para os autores, essa
discrepância entre percepção de movimento e de forma evidencia o déficit no feixe dorsal,
suposto no autismo.
70
O postulado da Teoria da Coerência Central (TCC), de que os autistas focalizam o
detalhe do estímulo e não formam o todo, tem sido debatido a partir desse olhar
neurofisiológico sobre os processos atencionais e perceptuais. Em um estudo de Mottron,
Burack, Iarocci, Belleville e Enns (2003), várias tarefas foram oferecidas a autistas de alto
funcionamento e a um grupo controle de crianças com desenvolvimento típico, para avaliar
percepção visual local (de detalhe) e global, como letras hierárquicas, letras fragmentadas,
letras isoladas/embutidas e identificação de silhuetas5. Os autores concluíram que os
autistas processam os estímulos em nível global, mas há tendência para aumento na
detecção de estímulos específicos, sem que obrigatoriamente o detalhamento ocorra em
detrimento do todo.
Dakin e Frith (2005) fazem uma revisão dos estudos sobre percepção em TEA,
considerando também os posicionamentos da Teoria da Coerência Central (TCC) e da
hipótese da Função Perceptual Aumentada (FPA defendida por Mottron e colaboradores,
em 2003). Os autores discutem se as diferenças observadas na função visual dos autistas
seriam devidas a um déficit nos processos visuais globais (TCC) ou a tendências
comportamentais dirigidas a certos tipos de informações (FPA). Nessa revisão, os estudos
comprovaram que os indivíduos com TEA têm processamento visual local superior, mas
déficits na percepção do movimento. A questão, no entanto, é complexa e demanda estudos
na área, não sendo possível afirmar se se trata de um déficit ou de um hiperfuncionamento
atípico do processamento perceptivo.
5
Tarefa de letras hierárquicas consiste em estímulos nos quais letras grandes (global) são formadas por
pequenas letras, geralmente invertidas, por exemplo, um A formado por Hs e H formado pos As. Tarefa de
letras fragmentadas compreende a apresentação de uma letra intacta, ou essa mesma letra segmentada por
linhas. Na tarefa de letras isoladas/embutidas, a letra é apresentada isoladamente, ou formando um padrão,
por exemplo, o dígito oito. E na tarefa de identificação de silhuetas, figuras são apresentadas com
características internas ou apenas com o contorno; há a possibilidade de a silhueta ser impossível de se
combinar com a figura.
71
Seguindo a linha de pesquisa FPA, Bertone, Mottron, Jelenic e Faubert (2005)
avaliaram autistas de alto funcionamento e indivíduos com desenvolvimento típico em
tarefas viso-espaciais estáticas e dinâmicas, em que era requerida a discriminação de
orientação de listas verticais ou horizontais com variação de luminância e textura na
apresentação. Os autistas tiveram desempenho superior em relação às condições que
exigiam luminância, mas não em relação às condições que exigiam textura. Isso demonstra,
segundo os autores, alteração no processamento de informação perceptual de baixo-nível.
Além disso, o comportamento superior ou inferior dos autistas, em percepção visual,
depende da complexidade da rede neural requerida para processar o estímulo. A baixa
sensitividade para estímulos complexos ocorreu, não só em autistas, mas a alta
sensitividade para estímulos estáticos simples foi exclusiva dos autistas.
Em tarefa de percepção facial, usando o efeito de inversão da face e priming, Lahaie
e cols. (2006) também obtiveram resultado de processamento configural (ou percepção de
configuração global) normal em autistas. Os estímulos eram imagens de faces com
expressão neutra, e greebles, ou seja, objetos cuja configuração conserva ou lembra partes
humanas, usados em experimentos que os comparam com reconhecimento facial. Os
participantes eram autistas adultos e adolescentes, além de um grupo controle de indivíduos
com desenvolvimento típico. Tanto no experimento 1, de reconhecimento facial simples,
como no experimento 2, em que as faces eram divididas em partes e uma figura esquema
servia de priming, os resultados mostraram possibilidade de processamento configural nos
autistas, com aumento no processamento das partes da face, contradizendo a hipótese de
que autistas têm déficit no processamento da configuração facial global.
Além desses estudos focados no processamento perceptual dos autistas, cabe aqui
descrever estudos voltados especificamente ao uso do Teste de Bender com esses
indivíduos, visto que este será um dos instrumentos utilizados, nesta pesquisa, para avaliar
72
autistas. No trabalho efetuado por Brannigan e Decker (2003), com o Bender-Gestalt II
(BG-II), consta a aplicação deste teste em uma amostra de 59 indivíduos autistas
provenientes de serviços de educação especial. A média de idade foi de 10,03 anos
(DP=3,71), sendo 80% do sexo masculino. Os resultados mostraram-se significativamente
mais baixos (indicando produções ruins) no grupo de autistas do que no grupo controle (t =
-6,51 para p=<0,001), em ambas as fases de cópia e de memória que esta versão do Bender
comporta. Esses dados apontam comprometimento na habilidade perceptomotora dos
autistas.
Volker e cols. (2009) aplicaram também o Bender-Gestatlt II (BG-II) e o BeeryBuktenica Developmental Test of Visual-Motor Integration, quinta edição (VMI-V), em 60
crianças com Transtorno do Espectro do Autismo, de alto funcionamento, e em 46 crianças
com desenvolvimento típico. As idades de ambos os grupos variaram de seis a 14 anos, e o
grupo de autistas tinha 54 participantes do sexo masculino. Foi feita uma avaliação prévia
com o WISC-IV, e a pontuação total registrou QIs entre 71 a 131 para os autistas e entre 90
a 132 para os típicos. Os critérios de inclusão para esta amostra foram ausência de déficit
cognitivo e ausência de falhas na linguagem comum. Os autores discutiram as diferenças no
conteúdo, na administração e na pontuação existentes entre os dois testes, mas ambos
avaliam habilidades viso-perceptuais e motora fina.
Os resultados do estudo de Volker e cols. (2009) mostraram que a correlação entre o
BG-II Cópia e o VMI-V Composto foi de r=0,55 para o grupo de autistas e r=0,48 para o
grupo típico. Além disso, o desempenho em percepção foi melhor do que em coordenação
motora em ambos os testes, na amostra de autistas. A média de pontuação do Teste Motor
foi de 9,4, e a do Teste de Percepção foi de 9,7. No VMI-V, a média de pontuação em
Coordenação Motora foi de 75,3, e em percepção foi de 95,3, verificando-se uma diferença
de 20 pontos. Segundo os autores, esses dados são consistentes com o que eles encontraram
73
na literatura, apontando déficits motores, mas habilidades perceptuais intactas, nos autistas.
Eles classificam este estudo como sendo o primeiro a usar ambos os testes numa amostra de
autistas, mas atentam para a falha de que não foi usado nenhum instrumento para
diagnóstico específico de autismo, como o ADI-R ou o ADOS, para avaliar previamente os
participantes.
2.5. Conclusão do capítulo
Os processos atencionais e os processos perceptuais ocorrem em estreita relação. De
acordo com Pessoa, Kastner e Ungerleider (2003), a atenção cumpre os papéis de ampliar a
sensibilidade perceptiva para que ocorra a discriminação de um determinado alvo, além de
reduzir a interferência de estímulos distratores. Esses autores comentam sobre
experimentos que têm mostrado o quanto a atenção interfere na atividade de áreas do
cérebro responsáveis por processar características dos estímulos, como cor, forma,
movimento e textura. Dessa forma, ambos os processos de atenção e percepção assumem
papel determinante para o desenvolvimento e aprimoramento das funções cognitivas mais
complexas, de um modo geral. Isso significa que eles embasam a resolução de problemas
complexos em testes de inteligência.
O próximo capítulo, então, abordará a questão da inteligência, trazendo inicialmente
o histórico da avaliação desse construto e os estudos que conduziram à elaboração dos
instrumentos mais conhecidos para investigação das diferenças individuais. Acompanhar a
evolução da abordagem psicométrica é fundamental para compreensão dos aspectos
estruturais da inteligência e de como os instrumentos se articulam para dar conta de medir,
ora estruturas mais gerais, ora estruturas mais específicas. Em seguida, a Teoria Triárquica
de Inteligência Humana, de Sternberg (2008), será brevemente explanada, acreditando-se
que uma abordagem complementar da Psicologia Cognitiva torna-se importante no estudo
74
da inteligência, para que sejam compreendidos os processos mentais subjacentes às tarefas
propostas nos testes que medem esse construto. Essa teoria foi escolhida por integrar os
componentes internos com a experiência e com o contexto sociocultural, favorecendo
discussões a esse respeito em relação à avaliação de indivíduos autistas.
75
CAPÍTULO 3 INTELIGÊNCIA
O termo inteligência, no senso comum, representa a habilidade ou a competência de
alguém para raciocinar logicamente, resolver problemas complexos, enfim, compreender e
modificar o ambiente em que vive. Assume, portanto, um caráter diferenciador de pessoas,
no meio social. De fato, dizer da inteligência ou da capacidade intelectual de alguém, ou da
falta desse atributo, ressoa para qualquer interlocutor como perfeitamente compreensível.
No entanto, os estudos psicológicos desse construto não comportam um consenso entre os
pesquisadores, que ao longo de mais de um século vêm teorizando sobre esse tema, na
tentativa de dar-lhe um significado possível de ser avaliado por métodos científicos (FloresMendoza, 2010).
Os dados históricos acerca da conceituação da inteligência apontam Spencer como o
primeiro a usar esse termo, em 1855, em uma publicação intitulada The Principles of
Psychology, considerando-o uma característica biológica representativa da adaptação do
indivíduo ao seu meio ambiente (Wasserman & Tulsky, 2005). No entanto, encontra-se em
Anastasi (1977) um comentário do trabalho de Esquirol, datado de 1838, no qual já existia
a tentativa de classificação da debilidade mental, e em que se concluía que o melhor critério
para a determinação do nível intelectual de um indivíduo seria o uso que ele pudesse fazer
da linguagem. Tal critério parece ter predominado ao longo dos anos, visto que muitos
testes de inteligência contemplam a habilidade verbal em seu conteúdo.
Em 1921, quatorze psicólogos foram questionados acerca do que seria inteligência
e, apesar da divergência de ideias, a capacidade de aprender com a experiência e de se
adaptar a novas situações do ambiente foram os temas mais consensuais. Esse mesmo
inquérito foi feito a 24 psicólogos cognitivos, sessenta e cinco anos mais tarde, e ainda
76
ficaram destacados os mesmos temas, acrescentando-se ênfase à metacognição
(compreensão dos próprios processos de pensamento) e ao papel da cultura nessa
concepção (Sternberg, 1992; 2008; Wasserman & Tulsky, 2005). Sternberg (2008) resume
essas ideias e propõe que:
a inteligência é a capacidade de aprender a partir da experiência, usando processos
metacognitivos para melhorar a aprendizagem e a capacidade de se adaptar ao
ambiente. Ela pode requerer diferentes adaptações em distintos contextos sociais e
culturais. (p. 450)
Na falta de uma definição precisa para esse construto, qualquer instrumento de
medida desenvolvido para esse fim está atrelado às concepções teóricas de cada
pesquisador; portanto, nunca poderá ser considerado completo e sempre estará sujeito a
críticas, no meio científico. O uso clínico de testes que se refiram a esse construto deve ser
feito de forma consciente sobre essas questões, sobretudo quando se tratar da avaliação de
populações especiais. Compreender o desenrolar dos fatos que culminaram no que hoje se
conhece sobre inteligência e as possibilidades de medi-la torna-se crucial para o presente
estudo, uma vez que a capacidade intelectual dos autistas, bem como a melhor forma de
medi-la, sempre foi assunto polêmico e vem sendo discutido de forma mais específica nos
textos atuais sobre esse transtorno, conforme será visto adiante.
3.1. O histórico da medida da Inteligência
Os estudos de Galton aparecem como o marco inicial das pesquisas que se
propuseram a avaliar a inteligência, sendo ele o primeiro a descrever o conceito de testes de
inteligência, em 1865, e a elaborar vários instrumentos, inclusive um que ainda hoje é
muito usado em avaliação neuropsicológica – o Digit Span (Anastasi, 1977; Almeida, 2002;
Wasserman & Tulsky, 2005). Galton sistematizou dados sobre as diferenças individuais
77
considerando os processos psicológicos simples, pois julgava que a capacidade intelectual
era avaliada por testes de acuidade sensorial e força física (Lemos, 2006). Vale salientar
que foram os questionamentos sobre as diferenças individuais e todos os seus
desdobramentos que permitiram o estudo e a testagem da inteligência (Anastasi, 1977).
O termo testes mentais foi utilizado por James Cattell, um discípulo de Galton, em
1890, quando publicou o Mental Tests and Measurements, uma bateria que incluía os testes
de Galton, Fechner e Wundt. Esses instrumentos, seguindo a mesma linha de compreensão
da inteligência de Galton, mediam mais as habilidades motoras, a acuidade e a
discriminação sensoriais do que os processos mentais superiores. Estudos estatísticos
posteriores mostraram correlação negativa entre essa bateria e o rendimento escolar
acadêmico, fato esse que suscitou a busca de métodos alternativos para avaliar a
inteligência. Tiveram destaque nessa tarefa os estudos franceses do início do século XX,
mais especificamente o trabalho de Binet e de seu colaborador Simon, que em 1905
apresentaram em congresso uma escala de inteligência para avaliar crianças com
dificuldades escolares (Anastasi, 1977; Wasserman & Tulsky, 2005).
Considerado o pai da avaliação intelectual e cognitiva, Binet usou o termo
inteligência como sendo a soma total dos processos mentais superiores, como memória,
imaginação e atenção, entre outros. O julgamento, a compreensão e o raciocínio eram
elementos fortes na sua concepção de inteligência. Seu trabalho foi disseminado
internacionalmente, sobretudo depois que Terman, na Universidade de Stanford (US),
conduziu trabalhos de revisão do teste em língua inglesa (Wasserman & Tulsky, 2005;
Lemos, 2006). O pioneirismo desse estudioso é marcado também pela proposta de
contextualização dos resultados do sujeito, sugerindo uma análise compreensiva dos dados
(Lemos, 2006). Hoje, as escalas Stanford-Binet encontram-se em sua 5ª edição,
reformuladas por Roid, em 2003 (Lezak, Howieson & Loring, 2004).
78
Junto ao trabalho de Binet, o termo quociente de inteligência, ou QI, passou a ser
usado na avaliação intelectual, mas pautado na proposta de Stern, que estabeleceu um
algoritmo no qual o resultado seria decorrente da razão entre a Idade Mental (IM), dividida
pela Idade Cronológica (IC), multiplicada por 100. Esses resultados geravam os chamados
QIs de relação, válidos durante um tempo. Posteriormente, os psicólogos passaram a
utilizar os chamados QIs de desvio, calculados a partir da comparação do escore medido,
com os escores de uma grande amostragem, distribuídos em curva normal (Sternberg,
2008).
Paralelamente a esses estudos iniciais práticos, voltados para a investigação da
diferenciação entre indivíduos, surgiram propostas de avaliação das capacidades
intelectuais visando à especulação dos fatores ou das aptidões que melhor explicariam a
inteligência humana. Os avanços estatísticos da época deram um novo rumo à compreensão
e à investigação da inteligência, e a abordagem fatorial, adotada por Spearman, até hoje
serve de referência para os pesquisadores desse construto (Lemos, 2006). A publicação de
Spearman, em 1904, sob o título de General Intelligence, Objectively Determined and
Measured, foi considerada a primeira contribuição para os estudos empíricos sobre
inteligência (Wasserman & Tulsky, 2005).
Spearman, em 1927, defendeu a ideia de que um fator geral, ou fator g, por ele
inicialmente concebido como uma energia mental inata, seria o responsável por explicar a
correlação positiva entre dois testes de capacidade mental. Fatores específicos, ou fatores s,
estariam envolvidos apenas em testes que dependessem de aprendizagem (Lemos, 2006;
Sternberg, 2008). Para ele, a construção de conhecimento ocorria por meio de três leis que
o regulariam: apreensão da própria experiência, edução de relações e edução de correlatos.
A primeira refere-se à capacidade maior ou menor de observação da própria mente; a
segunda diz respeito à capacidade de estabelecer ou inferir relações entre duas ou mais
79
ideias; e, a terceira significa a capacidade de incorporar, às relações inferidas, ideias
correlatas (Santos, Noronha & Sisto, 2005). Almeida (2002) comenta que testes atuais que
medem o fator g, como as Matrizes Progressivas de Raven, o Teste D-48 de Pichot, ou os
Testes de Cattell, usam ainda conteúdo figurativo-abstrato e novidade na tarefa para avaliar,
por meio de raciocínio indutivo e dedutivo, a edução de relações e de correlatos, conforme
proposto por Spearman.
A proposta de Spearman gerou críticas que culminaram em novos modelos de
habilidades cognitivas – os modelos multifatoriais de inteligência – que tiveram em
Thurstone sua maior expressão. Para Thurstone, a inteligência é composta por sete fatores
independentes, ou capacidades mentais primárias, que adquirem pesos diferentes nos vários
testes. Essas capacidades são: compreensão verbal, fluência verbal, aptidão numérica,
aptidão espacial, memória, velocidade perceptiva e raciocínio indutivo (Sternberg, 2008).
Thurstone, inicialmente, excluiu o fator g, porém mais tarde admitiu sua possível existência
como fator de segunda ordem (Wasserman & Tulsky, 2005). Muitas baterias foram
desenvolvidas a partir desses estudos teóricos, como a Primary Mental Abilities (PMA), do
próprio Thurstone, a Differential Aptitudes Tests (DAT), e as escalas Wechsler (Pasquali,
2010).
Influenciado pelo trabalho de análise fatorial de Spearman, Raymond Cattell
apresentou, em 1941, sua teoria da inteligência, na qual dois fatores gerais – habilidade
fluida e habilidade cristalizada – aparecem em separado. A habilidade ou inteligência fluida
refere-se à facilidade para raciocinar diante de situações novas que exigem adaptação. A
inteligência cristalizada consiste na habilidade de adquirir conhecimento por meio da
aprendizagem. Cattell e seu aluno Horn, na década de 1960, expandiram esse número de
fatores para cinco, e Horn, na década de 1990, elevou-o para nove (Wasserman & Tulsky,
2005). Posteriormente, Horn fixou em oito as habilidades consideradas de segunda ordem
80
ou superiores (higher-order), das quais derivam mais de oitenta habilidades mentais
primárias, consideradas capacidades elementares. Para ele, os testes de QI ou as baterias
neuropsicológicas medem as habilidades de segunda ordem. Horn analisa as teorias de
inteligência de forma realista, considerando que todas apresentam falhas, visto que as
condições de pesquisa com total controle de variáveis são impossíveis em estudos do
desenvolvimento humano (Horn & Blankson, 2005).
Em 1993, um novo modelo para as habilidades humanas foi proposto por Carroll, a
partir de um estudo de meta-análise efetuado com 461 conjuntos de dados de testes,
submetidos a análise fatorial. Esse modelo, denominado de três estratos, é uma organização
hierarquizada das habilidades cognitivas, dispostas em três camadas de acordo com o grau
de generalidade, ou seja, o fator g é de ordem superior, no terceiro estrato; oito fatores de
altas habilidades (broad abilities) estão no segundo estrato, aí localizados em função da
forte associação com o fator geral; no primeiro estrato estão mais de sessenta habilidades
(narrow abilities), marcadas pelo seu grau de especificidade (Wasserman & Tulsky, 2005;
Carroll, 2005). Conforme afirma Carroll (2005), não há nenhuma bateria de testes
específicos para avaliar os fatores descritos em sua teoria e nem se pretende que ela esteja
completa, podendo ou devendo comportar novas revisões. Ele também sugere que sua
teoria seja utilizada na prática profissional de psicólogos como um mapa de todas as
habilidades cognitivas conhecidas.
Ao analisar esse estudo de Carroll, que contou com dados de 1.500 referências,
dentre as quais os mais importantes estudos sobre a estrutura da inteligência (Primi, 2002),
é interessante observar que os artigos analisados, acrescidos de outro conjunto de dados
investigados por Carroll, juntamente com McGrew, em 2002, contemplam poucos estudos
acerca de populações específicas. Há menção de avaliação em esquizofrênicos, em
síndrome de Down, em casos de afasia e de retardo mental, apenas (Institute for Applied
81
Psychometrics, 2002). Artigos mais recentes, avaliados pelo Carroll Human Cognitive
Abilities Project, já contêm mais estudos com população diversificada, no que se refere a
condições especiais de desenvolvimento. Tais estudos fazem menção de avaliação em
disléxicos, afásicos, síndrome de Down, indivíduos com condição limitada de linguagem ou
impedimento da linguagem e Transtorno do Déficit de Atenção / Hiperatividade, entre
outros (Institute for Applied Psychometrics, 2004).
As teorias de Cattell e Horn sobre as inteligências fluida e cristalizada, unidas à
teoria dos três estratos de Carroll foram fundidas em um só modelo, denominado teoria
Cattell-Horn-Carroll de habilidades cognitivas, ou Teoria CHC, representando a mais atual
abordagem psicométrica sobre o construto inteligência. Nessa concepção, a integração das
capacidades cognitivas se dá também de forma hierárquica, de tal forma que, a partir do
fator g, ramificam-se progressivamente habilidades cada vez mais especializadas (Primi,
2002). As tendências atuais em Psicologia, tanto para a concepção da inteligência, quanto
para a construção de testes que visam à avaliação desse construto, referem-se à teoria CHC
(Primi, 2003). Tal concepção baseia-se na psicometria como medida, mas não se fixa na
busca de um fator geral de inteligência (g), conforme os primeiros estudos desenvolvidos
na área.
O modelo CHC foi proposto por McGrew em 1997, mas a publicação formal desse
termo ocorreu em 2001, no manual técnico do teste Woodcock Johnson III (McGrew,
2005). McGrew organizou as duas propostas de Cattell-Horn e de Carroll num modelo
único, composto por 10 fatores gerais (camada II) e 76 fatores específicos (camada I),
mantendo a hierarquia das capacidades cognitivas. Juntamente com Flanagan, revisou esse
modelo um ano mais tarde, o qual serviu de base para vários estudos na área (Schelini,
2002; Alfonso, Flanagan & Radwan, 2005; Schelini & Wechsler, 2006). Tendo o intuito de
estar sempre refinando e ampliando o conhecimento sobre a inteligência humana, esta
82
teoria tem trazido renovações em sua estrutura a partir de análises fatoriais recentes
(McGrew, 2009).
A compreensão dessa evolução da psicometria permite contextualizar o teste de
inteligência que será usado nesta pesquisa. Trata-se de um teste não-verbal, que avalia o
fator g de inteligência. De acordo com Brown (2003), ele foi criado em 1982 para
preencher uma lacuna na avaliação psicológica da época, que era avaliar pessoas que não
tinham proficiência na língua inglesa, pois os testes disponíveis não estavam com estudos
normativos apropriados. Além de eliminar a leitura, a escrita, a fala e a audição, foi também
considerado, na construção do TONI, o fato de ele ter pouca interferência cultural e exigir
resposta motora mínima. A escolha de medir o raciocínio abstrato e a resolução de
problemas, neste teste, apoiou-se em evidências de que as diferenças intelectuais entre os
indivíduos era mais fortemente marcada pelos processos mentais complexos, e que, esses
dois escolhidos, talvez fossem os preditores mais estáveis de todos para a inteligência geral.
Em relação às teorias da inteligência, a terceira versão do TONI, ou o TONI-3, tem
aspectos em comum com algumas das mencionadas anteriormente. Seu escore pode ser
representativo do fator g de Spearman; além disso, ele mede o raciocínio, tal qual a sexta
habilidade mental primária de Thurstone, e, ainda, foi construído para medir inteligência
fluida, mais que cristalizada (Brown, 2003). Segue um sistema classificatório de QI e de
percentil, distribuído em sete graus que variam desde o muito inferior (< 70) até o muito
superior (>130), a partir de uma média (90 a 110). Seu manual contém interpretação de
escores desviantes (Brown, Sherbenou & Johnsen, 2006).
No entanto, concordando com Kamphaus, Winsor, Rowe e Kim (2005), o cálculo
do QI é apenas o primeiro passo para uma interpretação clínica de habilidades cognitivas,
havendo necessidade de serem examinados mais dados sobre o funcionamento cognitivo
dos indivíduos avaliados. Concordando com isso, algumas contribuições da Psicologia
83
Cognitiva pareceram pertinentes de serem aqui descritas, pois seus teóricos visam
compreender os processos mentais que podem embasar a resolução de problemas
complexos em testes de inteligência. Pasquali (2010), em uma revisão histórica dos
instrumentos psicológicos, comenta sobre as tendências atuais de superação das
dificuldades da psicometria clássica e cita a Psicologia Cognitiva como uma dessas
tendências. Segue, então, uma explanação sobre essa abordagem.
3.2. Psicologia Cognitiva e os aspectos operacionais da inteligência
A abordagem comentada no tópico anterior assume um caráter psicométrico, no
sentido de tentar compreender a inteligência, ou as capacidades cognitivas humanas, em
termos de fatores ou estruturas mentais, responsáveis então pelas diferenças individuais
expressas e medidas em testes organizados para esse fim. As várias teorias que compõem
essa abordagem têm suas diferenças marcadas pelo número de fatores propostos e pelo
arranjo que esses fatores assumem, uns em relação aos outros (Sternberg, 1992).
Uma outra abordagem, complementar a essa, é composta por uma série de
concepções desenvolvidas por psicólogos cognitivos dispostos a compreender a inteligência
humana, investigando os processos mentais que subsidiam o desempenho de um indivíduo
em tarefas cognitivas. Chamados de teóricos do processamento da informação, esses
estudiosos buscam saber como as pessoas manipulam mentalmente o que apreendem do
mundo. Suas concepções diferenciam-se em relação à ênfase dada à velocidade ou à
precisão do processamento para emissão da resposta, mas ambos os fatores são
considerados importantes no estudo sobre a inteligência (Sternberg, 1992; 2000; 2008).
Retomando brevemente alguns conceitos sobre a Psicologia Cognitiva oferecidos
por Eysenck e Keane (1994), nesta concepção a mente é vista como um sistema de
processamento de símbolos, que permite ao ser humano interagir com o mundo externo. O
84
ser humano não é passivo em tal interação, e os processamentos podem ser provocados pelo
estímulo, sendo assim denominados de bottom-up; ou afetados por concepção prévia, como
exemplo as expectativas que o indivíduo atribui aos estímulos, sendo então denominados
top-down. Os processos são as modificações, ou as transformações dos símbolos, tornandose tarefa do pesquisador, nessa abordagem, “especificar os processos simbólicos e
representações subjacentes ao desempenho de todas as tarefas cognitivas” (p. 14).
Considerando que os processos são sequenciais e muitas vezes complexos, sobressaem-se
os estudos sobre o tempo de reação, tema bem explorado pelos pesquisadores cognitivos.
Sternberg (2008) menciona frentes de pesquisas, efetuadas por teóricos do
processamento da informação, em que as concepções sobre inteligência vêm se
estruturando, três delas com o foco na velocidade, e uma com o foco na complexidade do
processamento. As pesquisas, citadas por ele, que investigam a rapidez no processamento,
analisam tempo de inspeção, tempo de escolha e velocidade de acesso lexical. Tempo de
inspeção significa a quantidade de tempo que o indivíduo leva para observar um estímulo e
tomar uma decisão acerca dele. Quanto menores os tempos de inspeção, maiores os escores
em testes de QI. Tempo de reação para escolha refere-se ao tempo em que o indivíduo
seleciona uma resposta em meio a várias possibilidades. A correlação desse tempo de
reação com QIs mais elevados sofre críticas, porque fatores como a atenção podem
interferir na eficiência da resposta. As pesquisas que investigam a velocidade de acesso ao
léxico analisam a rapidez com que o indivíduo recupera informações sobre palavras que
estão armazenadas na memória de longo prazo. Maior capacidade verbal tem correlação
negativa com o tempo de acesso ao léxico.
Com a finalidade de compreender quais processos mentais são utilizados na
resolução de tarefas complexas contidas em testes de inteligência, Sternberg (2000; 2008)
propôs a teoria componencial. A partir do desempenho de pessoas em tarefas como
85
analogias, seriações e silogismos, quatro processos foram detectados, compreendidos como
componentes da inteligência. O primeiro é a codificação dos itens do problema; o segundo
é a inferência de relações entre esses itens; o terceiro é o mapeamento, que consiste na
verificação de relações semelhantes às já inferidas, em outros itens do problema; e, o quarto
é a aplicação dessas relações a novos problemas. Os primeiros componentes referem-se ao
planejamento global da tarefa, e os últimos, ao planejamento local. Descobriu-se que
escores mais altos em testes convencionais de inteligência correlacionam-se com maior
gasto de tempo em planejamento global da tarefa, compensando esse atraso com maior
rapidez no planejamento local, ou seja, na aplicabilidade de estratégias para resolução do
problema. Esta teoria foi acoplada a outra, do mesmo autor, denominada Teoria Triárquica
da Inteligência Humana, que integra a inteligência ao contexto sociocultural, considerandoa, não apenas como um atributo biológico, mas também como um sistema complexo, em
plena integração com os vários aspectos proporcionados pelo ambiente.
Proposta por Sternberg, desde 1985 a Teoria Triárquica, como o próprio nome
sugere, compreende a inteligência a partir de três subteorias denominadas componencial,
experiencial e contextual, que explicam a relação da inteligência com o mundo interno do
indivíduo, com a experiência vivida e com o mundo externo, respectivamente. Na relação
com o mundo interno, a inteligência emerge de processos mentais (ou componentes do
processamento da informação) responsáveis pela resolução de problemas. Na relação com
as experiências, a inteligência manifesta-se por meio da capacidade com que esses
componentes do processamento da informação lidam ou interagem com tarefas, desde as
que são completamente novas, inéditas, até as que já estão bem conhecidas e
automatizadas. Por fim, na relação com o mundo externo, o comportamento inteligente
presume a aplicabilidade desses componentes em tarefas do dia a dia, com as funções de
86
adaptação ao ambiente, modificação ou escolha de novos ambientes, conforme seja
necessário (Sternberg, 2000; 2008).
De maneira mais objetiva, para Sternberg a inteligência é o resultado de um
equilíbrio no uso de habilidades analíticas, criativas e práticas, que em conjunto, garantem
o sucesso do indivíduo em um determinado contexto sociocultural. Compreende-se por
habilidades criativas aquelas que geram ideias; por habilidades analíticas aquelas que
determinam se essas ideias são boas, e por habilidades práticas a efetivação dessas ideias
em ações. Essas habilidades devem trabalhar harmoniosamente, para que a pessoa seja bem
sucedida (Sternberg, 2005).
Para compreensão dos processos mentais subjacentes ao pensamento inteligente,
Sternberg (2005) propõe 3 tipos fundamentais de componentes do processamento da
informação: os metacomponentes, os componentes de desempenho e os componentes de
aquisição de conhecimento. Os metacomponentes são processos chamados de executivos,
ou de ordem superior (higher-order), utilizados para planejar o que deve ser feito na
resolução de um problema, monitorar essa ação enquanto ela está sendo executada, e
avaliá-la, depois que estiver consumada. Podem ser mais bem compreendidos se
detalhados em oito subcomponentes: 1. Reconhecimento da existência do problema; 2.
Decisão da natureza do problema; 3. Seleção de um conjunto de processos de ordem
inferior (lower-order) para resolver o problema; 4. Seleção de uma estratégia que agrupe
esses componentes de ordem inferior; 5. Seleção de uma representação mental para a
informação, na qual os componentes e a estratégia possam agir (ex: linguística ou
imagética, holística ou analítica); 6. Localização de recursos mentais; 7. Monitoramento da
resolução do problema, enquanto ela acontece; e, 8. Avaliação da resolução depois que ela
foi executada.
87
Os componentes de desempenho são os processos de ordem inferior (lower-order)
que executam o que é determinado pelos metacomponentes. Apesar de serem inúmeros,
Sternberg (2005) descreve os que são utilizados no raciocínio indutivo, mais precisamente
em tarefas de analogias, por considerá-los os mais usados em testes clássicos de
inteligência. São eles: 1. Codificação, que se refere à atribuição semântica dada à resolução
da analogia; 2. Inferência, ou a descoberta da relação entre os primeiros itens ou termos; 3.
Mapeamento, ou a descoberta de que a relação desses primeiros itens pode se aplicar aos
últimos; 4. Aplicação efetiva dessa relação completando a analogia; 5. Comparação das
opções de resposta com aquela gerada mentalmente, para que se possa decidir qual é a
correta; 6. Justificativa, que é um componente opcional, utilizado quando não se encontra a
opção considerada correta e escolhe-se a mais aceitável; e, 7. Resposta, ou consolidação da
opção, feita por meio de uma ação qualquer.
Os últimos componentes do processamento da informação descritos por Sternberg
(2005) são os de aquisição de conhecimento, igualmente importantes para o funcionamento
inteligente. Estão subdivididos em: 1. Codificação seletiva, que se refere à filtragem ou à
separação de informações relevantes das irrelevantes; 2. Combinação seletiva, que
completa o primeiro, combinando partes da informação considerada relevante, para formar
um todo; 3. Comparação seletiva, que significa descobrir a relação entre uma informação
nova com alguma já adquirida. Dessa forma completa-se a explanação da subteoria
componencial.
Na subteoria experiencial, a segunda que compõe a tríade do pensamento
inteligente, para Sternberg, o autor discute a questão da novidade da tarefa e da
automatização do processamento da informação como fatores de influência nas medidas de
inteligência. Habilidades para lidar com situações relativamente (e não totalmente) novas e
para automatizar o processamento de informações estão relacionadas a comportamento
88
inteligente. Tais habilidades não estão desconectadas da subteoria componencial, pois os
componentes da inteligência são constantemente recrutados para tarefas que ocorrem em
vários níveis de experiência. Da mesma forma, essas duas subteorias não estão isoladas da
contextual, porque o pensamento inteligente assume funções dentro do contexto
sociocultural das pessoas. A adaptação ao ambiente, sua modificação caso falhe a tentativa
de adaptação inicial, bem como a seleção de um novo ambiente, se ocorrer falha nas duas
tentativas anteriores, constituem os três objetivos comportamentais previstos na subteoria
contextual (Sternberg, 2005). É importante ressaltar que as requisições impostas para que
uma adaptação ocorra variam de um ambiente a outro, e Sternberg (2005) considera essa
questão fundamental, quando se trata de avaliação da inteligência, pois um teste pode ser
adequado em um determinado contexto, mas não em outro.
Essas subteorias propostas por Sternberg permitem que a tarefa que os participantes
desta pesquisa terão de executar, no teste de inteligência, possa ser vista também
qualitativamente. Especificamente as subteorias experiencial e contextual favorecem a
discussão da capacidade intelectual de indivíduos autistas, em função das dificuldades
adaptativas e da inflexibilidade que eles demonstram ter frente a experiências novas.
A partir disso, o próximo tópico comporta questões relativas ao processo avaliativo
propriamente dito, primeiramente considerando esta questão de maneira mais geral e, em
seguida, relacionando-a à população específica de indivíduos autistas. A proposta avaliativa
aqui escolhida para aplicação do teste de inteligência foi a dinâmica, ou assistida. Detalhes
dessa avaliação serão vistos adiante.
3.3. Avaliação Psicológica e o uso dos Testes de Inteligência
A avaliação psicológica da inteligência vem passando por algumas revisões; por um
lado, em função das críticas feitas ao uso dos testes, cujos resultados estavam assumindo
89
um caráter absoluto na decisão sobre as capacidades intelectuais dos indivíduos; por outro
lado, em função da necessidade de melhor definição, desse e de outros construtos
psicológicos, considerando mais sua natureza ou sua essência, e não apenas o desempenho
manifesto (Almeida & Primi, 2010). É claro que o uso de instrumentos adequados para fins
diagnósticos continua sendo importante na tarefa avaliativa, mas o objetivo não é o de
determinar baixos ou altos rendimentos, mas ser um auxiliar na compreensão do
funcionamento cognitivo do indivíduo e na orientação das decisões subsequentes a esse
processo.
De acordo com Almeida e Primi (2010), uma das modificações previstas para a
avaliação da inteligência refere-se à inclusão de aspectos mais dinâmicos do funcionamento
cognitivo, como estratégias de processamento da informação, com interesse particular no
como esse funcionamento ocorre, e não no quanto de potencial existe. Trata-se de uma
avaliação em que o avaliador deve interagir com o examinando, para verificar a
discrepância entre as capacidades que ele já desenvolveu e as capacidades latentes, as quais
ainda necessitam da intervenção de terceiros para que seja desenvolvida.
A avaliação dinâmica assenta-se no conceito de zona de desenvolvimento proximal
de Vygotsky e na teoria da experiência de aprendizagem mediada de Feuerstein, que teve
seus estudos apoiados em Vygotsky e em Piaget. Nesta abordagem, a preocupação não está
na performance a ser alcançada pelo examinando (produto), mas nos resultados atingidos
mediante intervenções (processos). Torna-se, portanto, muito mais prospectiva do que
retrospectiva, pois enfatiza o potencial de aprendizagem (Souza, Desprebiteris & Machado,
2004; Cruz, 2008).
Entende-se por aprendizagem mediada aquela que depende de duas pessoas, sendo
que uma possui mais informações do que a outra; isso permite que a menos habilitada
gradativamente se torne capaz (Linhares, Escolano & Enumo, 2006). A mediação significa,
90
então, que as experiências de aprendizagem de um indivíduo, em contato com os estímulos
do ambiente, são enriquecidas por conta da interposição de um mediador, que transforma
esses estímulos com o intuito de favorecer a compreensão deles pelo mediado (Feldman,
2006).
Há três parâmetros universais de mediação: a intencionalidade-reciprocidade, a
transcendência e o significado. A intencionalidade refere-se ao investimento que o
mediador faz para orientar a interação do mediado com o estímulo, ensinar uma habilidade
ou auxiliar na focalização e seleção do estímulo a ser aprendido. A reciprocidade refere-se
à troca necessária nesse processo, pois ele não pode ser um investimento unilateral.
Transcendência é a compreensão de que os princípios que regem uma experiência podem
ser generalizados para outras situações, aplicados a novas experiências. Por fim, mediação
do significado refere-se ao componente afetivo-emocional da interação. O mediador deve
conduzir o mediado à busca do significado, do valor, não somente de uma tarefa específica,
mas de um sentido maior de mundo (Feuerstein, Feuerstein, Falik & Rand, 2002; Souza,
Desprebiteris & Machado, 2004; Feldman, 2006).
De acordo com Linhares, Escolano e Enumo (2006), a avaliação psicométrica
ocupa-se com o nível atingido pela criança, quando ela trabalha sozinha (desempenho real);
já a abordagem sociocognitiva, como a de Vygotsky, objetiva compreender o desempenho
da criança durante e após a assistência (desempenho potencial). Sendo assim, as autoras
definem a avaliação dinâmica, também denominada de assistida ou interativa, como aquela
que cria uma situação de ensino-aprendizagem no procedimento de avaliar, com o intuito
de detectar indicadores de potencial de aprendizagem em crianças que apresentam
desempenho rebaixado em avaliações psicométricas tradicionais de inteligência. Pode ser
usada, não apenas com testes específicos para isso, mas também com testes tradicionais.
91
São quatro as dimensões que caracterizam uma avaliação dinâmica, de acordo com
Linhares (1995): a interação, o método, o conteúdo e o foco. A interação diz respeito às
ações mediadoras que podem ocorrer durante o processo, como o fornecimento de pistas,
feedback após o desempenho, instrução detalhada, demonstrações, permissão de várias
tentativas, prolongamento do tempo, adicionais verbais e concretos de memória, sugestões,
análise conjunta das estratégias de solução usadas, controle da impulsividade, entre outras.
O método de ajuda usado na avaliação pode ser clínico ou estruturado. No método clínico
as intervenções não são sistematizadas e o que se obtém é uma análise qualitativa mais
geral do desempenho do examinando. No método estruturado, as intervenções são
sistematizadas, e podem ocorrer em três formatos: assistência e manutenção; fase inicial
sem ajuda, assistência e manutenção; fase inicial sem ajuda, assistência, manutenção e
transferência ou generalização da aprendizagem. Em relação ao conteúdo, a avaliação pode
ser de habilidades cognitivas gerais ou específicas. O foco refere-se ao desempenho
potencial que pôde ser percebido na avaliação, ou seja, como era o desempenho antes, sem
assistência, qual a quantidade e o tipo de ajuda necessários e como o examinando
respondeu a essa ajuda.
Nesta pesquisa, o método utilizado para avaliação da inteligência, por meio do
TONI-3 Forma A, foi clínico, considerando apenas uma pontuação final, mas com uso
moderado de pistas, conforme está descrito mais adiante, no procedimento da avaliação, no
capítulo sobre o método. Por se tratar de participantes autistas, o uso da assistência foi
compatível com a possibilidade de compartilhamento que eles conseguiram ter nessa
interação. No próximo tópico, finalizando este capítulo, a avaliação intelectual de
indivíduos autistas será investigada, culminando na definição dos objetivos deste trabalho.
92
3.4. Avaliação da inteligência em indivíduos autistas
A capacidade intelectual de crianças autistas tem sido descrita, em guias
informativos e em livros específicos de divulgação desse transtorno, como sendo abaixo da
média para a maioria dos indivíduos, ou seja, 70 a 75% dos autistas, e na média ou acima
dela, para os de alto funcionamento ou com síndrome de Asperger. Apenas
aproximadamente 30% desses indivíduos apresentariam quociente de inteligência acima de
70, conforme salientam Gauderer (1997), Sigman e Capps (2000) e Schwartzman (2003).
Nessas descrições não são apontados os instrumentos de avaliação utilizados para se chegar
a esses índices, mas Gauderer (1997) afirma que os autistas apresentam dificuldade ao
serem testados em tarefas verbais, sobretudo as que solicitam pensamento simbólico ou
sequência lógica; saem-se bem, no entanto, em tarefas que exigem habilidades manuais,
visioespaciais e de memória imediata. Essa descrição supõe testagem efetuada com as
escalas Wechsler.
Abordagens mais recentes, no entanto, vêm questionando esse índice, afirmando
que essa proporção tende a diminuir em virtude de um novo olhar sobre a capacidade
intelectual dos autistas, defendendo-se a ideia de que esses indivíduos apresentam
desabilidades cognitivas distintas das crianças deficientes mentais (Goldstein & Ozonoff,
2009; Mottron, 2006). Klinger, O’Kelley e Mussey (2009) atentam para o fato de que,
tendo os autistas um perfil confuso de habilidades cognitivas, torna-se tarefa complicada
para os psicólogos definir qual instrumento seria o melhor para avaliá-los, pois eles podem
se apresentar abaixo da média num WISC, mas na média ou acima dela em testes nãoverbais que requisitem sequência visual e habilidades de percepção de padrões.
Edelson, Schubert e Edelson (1998) já haviam discutido, em seu estudo, a
inadequação do uso frequente de medidas de inteligência que requerem habilidades verbais,
por exemplo, o WISC-R ou o WISC-III, em indivíduos autistas. Segundo eles, as respostas
93
verbais solicitadas nesses testes requerem, além de conhecimentos específicos da criança
naquilo que está sendo avaliado, capacidade para compreender a instrução, o que muitas
vezes é difícil para um autista. As respostas inadequadas aos itens do teste são consideradas
incorretas, e isso altera a pontuação total, interferindo negativamente na classificação
dessas crianças.
Esses mesmos autores comentam que, independentemente do nível de
funcionamento cognitivo de uma pessoa com autismo ser irrelevante para o diagnóstico,
considerando-se os critérios sintomatológicos contidos no DSM-IV, tais indivíduos estarão
sempre sendo avaliados sob esse aspecto, tanto em instituições educacionais, para fins de
inserção em programas de intervenção, quanto em atendimentos clínicos, para
determinação das melhores propostas terapêuticas. Afirmam que algumas dimensões
deveriam ser consideradas na avaliação de autistas, quais sejam, seu funcionamento
cognitivo geral, o número de sintomas autísticos que apresentam e a severidade desses
sintomas. Defendem a ideia de que, quando se avalia somente a dimensão do
funcionamento cognitivo, 50 a 75% dos autistas são considerados deficientes mentais, isso
porque não foram consideradas as interferências das outras duas dimensões (presença e
severidade dos sintomas) sobre os resultados coletados. Para eles, assim como para Gilberg
(2005), é possível que um indivíduo tenha uma sintomatologia severa em autismo, com
pontuação intelectual alta, assim como pode ocorrer que pontuações baixas apareçam em
resultados de indivíduos autistas com grau mínimo de severidade.
Se, por um lado, existem descrições gerais acerca das dificuldades manifestadas
pelos autistas, por outro lado há comentários acerca de capacidades cognitivas fantásticas
apresentadas por alguns deles, como memória, habilidades musicais, e até mesmo cálculo e
rapidez para resolução de quebra-cabeças. Performances superiores na prova de Cubos da
escala Wechsler aparecem na descrição geral dos autistas de alto funcionamento (Shah &
94
Frith, 1993), síndrome de Asperger, ou ainda os idiots-savants – autistas com habilidades
específicas prodigiosas, mas prejudicados na interação social recíproca (Wing, 1997;
Trevarthen & cols., 1998; Bosa, 2002; Baron-Cohen & Bolton, 2003).
Um estudo de Bölte e Poustka (2004) buscou fazer a comparação entre autistas
savants e não-savants, na tentativa de investigar se os dois grupos apresentavam diferenças
nos perfis intelectuais, e se haveria associação entre os talentos savants e as características
intelectuais. Na verdade, o estudo visava, principalmente, verificar se um perfil cognitivo
distinto poderia ser identificado mediante testes padronizados, e os autores usaram o
WISC-R e o WAIS-R (versão alemã) como instrumentos principais da pesquisa.
Participaram do estudo 59 indivíduos autistas, dentre eles 33 savants e 26 não-savants
provenientes de um projeto de genética molecular de autismo entre os países da Alemanha,
Áustria e Suécia. O grupo de savants (28 homens e 5 mulheres, com idade entre 7 e 49
anos), tinha mais que uma habilidade especial, dentre elas a memória, a musicalidade, a
aritmética, a leitura, a visioespacial e o desenho. Seu QI variava entre 36 e 128. O grupo de
não-savants (13 homens e 13 mulheres) tinha idade variada entre 6 e 29 anos.
Os resultados mostraram que de um modo geral não houve diferença significativa
entre os dois grupos no que se refere ao nível intelectual avaliado por aqueles testes. Em
relação aos subtestes, ambos os grupos apresentaram maior habilidade em atividades
visioespaciais e menor habilidade em tarefas de conhecimentos. No entanto, houve
diferença de média entre os grupos savants e não-savants no subteste de Dígitos, que
consiste numa tarefa de memória auditiva de curto prazo, envolvendo atenção e
autocontrole. Os savants tiveram melhor desempenho nessa tarefa, que também é usada
como medida de memória de trabalho em avaliações de funções executivas, o que pode
significar que, para este grupo, tal tarefa pode funcionar como uma medida de memória
mecânica, já comprovada como sendo a habilidade principal em indivíduos savants.
95
Os fatores individuais que causam maior ou menor grau de comprometimento nos
indivíduos autistas ainda são desconhecidos, mas alguns autores concordam que os
problemas maiores estão nos primeiros anos de vida. As defasagens em relação ao
desenvolvimento normal e à vida adaptativa seriam mais acentuadas na primeira infância
(Wing,1997; Sigman & Capps, 2000) e a melhora no quadro estaria relacionada, em grande
parte, pela aquisição da linguagem (Martins, Preussler & Zavaschi, 2002; Mottron, 2006;
Baron-Cohen, 2008).
Alguns estudos se propuseram a investigar mais detalhadamente as características
dos instrumentos de avaliação cognitiva e as condições de resposta do indivíduo autista. Yu
e Martin (2003) desenvolveram uma pesquisa na qual discutiram a influência de
modalidades de estímulos nas respostas de escolha. Utilizaram um teste denominado The
Assessment of Basic Learning Abilities – ABLA (Avaliação de Habilidades Básicas de
Aprendizagem), e concluíram que pessoas com distúrbios do desenvolvimento e com
ausência ou limitação na comunicação deveriam ser avaliadas preferencialmente mediante
discriminações de estímulos visuais simples, comparações visuais com modelos, ou
discriminações auditivo-visuais.
Pesquisas utilizando o Teste de Inteligência Não-Verbal – segunda edição (TONI-2)
e terceira edição (TONI-3) foram realizadas por Edelson, Schubert e Edelson (1998),
Edelson, Edelson e Jung (1998), e Edelson (2005), em amostras de crianças autistas. O
primeiro estudo avaliou 258 autistas (que faziam parte de uma amostra mais ampla, de 393
participantes, dos quais 135 não puderam ser testados), com idades entre 4 e 41 anos, tendo
por objetivo investigar se esse teste era apropriado para avaliar essa população e se os
fatores de habilidade verbal e grau de comprometimento em autismo interfeririam nos
resultados.
96
Os autores afirmam que a melhor forma de avaliar se indivíduos autistas possuem
déficits cognitivos, comparados a indivíduos normais, é selecionar um instrumento de
avaliação que seja adequado e que não os coloque em desvantagem. Escolheram o TONI-2,
por ter instruções não-verbais, não ter tempo previsto para seu término e por não estar
baseado em estímulos academicamente trabalhados. Com isso, seriam respeitadas as
dificuldades em processamento auditivo, em atenção e em habilidades acadêmicas, que os
autistas exibem. Outro fator considerado em relação ao TONI-2 diz respeito ao seu
formato, contendo itens livres de linguagem e cultura, que permitem familiarização rápida
com seu esquema antes de se iniciar a tarefa.
Nesse estudo, o primeiro de uma série, considerou-se fundamental comparar o
grupo de autistas com as normas contidas no manual do teste, para indivíduos com retardo
mental, no intuito de verificar se os escores das duas populações seriam similares. Foi feita
também comparação dos escores dos autistas com os de população com lesão cerebral.
Havia o desejo dos autores de construir normas específicas para indivíduos autistas, mas a
amostra não era suficientemente representativa para que tal objetivo fosse atingido.
Além do TONI-2, os autores utilizaram como instrumentos de avaliação: a Aberrant
Behavoir Checklist (ABC), uma escala que visa analisar comportamentos desviantes; a
escala de Hiperatividade retirada da Conner’s Rating Scales (CRS); a Fisher’s Auditory
Problems Checklist (FAPC), para investigação do processamento auditivo; e, a Form E-2
Checklist, que consiste num inventário para avaliar o grau de comprometimento do autismo
como leve, moderado ou severo. O uso do TONI-2 sofreu modificação, pois os
pesquisadores optaram por oferecer aos participantes instruções verbais, justificando que
muitos deles não compreenderiam os gestos. Solicitaram também aos pais que ajudassem
na fase inicial de esclarecimento instrucional, reforçando as orientações dadas, para garantir
a compreensão plena daquilo que estava sendo solicitado. Os autores queriam medir a
97
performance máxima dos participantes mais do que sua performance típica, por acreditarem
que assim teriam um melhor indicador do seu verdadeiro funcionamento.
O resultado das investigações estatísticas iniciais, comparando-se as duas amostras,
de indivíduos testáveis e não testáveis, mostrou que a falta de atenção e o número de
sintomas autísticos foram os fatores que interferiram de forma significativa na possibilidade
de testagem. Os autores surpreenderam-se com a influência positiva da habilidade verbal
nos resultados dos testes, visto que o TONI-2 foi escolhido justamente por não requerer
essa habilidade. No entanto, deve-se lembrar que houve mudança nas instruções em função
da crença de que autistas têm dificuldade em processar informação gestual e em dirigir sua
atenção ao que lhes é solicitado.
A comparação dos resultados da amostra testada com as normas existentes para
populações especiais, inclusive de retardo mental, não acusou similaridade. A média dos
quocientes dos autistas no TONI-2 foi de 88,99, com desvio padrão de 21,13, enquanto a
média estimada para a classificação em retardo mental era de 66 para a forma A do teste e
de 68 para a forma B.
Uma réplica desse primeiro estudo foi feita por Edelson, Edelson e Jung (1998),
com uma amostra de 39 crianças autistas (37 homens e 2 mulheres) de Taiwan, com idades
entre 3 e 15 anos de idade. O objetivo foi o de comparar os resultados desse estudo com os
do estudo original e verificar se as características da amostra de Taiwan afetariam o
resultado. Essa amostra tinha expressão verbal inferior à anteriormente estudada. Todos
foram diagnosticados pelo DSM-IV e avaliados com o TONI-2 e a Aberrant Behavior
Checklist (ABC).
Os resultados foram analisados por diferença de média (t teste) entre as amostras e
mostraram-se similares ao estudo anterior, de 1998, em relação tanto às médias, quanto às
variáveis idade e gênero, bem como a problemas comportamentais (avaliados por meio da
98
escala ABC). Verificou-se que as crianças menores e as mais verbais tiveram melhores
resultados no teste, o que significa que, apesar de a habilidade verbal não ser uma
requisição básica para o TONI-2, parece afetar indiretamente seus resultados. Não houve
relato, nesse estudo, de modificações instrucionais do teste para a população de Taiwan.
Um fator que não pôde ser comparado entre as amostras foi a dificuldade atencional, pois
apenas a população original foi mensurada pelo Fisher´s Auditory Problems Checklist
(FAPC).
O estudo mais recente desenvolvido por Edelson (2005) utilizou o Teste de
Inteligência Não-Verbal – terceira edição (TONI-3) e o subteste Raciocínio Analógico do
Teste Universal de Inteligência Não-Verbal (UNIT). Foram avaliadas 35 crianças (23
homens e 12 mulheres) com idade entre 4 e 18 anos, diagnosticadas clinicamente como
autistas, sendo provenientes de dois países, Itália e Estados Unidos. O objetivo da pesquisa
foi o de investigar se os déficits de conhecimento do mundo real influenciavam nas
pontuações da capacidade intelectual de indivíduos com autismo. Havia a hipótese de que
os autistas teriam performance melhor no TONI-3 do que no UNIT, por se tratar de uma
medida puramente abstrata. Ambos os testes se valem de instrução não-verbal, sendo que o
TONI-3 é constituído de itens que avaliam raciocínio abstrato, enquanto o subteste de
raciocínio analógico do UNIT avalia também conhecimento do mundo real, ou seja, há
itens que requerem a resolução da matriz analógica usando figuras de objetos comuns. Os
resultados mostraram que não houve diferença significativa entre as pontuações totais das
duas medidas, mas quando a porcentagem de acertos em conhecimento do mundo real era
maior, aumentava em 8 pontos o resultado do TONI-3; quando a porcentagem era baixa,
não foi observada diferença entre os resultados dos dois testes.
Mais um estudo que visou avaliar a capacidade intelectual de autistas foi o de
Mayers e Calhoun (2003), utilizando o Stanford-Binet Intelligence Scale: Fourth Edition e
99
o WISC-III, com o objetivo de compreender o funcionamento cognitivo desses indivíduos e
planejar intervenções educacionais adequadas. Os participantes foram 53 crianças com
idade entre três e sete anos, que foram avaliadas com o Stanford-Binet, e 63 crianças com
idade de seis a 15 anos, que foram avaliadas com o WISC-III. Todas foram diagnosticadas
mediante o DSM-IV, além de terem sido coletadas outras informações junto aos pais e
professores. Os resultados relativos ao Stanford-Binet mostraram que os QIs não-verbais
foram significativamente maiores que os verbais para o grupo como um todo. Os escores
mais elevados foram encontrados em tarefas que envolviam memória e raciocínio
quantitativo, significando que as capacidades mais desenvolvidas no autismo estariam nas
habilidades visuais relacionadas com emparelhamento, relações espaciais e memória de
curto-prazo.
Em relação ao WISC-III, essas autoras não encontraram diferença significativa entre
os QIs verbal e de execução na amostra estudada. Uma das explicações foi a de que havia
diferença na idade dos dois grupos e que o QI verbal, para muitas crianças autistas, tende a
aumentar durante os anos pré-escolares. Os escores mais baixos no WICS-III foram no
subteste de Compreensão, em contraste com Semelhanças, Vocabulário e Informação,
podendo indicar dificuldades em compreensão verbal no que se refere a raciocínio social,
característica esta presente em autismo. Crianças com baixo QI tiveram escores mais
elevados em Cubos e em Armar Objetos, indicando maiores habilidades visioespaciais e
habilidades manipulativas visiomotoras. Esse dado não foi confirmado em crianças com
alto QI. Nestas, houve performance baixa em Códigos e em Dígitos, podendo-se confirmar
as dificuldades em coordenação motora e em manutenção da atenção relatadas em autismo.
Aspectos específicos da avaliação intelectual de autistas encontram-se detalhados no
trabalho atual de Klinger, O’Kelley e Mussey (2009), que apontam diretrizes clínicas para a
atuação psicológica no processo avaliativo dessa população. Eles atentam para o perfil não
100
homogêneo de habilidades cognitivas que os autistas têm, tornando difícil a tarefa dos
psicólogos de escolher qual instrumento utilizar para medir o QI. Com certeza não há um
melhor teste para medir o funcionamento intelectual de autistas, mas é preciso tomar alguns
cuidados, a partir do conhecimento obtido na literatura sobre as capacidades e as limitações
desses indivíduos, a interferência dos sintomas autísticos sobre a performance intelectual e
ainda, as propriedades específicas dos testes de inteligência, para que a escolha seja mais
adequada a cada caso.
Segundo esses autores, uma avaliação pautada em QI pode superestimar a falha ou
subestimar a capacidade de um autista; por outro lado, quando a escolha do instrumento é
apropriada, a avaliação da inteligência ajuda a clarificar forças e fraquezas no indivíduo
avaliado e apontar áreas que precisam de intervenção. Essa escolha requer que se considere,
inicialmente, a idade em que o indivíduo se encontra e as intervenções que ele vem tendo,
pois poderá haver mudanças nas suas habilidades cognitivas ao longo do desenvolvimento.
Um QI mais estável pode ser atingido na vida adulta.
Outros cuidados na escolha dos instrumentos requerem que o avaliador considere
que a rapidez e as habilidades motoras são fatores complicadores numa avaliação de
autistas, bem como tarefas que envolvam imitação, atenção compartilhada, atenção a
informações sociais, compreensão de pronomes pessoais e uso do dedo indicador para
apontar a resposta. Quanto à sessão de avaliação, considera-se que o posicionamento
correto do avaliador seja ao lado da criança, sendo possível manter um adulto significativo
para ela, como um dos pais, por exemplo, ao seu lado também, até mesmo fortalecendo as
instruções dadas. Além disso, sugere-se a criação de uma rotina de atividade para a
diminuição da ansiedade da criança, e pistas visuais para complementação da tarefa, como
stickers ou numeração para cada atividade feita. Sugere-se também que o avaliador use
101
palavras ou expressões compactas como comandos, criando-se uma rotina, sem cobranças
de contato visual (Klinger, O’Kelly & Mussey, 2009).
Mottron (2006), trabalhando com o que ele denomina de transtornos invasivos do
desenvolvimento sem deficiência intelectual (TEDSDI), aponta falhas na avaliação
intelectual de autistas, com base em testes que usam somatório de habilidades para cálculo
de QI, ou para classificação intelectual, como as escalas Wechsler, pois eles incluem
subtestes que colocam o autista em desvantagem. Para ele, não é válido um resultado total
em que grande parte dos subtestes não pôde ser cumprida em função de dificuldades
inerentes às características sintomatológicas do próprio transtorno. A questão da
compreensão de instruções verbais é um agravante nesses tipos de teste, o que torna os
subtestes verbais impróprios para boa parte dessa população que apresenta dificuldades
mais ou menos intensas na capacidade comunicativa.
A questão discutida não dispensa a compreensão de forças e fraquezas dos avaliados
a partir de uma bateria multifatorial, mas se constitui como crítica ao uso de um índice total
de QI que classifica indivíduos autistas como deficientes mentais, sem consideração às suas
habilidades. Mottron (2006) defende a ideia de que uma deficiência intelectual pressupõe
um comportamento comprometido na maioria das áreas avaliadas em um teste de
inteligência, e que os autistas possuem picos de habilidade, o que tornam seu perfil atípico,
mas não deficiente. Além disso, se o autista não responde bem a um teste multifatorial, mas
responde a um teste não-verbal, como as Matrizes Progressivas de Raven, algum diferencial
deve existir entre essas medidas, relacionado provavelmente às características autísticas.
102
103
CONCLUSÃO DOS CAPÍTULOS E DEFINIÇÃO DOS
OBJETIVOS DA PESQUISA
A presente pesquisa contou com a apropriação de algumas diretrizes mencionadas
no tópico anterior e com o ajuste da avaliação de sua amostra às condições consideradas
satisfatórias. Foi selecionada, inicialmente, uma escala que pudesse diferenciar os graus de
comprometimento autístico dos indivíduos avaliados. Em relação aos testes cognitivos, o de
atenção por cancelamento e o de habilidade perceptomotora foram escolhidos porque,
embora exijam resposta motora, sua execução é rápida e oferece dados importantes para a
compreensão do processamento do estímulo visual dos participantes, bem como da sua
maturidade perceptomotora. Para a avaliação da inteligência foi escolhido um teste nãoverbal, que oferece itens de treino anteriores à sua execução e que requer resposta motora
simples. A avaliação assistida foi selecionada porque permite que o resultado do teste de
inteligência seja mais compatível com o desempenho potencial dos examinandos do que
com o seu desempenho real. Quanto ao ambiente, pensou-se em organizá-lo de acordo com
o que é mais confortável e seguro para cada participante, além de contar com a postura da
pesquisadora de sentar-se ao lado do examinando, para não lhe impor o olhar frontal.
Procurou-se obter, portanto, uma forma de otimizar o processo avaliativo para esses
indivíduos, valendo-se de instrumentos possíveis de serem usados no dia a dia de um
psicólogo clínico. Foi preciso olhar para as características dos autistas, considerando suas
particularidades cognitivas (o indivíduo – quem avaliar?); olhar para os testes escolhidos,
vendo neles um meio de entender o funcionamento cognitivo do indivíduo autista (o
instrumento – com o quê avaliar?); e olhar para a situação de testagem administrando as
interferências que poderiam impossibilitar a avaliação (o processo – como avaliar?).
104
Sendo assim, considera-se que, de forma mais ampla, tentou-se investigar o
funcionamento cognitivo de indivíduos que apresentam Transtornos do Espectro do
Autismo, em tarefas que avaliam atenção visual seletiva e alternada, em habilidade
perceptomotora de cópia de formas, e em teste de inteligência não-verbal, que requer
estratégias de raciocínio lógico e resolução de problemas. De forma mais específica foram
estabelecidos estes objetivos:
1. Verificar evidências de validade convergente/discriminante entre os resultados
do TONI-3 Forma A, do B-SPG, do Teste de Atenção por Cancelamento e dos
Screenings Motor e de Percepção com a escala PDDAS-SQ.
2. Verificar os coeficientes de correlação entre os testes TONI-3 Forma A, B-SPG,
Teste de Atenção por Cancelamento e Screenings Motor e de Percepção, para
esta amostra estudada.
3. Buscar indícios de evidências de validade de critério para a escala PDDAS-SQ
baseadas no julgamento dos profissionais que trabalham com os autistas que
serão avaliados, acerca do grau de comprometimento autístico desses
indivíduos.
Outras questões que emergiram a partir da definição dessa proposta de pesquisa
foram:
1.
Os
instrumentos
escolhidos
poderiam
ser
aplicados
em
autistas,
independentemente de seu grau de comprometimento? 2. A forma de responder ao TONI-3,
ou seja, apontando a resposta correta, estaria incompatível com a dificuldade em pointing
que os autistas apresentam, devendo ser pensada uma outra forma de resposta? 3. O Teste
de Atenção por Cancelamento e o B-SPG podem oferecer pistas a respeito dos dados
encontrados em literatura sobre a atenção e função perceptomotora dos autistas, tornandose testes sensíveis à avaliação cognitiva dessa população?
105
106
107
MÉTODO
O delineamento desta pesquisa é correlacional, pois serão verificadas as
convergências ou divergências entre construtos, por meio de trato estatístico, valendo-se,
para tanto, de amostragem por conveniência, por se tratar de investigação em população
especial, mais precisamente, autistas. As variáveis investigadas foram: inteligência,
percepção e atenção. Medidas específicas foram escolhidas tentando-se ajustar as
características dos instrumentos às necessidades especiais avaliativas da população em
questão.
Participantes
Os dados coletados neste estudo foram provenientes de três conjuntos de
participantes, que aqui serão classificados como primários, secundários e terciários, de
acordo com seu grau de relação com o foco do problema. Sendo assim, os participantes
primários foram os indivíduos autistas, que se submeteram aos testes; os secundários foram
os pais (casal, pai ou mãe), que responderam à escala de avaliação; e os terciários foram os
profissionais psicólogos que se dispuseram a fornecer um parecer verbal, baseado apenas
na experiência profissional, sobre o grau de funcionalidade cognitiva (considerada apenas
como alto ou baixo funcionamento) e o grau de comprometimento autístico (considerado
como leve, moderado ou severo) desses indivíduos, por eles cuidados em consultório, em
escola ou em instituição.
Essa classificação será utilizada apenas neste tópico, para determinação da
contribuição de cada grupo na pesquisa. Mas nos capítulos seguintes, serão chamados de
108
participantes, apenas os indivíduos autistas, para facilitar o uso da nomenclatura. Os outros
serão denominados pelas suas próprias funções, ou seja, pais ou profissionais psicólogos.
Os participantes primários avaliados somaram 28 indivíduos, sendo 25 do sexo
masculino e três do sexo feminino, com idade entre cinco e 26 anos (Média = 11,82; DP =
5,68), apresentando diagnóstico compatível com os chamados Transtornos do Espectro do
Autismo. Entre as idades de cinco a 10 anos havia 15 indivíduos; entre 11 e 20 anos havia
nove; e entre 20 e 26 havia quatro.
Não foi possível obter os laudos técnicos da maioria dos diagnósticos, mas contouse com o relato dos pais sobre a trajetória dos tratamentos até a efetivação ou a hipótese
diagnóstica para cada caso. Desse relato ficou registrado que 12 autistas foram
diagnosticados por psicólogos (depois confirmados por outros profissionais), nove tiveram
diagnóstico conjunto, feito por psicólogos e outros profissionais, e sete foram
diagnosticados por outros profissionais (neurologistas, psiquiatras). As nomenclaturas
usadas pelos pais nas descrições do quadro apresentado pelos filhos foram: Transtorno
Autista (para 12 participantes), Síndrome de Asperger (para sete participantes), Transtornos
do Espectro do Autismo (três participantes), Autismo Atípico (dois participantes),
Síndrome de Asperger e/ou Distúrbio Semântico Pragmático (um participante), Síndrome
de Asperger reavaliado como Transtorno Autista (um participante), Transtorno Global do
Desenvolvimento, sem diagnóstico fechado (um participante), Autismo com deficiência
intelectual, sem diagnóstico fechado (um participante).
No que se refere aos tratamentos recebidos por esses participantes, 27 estão de
alguma forma sendo atendidos em diferentes áreas de intervenção, sendo que 13 estão
institucionalizados e 14 recebem atendimentos em centros de reabilitação ou em
consultórios particulares. Um deles está sem atendimento, atualmente. Vinte usam
comunicação oral, sete usam comunicação mista (oral e/ou alternativa e/ou gestual) e um
109
usa comunicação gestual. Quanto ao tipo de escola frequentada por eles, 15 estudam ou
estudaram em escolas particulares, 10 em escolas públicas e três em escolas especiais
públicas. No ensino regular, seis cursam a Educação Infantil, 12 estão no Ensino
Fundamental Nível I, três estão no Ensino Fundamental Nível II, um está completando o
Ensino Médio e outro já o concluiu.
As habilidades citadas pelos pais destes participantes, como sendo as mais
evidenciadas no comportamento deles, puderam ser agrupadas em seis categorias, de
acordo com o conteúdo analisado da descrição oferecida. Em termos de frequência, 23
foram classificados como tendo habilidade em memória, 16 foram apontados como tendo
habilidade em computação, sete tiveram registro de apresentarem hiperlexia, seis foram
considerados tendo habilidade em pintura e desenho, cinco em lógica, e cinco em
percepção. Mais de uma habilidade pôde ser registrada para um mesmo participante
primário.
A proveniência desta amostra foi diversificada contando com indivíduos atendidos
pela própria pesquisadora, em consultório; indivíduos indicados por profissionais
psicólogos que os atendem também em seus consultórios particulares ou em instituições
especializadas para tratamento de autismo (Anexo C – Carta de Autorização); indivíduos
indicados por psicólogos que os atendem em APAEs ou em Centros de Reabilitação
Clínica; indivíduos indicados por profissionais que os conhecem e outros ainda indicados
por pais de autistas avaliados. Os 28 participantes primários estão distribuídos em sete
cidades do Estado de São Paulo e duas cidades do Estado de Minas Gerais.
Como critério de inclusão, foram aceitos os indivíduos que tiveram condições de
responder minimamente aos testes, independentemente de seu grau de comprometimento
em autismo, com idade acima de cinco anos e abaixo de 30 anos. Como critério de
exclusão, foram eliminados os autistas que tinham comorbidades clínicas, como síndromes
110
genéticas, deficiências sensoriais, ou quadros neurológicos claramente definidos, por
exemplo, síndromes congênitas. Esses dados já eram checados ao primeiro contato da
pesquisadora com a família ou com a instituição. Foram eliminados, também, três
indivíduos que apresentaram, já em fase de avaliação, comportamentos mais claramente
compatíveis com deficiência mental. Nestes casos, durante a entrevista com os pais,
verificou-se que os diagnósticos dos filhos ainda não estavam definidos, mas os
comportamentos manifestados por eles não cumpriam com as características autísticas, de
acordo com os critérios diagnósticos básicos plenamente reconhecidos pela pesquisadora.
Estimava-se um número de 30 autistas para esta pesquisa, mas foi possível avaliar
apenas 28 no período designado para a coleta. Um dos possíveis participantes foi eliminado
por não ter completado a bateria de testes, em duas tentativas feitas, devido à dificuldade
em manter-se envolvido com a tarefa. Além desse, mais três crianças também não
conseguiram efetuar, nem mesmo as primeiras tarefas solicitadas. Outros dois foram
considerados sem condições de avaliação, após a entrevista feita com os pais. Ao todo,
portanto, foram iniciados 34 protocolos, mas apenas 28 puderam ser analisados em todas as
tarefas aplicadas.
Os participantes secundários, ou seja, os pais dos autistas, que responderam à escala
de avaliação de Transtornos Globais do Desenvolvimento (PDDAS-SQ), foram 10 casais,
17 mães e um pai. O grau de instrução do chefe da família variou de primário incompleto
(1) até superior completo (11), com uma concentração de 22 entre colegial completo e
superior completo. De acordo com o Critério de Classificação Econômica Brasil (CCEB) as
famílias situaram-se entre A1 (2 famílias) e C (8 famílias), com a maior frequência em B1
(9 famílias). Todos assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Anexo D).
Com relação aos participantes terciários pôde-se contar com as informações
oferecidas por 26 psicólogas, pois não foi possível o contato com uma profissional, e um
111
dos participantes primários não estava mais sob atendimento psicológico. Algumas destas
psicólogas não estavam atendendo diretamente esses autistas, mas tinham contato suficiente
com eles, ou nas escolas ou nas instituições, para fornecerem as informações solicitadas.
Materiais
1.
Pervasive
Developmental
Disorder
Assessment
Scale
/
Screening
Questionnaire – PDDAS-SQ (Grossmann, 2004)
Trata-se de um screening experimental elaborado pelo neuropediatra americano
Rami Grossmann (2004), específico para avaliação de graus de comprometimento em
Transtornos Globais do Desenvolvimento, mais especificamente Autismo, Asperger e
TGD-SOE. Este instrumento encontra-se disponibilizado na internet por meio do site
http://childbrain.com/pddassess.html. Para esta pesquisa ele foi traduzido do inglês para o
português, por profissional competente na área, e com a devida autorização de uso
concedida pelo autor.
Ele foi construído com base nos critérios oferecidos pelo DSM-IV e é composto por
quatro áreas amplas de investigação, cujos itens são pontuados de acordo com cinco
possibilidades de comprometimento, quais sejam: não (não se aplica ao caso), resolvido (já
ocorreu, mas não ocorre mais), leve, moderado ou severo. A pontuação dos itens gerais,
que dão nome às quatro subescalas, é de 0 para o não e para o resolvido, oito para o leve,
12 para o moderado e 16 para o severo. A pontuação de seus subitens é diferente, e variam
de zero a quatro para os mesmos cinco graus considerados. A área de Dificuldades na
Interação Social possui 15 itens, a de Atrasos na Fala e na Linguagem possui 14 itens, a de
Jogo Imaginário e Simbólico Anormal possui 15 itens e a área de Dificuldades
Comportamentais é constituída apenas desse item geral. Ao todo, somam-se, portanto, 48
itens, sendo quatro itens gerais e 44 itens específicos. Cada item geral, assim como os itens
112
específicos, conta com uma explicação detalhada para cada uma das possibilidades de
pontuação. O preenchimento desse screening é feito com os pais e por profissional que
tenha experiência clínica.
O resultado final oferecido pelo instrumento, ou seja, a somatória dos pontos dos
itens gerais e dos itens específicos reflete o nível de disfunção em autismo, que pode variar
em quatro classificações: ausente (de 0 a 49), leve (de 50 a 100), moderado (de 100a 150) e
severo (mais que 150). Segundo o autor, esses valores foram estimados arbitrariamente e
ele sugere que seja feito um estudo mais amplo para confirmação, pois ainda não foram
realizados. O examinando deve pontuar em todas as áreas para ser considerado autista, mas
se não tiver pontuação na segunda área – Atrasos na Fala e na Linguagem – e mesmo assim
tiver um total de mais de 60 pontos pode ser considerado um Transtorno de Asperger, de
acordo com o que consta descrito na escala.
2. Teste de Atenção por Cancelamento (Montiel & Capovilla, 2007)
Esse instrumento constitui-se em uma das versões que um teste de cancelamento
pode assumir. Foi desenvolvido por Montiel e Capovilla, em 2005, e encontra-se disponível
para uso em pesquisas (Montiel & Capovilla, 2007). Visa avaliar a atenção seletiva em dois
níveis de dificuldade e a atenção alternada, além da velocidade de processamento. O teste
completo é composto por 3 tarefas sendo que em cada uma delas há uma matriz com 300
figuras geométricas distribuídas em 15 linhas, com 20 figuras em cada linha. As figuras
são: círculos, quadrados, triângulos retângulos, cruzes e estrelas, pintadas de preto em
fundo branco.
Na primeira tarefa, denominada de Parte 1, a atenção requerida é a seletiva simples.
Há um modelo localizado acima da matriz de estímulos, e, das 300 figuras distribuídas na
página, há 50 figuras iguais a este modelo para serem assinaladas pelo examinando. Na
113
segunda tarefa, ou Parte 2, a atenção requerida é seletiva complexa. Há duas figuras juntas,
localizadas acima da matriz, e sete pares iguais estão distribuídos entre as 300 figuras da
página. O examinando deve riscar entre as duas figuras que aparecem na mesma posição
que o modelo. Na terceira tarefa, ou Parte 3, a atenção requerida é a alternada. Do lado
esquerdo da folha há um estímulo associado a cada fileira, determinando que é este o
modelo que deve ser riscado. Nesta terceira tarefa, o examinando deve assinalar as figuras
considerando a mudança de estímulo a cada fileira. O tempo determinado para a execução é
de um minuto para cada tarefa, salientando-se que, anterior à atividade propriamente dita, o
examinando recebe instruções detalhadas sobre o que é para ser feito, inclusive com uma
atividade-exemplo visualizada, em folha separada do teste.
Montiel e Capovilla (2007) comentam que esse teste conta com um estudo de
validação que viabiliza seu uso para avaliação de pacientes com Transtorno do Pânico, pois
num estudo feito por Montiel, em 2005, foi encontrada diferença significativa entre os
grupos com e sem esse transtorno. Essas diferenças foram em duração, na Parte 1
(p=0,025), total de acertos, na Parte 2 (p=0,009), total de ausências, na Parte 2 (p=0,013),
duração, na Parte 2 (p=0,040) e duração total do teste (p=0,011). Os autores citam também
estudos correlacionais deste instrumento com outros três testes de atenção, quais sejam, o
Teste de Trilhas B e o Teste de Stroop Computadorizado em suas formas neutra e
emocional. Segundo os autores, as correlações foram significativas. Em relação à correção,
eles sugerem anotação de três tipos de escores: número total de acerto, número total de
erros/acréscimos, e número total de erros/omissões. Esses escores podem ser calculados
para cada um dos quatro quadrantes da folha, separadamente, para interpretação de
velocidade de processamento ou indícios de lesões encefálicas.
Na presente pesquisa, as folhas de atividade foram mantidas conforme os originais,
mas optou-se por modificação nas folhas instrucionais, com ampliação da tarefa-exemplo,
114
adotando-se a proposta de o participante executá-la. O fator tempo também não seguiu o
padrão, ou seja, o participante pôde executar a tarefa sem limite temporal pré-determinado,
mas o tempo utilizado em minuto foi anotado de maneira sutil, para verificação da
velocidade de processamento. O tempo total utilizado em cada tarefa também foi anotado.
3. Teste Motor e Teste de Percepção suplementares ao Bender (Brannigan &
Decker, 2003)
Esses instrumentos fazem parte de uma nova versão de administração do Bender,
proposta por Brannigan e Decker (2003), na qual imediatamente após a fase de memória do
então chamado Bender II, dois testes suplementares – motor e de percepção – são aplicados
servindo de screening para a verificação das habilidades motora e perceptual dos
examinandos. As tabelas normativas desses dois screenings foram montadas com base num
estudo com 400 pessoas, cujas idades variaram de quatro a 70 anos ou mais.
O Teste Motor é composto de uma tarefa-exemplo e mais quatro tarefas contendo
três atividades cada item. A criança deverá unir dois pontos situados dentro de retângulos,
sem ultrapassar suas bordas. Esses retângulos assumem três larguras diferentes. Há um
limite de quatro minutos para a execução do teste. A tarefa-exemplo pode ser executada
pelo examinador, caso seja necessário. Cada resposta correta recebe um ponto sendo que o
máximo é de 12 pontos nesse instrumento. A pontuação é transformada em percentil (ou
quartis), de acordo com os acertos por grupos de idade. Resposta correta compreende
traçados que tocam os dois pontos e não saem do retângulo delimitador do espaço, sendo
permitido apenas esbarrar em seus limites.
O Teste de Percepção é composto por 10 itens, cada um deles composto por cinco
figuras alinhadas horizontalmente dentro de grades, estando a figura-modelo à esquerda da
folha, seguida das alternativas a serem escolhidas pelo examinando. É preciso procurar uma
115
figura igual ao modelo, nessa sequência de figuras à direita dele. O examinando deverá
circular ou apontar para a figura que julgar correta. O examinador poderá assinalar a
resposta escolhida pelo examinando, caso ele não tenha condições de fazê-lo. Há um limite
de quatro minutos para a execução do teste. Cada resposta correta recebe um ponto e o
máximo possível é de 10 pontos, nesse instrumento. A pontuação é transformada do mesmo
jeito que no Teste Motor.
Nesta pesquisa, os Testes Motor e de Percepção foram aplicados antes da execução
de cópia do B-SPG e não foi cobrado tempo para serem completados. A pontuação foi
mantida em um ponto para cada acerto, em ambos os testes.
4. Teste Gestáltico Visomotor de Bender – Sistema de Pontuação Gradual
(B-SPG) (Sisto, Noronha & Santos, 2005)
Este teste foi criado por Lauretta Bender, em 1929, e apresentado para uso clínico
em 1938. É composto por nove figuras inspiradas nos princípios da Gestalt, que permitem
investigar a maturação percepto-motora de crianças, uma vez que implica solicitação de
cópia dessas nove figuras expostas em cartões individuais.
No Brasil, o Sistema de Pontuação Gradual – B-SPG (Sisto, Noronha & Santos,
2005) – é o que atualmente atende às exigências do Conselho Federal de Psicologia, no que
se refere a evidências de validade, precisão e normatização do teste. Nesse sistema, avaliase a distorção da forma na reprodução gráfica das figuras, com o objetivo de determinar o
nível de maturação da função gestáltica motora em crianças de seis a 10 anos de idade. A
aplicação pode ser individual ou coletiva. A pontuação varia de zero a dois para todas as
figuras, exceto a de número seis, para a qual podem ser atribuídos pontos de zero a três. O
total de erros cometidos pode atingir 21 pontos, e o manual oferece tabelas para conversão
dessa pontuação de erros em percentil e em quartil (por idade). Há também tabela de
116
porcentagem de acertos, que permite uma análise qualitativa da maturação percepto-motora
das crianças avaliadas. O estudo normativo contou com 1052 crianças.
Com o objetivo de evidenciar a validade desse sistema, em relação a mudanças no
desenvolvimento, foi verificada a correlação entre o B-SPG e a variável idade, registrandose um índice de r = -0,58, o que indica que conforme aumenta a idade diminui a pontuação
de erros no teste. A análise de variância demonstrou que as idades de sete e de 10 anos
solicitaram diferenciação por sexo.
Em busca de evidência de validade por critério, Suehiro e Santos (2006)
desenvolveram dois estudos. No primeiro, avaliaram as médias entre crianças de 2ª e de 3ª
série identificando diferença significativa entre os dois valores. Isso indica que o B-SPG
mostrou-se sensível para diferenciar a maturação perceptomotora dessas duas etapas de
escolaridade. No segundo estudo, as autoras compararam o desempenho de grupos
extremos avaliando crianças de 3ª série, por meio da Escala de Avaliação das Dificuldades
na Aprendizagem da Escrita (ADAPE) e do B-SPG. Dois grupos foram identificados no
ADAPE considerando-se o escore no B-SPG, ou seja, crianças com nenhuma dificuldade e
com dificuldade leve tiveram melhor desempenho no B-SPG, ao passo que crianças com
dificuldade média e dificuldade acentuada tiveram desempenhos claramente inferiores.
Sisto, Bartholomeu, Rueda, Santos e Noronha (2008) investigaram a possibilidade
de convergência entre os escores do B-SPG e das Matrizes Progressivas Coloridas de
Raven (Raven-MPC) em 239 crianças de sete a 10 anos de idade. O índice de correlação
entre os testes foi de r=-0, 55 para p=<0,001, significando que o aumento da pontuação no
Raven-MPC foi compatível com a diminuição dos erros no B-SPG. Avançando nos estudos
com grupos extremos, os autores registraram que, por meio do Raven-MPC, foi possível
discriminar desempenhos melhores e piores no B-SPG.
117
Os índices de precisão por Alfa de Cronbach (0,80), procedimento de duas metades
de Spearman-Brown (0,77) e modelo Rasch (0,76), para todas as idades no B-SPG (de seis
a 10 anos) representam valores altos. O índice de precisão entre avaliadores foi de 89,67%.
Estudos valendo-se desse sistema de pontuação em população especial têm
contribuído para a ampliação de informações que o teste pode oferecer. Pacanaro (2007)
aplicou o B-SPG em indivíduos com Síndrome de Down, correlacionando-o com o TONI-3
Forma A, obtendo um índice de correlação significativo (r=-0,57 para p<0,001). Santos e
Jorge (2008) aplicaram esse sistema de pontuação do Bender em crianças e adolescentes
disléxicos, comparando-o com o sistema Lacks, e obtiveram um índice de correlação
significativo e alto (r = 0,76).
5. Teste de Inteligência Não-verbal - TONI-3 (Brown, Sherbenou & Johnsen,
2006)
O Teste de Inteligência Não-Verbal (TONI) foi desenvolvido em 1982, por Brown,
Sherbenou e Johnsen, e encontra-se, hoje, em sua terceira edição (TONI-3), apresentado em
duas formas paralelas A e B. Ele se propõe medir a inteligência geral por meio de
raciocínio abstrato e resolução de problemas, distribuídos em 45 pranchas, contendo figuras
abstratas, dispostas em formatos variados. Tais formatos dividem-se em matrizes de 2x2,
matrizes de 2x3, matrizes de 3x3, grupos de 5 faltando 1 e grupos de 5 faltando 4. Como
recurso instrucional, este teste segue o modelo não-verbal, ou seja, as instruções são
fornecidas por meio de gestos.
Esse instrumento tem sido indicado, conforme consta em seu manual com tradução
e adaptação brasileira (Brown, Sherbenou & Johnsen, 2006), para avaliar indivíduos que
apresentam dificuldades em responder a testes convencionais de inteligência devido a
problemas com a linguagem, com a motricidade e com a diversidade cultural, justamente
118
por apresentar conteúdo e instruções não-verbais. Ele não requer leitura, escrita, fala ou
audição por parte do examinando, nem habilidades motoras refinadas, pois a forma de
responder aos itens é simples, bastando um gesto indicativo da escolha feita. Não há tempo
para sua execução.
Seus 45 itens estão organizados seguindo uma gradação de dificuldade. Cabe ao
examinando observar a natureza do problema e analisar seus componentes; planejar a
estratégia de resolução, a partir do que tem disponível em seu repertório; tentar encontrar
uma regra organizadora ou uma relação lógica para resolver o problema; e escolher a
alternativa que lhe parece solucionar a questão, podendo revê-la caso tenha dúvidas. É
preciso escolher uma resposta correta dentre quatro ou seis alternativas, não numeradas,
dispostas na parte inferior da folha. As figuras que compõem as tarefas variam em
características de forma, posição, direção, rotação, contiguidade, sombreamento, tamanho e
movimento. A dificuldade dos itens depende da quantidade dessas características contidas
nos estímulos, gerando maior ou menor complexidade nas relações e regras que as
organizam.
Estratégias ou habilidades de raciocínio são requeridas para dar conta da resolução
dos problemas, ou da compreensão das regras, podendo-se combinar de formas múltiplas,
dependendo do item a ser analisado. Há sete estratégias de raciocínio possíveis neste teste:
1. Generalização e Classificação, em que se requer identificação de similaridades; 2.
Discriminação, em que se requer a identificação de diferenças; 3. Raciocínio Analógico,
definido pela fórmula clássica “A está para B, assim como C está para ____”; 4. Seriação,
em que o sujeito deve perceber que a relação entre os estímulos é sequencial; 5. Indução,
em que é preciso descobrir o princípio que une figuras; 6. Dedução, em que se deve
encontrar um exemplo que represente um princípio ou uma regra; e 7. Reconhecimento de
119
Detalhe, em que se requer a identificação de partes que estão faltando, ou que devem ser
inferidas (Brown, 2003).
A aplicação do teste consiste em apresentar ao examinando as pranchas, uma a uma,
fornecendo-lhe instrução não-verbal, mas com rapport anterior. Há cinco itens de treino,
antes da execução do teste, que servem para garantir a compreensão da tarefa, mas eles não
são pontuados. A pontuação é feita pelo número de itens corretos escolhidos até o chamado
item de teto, que significa o último de três itens errados em uma sequência consecutiva de
cinco itens. A anotação na folha de respostas é feita pelo examinador. A conversão do
escore bruto oferece índices de QI e de Percentil.
No Brasil, o TONI-3 possui um estudo normativo para a Forma A do teste, a partir
dos protocolos de 382 crianças entre as idades de seis a 10 anos. Os resultados são
convertidos para Percentil. Os estudos psicométricos contam com análise de itens,
evidências de validade e coeficientes de precisão. A correlação entre o TONI-3 Forma A e
a idade dos participantes apontou um índice de r=0,33 para p=0,001, evidenciando uma
validade relativa ao desenvolvimento. Após análise de variância foram encontrados três
subgrupos com variação pela idade (seis-sete, oito-nove e dez), e não cinco grupos, como
era esperado. Um estudo de validade convergente foi efetuado a partir da comparação do
TONI-3 Forma A com o Teste do Desenho da Figura Humana – DFH - Escala Sisto – uma
vez que os dois instrumentos se propõem avaliar inteligência. Obteve-se um coeficiente de
r=0,49 para p<0,001, e a convergência foi confirmada pelas diferenças entre grupos
extremos (Sisto, Noronha & Santos, 2006).
Outros estudos de validação do TONI-3 Forma A, no Brasil, foram feitos mediante
a comparação deste teste com o Cloze, com a Escala de Avaliação de Escrita e com a
Escala de Reconhecimento de Palavras, atingindo índices de correlação r=0,46, r=-0,46 e
r=0,31, respectivamente, considerando-se os valores obtidos sem especificação de série.
120
Todos os resultados evidenciaram compartilhamento de aspectos relacionados às propostas
de medida. Em relação à precisão, os coeficientes baseados em Alfa de Cronbach,
Spearman-Brown, Guttman e Rasch foram satisfatórios, variando de 0,62 a 0,83. A
correlação obtida em estudo de teste-reteste ofereceu o índice de r=0,999 para p<0,001,
demonstrando alto índice de precisão. Esses estudos constam no manual do examinador do
TONI-3, na Parte III da tradução brasileira, onde são descritos os estudos psicométricos
brasileiros (Brown, Sherbenou & Johnsen, 2006).
O TONI-3 Forma A também foi utilizado por Pacanaro, Santos e Suehiro (2008) ao
avaliarem as habilidades intelectuais de pessoas com Síndrome de Down. A amostra contou
com 51 indivíduos, com idades entre seis e 24 anos (Média = 15,3 e DP = 4,9), sendo que
26 eram do sexo feminino e 25 do sexo masculino. As pontuações obtidas variaram de um a
20 pontos (Média = 6,7 e DP = 4,16), com 72,6% da amostra concentrados nas frequências
entre dois e 10 pontos.
Outro estudo brasileiro, buscando evidências de validade para este teste, teve sua
aplicação feita em escolares surdos, sob duas versões: a de lápis e papel e a
computadorizada (Barbosa, 2007). Foram avaliados 205 surdos, sendo 86 do sexo feminino
e 119 do sexo masculino, com idades entre seis e 25 anos (Média = 14 e DP = 4,4). Eles
frequentavam escolas públicas e cursavam do 1º ao 9º ano do Ensino Fundamental. Os
resultados apontaram aumento crescente da pontuação, conforme também se elevavam a
idade e a escolaridade, evidenciando validade desenvolvimental. O tipo de surdez não
mostrou diferença significativa na pontuação. As duas versões, papel e lápis e
computadorizada, mostraram ser viáveis para avaliação da inteligência em surdos.
121
6. Ficha sociodemográfica e de informações específicas
Esta ficha foi elaborada para ser preenchida com os pais, a fim de coletar dados
gerais da família e dados específicos do histórico de vida de seu filho. Nela consta o nome
do participante, a idade, o sexo, data de nascimento, nome do informante, endereço e
telefone para contato. Para investigação do nível socioeconômico utilizou-se o Critério de
Classificação Econômica Brasil (CCEB).
Sobre o histórico de vida, as investigações foram, de um modo geral, sobre as
condições de gestação e parto, comportamentos nos primeiros anos de vida, doenças, início
do tratamento e/ou da institucionalização, escolarização, uso de medicação, comunicação
usada, habilidades específicas, e quem estabeleceu a classificação em autismo, sob qual
sistema e época. Além disso, a ficha contém espaço específico para preenchimento do grau
de comprometimento autístico e do grau de funcionalidade cognitiva dos examinandos,
dados esses coletados com os profissionais responsáveis (clínico ou institucional) por eles.
Procedimento de aplicação e correção
1ª fase – preparação
Primeiramente foi feito o contato com as instituições, escolas e consultórios
particulares, solicitando a elegibilidade de indivíduos autistas para a pesquisa. Esse contato
foi feito pessoalmente, por telefone ou por e-mail, havendo necessidade, na maioria das
vezes, de se complementar o pedido com explicações mais minuciosas requeridas pelos
profissionais. Em cidades mais distantes, e a instituições, o Termo de Consentimento Livre
e Esclarecido (TCLE), bem como a Carta de Autorização para a Instituição foram enviados
por e-mail às psicólogas responsáveis, para aprovação do processo e agilização dos
esclarecimentos aos pais. Os dias e horários marcados foram ajustados de acordo com a
122
disponibilidade das instituições ou dos pais dos participantes, e a agenda de coleta de dados
da pesquisadora.
2ª fase – aplicação
A avaliação foi planejada de forma a seguir um esquema sistemático de aplicação
dos instrumentos, mas a pesquisa em campo solicitou ajustes nesse esquema, sobretudo no
que diz respeito à aplicação da escala PDDAS-SQ com os pais, que deveria ser seguida dos
testes com seus filhos. Então, em alguns casos, a escala foi aplicada antes da avaliação com
o autista, e em outros, foi aplicada depois, isso ocorrendo ou no mesmo dia, ou em dias
diferentes. Esse arranjo foi feito em função de os pais não poderem estar presentes no dia
agendado para a avaliação, ou para minimizar a ansiedade de alguns autistas, ajustando a
avaliação deles ao melhor momento de execução de tarefa.
A aplicação de 27 escalas foi efetuada pela própria pesquisadora em entrevistas que
duraram em média duas horas e meia, contando que a ficha sociodemográfica também
deveria ser preenchida nesse momento. Apenas uma escala foi preenchida por uma
profissional psicóloga, residente na mesma cidade de um dos participantes, pois a
pesquisadora já havia feito a tentativa de entrevista em três oportunidades diferentes e a
instituição não conseguiu, em nenhum desses dias, agendar horário com a mãe. Essa
psicóloga auxiliar foi devidamente orientada no preenchimento da escala, cuidando para
que cada questão fosse muito bem classificada. As anotações minuciosas feitas ajudaram na
conclusão das pontuações, que foram finalizadas pela pesquisadora.
As demais escalas tiveram também esse detalhamento de dados para que a
classificação do indivíduo, em cada item, não gerasse impasse. Todas as dúvidas que os
pais tiveram foram discutidas e esclarecidas pela pesquisadora, o que contribuiu para que o
tempo usado nessa coleta fosse extenso. Algumas entrevistas ocorreram nas instituições as
123
quais os autistas frequentavam; outras ocorreram no consultório da pesquisadora; e outras
foram feitas nas próprias residências dos participantes.
Com os autistas, os testes foram aplicados sempre na mesma ordem, ou seja,
primeiramente eles fizeram os Screenings Motor e de Percepção, depois o Teste de Bender
– B-SPG, em seguida as três etapas do Teste de Atenção por Cancelamento, e por último o
TONI-3 Forma A. Quase todos conseguiram suportar o ritmo de execução em uma mesma
sessão, mas alguns indivíduos se cansaram e foi necessário aplicar os testes restantes em
um outro dia, ou mesmo reapresentar alguns testes que tinham sido iniciados, mas as
primeiras respostas foram dadas com clara demonstração de irritação ou cansaço.
Apesar de os locais de aplicação serem diversificados, o arranjo do posicionamento
da pesquisadora em relação ao participante foi sempre o mesmo, ou seja, um ficava sentado
ao lado do outro, e não de frente. Essa estratégia foi adotada pensando-se em minimizar o
estresse pelo qual muitos autistas passam quando precisam olhar o interlocutor
frontalmente. Valorizou-se, assim, o olhar para os materiais gráficos e para os movimentos
manuais da pesquisadora, necessários para a compreensão da tarefa.
Todos os participantes que não eram conhecidos da pesquisadora tiveram
acompanhantes na sala de avaliação, sendo estes, profissionais que trabalhavam com eles e
com os quais eles se sentiam seguros; ou os próprios pais, seguindo o mesmo raciocínio de
deixá-los com o sentimento de segurança. Com a permanência dos pais no local de
avaliação, foi impossível controlar, em alguns casos, a interferência deles na execução das
tarefas dos filhos. Em algumas avaliações essa interferência foi benéfica, pois os pais
sabiam a melhor forma de dar certas instruções aos seus filhos; em outras, porém, a
ansiedade dos pais exigiu que a pesquisadora pedisse que eles se contivessem na ajuda que
queriam oferecer.
124
Para a execução do Screening Motor a instrução foi rápida, oferecendo-se à criança
o lápis grafite e mostrando a ela como deveria unir os pontos formando uma reta, ou uma
linha. Alguns participantes sentiram dificuldade para entender a instrução oral havendo
necessidade de a pesquisadora valer-se do exemplo, ou ela mesma demonstrar como fazer,
ou ainda segurar na mão do examinando e mostrar-lhe como era para ser feito.
A compreensão da tarefa solicitada no Screening de Percepção foi difícil para
muitos participantes, o que fez com que a pesquisadora usasse vários recursos para alcançar
seu objetivo. Em alguns momentos, fazer um “x” no primeiro quadrante de cada conjunto
de estímulos foi o suficiente para a busca da outra figura igual; em outros momentos,
solicitar quais as duas figuras iguais, em cada conjunto, foi o mais adequado. Noutra
tentativa, usar o primeiro conjunto como exemplo foi preciso, mostrando um por um dos
desenhos e dizendo sim ou não para a igualdade. Ainda, como mais uma tentativa para a
compreensão da tarefa, foi preciso que a pesquisadora usasse vários itens como exemplo,
até que a atividade fosse compreendida visualmente e não auditivamente. Ao observar que
a tarefa não tinha condições de ser compreendida e o participante já estava estressado com
a situação, houve interrupção antes de seu término.
O teste de Bender – B-SPG – foi o instrumento proposto logo após os Screenings e
sua aplicação seguiu o esquema clássico de dizer ao participante que lhe seriam mostradas
nove figuras, uma a uma, e que ele deveria copiar essas figuras numa folha disponibilizada
à sua frente, de maneira tal que ficassem parecidas com o modelo. Para alguns participantes
houve redução da instrução, simplesmente mostrando-lhes as figuras e pedindo que elas
fossem copiadas no papel de forma a ficarem parecidas com o modelo. Um dos
participantes teve necessidade de que as duas primeiras figuras fossem desenhadas junto
com ele, com a ajuda da pesquisadora pegando em sua mão, para que ele pudesse entender
o pedido feito. As duas figuras foram redesenhadas por ele, em seguida, e ele pôde seguir
125
sozinho nas outras cópias. Os outros participantes todos compreenderam a tarefa, mesmo
que não a tenham executado de maneira fiel aos modelos.
O Teste de Atenção por Cancelamento seguiu a aplicação do B-SPG e contou com
um período maior de treinamento, em cada etapa, conforme explicado na descrição dos
instrumentos. Isso ocorreu porque foi respeitada a informação colhida em literatura de que
os autistas precisam de mais tempo para a familiarização com a tarefa. As instruções foram
curtas, associando-se fala a demonstração. As propostas de marcação dos estímulos foram
tanto o riscar quanto o circular, dependendo da qualidade do traçado dos participantes, já
analisada nos testes anteriores. O fator tempo não foi mencionado e apenas suportes verbais
frequentes foram dados, lembrando-lhes da tarefa a ser cumprida. Foram anotadas as
formas de varredura usadas por eles na Parte 1 do teste, bem como a quantidade de
estímulos assinalados em um minuto, e o tempo total usado por cada um para completar a
tarefa. Quatro participantes não tiveram seu rendimento computado no tempo de um
minuto, e um participante não teve seu tempo total anotado.
A segunda parte deste teste precisou de mais explicações da pesquisadora para que
houvesse compreensão dos participantes sobre a tarefa a ser cumprida, mas mesmo assim
ainda foi difícil para alguns deles. Os riscos (marcas) entre as figuras a serem encontradas
dificultou a compreensão de muitos participantes em relação à contingência de proximidade
requerida nesta tarefa. Fazer um círculo em torno das duas figuras foi uma tentativa usada,
pela pesquisadora, para facilitar a compreensão dos examinandos acerca do objetivo da
tarefa. Assim como na primeira parte, nesta também foram anotadas a execuções feitas em
um minuto e o tempo total utilizado para o cumprimento da atividade. Dois participantes
não tiveram seu rendimento computado em um minuto e um participante não teve seu
tempo total anotado. Alguns não concluíram o teste e outros apenas rasuraram a folha,
rabiscando-a.
126
Na terceira parte do teste os participantes já estavam mais familiarizados com o
sistema de marcação, mas alguns precisaram de indicação sistemática da figura a ser
procurada em cada linha, como um start para sua execução. Para isso a pesquisadora usou
circular cada figura-modelo e fazer uma seta indicando a linha a ser investigada, após a
nomeação que eles mesmos davam aos estímulos. Muitos tiveram dificuldade para entender
a mudança de estímulo a cada linha, por imaginarem que a tarefa era idêntica à da primeira
parte, ou seja, a busca de um estímulo específico. Sendo assim, a pesquisadora usou de
recursos como: fazer duas linhas de busca, apontando com o dedo, sob observação do
avaliado; mostrar-lhe linha por linha, ao dar-lhe as instruções, cobrindo as outras com um
papel, retirando-o no momento da execução; e, usar comandos curtos, mas direcionados.
Nesta tarefa foram anotadas quantas fileiras os participantes conseguiram fazer em um
minuto e o tempo total utilizado para o cumprimento da atividade. Apenas um participante
não teve seu rendimento em um minuto anotado.
É importante comentar que os tempos foram anotados com valor aproximado, pois
isso não foi feito com cronômetro e sim de forma sutil, com a pesquisadora olhando em seu
relógio de pulso. Por essa razão, algumas intercorrências prejudicaram as anotações das
primeiras aplicações, mas conforme a avaliação foi seguindo, essa situação ficou mais sob
controle e não foi difícil anotar nenhum dos dois tempos. Algumas interferências da
pesquisadora, principalmente na Parte 3 (circulando o modelo e fazendo a seta) também
devem ser levadas em consideração na contagem do tempo, mas foram necessárias e
ocorriam nas primeiras linhas, visto que o interesse, neste estudo, era a verificação da
possibilidade de execução de tarefas desta natureza, por indivíduos autistas. Para um dos
participantes, que havia rasurado a primeira parte deste teste, houve a tentativa de
reaplicação em um outro dia, logo após a reavaliação com o TONI-3 Forma A, e nesse
momento ele respondeu adequadamente à atividade solicitada.
127
A aplicação do TONI-3 Forma A foi a última tarefa efetuada e ocorreu em
sequência completa para a maioria dos participantes, ou seja, não foi considerado o item de
teto para interrupção do teste, com o intuito de se avaliar posteriormente a possibilidade de
um padrão de resposta para o grupo de autistas. No entanto, para alguns indivíduos, esse
procedimento gerou desconforto ou cansaço e o teste foi suspenso de forma tradicional, ou
seja, após três erros em cinco respostas consecutivas. As instruções não-verbais foram
usadas, inicialmente, conforme proposta original do teste, mas isso incomodou muito os
participantes de um modo geral. Os que eram verbais perguntavam o que era para fazer, e
os que não eram, olhavam para a pesquisadora e tentavam imitar os gestos dela apenas, sem
demonstrarem compreensão da tarefa a ser efetuada. Compreendeu-se que a instrução nãoverbal requer, da mesma forma que a verbal, habilidade no reconhecimento do processo
comunicativo e isso é falho nos autistas. Optou-se, portanto, pelas instruções verbais, com
orientações reduzidas, salientando o gesto, sim, mas acompanhado de falas curtas,
objetivas, que dessem significado àquilo que estava sendo mostrado.
As instruções verbais adaptadas seguiram o seguinte esquema: mostrar a matriz (ou
o quadrado dividido), nomear as figuras dentro da matriz, dizer que faltava uma, perguntar
qual era, mostrar as opções, esperar resposta espontânea do examinando, mostrar a resposta
certa caso não fosse apontada, salientar que as outras não eram corretas, e passar para o
próximo item de treino. A pesquisadora tentou garantir que durante o treino os participantes
demonstrassem ter compreendido a tarefa, inclusive retornando aos primeiros itens, em
alguns casos, para checar a real compreensão. Porém, para dois deles isso não foi possível,
porque não conseguiram abstrair a resposta mediante o apontar. Um deles deu murros sobre
as alternativas, parecendo incidir mais sobre a resposta correta, mas essa intenção não
estava clara; o outro, apontava todas as alternativas imitando a atitude da pesquisadora de
mostrar-lhe as opções, porém não fazia escolhas.
128
Houve, então, a tentativa de adaptar o teste às condições de resposta desses dois
participantes em específico. Sendo assim a pesquisadora recortou todas as alternativas dos
itens, de um caderno de exercício do TONI-3 Forma A, tradução brasileira, numerou-as no
verso e apresentou essa versão aos dois participantes, em outro dia de reavaliação. Dessa
forma adaptada, eles conseguiram efetuar o teste, compreendendo melhor a tarefa de
completar a matriz, preenchendo o vazio com uma das figuras alternativas, agora palpáveis.
Houve videogravação das execuções dos participantes durante a aplicação do TONI3, para que ficassem registrados dados importantes para a análise qualitativa posterior.
Essas gravações foram feitas, em alguns poucos casos, por uma auxiliar da pesquisadora, e
na maioria das avaliações, pelos próprios acompanhantes dos participantes. Foram,
portanto, gravações amadoras. Para alguns pais, foi solicitada uma autorização de uso de
som e imagem, visando edição desses vídeos para registro de detalhes interessantes nas
respostas dos participantes e análise das mediações feitas pela pesquisadora durante a
aplicação do teste. Apenas as mãos dos participantes foram focalizadas durante a gravação,
apontando para as respostas.
No que diz respeito à mediação ou à assistência feita pela pesquisadora, as pistas
oferecidas aos participantes se resumiram em: tolerância ao erro, permitindo tentativas de
correção espontânea; sugestão verbal e gestual de nova varredura em todas as alternativas,
algumas vezes controlando fisicamente a impulsividade do participante em virar o papel
rapidamente; sugestão de nova varredura na matriz, apresentando a eles, apenas
visualmente, os dois alinhamentos principais, ou seja, o horizontal e o vertical; feedback
verbal sobre respostas rápidas demais; e feedback verbal para os acertos, sobretudo quando
alguns solicitavam isso. Para os dois participantes que responderam ao TONI-3 Forma A
adaptado houve também feedback verbal acerca de escolhas de similares à resposta correta,
que sofriam rotação da figura nas suas mãos. A assistência estava prevista para todas as
129
aplicações, mas foi ajustada às necessidades de cada participante, todos eles tendo
oportunidades de, em algum momento, repensar suas respostas. Porém, essas mediações
foram mais intensas nos primeiros itens, até que o examinando se organizasse com a tarefa
e demonstrasse ter condições de se beneficiar dessas pistas para orientar seu raciocínio.
3ª fase – correção
Os protocolos de todos os testes estavam organizados em pastas individuais e foram
numerados para a efetivação da correção garantindo-se, assim, a preservação da identidade
dos participantes. O mesmo número de identificação foi utilizado nos testes, na ficha
sociodemográfica e na escala. A própria pesquisadora avaliou e corrigiu todos os
instrumentos. Os dados foram categorizados e tratados estatisticamente. Os resultados
provenientes deste tratamento encontram-se disponíveis no capítulo seguinte.
Os Screenings foram corrigidos de acordo com o que consta no Manual do
Examinador do Bender Gestalt II (Brannigan & Decker, 2003). Cada resposta correta
recebeu um ponto e a incorreta foi pontuada em zero. Como resposta correta do Teste
Motor considerou-se a linha que tocava os dois pontos e não saía do limite determinado,
podendo esbarrar nas bordas. Como resposta correta do Teste de Percepção considerou-se,
é claro, a igualdade entre a alternativa escolhida e a figura-modelo. Os pontos foram
transformados em postos percentílicos de 0-25, 26-50, 51-75 e 76-100, por grupos de idade,
mas utilizou-se também a pontuação bruta.
O Bender foi corrigido de acordo com Sistema de Pontual Gradual (B-SPG), no
qual são atribuídos pontos de zero a dois, para quase todas as figuras, menos a figura seis,
que recebe pontuação de zero a três. O crescente da pontuação refere-se à intensidade do
erro e não do acerto. Trabalhou-se com pontuação bruta e com as porcentagens de acerto,
ou seja, pontuações em zero, obtidas em cada figura.
130
O Teste de Atenção por Cancelamento teve sua pontuação feita de forma atípica,
considerada, aqui, a única possível. Na Parte 1 foram vistos os acertos que os participantes
tiveram dentro do tempo de um minuto e os acertos totais. Portanto, esta parte teve duas
pontuações. Para os quatro examinandos que não tinham as anotações da pesquisadora
quanto as suas execuções de um minuto, uma proporção foi feita considerando-se o tempo
total. Nenhum participante cometeu acréscimos neste subteste, apenas omissões. Na Parte
2, a pontuação foi feita sobre os acertos conseguidos em um minuto, sem as considerações
de acréscimos, extraindo-se, desta parte, apenas uma pontuação. Na Parte 3, optou-se por
pontuar fileiras e não estímulos independentes, considerando-se apenas as fileiras
totalmente corretas. Isso se deu em função de se julgar mais correto, permanecer nesta
terceira parte, com a pontuação também sobre os acertos. A atenção alternada continuou
sendo bem avaliada com esse critério, ou seja, com garantia da alternância, não havendo
respostas ao acaso. Duas pontuações também foram retiradas deste subteste, ou seja, uma
contando com as fileiras corretas efetuadas em um minuto, e outra com as fileiras corretas
totais, marcadas até o final.
A correção do TONI-3 Forma A também seguiu o que consta no manual, ou seja, a
pontuação refere-se à quantidade de itens acertados até a determinação do item de teto.
Item de teto é o terceiro erro em cinco itens consecutivos. Além da pontuação total, este
teste contou com a conversão dos pontos em QI e suas classificações, mas foi usada a
tabela americana para isso, pois a versão brasileira conta, por enquanto, com normas
apropriadas para as idades de seis a 10 anos.
Por fim, a correção da escala PDDAS-SQ foi feita com base no que consta nela
própria, logo no início dos itens de cada subescala. Sendo assim os itens gerais, que dão
nome às subescalas, receberam pontuação de zero para as respostas classificadas como não
e como resolvido; oito pontos para respostas classificadas como leve; 12 pontos para
131
moderado; e 16 pontos para severo. Os itens específicos foram pontuados em zero para
respostas classificadas como não; um para resolvido; dois para leve; três para moderado; e
quatro para severo. O total de pontos foi somado e a ele atribuído uma classificação geral
que seguiu também a regra que consta no final da escala, ou seja, ausente para pontuações
de 0 a 50, leve para pontuações de 50 a 100, moderado para pontuações de 100 a 150 e
severo para pontuações acima de 150.
Procedimento de análise de dados
Compreendendo que esta pesquisa contou com a aplicação de muitos instrumentos
e, portanto, o tratamento dos dados gerou uma grande quantidade de informações
diversificadas, optou-se por uma organização sistemática na apresentação dos resultados, a
fim de facilitar a apreensão do conteúdo oferecido. Um resumo do tratamento estatístico
realizado com os dados coletados encontra-se registrado na Tabela 2, como um sumário
norteador da exposição dos resultados. Nota-se que a descrição será feita por instrumento, e
cada um deles será analisado separadamente, mas adicionado gradativamente às análises
dos instrumentos seguintes.
Cabe aqui ressaltar que a amostra utilizada foi pequena (12<N<30), além de ser
eminentemente clínica, proveniente de contextos diferentes, o que sugere ser imprópria a
generalização dos dados obtidos. Além disso, os critérios para inclusão dos participantes na
pesquisa foram específicos, gerando uma amostra que representa de forma parcial, a
população de autistas, ou seja, representa os autistas que foram capazes de responder aos
testes aplicados. Essa caracterização da amostra conduz a um trato estatístico baseado em
testes não-paramétricos. Contudo, os dados não deixam de ser importantes e instigadores de
novas pesquisas acerca do funcionamento cognitivo de indivíduos autistas.
132
Os testes estatísticos não-paramétricos utilizados foram a correlação de Spearman
(com resultados em rho e p), para análises de convergência-divergência entre os construtos
investigados; teste de Mann-Whitney U (com resultados em U, Z e p), para verificação de
diferenças entre médias do rank de duas variáveis independentes; teste de Kruskal-Wallis
(com resultados em χ2, gl e p), para verificação de diferenças entre médias do rank de três
ou mais variáveis independentes; e teste t One-Sample, para verificar também diferença de
médias, contando que uma delas tem seu valor conhecido por representar uma média de
população normativa.
As estatísticas descritivas, apresentando as frequências dos dados avaliados, com
suas respectivas medidas de tendência central e de dispersão, iniciam todas as
apresentações dos instrumentos. As correlações pertinentes a cada teste são comentadas
valendo-se da nomenclatura oferecida por Dancey e Reidy (2006) para a classificação das
magnitudes encontradas nas análises correlacionais. Segundo esses autores, correlações de
0,1 a 0,3 são consideradas fracas; de 0,4 a 0,6 consideradas moderadas; de 0,7 a 0,9 são as
correlações fortes e o valor correlacional de 1,0 é considerado perfeito. Os centesimais
entre 0,3 a 0,4 ficaram sujeitos à interpretação do p, que muitas vezes deu à correlação um
índice de significância marginal, desde que superior a 0, 050.
Este capítulo se restringirá à apresentação dos tratamentos estatísticos sobre os
dados e o capítulo seguinte contará com as discussões geradas a partir desses resultados.
Porém, em determinados momentos, faz-se aqui necessário tecer alguns comentários sobre
os dados encontrados, para esclarecimento do raciocínio que conduzirá ao tratamento
seguinte. A Tabela 2 encontra-se disponível a seguir, com o resumo do tratamento
estatístico dos dados coletados na pesquisa.
133
Tabela 2. Resumo do tratamento estatístico dos dados coletados na pesquisa.
Instrumento
Escala
PDDAS-SQ
Tratamento Estatístico
1. Frequência dos participantes nos níveis classificatórios da escala.
2. Conversão da pontuação das subescalas em níveis classificatórios.
3. Correlação entre as classificações das subescalas e delas com a classificação geral
do PDDAS-SQ.
4. Frequências dos resultados sob nova pontuação.
5. Correlação das pontuações das subescalas entre si e delas com o total geral, tanto
da pontuação oficial quanto da nova pontuação.
6. Correlação dos itens específicos de cada subescala com seus respectivos itens
gerais.
7. Correlação dos itens específicos de cada subescala com os totais parciais dessas
subescalas e com o total geral do PDDAS-SQ.
8. Correlação do resultado total da escala com os pareceres fornecidos pelos
profissionais psicólogos, nas duas pontuações.
9. Análises estatísticas do PDDAS-SQ com dados da ficha sociodemográfica.
Teste de
Atenção por
Cancelamento
(TAC)
1.
2.
3.
4.
5.
Estatísticas descritivas das pontuações de cada parte do teste.
Correlação entre as três partes.
Diferença de média das varreduras visuais da Parte 1 do TAC.
Correlação entre as três partes e a escala.
Comparação de médias dos graus de comprometimento autístico com os TACs.
Testes Motor e
de Percepção
(Screenings)
1.
2.
3.
4.
Frequência de pontuações para cada um dos screenings.
Correlação entre ambos
Correlação deles com a escala PDDAS-SQ.
Correlação com os TACs e diferença de média com as varreduras do TAC 1.
Bender
1. Frequência de pontuações (erros)
2. Comparação da pontuação bruta com a média esperada por idade, de acordo com
as normas brasileiras.
3. Frequência e porcentagens de acerto por figura.
4. Comparação do desempenho nas figuras, com os níveis de dificuldade sugeridos a
partir das normas brasileiras.
5. Pontuação média por figura e por idade, comparadas às médias normativas.
6. Correlação com a escala PDDAS-SQ
7. Correlação com os TACs.
8. Correlação com os Screenings e comparação de médias com seus quartis.
BSPG
TONI-3
Forma A
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
9.
10.
11.
Frequência de pontuação bruta.
Frequências de QI e suas classificações de acordo com as normas americanas.
Correlação da idade dos participantes com os QIs.
Correlações e diferenças de médias dos QIs do TONI-3 com dados da ficha
sociodemográfica.
Correlação das cinco estruturas de apresentação do problema, com o total geral de
acertos no teste.
Correlação dos QIs com a pontuação total da escala PDDAS-SQ.
Correlação dos QIs com os graus de comprometimento sugeridos pelos
profissionais.
Correlação dos QIs com os graus de funcionalidade cognitiva sugeridos pelos
profissionais.
Correlação com os TACs e diferença de média com as varreduras do TAC 1.
Correlação com os Screenings.
Correlação com o B-SPG.
134
135
136
137
RESULTADOS
Escala de Avaliação de Transtornos Globais do Desenvolvimento / Questionário
Screening (PDDAS-SQ)
Considerando que o objetivo do uso desta escala é fornecer a classificação ou o grau
de comprometimento autístico dos indivíduos avaliados, justifica-se iniciar a apresentação
dos dados referentes a esse instrumento com a mostra da distribuição dos participantes
desta pesquisa em relação à classificação proposta na escala. A Tabela 3 expressa esses
dados.
Tabela 3. Frequência dos participantes em cada nível classificatório da escala PDDAS-SQ
Graus de comprometimento
leve
moderado
severo
Total
F
%
9 32,1
16 57,1
3 10,7
28 100,0
Observa-se que o grau moderado de comprometimento foi o mais frequente,
compondo mais da metade da amostra. Isso indica que, não apenas os indivíduos com
comprometimento leve, mas também muitos de grau moderado e alguns até de grau severo,
puderam ser avaliados em suas capacidades cognitivas. Apesar de a escala propor também a
condição de ausência de autismo em sua classificação, nenhum dos avaliados preencheu
essa condição, por isso ela não apareceu na tabela, o que demonstra que todos os
participantes apresentaram caracterização compatível com os Transtornos do Espectro do
Autismo (TEA).
Explorando um pouco mais os dados sobre as classificações oferecidas pela escala,
foram elaboradas, pela pesquisadora deste estudo, pontuações proporcionais para cada
138
subescala (cada área investigada), transformando-as em níveis classificatórios equivalentes,
em função de o PDDAS-SQ oferecer apenas classificação sobre a pontuação total estimada.
O raciocínio dessas equivalências está demonstrado na Tabela 4. A nomenclatura das
subescalas será sempre abreviada na exposição dos resultados, para facilitação de seu uso
nas tabelas.
Tabela 4. Conversão da pontuação das subescalas em níveis classificatórios
Referência do
total
Classificação
total
%
Interação
Social
Fala e
Linguagem
Jogo
Simbólico
Comportamento
até 50
de 50 a 100
de 100 a 150
acima de
150 a 240
Ausente
Leve
Moderado
Severo
20,08
41,60
62,50
100,00
16
32
48
acima de
48 a 76
15
30
45
acima de
45 a 72
16
32
48
acima de
48 a 76
0
8
12
16
Foi calculada a porcentagem de cada grau de comprometimento proposto na escala,
considerando-se o total possível de pontos. Em seguida, aplicou-se essa mesma
porcentagem a cada subescala, considerando seu total parcial. Obteve-se, assim, o valor
para cada um dos graus, agora também para as subescalas.
A partir desses limites fixados por subescala, para classificação do grau de
comprometimento autístico, pôde ser feito um estudo mais detalhado, ainda que
exploratório, sobre as relações de cada área investigada, com a escala como um todo. A
Tabela 5 apresenta os resultados referentes à correlação de Spearman, proposta para
analisar o grau de convergência entre as classificações das subescalas, e cada uma delas
com a classificação geral do PDDAS-SQ.
139
Tabela 5. Correlações entre as classificações das subescalas do PDDAS-SQ e delas com a
classificação geral
Correlação
de Spearman
Classificação
Fala e na
Linguagem
rho
rho
p
Classificação
Geral do
PDDAS-SQ
Classificação
em Jogo
Simbólico
Classificação
em
Comportamento
-0,03
p
Classificação em
Comportamento
Classificação
em Fala e
Linguagem
rho
p
Classificação em
Jogo Simbólico
Classificação
em Interação
Social
0,895
0,60
-0,01
0,001
0,978
0,22
0,09
0,37
0,270
0,658
0,052
0,53
0,50
0,60
0,58
0,004
0,006
0,001
0,001
rho
p
Observa-se que as classificações de todas as subescalas possuem nível de correlação
significativo e de magnitude moderada, com a classificação geral do instrumento. No que
concerne às relações entre as subescalas, no entanto, apenas o par formado pelas
classificações em Jogo Simbólico e Interação Social apresentou correlação significativa, de
magnitude moderada. O par formado pelas classificações em Jogo Simbólico e
Comportamento apresentou correlação com nível de significância marginal, e outros pares
não apresentaram correlação significativa, e as magnitudes foram fracas. Isso pode sugerir,
dentre outras possibilidades, que cada subescala tende a funcionar de maneira independente
com seus próprios itens; pode significar, também, que as subescalas de Jogo Simbólico e
Interação Social representam as áreas mais compatíveis com os quadros de autismo. No
entanto, por serem os Transtornos do Espectro do Autismo um conjunto de sintomas que
devem se combinar para finalização diagnóstica, esperava-se que as magnitudes das
correlações entre todas as subescalas fossem mais expressivas.
140
Uma outra explicação para a ausência de correlação mínima entre as subescalas
seria a existência de distribuição inadequada na pontuação dos itens, o que pode estar
relacionado, sobretudo, à pontuação dos itens gerais, pois eles seguem um critério diferente
do proposto aos itens específicos. A pontuação dos itens gerais é de zero para respostas
classificadas, tanto para não, como para resolvido; depois já pontua oito para classificações
em leve; 12 para moderado; e, 16 para severo. A pontuação de itens específicos segue a
sequência natural de zero, um, dois, três e quatro pontos para as classificações de não,
resolvido, leve, moderado e severo, respectivamente. Além disso, a subescala de
Comportamento conta com apenas um item, pontuado de forma geral e não específica.
Com o intuito de obter um modo de equilibrar esses valores, elaborou-se uma nova
pontuação para os itens que compõem a escala. Algumas comparações entre as duas formas
de pontuar serão oportunamente discutidas, ao longo deste capítulo. Porém, os tratamentos
estatísticos subsequentes serão referentes às duas pontuações apenas quando se julgar
necessário salientar alguma diferença entre elas. Todos os tratamentos aqui feitos serão
primariamente pautados nos dados da escala original. A Tabela 6 apresenta os resultados
pareados, das classificações dos graus de comprometimento autístico referentes às
pontuações originais e à nova pontuação proposta.
Tabela 6. Frequências da nova forma de pontuação e da pontuação original do PDDAS-SQ
Classificação original Classificação proposta
Graus de
comprometimento
F
%
F
%
leve
moderado
severo
Total
9
16
3
28
32,1
57,1
10,7
100,0
10
17
1
28
35,7
60,7
3,6
100
141
Esse novo critério de correção sugere progressão geométrica na pontuação dos itens
(zero, um, dois, quatro e oito) e não pontua de forma diferente os itens gerais. Considera a
intensidade com que o sintoma se manifesta, independentemente de ser geral ou específico.
Portanto, os 48 itens da escala são pontuados da mesma forma. Os limites de corte para as
classificações decorrentes dessa nova pontuação são de 50 (ausente), 100 (leve), 200
(moderado), e o teto, de 384 (severo). Os valores referentes ao grau severo de
comprometimento foram, conforme Tabela 6, os que sofreram mais alterações, mas a maior
ocorrência continuou sendo a do grau moderado.
Se forem relacionados os totais gerais das duas formas de pontuação obter-se-á a
correlação de rho=0,92 para p<0,001, ou seja, quase perfeita, até porque as classificações
em zero, um e dois não se modificaram, em sua maioria. O que se modificou mais foram as
intensidades de moderado e severo e os limites de corte para esses mesmos graus.
Correlacionando-se ainda a nova pontuação parcial de cada subescala (e não as
classificações) com seu total geral, obtém-se correlação significativa para todas, com
magnitude forte para a subescala de Fala e Linguagem. O pareamento entre esses resultados
da nova pontuação e os da pontuação original encontra-se registrado na Tabela 7.
Tabela 7. Correlação das pontuações parciais de cada subescala com o total geral, nas duas
pontuações
Total Geral do
PDDAS-SQ Original
Correlação de
Spearman
rho
p
Total Geral do
PDDAS-SQ Nova
rho
p
Total de
Interação Social
Total de Fala e
Linguagem
Total de Jogo
Simbólico
Total de
Comportamento
0,70
0,56
0,89
0,54
<0,001
0,002
<0,001
0,003
0,66
0,84
0,62
0,47
<0,001
<0,001
<0,001
0,012
A homogeneização da pontuação, na nova proposta de correção, elevou o índice
correlacional da subescala Fala e Linguagem com o instrumento como um todo. No
142
entanto, os dados das correlações entre as subescalas ainda apontam correlação significativa
apenas entre Jogo Simbólico e Interação Social (rho=0,54 para p= 0,003), que também
aparece na pontuação original (rho=0,55 para p=0,003) e entre as subescalas Jogo
Simbólico e Comportamento (rho=0,47 para p=0,011), mas não atinge grau de significância
entre as outras. Disso conclui-se que a nova pontuação, por si só, não foi suficiente para
alcançar um nível mínimo de relação entre as subescalas dentro da pontuação total.
Procedeu-se, então, a uma análise correlacional entre o item geral de cada subescala
e seus subitens específicos, considerando-se a pontuação original, e foi observado que três,
de 15 itens, correlacionaram-se significativamente com o item geral de Interação Social;
cinco, de 14 itens, tiveram correlação significativa com o item geral de Fala e Linguagem;
e, apenas um item, de 15, teve correlação significativa com o item geral de Jogo Simbólico.
Todas as magnitudes foram moderadas. A subescala de Comportamento não contém itens
específicos. Os dados estatísticos desta análise, apenas com os índices correlacionais
significativos, encontram-se na Tabela 8.
143
Tabela 8. Correlações entre os itens de cada subescala e seus respectivos itens gerais
Crises, reação exagerada quando as
coisas não são do seu jeito
Correlação de
Spearman
rho
Interação Social
Geral
Fala e Linguagem
Geral
0,43
p
0,022
Ignora dores
rho
p
0,48
0,010
Incomoda-se com multidões
rho
p
0,38
0,047
Perda de fala adquirida
rho
p
0,64
<0,001
Dificuldade em expressar necessidades
e desejos
rho
0,55
p
Falta de iniciação espontânea da fala
e da comunicação
rho
Jogo Simbólico
Geral
0,002
0,54
p
0,003
Não consegue manter uma conversa
rho
p
0,47
0,013
Fala monótona, pausa incorreta
rho
p
0,42
0,025
Anda na ponta dos pés
rho
p
0,38
0,048
Os dados apontam para uma necessidade de revisão da estrutura interna da escala,
com ajuste de alguns itens dentro das subescalas, inclusive porque o único item que se
salientou dentro da subescala Jogo Simbólico não estaria apropriado para esse conjunto de
sintomas. Visando, então, analisar a relação que cada item mantém com os totais parciais e
o total geral da escala, foi feito um estudo de correlação, cujos dados estão demonstrados
separadamente nas Tabelas 9, 10, 11 e 12, iniciando-se pela subescala de Interação Social.
144
Tabela 9. Correlação de cada item da subescala Interação Social com seu total parcial e
com o total geral da escala
Dificuldades de Interação Social – Item geral
Correlação de
Spearman
rho
p
Contato visual deficiente, olhar fixo de um ângulo incomum
rho
p
Ignora quando chamado
rho
p
Medo excessivo de barulhos
rho
p
Permanece em seu próprio mundo
rho
p
Falta de curiosidade pelo ambiente
rho
p
A expressão facial não condiz com a situação
rho
p
Riso ou choro inapropriados
rho
p
Crises, reação exagerada quando as coisas não são do seu jeito
rho
p
Ignora dores
rho
p
Não gosta de ser tocado ou segurado
rho
p
Incomoda-se com multidões
rho
p
Excessivamente ansioso ou amedrontado
rho
p
Resposta emocional inapropriada
rho
p
Expressão de alegria anormal ao ver os pais
rho
p
Falta de habilidade para imitar
rho
p
Dificuldades de interação Social – Total parcial da subescala
rho
p
Interação Social
parcial
0,57
PDDAS-SQ
Total geral
0,63
0,002
<0,001
0,43
0,04
0,024
0,829
0,61
0,28
0,001
0,150
0,47
0,28
0,011
0,144
0,47
0,47
0,013
0,011
0,23
0,30
0,246
0,123
0,65
0,39
<0,001
0,039
0,64
0,31
<0,001
0,108
0,47
0,49
0,013
0,008
0,66
0,49
<0,001
0,009
0,53
0,41
0,004
0,030
0,36
0,37
0,064
0,050
0,45
0,06
0,016
0,749
0,56
0,45
0,002
0,015
0,33
0,27
0,082
0,171
0,38
0,38
0,044
0,100
0,70
<0,001
Conforme se observa, apenas três itens, de 15, não alcançaram nível de significância
aceitável em relação ao total parcial da subescala. Oito itens não atingiram significância
com o total geral da escala, e dois tiveram índice de significância marginal. A próxima
tabela refere-se à subescala Fala e Linguagem.
145
Tabela 10. Correlação de cada item da subescala Fala e Linguagem com seu total parcial e
com o total geral da escala.
Atrasos na Fala e na Linguagem – item geral
Correlação de
Spearman
rho
p
Perda de fala adquirida
rho
p
Produz sons incomuns ou grunhidos infantis
Voz mais alta do que o necessário
Frequente falta de coerência na fala ou uso de jargão
rho
-0,05
0,14
p
0,822
0,463
0,30
0,13
0,116
0,496
rho
rho
rho
rho
rho
rho
p
Linguagem repetitiva
rho
p
Não consegue manter uma conversa
rho
p
Fala monótona, pausa incorreta
rho
p
Fala da mesma maneira com adultos, crianças e objetos
rho
p
Usa linguagem inapropriada
rho
p
Atrasos na Fala e na Linguagem – Total parcial da subescala
0,06
0,760
0,63
p
Repete palavras ouvidas, partes de palavras ou comerciais de TV
0,49
0,009
<0,001
p
Falta de iniciação espontânea da fala e da comunicação
0,849
0,43
p
Dificuldade em expressar necessidades e desejos
0,001
0,022
p
Puxa os pais quando quer alguma coisa
PDDAS-SQ
Total geral
-0,04
p
rho
p
Dificuldade em compreender coisas básicas
Fala e Linguagem
parcial
0,61
rho
p
0,41
0,30
0,031
0,123
0,15
0,11
0,445
0,586
0,58
0,23
0,001
0,240
0,82
0,30
<0,001
0,127
0,48
0,43
0,009
0,021
0,38
0,37
0,048
0,050
0,75
0,49
<0,001
0,008
0,71
0,56
<0,001
0,002
0,48
0,64
0,009
<0,001
0,69
0,43
<0,001
0,021
0,56
0,002
Nesta subescala, também apenas três itens, de 14, não alcançaram nível de
significância com os totais parciais. Porém, nem o item geral, juntamente com mais sete
itens atingiu significância com o total geral da escala. A tabela seguinte apresenta as
correlações com os itens da subescala Jogo Simbólico.
146
Tabela 11. Correlação de cada item da subescala Jogo Simbólico com seu total parcial e
com o total geral da escala.
Jogo Simbólico ou Imaginário Anormal – item geral
Correlação
de
Spearman
rho
p
Agitação da mão ou dedo; auto-estimulação
rho
p
Bate a cabeça
rho
p
Automutilação, causa dor ou ferimento a si próprio
rho
p
Anda na ponta dos pés
rho
p
Organiza os brinquedos em fileiras
rho
p
Cheira, bate, lambe ou usa os brinquedos de maneira inapropriada
rho
p
Tem interesse em partes dos brinquedos
rho
p
Tem obsessão por alguns objetos ou temas
rho
p
Gira objetos ou o próprio corpo
rho
p
Interesse restrito
rho
p
Dificuldade em parar atividade ou conversa repetitiva e chata
rho
p
Fixação por objetos incomuns
rho
p
Preso a rituais e rotinas
rho
p
Gosto restrito pela consistência ou pelo formato da comida
rho
p
Habilidades Savant
rho
p
Jogo Simbólico ou Imaginário Anormal – Pontuação parcial da
subescala
rho
p
Jogo
Simbólico
parcial
0,54
PDDASSQ
Total geral
0,41
0,003
0,029
0,38
0,29
0,050
0,135
0,24
0,06
0,227
0,759
0,40
0,27
0,036
0,170
0,66
0,69
<0,001
<0,001
0,11
0,10
0,576
0,625
0,67
0,50
<0,001
0,007
0,66
0,75
<0,001
<0,001
0,26
0,06
0,189
0,750
0,47
0,45
0,012
0,016
0,30
0,21
0,117
0,285
0,28
0,28
0,149
0,155
0,15
0,08
0,451
0,705
0,44
0,26
0,020
0,174
0,53
0,50
0,004
0,007
0,17
0,29
0,395
0,139
0,82
<0,001
Esta subescala teve sete itens, de 15, não correlacionados significativamente com os
totais parciais, e dez itens que não se correlacionaram, em nível significativo e com
magnitude aceitável, com o total geral da escala. Isso indica que a subescala precisa sofrer
revisão de seus itens, e que o alto índice de correlação entre seu subtotal e o total geral da
147
escala pode refletir a magnitude mais elevada de alguns itens apenas, dentro da escala. A
tabela seguinte refere-se à subescala de Comportamento, que, por conter apenas o item
geral, já teve essa correlação apresentada anteriormente; mas, para sua análise não se perder
do conjunto das análises dos itens, foi aqui novamente registrada.
Tabela 12. Correlação do item geral da subescala de Comportamento com o total geral da
escala
PDDAS-SQ
Correlação de
Total geral
Spearman
Dificuldades
rho
0,54
Comportamentais
0,003
p
Seguindo com os estudos cabíveis nesta pesquisa, em função de esta escala ser um
instrumento razoavelmente recente e não contar com estudos de validade ou de precisão
publicados no Brasil, usou-se a informação coletada com os profissionais psicólogos6 sobre
o grau de comprometimento autístico estimado por eles para classificar os participantes,
como recurso para a busca de evidência de validade de critério à PDDAS-SQ. A Tabela 13
mostra os resultados obtidos nesta análise, valendo-se dos dois esquemas de pontuação, o
original e o novo.
Tabela 13. Correlação entre os pareceres dos profissionais e as classificações aferidas na
escala, segundo as pontuações original e nova
Classificação
Classificação
Correlação de
PDDAS-SQ original PDDAS-SQ nova
Spearman
Grau de Comprometimento rho
0,33
0,36
Autístico - profissionais
0,089
0,057
p
6
As informações referentes a dois participantes não puderam ser coletadas porque não foi possível contato
com os profissionais responsáveis.
148
Conforme demonstrado, a nova pontuação assumiu correlação marginalmente
significativa com os graus de comprometimento autístico fornecidos pelos profissionais,
considerando-se a classificação que decorre da escala. O mesmo não ocorreu com a
pontuação original, que reforçou a sugestão de reorganização dessa pontuação. O teste de
Kruskal-Wallis, também aplicado nos dois critérios de pontuação total, para verificação de
diferenciação de grupos a partir do grau de comprometimento oferecido pelos profissionais,
não acusou nível de significância aceitável, nem para a pontuação original (χ2=0,04; gl=2;
p=0,979), nem para a pontuação nova (χ2 =3,10; gl=2; p=0,212).
Análises estatísticas do PDDAS-SQ, pontuação original, referentes aos dados
coletados na ficha sociodemográfica, indicaram que a institucionalização (U=77,50; Z=0,92; p=0,357) e o tipo de escola frequentada (χ2=0,40; gl=2; p=0,819) não diferenciaram
significativamente, em suas médias, em relação à pontuação total da escala. A correlação
entre a idade dos participantes e o total da escala PDDAS-SQ (rho=0,02 para p=0,915) não
acusou nível de significância estatística.
Resumindo o olhar sobre esta escala, pode-se dizer que o raciocínio partiu da
classificação geral, com a proposta de uma classificação para as subescalas; a partir daí,
surgiram dados sobre o funcionamento entre essas subescalas que conduziram a uma nova
proposta de pontuação geral. Ao se perceber que essa pontuação não tinha sido suficiente
para justificar as relações entre as subescalas, procedeu-se a um estudo sobre os itens da
escala; ficou registrado que os itens precisam de ajuste. Sendo assim, o estudo de validade
de critério pretendido, a partir dos pareceres dos profissionais psicólogos, não ficou
concluído, mas os dados permitem reflexões que trarão benefícios, tanto para a escala,
quanto para a prática clínica. Essas questões serão mais bem discutidas no capítulo
seguinte. Por fim, foram feitas análises estatísticas entre a escala e os dados coletados na
ficha sociodemográfica.
149
Teste de Atenção por Cancelamento (TAC) – Partes 1, 2 e 3.
Este teste teve por objetivo investigar a performance de indivíduos autistas em
relação à seletividade e à alternância da atenção, considerando, de forma não explícita, a
velocidade do processamento, pois a instrução de tempo não foi salientada a eles, mas
pontuações foram feitas sob o tempo de um minuto. Investigou-se também, de alguma
forma, a sustentação da atenção, porque foi permitido que os participantes fizessem as
tarefas até o final, sem limite de tempo, mas não foi calculada a diferença da produção
inicial e final deles.
Ressalta-se que, na Parte 1 (TAC 1), as pontuações dividem-se de duas formas:
quantidade de marcas corretas feitas em um minuto (velocidade de processamento na
seletividade) e quantidade total de estímulos corretos marcados, sem limite de tempo
(capacidade seletiva dentro do período de sustentação da atenção). Observe-se que nenhum
dos participantes apresentou acréscimo nas respostas. Na Parte 2 (TAC 2), as pontuações
não puderam ser divididas porque alguns participantes apresentaram muitos erros, o que
comprometeu a informação sobre seletividade. Sendo assim, a pontuação em um minuto
refere-se apenas ao número de estímulos selecionados corretamente dentro desse tempo,
sem cálculo sobre acréscimos. Na Parte 3 (TAC 3), as pontuações foram também divididas
considerando-se, em uma delas, o número de fileiras corretas marcadas em um minuto
(velocidade de processamento na alternância); e, na outra, o número total de fileiras
corretas marcadas, sem contagem de tempo (capacidade de alternância dentro do período de
sustentação da atenção). As estatísticas descritivas das pontuações dos participantes, nas
três partes deste teste, encontram-se na Tabela 14.
150
Tabela 14. Estatísticas descritivas referentes ao Teste de Atenção por Cancelamento
N
TAC 1
TAC 1
1 min.
Total
Estímulos F Estímulos
(50)
(50)
28
28
F
TAC 2
1 min.
Estímulos
(7)
28
F
TAC 3
1 min.
Fileiras
(15)
28
F
TAC 3
Total
Fileiras
(15)
28
F
Média
24,11
42,64
1,79
2,96
7,43
Mediana
24,00
49,00
2,00
2,50
6,00
23,00(a)
50,00
0,00
0,00
0,00
10,35
12,23
1,71
3,07
6,89
0,00 10
0,00 12
0,00 10
5,00
9,00
Moda
DP
Mínimo
4,00 1
Máximo
44,00 1
4,00
1
50,00 12
2
1
15,00
9
Existem múltiplas modas. O menor valor é mostrado.
Fica evidente, a partir da observação dos dados na tabela, que a capacidade seletiva
na busca de estímulo simples, independentemente do fator tempo, foi a tarefa na qual os
participantes obtiveram maior pontuação, inclusive com a moda equivalente ao total de
estímulos-alvo. Na Parte 1 como um todo, observa-se ainda que houve possibilidade de
resposta para todos os participantes, mesmo que fosse com baixa produção, o que já não
ocorreu nas Partes 2 e 3 do teste, nas quais muitos não conseguiram cumprir nem mesmo o
mínimo de pontuação.
O total de tempo utilizado por eles para o cumprimento da tarefa referente à Parte 1
do teste foi em média dois minutos e oito segundos, calculado sobre 27 participantes, pois o
tempo total de um deles não foi anotado. O mínimo foi de um minuto, e o máximo, cinco
minutos, suficientes para eles considerarem a tarefa completa. O total de tempo nas outras
duas tarefas não pôde ser calculado.
Na Parte 2, dos 28 participantes 10 não tiveram erro; 14 tiveram erros por rotação
dos estímulos, por agregação diagonal dos estímulos-modelo, ou por busca separada dos
estímulos-modelo; quatro tiveram erros por assinalar pares incorretos; e, outros quatro não
151
conseguiram compreender a tarefa. Os que não conseguiram compreender a tarefa tiveram
zero na pontuação, e participaram, dessa forma, na computação geral dos dados.
A análise da correlação entre essas três partes do TAC permitiu verificar a
magnitude da convergência entre elas. Os valores encontrados estão apresentados na Tabela
15.
Tabela 15. Correlações entre as três partes do Teste de Atenção por Cancelamento
Correlação de
Spearman
TAC 1
1 min.
TAC 1
Total
TAC 2
1 min.
TAC 1 Total
rho
p
0,25
0,208
TAC 2 1 min.
rho
p
0,43
0,022
0,43
0,024
TAC 3 1 min.
rho
p
0,36
0,062
0,65
<0,001
0,70
<0,001
TAC 3 Total
rho
p
0,31
0,113
0,68
<0,001
0,75
<0,001
TAC 3 1
min.
0,88
<0,001
Os valores da Tabela 15 precisam ser considerados a partir da leitura conjunta dos
dados de frequência, por exemplo, a correlação de magnitude forte entre as Partes 2 e 3
sinaliza que as performances dos participantes, nessas duas tarefas, foram convergentes, em
função até da dificuldade de compreensão deles sobre o que era para ser feito. Assim,
provavelmente indivíduos que pontuaram zero em uma delas também o fizeram na outra. A
correlação fraca entre as duas pontuações da Parte 1 indica que a produção em um minuto
pode não representar o potencial de produção dos participantes, ou seja, indivíduos que
pontuaram baixo em um minuto podem ter atingido o mesmo grau de produção final que os
indivíduos que pontuaram alto em um minuto também. No entanto, com a Parte 2 do teste,
ambas as pontuações da Parte 1 assumiram correlação de magnitude moderada, mostrando
que as capacidades de seletividade simples e complexa, desses participantes, apresentam
152
mais convergência, embora nem sempre ter ido bem em uma tarefa signifique ter ido bem
na outra, com ou sem o limite de tempo.
As correlações da Parte 1, pontuação total, com ambas as pontuações da Parte 3,
foram moderadas, mas quando a pontuação da Parte 1 é de um minuto, as correlações com
as duas pontuações da Parte 3 se tornam fracas. Isso significa que a capacidade de
alternância no foco convergiu com a capacidade de selecionar estímulos simples, apenas se
esta não esteve subordinada ao limite de tempo.
Durante a Parte 1 do TAC foi registrado o tipo de varredura visual que os
participantes fizeram, nomeadas como direcionada, quando a marcação era feita na direção
gráfica, ou aleatória, quando as marcações seguiam direções variadas. A frequência com
que isso ocorreu foi de 11 (39,3%) varreduras direcionadas e 17 (60,7%) varreduras
aleatórias. Dos 12 participantes com idade até nove anos, sete fizeram varredura aleatória, e
dos outros 16 participantes com idade acima de nove anos, apenas seis fizeram varredura
direcionada. Com o intuito de verificar se esses tipos de varredura teriam diferenças
significativas na tarefa da Parte 1, em ambas as pontuações, seus dados foram submetidos
ao teste estatístico de Mann-Whitney U e os resultados estão demonstrados na Tabela 16.
Tabela 16. Diferenças de média da varredura visual em relação à Parte 1 do TAC
TAC 1
Varredura visual
TAC 1 - 1 min. direcionada
aleatória
TAC 1 - Total direcionada
aleatória
N
Média
do Rank
11
17
11
17
15,64
13,76
19,45
11,29
Soma dos
Ranks
172,00
234,00
214,00
192,00
U
Z
p
81
-0,59
0,556
39
-2,67
0,008
Observa-se que houve diferença de média significativa dos ranks referentes às
varreduras visuais apenas em relação à Parte 1, pontuação total. Isso indica que o tipo de
153
varredura diferenciou grupos, considerando-se a capacidade seletiva total, e não a
velocidade de processamento, e que a média maior encontra-se na varredura direcionada.
Buscando ainda correlacionar o TAC com a pontuação total da escala PDDAS-SQ,
foram obtidos coeficientes estatisticamente significativos para a pontuação total da Parte 1
(rho=-0,46 para p=0,014), pontuação total da Parte 3 (rho=-0,41 para p=0,029) e pontuação
de um minuto da Parte 3 (rho=-0,46 para p=0,014). As outras correlações não alcançaram
significância estatística. A correlação é negativa em função de que as pontuações mais altas
na escala registram comprometimentos autísticos cada vez mais acentuados, contrariamente
ao TAC, que tem sua maior pontuação pautada nos acertos ou no bom desempenho.
Portanto, observou-se, nessas correlações, que a capacidade atencional dos participantes,
tanto em seletividade de estímulo, sem envolver velocidade de processamento, quanto em
alternância do foco, considerando o tempo ou a produção total, tenderam a ser divergentes
com o aumento do grau de comprometimento autístico deles.
Visando maior exploração desse dado, foi aplicado o teste de Kruskal-Wallis, para
verificação da diferença de média dos ranks relativos ao comprometimento autístico,
acusado na classificação do PDDAS-SQ, considerando-se as três Partes do TAC. A Tabela
17 contém essa informação.
154
Tabela 17. Comparação de médias dos ranks na classificação do PDDAS-SQ em relação às
Partes 1, 2 e 3 do teste de Atenção por Cancelamento.
TAC 1 - 1
min.
TAC 1 - Total
TAC 2 - 1
min.
TAC 3 - 1
min.
TAC 3 - Total
Classificação
Geral do TGD
Leve
Média do
Rank
N
9
14,28
Moderado
Severo
Leve
Moderado
Severo
Leve
16
3
9
16
3
15,16
11,67
18,33
14,03
5,50
9
17,78
Moderado
Severo
Leve
16
3
12,75
14,00
9
18,89
Moderado
Severo
Leve
Moderado
Severo
16
3
9
16
3
12,94
9,67
19,39
12,16
12,33
χ2
gl
p
0,47
2
0,792
6,08
2
0,048
2,30
2
0,316
4,56
2
0,102
5,09
2
0,079
Os dados apontam significância na diferença entre as médias dos ranks dos graus
leve, moderado e severo, previstos na escala PDDAS-SQ, apenas na Parte 1, pontuação
total, do TAC. O fator tempo não diferenciou grupos em nenhuma tarefa, e a alternância
sem a contagem de tempo também não os diferenciou. Aliás, na Parte 3, pontuação total, as
médias entre os níveis moderado e severo foram muito próximas, e, na Parte 2, a média do
nível severo foi maior que a do moderado.
Resumindo o olhar dirigido ao Teste de Atenção por Cancelamento, foi feita
inicialmente uma análise sobre as pontuações dos participantes nas três tarefas,
considerando tempo e produção total e, observando as diferenças registradas; depois foi
proposta uma correlação entre as partes para verificação das magnitudes de convergência
entre elas; em seguida foi analisado se o tipo de varredura utilizada pelos participantes
diferenciou grupos em relação à Parte 1 do teste; constatado isso, verificou-se a correlação
entre as partes deste teste e a escala PDDAS-SQ; e, por fim, visando explorar mais os dados
155
revelados pela prova de correlação, foi feita uma análise de comparação das médias dos
ranks dos comprometimentos previstos naquele instrumento, em relação às três partes do
Teste de Atenção.
Teste Motor e Teste de Percepção suplementares ao Bender II – Screenings
O uso destes testes teve o intuito de verificar a possibilidade de registro gráfico dos
participantes e a qualidade desse traçado. Objetivou-se, também, checar se eles saberiam
comparar figuras, identificando igualdade entre elas, considerando detalhes estruturais e
espaciais. Seus dados tiveram valor principal, comparados aos do Teste de Bender, mas
foram também correlacionados aos outros instrumentos. As frequências de pontuações
referentes a esses Screenings encontram-se na Tabela 18.
Tabela 18. Estatísticas descritivas referentes aos Testes Motor e de Percepção (Screenings)
Pontuação bruta do F Pontuação bruta do F
Teste Motor
Teste de Percepção
N
28
28
Média
9,96
6,43
Mediana
12,00
9,00
Moda
12,00
10,00
DP
3,16
4,20
Mínimo
0,00 1
0,00 6
Máximo
12,00 15
10,00 12
Dos dados descritivos, destaca-se a performance motora ocorrendo em melhor
condição que a perceptiva, muito embora nos dois testes tenha havido a ocorrência de
opostos na pontuação, com a moda na pontuação máxima. A correlação entre esses dois
testes foi de rho=0,37 com p=0,051, considerada marginalmente significativa, indicando
que não obrigatoriamente os mesmos indivíduos tenham se saído bem ou mal nas duas
tarefas.
156
A correlação do Teste Motor com a escala PDDAS-SQ foi de rho=-0,51 para
p=0,006, sugerindo que a competência grafomotora dos participantes está negativamente
correlacionada ao comprometimento autístico. Com o Teste de Percepção o índice foi de
rho=-0,36 para p=0,061, demonstrando que o reconhecimento de igualdade entre figuras e
o comprometimento autístico tiveram correlação fraca, porém próxima de um nível
marginal. Estudos correlacionais destes Screenings com as Partes 1, 2 e 3 do Teste de
Atenção por Cancelamento encontram-se registrados na Tabela 19.
Tabela 19. Correlações entre os Screenings e as Partes 1, 2 e 3 do TAC
Pontuação bruta
Pontuação bruta do
Correlação de
do Teste Motor
Teste de Percepção
Spearman
TAC 1 - 1 min.
TAC 1 - Total
TAC 2 - 1 min.
TAC 3 - 1 min.
TAC 3 - Total
rho
p
rho
p
rho
p
rho
p
rho
p
0,20
0,299
0,46
0,014
0,58
0,001
0,66
<0,001
0,61
0,001
0,26
0,191
0,47
0,012
0,51
0,006
0,51
0,006
0,61
0,001
De acordo com os dados, ambos os testes apresentaram correlação significativa com
o Teste de Atenção por Cancelamento, Partes 2 e 3, além da Parte 1, com pontuação total.
Pode-se dizer, portanto, que os aspectos motor e perceptivo, avaliados por meio desses
Screenings, apresentaram convergência com o desempenho dos participantes em atenção
seletiva simples e complexa, e em atenção alternada, com maior magnitude referente à
Parte 3, na qual era requerida a capacidade de alternância do foco. A correlação fraca
desses instrumentos com a Parte 1 do TAC, pontuada em um minuto, salienta que a atenção
seletiva simples, submetida ao fator tempo, não convergiu também com este teste. Com o
intuito de investigar se a varredura utilizada na Parte 1 do TAC diferenciaria grupos em
157
relação aos Testes de Percepção e Motor, foi utilizado o teste de Mann-Whitney U, cujos
resultados encontram-se disponíveis na Tabela 20.
Tabela 20. Diferenças de média da varredura visual em relação aos Testes de Percepção e
Motor
TAC 1
Média do Soma dos
Varredura
N
Rank
Ranks
U
Z
p
Teste de Percepção direcionada 11
18,36
202,00
51,00 -2,10 0,036
aleatória
17
12,00
204,00
Teste Motor
direcionada 11
19,09
210,00
aleatória
11,53
196,00
17
43,00 -2,59 0,010
A diferença de médias foi significativa, e a média mais alta foi a da varredura
direcionada, para ambos os testes. O olhar sobre esses testes foi então o de verificar suas
frequências entre os participantes e, em seguida, a correlação dos dois screenings entre si.
Depois, foi vista a correlação entre eles e a escala PDDAS-SQ, e entre eles o Teste de
Atenção por Cancelamento. Por fim, julgou-se interessante analisar se a varredura visual
registrada na Parte 1 do TAC diferenciaria grupos nos Testes Motor e de Percepção.
Teste Gestáltico Visomotor de Bender – Sistema de Pontuação Gradual (B-SPG)
Utilizado para investigar a capacidade percepto-motora dos participantes e sua
relação com os demais instrumentos aplicados, o Teste de Bender teve aqui sua correção
feita pelo Sistema de Pontuação Gradual, que investiga o aspecto de distorção da forma nas
figuras. As pontuações variaram desde o mínimo de dois ao máximo de 21 pontos, nesta
amostra, lembrando-se que este teste pontua erros, e não acertos. A média foi de 14,46, e o
desvio padrão, de 6,30. A distribuição de frequência pode ser mais bem visualizada na
Figura 2.
158
6
Frequência
5
4
3
2
1
0
2
4
5
6
7
9
10
13
15
17
18
19
20
21
Total BSPG
Figura 2. Distribuição de frequências do B-SPG para esta amostra
Por meio desses dados, pôde-se constatar que a maioria dos participantes teve
pontuação de erros acima de 15, sendo que, de acordo com as normas brasileiras, a média
de erros esperada para a idade mínima avaliada, ou seja, seis anos, era de 14,36. Procedeuse, então, a uma análise, comparando-se os resultados dos participantes com as médias
esperadas nas respectivas idades, de acordo com as normas brasileiras. Esses resultados,
apoiados no tratamento estatístico feito pelo teste t One-Sample, não demonstraram
diferença de média significativa para as idades de seis-sete anos agrupadas (t=1,96; gl=5;
p=0,108), oito anos (t=1,97; gl=1; p=0,299) e nove anos (t=1,28; gl=3; p=0,292), mas para
a idade de 10 anos e as idades acima de 10 anos houve diferença significativa, conforme
mostram as Tabelas 21 e 22. Vale esclarecer que o agrupamento para as idades de seis-sete
anos comportou uma criança de cinco anos que foge da idade normativa de piso e uma
criança de sete anos que seria prejudicada, se fosse agrupada à idade de oito anos.
159
Tabela 21. Estatísticas descritivas dos participantes com idade de 10 anos e acima de 10
anos
Total B-SPG
10 anos
Total B-SPG
Acima de 10 anos
N
Média
Desvio-padrão
3
13,33
2,89
13
13,38
7,08
Tabela 22. Diferença de média entre os participantes de 10 anos e acima de 10 anos, em
relação à norma prevista para esta idade
t
Total B-SPG
10 anos
Total B-SPG
Acima de 10 anos
Média esperada = 5.79
Diferença de
média
gl
p
4,53
2
0,046
7,54
3,87
12
0,002
7,59
Para os participantes de 10 anos a média de 13,33 foi considerada
significativamente mais alta que a média de 5,79, esperada para essa faixa etária. Para os
participantes com idades entre 11 e 26 anos, a média de 13,38 também foi considerada
significativamente maior que a média de 5,79, prevista para a idade de 10 anos, que é a
faixa etária teto, na amostra brasileira. Considerando que a maturação perceptomotora
aumenta com o avanço da idade, os dados aqui colhidos refletem que isso não ocorreu com
os participantes desta pesquisa. Mesmo não havendo diferença significativa entre as médias
das idades anteriores com as médias normativas esperadas para as referidas idades, as
médias de erro dos participantes foram sempre maiores, ou seja, para seis-sete anos a média
foi de 18, e era esperada 14,36, pois considerou-se a menor idade; para oito anos a média
foi de 17, e era esperada 9,11; para nove anos, a média foi de 12,25, e era esperada 7,11.
Pensou-se, então, em analisar como ocorreram as pontuações dos participantes em cada
figura, e para isso foram organizados seus dados de frequência com as respectivas
porcentagens, disponibilizados na Tabela 23.
160
Tabela 23. Frequências e porcentagens de acerto por figura do B-SPG
Frequências e Porcentagens
SPG
A
1
2
3
4
5
6
7A
7B
8
F
%
F
%
F
%
F
%
F
%
F
%
F
%
F
%
F
%
F
%
0
11
39,3
12
42,9
3
10,7
5
17,9
4
14,3
6
21,4
1
3,6
4
14,3
6
21,4
3
10,7
1
8
28,6
3
10,7
9
32,1
5
17,9
9
32,1
7
25,0
6
21,4
5
17,9
4
14,3
4
14,3
2
9
32,1
13
46,4
16
57,1
18
64,3
15
53,6
15
53,6
6
21,4
19
67,9
18
64,3
21
75,0
15
53,6
3
Os dados da Tabela 23 permitem visualizar que, em nove das dez figuras,
praticamente a metade dos participantes pontuou o valor máximo de distorção da forma
atribuído a cada uma delas. A figura A e a figura 1 foram aquelas em que os participantes
mais apresentaram pontuação nula. A figura 8 teve a maior frequência de erros, e a figura 6
a menor frequência de acertos, com apenas um participante pontuando zero.
Com a finalidade de investigar, ainda, se a performance dos participantes
acompanhou indicadores de figuras fáceis, médias e difíceis, existentes nas normas
brasileiras, foi aplicado o teste estatístico Kruskal-Wallis sobre os dados. Os valores
encontrados estão demonstrados na Tabela 24.
161
Tabela 24. Comparação, por faixa etária, do desempenho nas figuras do B-SPG
classificadas por nível de dificuldade
p
Agrupamento por idade N Média do Rank Qui-Quadrado gl
B-SPG Difíceis 5 – 6 – 7anos
6
20,33
8 anos
2
20,00
9 anos
4
10,88
7,08
4 0,132
10 anos
3
8,17
11 a 26 anos
13
13,54
B-SPG Médias 5 – 6 – 7 anos
6
19,83
8 anos
2
15,25
9 anos
4
10,63
4,18
4 0,383
10 anos
3
11,33
11 a 26 anos
13
13,85
B-SPG Fáceis
5 – 6 – 7 anos
6
16,92
8 anos
2
21,50
9 anos
4
16,00
3,33
4 0,504
10 anos
3
12,50
11 a 26 anos
13
12,31
Esses dados mostram que não houve diferença significativa entre as médias dos
ranks calculadas por idade dos participantes, no que diz respeito às dificuldades das figuras
do Bender. O que se pode observar, porém, é uma média de erros mais alta, nas figuras
médias e nas difíceis, para os participantes com mais de 10 anos, equiparando-as às das
idades de 10 ou de nove anos. Nas figuras fáceis, os participantes de oito anos apresentaram
média maior de erros que os de cinco a sete anos. Portanto, para esta amostra, apenas as
idades de cinco a sete anos acompanharam o desenvolvimento perceptomotor em relação à
gradação de dificuldade das figuras estabelecidas pelo manual.
Unindo todas essas informações acerca da performance dos participantes neste teste
perceptomotor, julgou-se interessante traçar um perfil do desempenho deles, considerandose a porcentagem de acerto que eles tiveram e equiparando os dados por eles alcançados às
porcentagens previstas nas normas brasileiras. A Tabela 25 apresenta esse perfil.
162
Tabela 25. Pontuações médias no B-SPG, por figura e por idade, comparativas às médias da
população normativa
6
7
8
9
10
Fig. A
34
39
52
67
77
85
Fig. 1
43
51
54
61
70
76
29
36
Fig. 2
2
7
Fig. 3
1
7
Fig. 4
4
12
Fig. 5
18
Fig. 7A
11
7
14
18
15
20
28
18
30
29
30
40
45
4
13
13
27
37
9 14
28
40
53
73
Fig. 6
21
10
Fig. 7B
13
21
31
46
63
73
Fig. 8
11
14
39
53
68
80
Os dados da Tabela 25 indicam que os desempenhos destes participantes estão
concentrados no equivalente à idade de 6 anos, com as figuras 2 e 4 equiparadas à idade de
8 anos, e a figura 3, à idade de 9 anos. Essas porcentagens referem-se aos acertos que eles
tiveram.
Iniciando as análises de correlação do B-SPG com os demais instrumentos já
apresentados encontra-se o valor de rho=0,30 para p=0,125 como índice referente à
correlação deste instrumento com a escala PDDAS-SQ. Esse dado permite considerar que a
performance dos participantes neste teste perceptomotor não correspondeu, de forma
significativa, aos graus de comprometimento autístico deles. Considerando-se, porém, a
nova proposta de pontuação da escala, esse valor assume correlação marginalmente
significativa com rho=0,37 para p=0,050.
Para maior aprofundamento da análise entre o Bender e o PDDAS-SQ, usou-se o
teste de Kruskal-Wallis para verificar se as classificações propostas na escala
163
diferenciariam grupos em relação ao B-SPG. O resultado também não foi significativo, nem
para a pontuação original (χ2 =4,59; gl=2; p=0,101), nem para a nova pontuação (χ2 =5,34
gl=2; p=0,069), mas a média maior foi do grupo de comprometimento severo, em ambos os
critérios de pontuação.
Em relação ao Teste de Atenção por Cancelamento, no entanto, os valores
correlacionais foram significativos entre a maioria das suas subpartes e o B-SPG. Na
Tabela 26 estão expostos os resultados desta análise. Os resultados foram negativos porque
o TAC pontua acertos e o B-SPG pontua erros.
Tabela 26. Correlação entre o B-SPG e as Partes 1, 2 e 3 do TAC
Total B-SPG
Correlação de TAC 1 TAC 1 TAC 2 TAC 3 TAC 3
1 min. Total 1 min. 1 min. Total
Spearman
0,01 -0,42 -0,53
-0,73
-0,67
rho
0,967 0,024 0,003 <0,001 <0,001
p
Os dados da Tabela 26 permitem relacionar a maturidade perceptomotora à atenção
seletiva e à alternada, considerando os participantes autistas. Os maiores índices de
correlação ocorreram com a Parte 3 do TAC, inclusive com a pontuação em um minuto
considerada de magnitude forte. A correlação do B-SPG com a Parte 1 do TAC, um
minuto, não foi significativa, e esse mesmo panorama já foi encontrado nos Screenings.
As correlações do B-SPG com o Screening Motor (rho=-0,67 para p<0,001) e o
Screening de Percepção (rho=-0,45 para p=0,016) foram significativas, consistindo em
indicativos de uma evidência de validade para estes testes suplementares a ele, evidência
essa que deve ser mais bem explorada em estudos futuros com amostras maiores. No
entanto, a diferença na magnitude das correlações entre o B-SPG e os dois screenings
conduziu a uma investigação sobre a possibilidade de os quartis identificados nesses
164
screenings estarem ou não diferenciando os escores do B-SPG. Os dados desta análise estão
registrados nas Tabelas 27 e 28.
Tabela 27. Diferença de média dos quartis do Teste Motor em relação ao B-SPG
Teste Motor
Média do
Quigl
p
Quartil
N
Quadrado
Rank
B-SPG Total 0-25
7
23,07
26-50
3
16,17
51-75
3
16,17
12,82
3 0,005
76-100
15
9,83
Tabela 28. Diferença de média dos quartis do Teste de Percepção em relação ao B-SPG
Teste de Percepção
Média do
Quigl
p
Quartil
N
Quadrado
Rank
B-SPG Total 0-25
15
17,37
51-75
1
17,50
4,61
2 0,100
76-100
12
10,67
De acordo com esses resultados, pôde-se constatar que o Teste Motor diferenciou
grupos no B-SPG com a média maior ocorrendo no primeiro quartil. Porém, o Teste de
Percepção, mesmo mantendo correlação significativa com o B-SPG, não diferenciou grupos
nas médias de seus ranks, mantendo as médias maiores no primeiro e no terceiro quartis,
com ausência de valores no segundo quartil. Além disso, houve polarização nos postos dos
quartis, dividindo o grupo praticamente nos dois extremos.
Seguindo os estudos com o B-SPG, foi feita uma análise visando verificar se as
varreduras visuais utilizadas pelos participantes na Parte 1 do TAC diferenciariam grupos
neste teste perceptomotor. Os dados desta análise encontram-se na Tabela 29.
Tabela 29. Diferença de média das varreduras visuais em relação ao B-SPG
TAC
Média do Soma dos
U
Z
p
Varredura
N
Rank
Ranks
B-SPG Total direcionada 11
8,05
88,50
aleatória
17
18,68
317,50 22,50 -3,36 0,001
165
Conforme se pôde constatar, a diferença entre as médias dos ranks das varreduras
foi significativa, e a média maior foi a da varredura aleatória. Isso deve ser interpretado
lembrando-se que a pontuação do B-SPG ocorre sobre os erros, significando, então, que as
maiores pontuações de erro no B-SPG ocorreram em participantes que se valeram de
varredura aleatória no TAC 1, e as melhores execuções no Bender foram feitas por aqueles
que utilizaram a varredura direcionada.
As últimas análises com este instrumento foram feitas visando verificar se as
habilidades em percepção e em desenho e pintura, salientadas na ficha sociodemográfica
coletada com os pais dos participantes, diferenciariam grupos no B-SPG. Os resultados do
Teste de Mann-Whitney U, tanto em relação à habilidade em percepção (U=57,50; Z<0,01;
p=1,000), quanto à habilidade em desenho e pintura (U=47,50; Z=-1,04; p=0,298), não
foram estatisticamente significativos.
As análises do B-SPG percorreram, assim, uma trajetória que teve início na
distribuição de frequências das pontuações dos participantes, seguida pela comparação das
médias dessas pontuações com as médias por idade e com os níveis de dificuldade das
figuras previstos nas normas brasileiras. Depois, iniciaram-se as correlações com os
instrumentos anteriormente vistos, quais sejam, a escala PDDAS-SQ, os Screenings e o
Teste de Atenção por Cancelamento. Diferenças de média entre os quartis dos Screenings e
o B-SPG entremearam essas análises. Finalizando, foi feita a verificação da possibilidade
de a varredura visual do TAC 1 e alguns dados afins da ficha sociodemográfica
diferenciarem grupos nesta tarefa perceptomotora.
Teste de Inteligência Não-Verbal (terceira edição) Forma A – TONI 3
O TONI-3, utilizado nesta pesquisa para investigação da capacidade intelectual
geral de indivíduos autistas, teve sua pontuação total distribuída em frequências que
166
variaram desde o mínimo de dois pontos ao máximo de 39 pontos, com a Média de 13,75 e
desvio-padrão 9,05. As maiores frequências foram de 11 e 12 pontos, conforme pode ser
visto na Figura 3.
5
Frequência
4
3
2
1
0
2
4
5
6
8
9
10 11 12 14 15 20 22 25 32 33 39
Total TONI 3
Figura 3. Distribuição das frequências da pontuação total no TONI-3
Apesar de a pontuação bruta ter-se concentrado na primeira terça parte do teste
como um todo, isso precisa ser analisado em relação à ponderação desses dados
relacionados às idades dos participantes. No entanto, por não existir ainda, no Brasil,
normas que contemplem idades maiores do que 10 anos, recorreu-se à tabela americana7 de
conversão dos pontos em QI, de acordo com a idade, para melhor compreensão desses
dados. O resultado dessa frequência encontra-se disponibilizado na Figura 4.
7
Os percentis das normas brasileiras, referentes às idades de 6 a 10 anos, foram equivalentes aos percentis
americanos, em sua maioria. Em função disso, julgou-se que o valor dos QIs, mesmo sendo americanos,
estariam apropriados.
167
3,5
3
Frequência
2,5
2
1,5
1
0,5
0
62 64 66 70 72 75 76 77 78 80 81 83 84 90 94 103 107 110 111 115 117 129
TONI 3 - QI EUA
Figura 4. Frequência da pontuação dos dados do TONI-3 convertidos em QI de acordo com
a norma americana
Esta distribuição varia de um valor mínimo de 62 até um valor máximo de 129, com
Média de 89,89 e desvio-padrão de 19,14. Se esses valores forem classificados de forma
qualitativa, ou seja, agrupados e nomeados conforme sua relação superior ou inferior a uma
média normativa, o que obterá como resultado é o que pode ser visualizado na Figura 5.
1 – Muito pobre (↓70)
2 – Pobre (70-79)
3 – Abaixo da média (80-89)
4 – Média (90-110)
5 – Acima da média (111-120)
6 – Superior (121-130)
7 – Muito superior (↑130)
8
7
Frequência
6
5
4
3
2
1
0
1
2
3
4
5
6
7
TONI 3 - Classificação EUA
Figura 5. Classificação dos QIs obtidos no TONI-3 segundo normas americanas
168
Conforme pode ser visto, 17 participantes ocuparam as classificações medianas, que
vão de um nível abaixo da média (de 80 a 89) até um nível acima da média (de 111 a 120).
Sete participantes encontram-se num nível considerado pobre (de 70 a 79), outros três,
abaixo deste limite (inferior a 70), e um participante encontra-se na classificação superior
(de 121 a 130). Correlacionando a idade dos participantes com esses valores de QI, obtevese rho=-0,53 para p=0,004, o que sugere que os QIs mais altos estão mais concentrados nas
idades mais baixas desta amostra. A correlação entre a idade dos participantes e a
pontuação total no TONI-3 obviamente não foi significativa (rho=0,03 para p=0,883).
Correlações feitas entre o valor de QI obtido no TONI-3 e os dados colhidos na
ficha sociodemográfica, como a classificação econômica da família (rho=-0,08 para
p=0,690) e o grau de instrução do chefe da família (rho=-0,07 para p=0,732), não foram
estatisticamente significativas. Comparações de médias, para verificar se o tipo de escola
frequentada (χ2 =5,03; gl=2; p=0,081), a comunicação usada pelo indivíduo autista (χ2
=3,01; gl=2; p=0,223) ou a condição de ser institucionalizado ou não (U= 61,50; Z=-1,66;
p=0,097) diferenciariam grupos em relação ao TONI-3, também não alcançaram nível de
significância. Dentre as habilidades pesquisadas na entrevista com os pais dos participantes,
apenas a habilidade em lógica diferenciou grupos em relação ao TONI-3, tanto em relação
à pontuação total, quanto em relação ao QI. Os dados dessa análise estão registrados na
Tabela 30.
Tabela 30. Diferença de média da habilidade em lógica, em relação ao TONI-3
Habilidade
Média do Soma dos
em lógica N
Rank
Ranks
U
Z
p
Total TONI-3 sim
5
23,10
115,50
não
23
12,63
290,50 14,50 -2,59 0,010
QI TONI-3 sim
não
5
23
22,70
12,72
113,50
292,50 16,50 -2,46 0,014
169
Apesar de apenas cinco participantes terem pontuado nesta habilidade, a média dos
ranks por eles atingidos em relação ao TONI-3 foi maior do que a média dos que não
pontuaram. Isso demonstra o quanto esta capacidade é exigida neste teste de inteligência.
Considerando, agora, a estrutura do TONI-3, que é um instrumento organizado a
partir de formatos diferentes nas proposituras de suas pranchas, julgou-se necessário
analisar o índice de correlação entre esses formatos e as pontuações atingidas no teste, para
verificar as magnitudes assumidas nas diferentes relações. Os dados da Tabela 31 registram
os índices desta análise.
Tabela 31. Correlação entre o desempenho total no TONI-3 e suas pranchas com diferentes
formatos
Total TONI-3
Correlação de
Spearman
rho
p
Matriz de
2X2
0,93
<0,001
Matriz de
2X3
0,64
<0,001
Matriz de
Grupo de 5 Grupo de 5
3X3
faltando 1
faltando 4
0,71
0,66
0,51
<0,001
<0,001
0,006
Como se pode observar, o formato em Matriz de 2x2 teve correlação muito forte e
significativa com a pontuação no teste, seguido da Matriz de 3x3. Os outros formatos
também mostraram convergência com o desempenho total, sendo todas moderadas e
significativas, cujo menor índice de correlação foi o Grupo de 5 faltando 4, no qual era
requerido que um grupo de estímulos fosse selecionado como correto e não um estímulo
apenas. Aqui foram consideradas as respostas totais dos participantes, uma vez que lhes foi
pedido para executarem o teste até o final.
Com particular interesse na investigação da relação entre os QIs obtidos no TONI-3
e os resultados alcançados na escala PDDAS-SQ, para cruzamento de dados que refletiriam
a correlação entre funcionamento intelectual e o comprometimento autístico destes
participantes, aplicou-se o teste de correlação de Spearman sobre os dados. Os resultados
foram de rho=-0,18 para p=0,349, indicando ausência de correlação significativa entre as
170
duas variáveis. Isso indica que não apenas os indivíduos menos comprometidos nas
características autísticas se saíram bem no teste de inteligência, pois autistas com grau de
comprometimento mais acentuado também puderam ter bom rendimento. Na análise de
diferença de médias, a classificação do PDDAS-SQ diferenciou grupos no TONI-3, e a
média maior encontra-se no grau moderado, conforme os dados da Tabela 32.
Tabela 32. Diferença de média das classificações do PDDAS-SQ em relação ao TONI-3
Média do
Quigl
p
PDDAS-SQ - Classificação N
Quadrado
Rank
TONI-3 QI leve
9
13,72
moderado
16
16,84
5,96
2 0,050
severo
3
4,33
Duas análises procedem para verificar se o grau de comprometimento autístico e o
grau de funcionalidade cognitiva, estimada pelos profissionais que trabalham com os
participantes, diferem grupos de forma significativa no TONI-3. Vale reafirmar que apenas
26 profissionais puderam ser contatados para oferecer esta informação. As Tabelas 33 e 34
contêm os dados referentes a essas análises, pois os testes estatísticos utilizados em cada
uma delas foram específicos, em função da diferença no número de variáveis investigadas.
Tabela 33. Comparação de médias, por grau de comprometimento, do desempenho no
TONI-3
Grau de comprometimento
autístico
N
QI TONI-3 leve
11
moderado
14
severo
1
Média do
QuiQuadrado
Rank
16,91
4,97
11,57
3,00
gl
p
2
0,083
Tabela 34. Diferença de média entre os participantes de alto e baixo funcionamento no
TONI-3
QI TONI-3
Nível de funcionamento
cognitivo
alto funcionamento
baixo funcionamento
N
18
8
Média do Rank
16,67
6,38
Soma dos Ranks
U
300,00
51,00 15,00
Z
p
-3,17 0,002
171
Os dados da Tabela 33 mostram que o grau de comprometimento autístico, estimado
pelos profissionais, não diferenciou grupos significativamente no TONI-3, e a média maior
encontra-se no grau leve. Na Tabela 34, o que se observa é uma diferença de média
significativa entre os graus de funcionalidade cognitiva, também estimados pelos
profissionais psicólogos, com a média maior ocorrendo no grupo considerado de alto
funcionamento. Seguindo com a análise entre os instrumentos, a verificação de correlação
entre os QIs do TONI-3 e o Teste de Atenção por Cancelamento resultou em dados que
estão expostos na Tabela 35.
Tabela 35. Correlações entre os QIs obtidos com o TONI-3 e as Partes 1, 2 e 3 do TAC
Correlação de TAC 1 TAC 1 TAC 2 TAC 3 TAC 3
Spearman
QI TONI-3 rho
p
1 min.
Total
1 min.
1 min.
Total
0,17
0,386
0,33
0,084
0,33
0,090
0,36
0,061
0,40
0,037
As correlações não foram significativas, exceto para a Parte 3, pontuação total. Isso
indica que a capacidade atentiva de alternância do foco, sem limite de tempo, avaliada no
TAC, mostrou-se convergente com a capacidade intelectual geral, medida por meio do
TONI-3, para os participantes desta pesquisa. No entanto, analisando as relações entre as
subpartes do TAC e a pontuação geral do TONI-3, obtém-se o que está demonstrado na
Tabela 36.
Tabela 36. Correlações entre a pontuação geral do TONI-3 e as Partes 1, 2 e 3 do TAC
Correlação de TAC 1 TAC 1 TAC 2 TAC 3 TAC 3
Spearman
Total TONI-3 rho
p
1 min.
Total
0,33
0,69
0,088 <0,001
1 min.
1 min.
Total
0,58
0,69
0,73
0,001 <0,001 <0,001
172
Os dados mostram que as correlações entre a capacidade atentiva e os raciocínios
exigidos nas pranchas do TONI-3 foram significativas, exceto para a Parte 1, um minuto. A
magnitude da correlação com a Parte 3 foi forte, inclusive. Ainda em relação ao Teste de
Atenção por Cancelamento, buscou-se verificar se a varredura utilizada pelos participantes
na Parte 1 do TAC também apresentaria diferença no desempenho deles no TONI-3,
considerando que este teste de inteligência exige resposta baseada em escolha de
alternativas não numeradas. Os dados desta avaliação estão disponíveis na Tabela 37.
Tabela 37. Diferença de média entre os tipos de varredura e o desempenho no TONI-3
TAC 1 Varredura N
Média do Soma dos
Rank
Ranks
U
Z
P
Total TONI-3 direcionada
aleatória
11
17
20,86
10,38
229,50 23,50 -3,30 0,001
176,50
QI TONI-3 direcionada
aleatória
11
17
18,77
11,74
206,50 46.50 -2,21 0,027
199,50
Observa-se que o tipo de varredura diferenciou grupos, de forma significativa, no
TONI-3, considerando-se, tanto a pontuação total quanto os valores de QI. As médias
maiores encontram-se na atenção direcionada, permitindo associar a sistematização na
busca do estímulo ao bom desempenho na resolução de problemas não-verbais e,
consequentemente, ao bom rendimento neste teste de inteligência.
Quanto à capacidade perceptomotora, o índice de correlação dos QIs do TONI-3
com o Screening Motor foi de rho=0,23 para p=0,250, e com o Screening de Percepção, o
resultado foi de rho=0,10 para p=0,627, indicando que a capacidade motora e perceptiva
não se correlacionaram de forma significativa com o rendimento intelectual desta amostra.
Porém, o índice de correlação da pontuação total do TONI-3 com o Screening Motor foi
significativo (rho=0,68 para p<0,001), não ocorrendo o mesmo com o Screening de
Percepção (rho=0,35 para p=0,067).
173
Fechando as análises do TONI-3, e relacionando seus QIs ao B-SPG, verificou-se
que o índice de correlação alcançado foi de rho=-0,23 para p=0,250, indicando que a
capacidade perceptomotora desta amostra não apresentou correlação significativa com a
capacidade intelectual geral medida no TONI-3. No entanto, a correlação da pontuação
total do TONI-3 com o B-SPG foi de rho=-0,56 para p=0,002, considerada negativamente
significativa, demonstrando que a capacidade perceptomotora apresenta relação com tarefas
de resolução de problemas e raciocínio lógico.
Os resultados referentes ao TONI-3 iniciaram sua trajetória com a apresentação das
frequências das pontuações brutas dos participantes convertidas, em seguida, em QI, de
acordo com as normas americanas, que por sua vez foram classificados, para interpretação
de desvios em relação à média. As idades dos participantes foram correlacionadas com os
valores de QI, e a pontuação bruta do TONI-3 teve análises de correlação e de diferença de
média com alguns dados da ficha sociodemográfica. Os diferentes formatos existentes nos
itens do TONI-3 também foram correlacionados com as pontuações totais do teste.
Iniciaram-se, então, as correlações com os outros instrumentos. Primeiramente, com a
escala PDDAS-SQ; em seguida, com o Teste de Atenção por Cancelamento, incluindo a
varredura visual registrada na Parte 1 deste teste; depois, com os Screenings e, finalmente,
com o B-SPG. Encerra-se, assim, este capítulo, e o capítulo seguinte segue com as
discussões referentes a todos os resultados obtidos nesta pesquisa.
174
175
176
177
DISCUSSÕES
Neste capítulo, os resultados apresentados anteriormente serão comentados
seguindo a mesma ordem em que os instrumentos foram tratados. Antes, porém, merecem
ser discutidos alguns dados sobre os participantes, como os diagnósticos e a proporção
entre os sexos, que foram detalhados no método. Como pôde ser visto, a variedade de
termos utilizados para a descrição dos participantes (ora especificados, ora gerais, ora
ambíguos) demonstra a dificuldade diagnóstica encontrada pelos clínicos para a
classificação dos sintomas observados em seus clientes. Isso é coerente com os comentários
de Rapin e Tuchman (2009) sobre as dificuldades práticas no diagnóstico do autismo,
decorrentes do fato de os sistemas classificatórios DSM e CID não darem conta da
diferenciação qualitativa dos prejuízos existentes nos quadros referentes ao espectro. Esses
autores ressaltam a variabilidade dos casos e, consequentemente, a dificuldade diagnóstica
para aqueles indivíduos que não têm as características típicas do autismo bem definidas.
Em relação à proporção entre os sexos, os dados mais atuais, descritos por
Trevathan e Shinnar (2009), apesar de não serem referentes a estudos brasileiros, propõem
a relação de 3 ou 4 meninos para 1 menina, com diminuição da proporção conforme
decresce o QI. Neste estudo foram avaliados 25 indivíduos do sexo masculino e três do
sexo feminino, numa proporção de praticamente 8:1. A prevalência de meninos sobre
meninas ficou comprovada, mas a amostra foi muito pequena para permitir qualquer outro
tipo de investigação. Segue, assim, a discussão dos instrumentos.
178
Sobre a escala PDDAS-SQ
A escolha do PDDAS-SQ nesta pesquisa teve como um dos objetivos estabelecer o
grau de comprometimento autístico dos participantes, para investigar como essa variável
estaria relacionada seus desempenhos nas várias tarefas cognitivas que lhes foram
propostas. O que determina os graus de comprometimento autístico, de acordo com Happé
e Frith (1991), é a intensidade com que a tríade autística se manifesta no indivíduo. Essa
tríade está contemplada nas classificações do DSM-IV (de forma quantitativa e não
qualitativa, conforme foi visto) e este foi o critério usado pelo autor da escala (Grossmann,
2004), para a constituição deste instrumento. Ficou constatado que o grau moderado de
comprometimento constituiu a maioria desta amostra.
Um segundo objetivo para a escolha do PDDAS-SQ, neste estudo, foi o de buscar
evidências de validade para essa escala, com vistas a poder, num futuro próximo, munir
profissionais psicólogos com um instrumento que poderá auxiliá-los na determinação mais
específica de intervenção aos autistas, mediante a aferição do grau de comprometimento
autístico desses indivíduos. Trata-se de uma escala construída a partir da experiência clínica
do autor, e ainda não existem estudos de validação que lhe dêem sustentação estatística
enquanto instrumento avaliativo. Os itens que a compõem estão divididos nas áreas
consideradas o tripé autístico (ou a tríade de Wing & Gould, 1979), e ela oferece uma
classificação final acerca da intensidade com que esses sintomas estão comprometendo o
desenvolvimento do indivíduo, no momento em que ele está sendo avaliado. Cada item
contém uma explicação pormenorizada das intensidades com que podem aparecer os
sintomas, o que ajuda, tanto os pais, quanto os profissionais, a refletir sobre cada
possibilidade de escolha e optar por uma delas com maior certeza. Conforme indica
Sampedro (2006), as escalas são necessárias, não apenas para os profissionais, mas também
179
para os pais, para que eles possam compreender melhor os comportamentos manifestados
pelo(a) filho(a).
No que se refere às evidências de validade convergente-discriminante essa escala
apresentou correlação negativa e significativa, de magnitude moderada, com as Partes 1 e 3,
pontuação total do TAC, e com a Parte 3, pontuação em um minuto; a correlação não foi
significativa com as Partes 1 e 2 do TAC, que envolviam seletividade com velocidade de
processamento. Com o Screening Motor, o PDDAS-SQ teve correlação significativa e de
magnitude moderada, e, com o Screening de Percepção, a correlação foi marginal. No
entanto, houve correlação fraca e não significativa, tanto com o B-SPG, quanto com o
TONI-3. Esses resultados serão discutidos detalhadamente a seguir.
A correlação significativa da escala com as tarefas de seletividade simples e de
alternância do foco de atenção mostrou o quanto essas funções atentivas estão, de alguma
forma, relacionadas ao grau de comprometimento global dos participantes. De fato, é
possível pensar que, se o indivíduo autista estiver mais comprometido nas relações que
precisa estabelecer com o mundo, menos apto estará para administrar a entrada dos
estímulos que vêm do ambiente. Se isso for visto sob uma perspectiva neuro-adaptativa, de
acordo com Gazzaniga, Ivry e Mangun (2006), apesar de o estado geral de alerta ativar o
organismo, são os estados seletivos que garantem a adaptação do organismo às várias
situações. Portanto, se o autista estiver comprometido na capacidade de selecionar os
estímulos do ambiente, terá sua adaptação ao mundo comprometida. Akshoomoff (2005),
associando anormalidades cerebelares a dificuldades de focalização e alternância em
indivíduos autistas, considera que prejuízos sociais possam ocorrer se essas anormalidades
se instalarem desde cedo no desenvolvimento da criança. Sheuer e Andrade (2007)
confirmam que as alterações sensório-perceptivas constituem a primeira etapa de
180
desenvolvimento cognitivo comprometido do autista. O papel da estimulação sensorial
torna-se, assim, fundamental a partir desse olhar.
Houve também correlação significativa entre a escala e o Screening Motor, mas a
correlação entre a escala e o Screening de Percepção foi praticamente marginal e, com o BSPG, não alcançou índice de significância. Os aspectos perceptivo e perceptomotor
mostraram-se bastante defasados nesta amostra, independentemente do grau de
comprometimento autístico. Esses dados divergem, em parte, dos que foram encontrados na
pesquisa de Volker e cols. (2009), na qual o comprometimento motor foi mais acentuado
que o perceptivo; observe-se que, em sua amostra, eles utilizaram os mesmos screenings.
No entanto, é importante considerar que os participantes daquela pesquisa eram todos de
alto funcionamento e com domínio da linguagem, o que pode ter garantido a compreensão
da tarefa a ser executada no Screening de percepção, principalmente. Com a amostra da
presente pesquisa, nem todos tinham domínio da fala, e houve muita dificuldade, por parte
de alguns, na compreensão da instrução. Outro fator a se considerar em relação à
divergência de dados aqui encontrados e os do estudo de Volker e cols. (2009) é que eles
não utilizaram nenhuma escala para avaliar o grau de comprometimento de sua amostra, o
que poderia ter contribuído para outras comparações entre as pesquisas.
A correlação entre esta escala e o TONI-3 não apresentou índice de significância
satisfatória, indicando que o funcionamento intelectual não estava relacionado aos graus de
comprometimento autístico desta amostra; mas a análise de diferença de médias
discriminou grupos, e a média mais alta encontrada foi a do grau moderado. Esse dado é
coerente com a explicação de Gilberg (2005), de que o indivíduo autista pode apresentar
divergências entre o grau de funcionamento cognitivo e o grau de comprometimento
autístico. Porém, a severidade dos sintomas autísticos pareceu comprometer o
funcionamento dos participantes nas tarefas cognitivas complexas.
181
A escala necessita, sem dúvida, de mais estudos, para busca de evidências de
validade e de precisão, mas não se pode deixar de reconhecer que, mesmo numa amostra
pequena, ela discriminou indivíduos autistas nos três graus de funcionalidade e situou a
amostra dentro dos Transtornos do Espectro do Autismo. Ainda que tenha sido indicada a
repontuação de seus itens, a discriminação dos graus de comprometimento ocorreu,
mostrando que seu grande valor talvez esteja no esclarecimento minucioso de cada
possibilidade de pontuação dentro do item, e não apenas no posicionamento quantitativo de
cada item numa escala crescente.
Suas subescalas, a partir da sugestão de também classificarem graus de
funcionalidade, podem ser úteis ao raciocínio clínico que enquadra o autista dentro do
espectro, considerando a maior ou menor intensidade com que cada área comprometida
marca o desenvolvimento desse indivíduo. No entanto, os dados mostraram a necessidade
de reorganização dos itens das subescalas para que elas possam, ao mesmo tempo,
conservar sua independência enquanto área e compartilhar características com as outras
subescalas, considerando que os Transtornos do Espectro do Autismo compõem um quadro
conjugado de comprometimentos. Tamanaha e cols. (2006) deixam claro que linguagem,
interação, imaginação e capacidade simbólica são fatores interdependentes.
A subescala de Atrasos na Fala e na Linguagem, por exemplo, a partir da
verificação da ausência de correlação entre seu item geral e o total geral de pontos, pode
estar demonstrando que os aspectos aí investigados não estão aferindo exatamente a
dificuldade em comunicação que o autista apresenta. Aliás, o próprio título da subescala
não menciona o termo comunicação, sendo que o DSM-IV-TR (2002) contém essa
denominação. Este fato é importante de ser considerado, pois é possível que no item geral
os pais não identifiquem grandes dificuldades na fala do(a) filho(a), mas ele(a) apresente
algum grau de dificuldade nas habilidades sociocomunicativas. Talvez por isso essa
182
subescala não tenha se correlacionado, de forma significativa, com nenhuma outra, na
análise feita entre as subescalas do instrumento. As questões que envolvem fala e
linguagem,
no
autista,
estão
subsidiadas
pela
defasagem
nas
habilidades
sociocomunicativas, como a atenção compartilhada, por exemplo, e, por essa razão,
certamente os aspectos comunicativos e sociais estão relacionados (Menezes & Perissinoto,
2008; Souza-Morato & Fernandes, 2009).
Em relação ao Jogo Simbólico ou Imaginário Anormal, sua correlação significativa
com Dificuldades na Interação Social e, ainda que de forma marginal, com as Dificuldades
Comportamentais, não seriam vistas como um problema na escala, não fosse sua
constituição a partir de itens que se confundem com problemas comportamentais. O índice
correlacional de seu item geral não está compatível com o índice correlacional de seu total
parcial, ambos em relação ao total geral de pontos da escala. Além disso, quase metade de
seus itens não se correlacionam com o total geral da escala. Sugere-se que os quatro
primeiros itens desta subescala sejam deslocados para a subescala de Dificuldades
Comportamentais, e que seu último item, relacionado à investigação de habilidades savants,
possa ser considerado um item geral, por não estar conceitualmente ajustado a nenhuma das
quatro escalas propostas. O DSM-IV-TR (2002) comenta sobre as habilidades em
hiperlexia e em cálculo de calendários como características associadas ao autismo.
A sugestão de repontuação dos itens surgiu, não apenas para verificar se a
correlação entre as subescalas poderia ocorrer de maneira mais homogênea, mas tambémem
função de se ter observado que, no critério original, as pontuações dos itens gerais
conservavam uma progressão diferente da pontuação dos itens específicos. A indicação de
zero ponto nos itens gerais servia para duas posições, ou seja, tanto a de não quanto a de
resolvido. Considerando que a posição em grau severo era mais facilmente reconhecida
pelos pais e que as posições em graus leve e moderado eram as que mais geravam dúvida,
183
optou-se por estabelecer uma pontuação que facilitasse essa diferenciação na computação
geral dos dados. A proposta de uma progressão geométrica pareceu razoável, frente à ideia
de intensidade com que os graus de comprometimento interferem no quadro do indivíduo
autista. Além disso, o uso da mesma pontuação para o item geral e os específicos pareceu
também facilitar as comparações que poderiam ser feitas entre esses elementos. Por meio
das correlações entre as pontuações nova e oficial, observou-se que a escala não foi
desconfigurada em sua essência, mas os estudos decorrentes dessa nova proposta, para
confirmação de sua pertinência, deverão acontecer juntamente com as outras adaptações
que estão sendo sugeridas a partir desta pesquisa.
Refletindo, agora, sobre a correlação de magnitude fraca encontrada no estudo de
indícios de evidência de validade de critério para esta escala, várias explicações podem ser
consideradas. Por um lado, pode-se pensar que, se uma reorganização da pontuação
favoreceu o índice correlacional (que passou a ser marginalmente significativo) entre a
classificação decorrente da escala e a classificação fornecida pelos profissionais, a escala
carece de um ajuste neste sentido, considerando-se os profissionais aptos a conhecerem os
graus de comprometimento destes participantes. Por outro lado, não se pode tirar o valor da
pontuação original, que gera as classificações, pois a correlação entre as duas pontuações,
nova e original, foi alta, sendo preciso, então, refletir sobre algumas questões que envolvem
o critério proposto.
A solicitação dos pareceres desses profissionais não foi feita de maneira formal, mas
apenas com uma breve explicação do que deveria ser feito, para não contaminar a
conclusão deles. Sabe-se que os critérios que definem esses graus de comprometimento não
são tão explícitos na literatura a respeito, pois se fala apenas em combinação e em
intensidade de sintomas (Happé & Frith, 1991); além disso, aqui no Brasil os clínicos não
contam com instrumentos disponibilizados para uso que possam auxiliá-los nessa decisão.
184
Sendo assim, mesmo considerando o ajuste que a escala deve sofrer, não se pode deixar de
refletir sobre a necessidade premente de munir os profissionais psicólogos de instrumentos
específicos à tarefa de determinação dos comprometimentos autísticos que essa clientela
apresenta. Tal informação é fundamental aos psicólogos, pois define a orientação das
intervenções para os indivíduos avaliados. Cabe aqui retomar que essa preocupação já vem
mobilizando pesquisadores brasileiros, visto que três escalas de avaliação de autismo –
ATA, ADI-R e CARS – possuem estudos de validação publicados (Assumpção Jr. & cols.,
1999; Aguiar, 2005; Pereira, 2007), porém, não estão disponibilizadas para uso clínico.
Um outro aspecto a ser considerado nessa questão é o de que esta escala teve seus
dados coletados a partir de entrevista com os pais. Apesar de ter sido minuciosa e até
mesmo longa, a entrevista ocorreu em situação diferente da convencional, pois a
pesquisadora não conhecia muitos dos participantes. Portanto, a qualificação das respostas
teve bastante peso desses pais, o que pode ter gerado divergências em relação aos pareceres
classificatórios oferecidos pelos profissionais. Essas divergências seriam apenas em termos
técnicos, pois, conforme apontam alguns autores, a participação dos pais no processo de
avaliação do autista deve ser valorizada, considerando suas informações altamente
confiáveis e de grande importância para a compreensão do desenvolvimento da criança
avaliada (Klin, Chawarska, Rubin & Volkmar, 2006).
Finalizando as considerações a esse respeito, é preciso assinalar também que os
limites definidores de um grau de comprometimento autístico – ou mesmo de qualquer
outra ordem, em se tratando de qualificação do comportamento humano – não devem ser
estanques, ou estáticos. Eles devem oferecer margem para que alguns indivíduos possam
ser classificados em áreas próximas a esses limites. O desenvolvimento humano é
dinâmico, e, mesmo quando sofre de desarmonias, expressas em transtornos globais do
185
desenvolvimento, por exemplo, é passível de apresentar melhoras dentro do continuum de
intensidade dos seus sintomas.
A sugestão, portanto, para as classificações dos comprometimentos autísticos, é a de
que sejam contempladas, na pontuação da escala, áreas intermediárias que poderiam ser
classificadas como leve/moderado e moderado/severo. A pesquisadora supõe que este
ajuste seria coerente com a concepção de atribuir à avaliação um caráter flexível na forma
de pensar o resultado alcançado, acreditando na capacidade de mobilização do indivíduo ao
longo do seu desenvolvimento, desde que ele seja trabalhado adequadamente em suas
necessidades especiais. A avaliação não tem sentido enquanto rótulo, mas se justifica
enquanto um olhar sobre o comportamento presente, compreendido em função de seu
histórico (passado) e com possibilidades de crescimento futuro, previsto mediante um
planejamento adequado de intervenções.
A partir dos dados analisados neste estudo, sobre o PDDAS-SQ, foi possível
constatar que este instrumento é potencialmente interessante na avaliação de indivíduos
autistas, mas poderia ser mais preciso em sua aferição se sofresse alguns ajustes, tanto em
sua pontuação quanto na distribuição de seus itens nas subescalas. Uma análise mais
aprofundada em relação à organização dos itens dentro da escala deveria ser feita, mas seria
necessário contar com um número maior de indivíduos, na amostra, para garantir a
adequação desse ajuste. Fica aqui registrada, portanto, a sugestão de um estudo mais
direcionado a este propósito, pois a presente pesquisa pretendeu apenas evidenciar aspectos
vulneráveis no instrumento, sem questionar seu valor enquanto auxiliar diagnóstico.
A prática clínica psicológica necessita, sim, de instrumentos para avaliação de sua
clientela diversificada, mas esses instrumentos precisam ser constantemente submetidos a
estudos de validade, a fim de atingirem um know how em relação àquilo que pretendem
avaliar. Todo instrumento psicológico é um meio de proporcionar ao profissional da área a
186
compreensão de aspectos específicos do indivíduo avaliado. Quanto mais ajustado esse
instrumento estiver àquilo que pretende avaliar, mais adequada será a compreensão do
profissional sobre o funcionamento do examinando. A propósito, o próprio autor da escala
deixa claro que seu instrumento ainda se encontra em estudo, exigindo, portanto, cautela
em relação à aplicabilidade de seus resultados (Grossmann, 2004).
Sobre o Teste de Atenção por Cancelamento (TAC)
Os dados da avaliação dos indivíduos autistas obtidos por meio deste instrumento,
foram particularmente interessantes, porque seus resultados puderam ser analisados, não em
função de acerto e erro, visto que não foi feita nenhuma comparação com médias previstas
para grupos normativos nas tarefas, mas com a proposta de se obter informações
indicadoras de algumas características cognitivas peculiares a esta amostra. Em primeiro
lugar, vale comentar que a dificuldade na compreensão da tarefa pôde ser vista como um
empecilho à sua execução, sobretudo nas Partes 2 e 3. A possibilidade de treino agregada às
instruções foi crucial para que essa compreensão pudesse acontecer, de alguma forma, para
alguns participantes, a partir do feedback da sua execução. Uma vez compreendida a
instrução, a busca do estímulo ocorria sem problemas, mas a não compreensão gerava
respostas bizarras, como uma tentativa de desempenhar algo, e não como erro deliberado
ou descaso. Como exemplo disso, na Parte 2 do teste muitos buscavam pelos estímulosalvo, separadamente („ e/ou S), ou marcavam arranjos com rotação das figuras, sem a
compreensão da relação posicional („S).
Na Parte 3 muitos também demonstraram conflito, pois queriam encontrar uma ou
cada figura-modelo, em toda a extensão da folha, sem consideração da linha; ou marcavam
apenas o primeiro estímulo encontrado em cada linha. Aliás, conceber qual a melhor forma
de pontuação para as Partes 2 e 3 deste teste não foi tarefa fácil. Fugiu dos padrões
187
sugeridos para a computação dos dados do teste, que deveria ser feita sobre os acertos, as
omissões e os acréscimos de estímulos (Montiel & Capovilla, 2007). Aqui, a pontuação foi
feita sobre os acertos na Parte 1, os acertos na Parte 2 (sem considerar os acréscimos) e as
fileiras corretas na Parte 3. Acertos e fileiras corretas nas Partes 1 e 3, respectivamente,
também tiveram marcação sob o tempo de um minuto. No entanto, mesmo admitindo atipia
nessa pontuação, ela não perdeu seu valor enquanto informação acerca da capacidade
atentiva dos participantes, tanto em relação à seletividade complexa, quanto em relação à
alternância no foco. Só o fator idade não pôde ser considerado.
É preciso compreender que instrumentos desse tipo, como o Teste d2, por exemplo,
possuem normas para interpretação dos resultados (Brickenkamp, 2000), o que não ocorre
em relação ao TAC. Além disso, os estudos feitos por Montiel, em 2005, usando o TAC,
contaram com um grupo controle para comparação dos resultados (Montiel & Capovilla,
2007), o que também não ocorreu na presente pesquisa. Contou-se, portanto, com algumas
comparações possíveis entre as próprias pontuações computadas dentro de uma mesma
subparte do teste ou entre essas subpartes.
Outro fator que chamou a atenção na aplicação do teste foi que o mesmo treino que
serviu de auxiliar ao entendimento de todos os participantes, quanto ao pedido de execução
da tarefa da Parte 1 do TAC, uma vez fixado, gerou uma atitude inflexível, em alguns deles,
que não conseguiram mais compreender as propostas diferenciadas das tarefas seguintes,
principalmente a da Parte 2, justificando correlação moderada entre as referidas Partes e as
pontuações em zero ocorridas. Esse fato, por si só, já pôde demonstrar a dificuldade de
alternância de tarefas, ou de flexibilidade mental, exibida por alguns autistas, conforme foi
comentado por Frith (2003) e por Baron-Cohen (2008), ao analisarem as dificuldades nas
funções executivas desses indivíduos.
188
É importante lembrar que a Parte 1 deste teste pode ser vista como tarefa de busca
por característica (Gazzaniga, Ivry & Mangum, 2006), contando com a percepção visual do
estímulo, pois apenas a forma do modelo varia em relação aos outros estímulos. Na parte 2,
a tarefa de busca deve ser feita pela relação espacial entre duas figuras, ou seja, as figuras
(ou a percepção delas) passam a ser secundárias, e a relação (condição imaginária) passa a
ser primária. Essa tarefa não foi compreendida por alguns autistas, visto que 10 pontuaram
zero em um minuto, pois eles queriam, conforme já foi dito, encontrar separadamente os
estímulos, seguindo a busca por característica, e não por relação. Alguns que
compreendiam a relação queriam encontrar os estímulos com associações diversificadas
(inversão, posição vertical, diagonal). Na parte 3, a tarefa solicitada retorna à busca por
característica, agora com alternância do foco a cada linha, o que também gerou conflito ou
incompreensão, fazendo com que 10 participantes pontuassem zero, mesmo considerando a
ausência do limite de tempo. Esse fato não confirma o que foi concluído nos estudos de
Burack e cols. (2003) ao afirmarem que a tendência ao aumento na detecção de estímulos
específicos, presente nos autistas, não acontece em detrimento do todo. Alguns estudos
sobre o todo e as partes, envolvendo autistas, parecem estar mais voltados à ideia de
percepção da configuração global do estímulo do que ao caráter relacional ou contextual
que os estímulos assumem.
A tarefa que mais abrangeu a possibilidade de execução dos participantes enquanto
grupo foi a Parte 1, pontuação total, mas sua convergência/divergência em relação aos
outros testes aplicados não poderia ter sido evidenciada se a pontuação total não tivesse
sido computada. As correlações geradas entre a pontuação total e os Testes Motor, de
Percepção e B-SPG, foram significativas, mas as geradas com as pontuações de um minuto,
não. Das três subpartes do TAC, esta é a tarefa mais fácil, mas é a primeira da série. Isso
parece ir ao encontro do comentário de Akshoomoff (2005) sobre uma lentidão presente
189
nos autistas, na orientação da atenção, interferindo, não apenas na alternância, mas também
na focalização. Ela reafirma o que, numa pesquisa com Courchesne, já tinha sido
observado, de que os autistas são capazes de responder aos estímulos se tiverem mais
tempo para executar a tarefa (Courchesne & cols., 1994).
Olhando para o teste como um todo, a análise de diferença de médias entre os graus
leve, moderado e severo de comprometimento, na escala, foram significativos apenas na
pontuação total da Parte 1. Disso conclui-se que a velocidade de processamento não
apontou diferenças significativas entre os comprometimentos dos participantes, mas a
capacidade seletiva total ficou mais evidente em autistas com grau leve de
comprometimento. Talvez essa constatação possa também ser pensada como uma
explicação para o fato de que em alguns testes de inteligência, nos quais a velocidade de
processamento de estímulos é exigida, muitos autistas, até pouco comprometidos, não se
saiam bem e sejam classificados como estando aquém da capacidade média esperada. A
escolha de instrumentos adequados para avaliar autistas tem sido tema de discussão para
vários autores (Edelson, Schubert & Edelson, 1998; Mottron, 2006; Klinger, O’Kelley &
Mussey, 2009), mas a crítica em relação ao WISC, por exemplo, está mais pautada no fato
de ele medir habilidades verbais, comprometidas nesses indivíduos; e as considerações em
relação ao tempo são menos expressivas. Sugere-se que questões que envolvem tempo /
autismo / inteligência devam ser mais exploradas.
É possível ainda discutir, em relação a este teste, a forma como os estímulos foram
mostrados aos participantes, na Parte 2 e 3, porque essa organização provavelmente tenha
dificultado a sua compreensão. Pensou-se, em relação à Parte 2 do TAC, que teria sido
interessante, para a pesquisa, ter invertido a ordem da sua apresentação, colocando-a em
primeiro lugar, para verificar se eles compreenderiam, de imediato, a relação entre os dois
estímulos, facilitando assim a aplicação das outras duas Partes. Porém, isso não foi feito
190
porque a amostra era muito pequena e heterogênea para que dois grupos fossem
comparados. Pensou-se, também, que as figuras-modelo poderiam estar emolduradas, para
darem a noção de conjunto ou de união. Na Parte 3, alguns participantes não consideraram
o espaço existente entre os modelos e os estímulos, e olharam para a folha como um
conjunto total de estímulos; talvez por isso não tenham conseguido compreender a tarefa,
mesmo com explicações diversas. A colocação de numeração em cada linha e o uso de uma
linha demarcatória entre o modelo e os estímulos talvez pudesse facilitar, aos participantes,
a compreensão da tarefa.
A análise sobre a varredura visual, proposta para a Parte 1 do TAC, considerada
mediante a observação da sequência de marcas que os examinandos faziam nos estímulos e
acrescida muitas vezes do uso do lápis sob os estímulos direcionando o olhar, permitiu
verificar que a sistematização na busca do alvo favoreceu a produção dos avaliados. No
entanto, a diferença de médias foi significativa apenas considerando a pontuação total, e
não a de um minuto. A varredura direcionada também facilitou o rendimento nos
Screenings, no Bender e no TONI-3, conforme demonstrado nas diferenças de média feitas
sobre estes testes também. De acordo com Wasserman e Lawhorn (2003), crianças menores
que oito ou nove anos fazem varredura e marcam o alvo aleatoriamente. Na amostra desta
pesquisa, apenas sete de 12 participantes com idade abaixo de nove anos fizeram varredura
aleatória.
Além disso, cabe aqui comentar que alguns detalhes a mais na varredura do TAC
foram percebidos, mas não pontuados, por exemplo: começar a fazer as marcas iniciando
pelo meio da folha, ou de baixo para cima; pular linhas; trabalhar por blocos ou mesmo
contornando a folha. Em quatro participantes ficou nítida a heminegligência esquerda.
Wasserman e Lawhorn (2003) atentam para o fato de que este tipo de teste promove o olhar
sobre as negligências, que ocorrem mais acentuadamente no campo esquerdo e têm
191
implicações neurológicas. Esse dado pode servir, então, de indício para que investigações
neurológicas mais específicas, em autistas, tragam mais informações a respeito.
Sobre o B-SPG e os Testes Motor e de Percepção (Screenings do Bender II)
Os Testes Motor e de Percepção também forneceram uma contribuição interessante
nesta pesquisa, não apenas porque serviram de screenings para a tarefa perceptomotora
mais ampla, que seria feita com o B-SPG, mas também porque favoreceram reflexões
acerca dessas duas capacidades, numa amostra de autistas, a partir de estudos correlacionais
com outros testes. Desde sua aplicação foi possível perceber as dificuldades dos
participantes na execução, tanto da tarefa grafomotora, quanto da tarefa perceptiva, mas
isso não ocorreu obrigatoriamente nos mesmos indivíduos, o que gerou uma correlação
marginalmente significativa entre os dois Screenings, apontada no tratamento estatístico.
As dificuldades grafomotoras marcadas pela inabilidade de alguns participantes em
até mesmo pegar no lápis, comprometeram o desempenho deles no B-SPG, tanto que o
índice de correlação negativa entre o Screening Motor e o B-SPG foi expressivo (rho=0,67; p<0,001). A correlação é negativa porque o B-SPG pontua erros e o Teste Motor
pontua acertos. Com o Screening de Percepção, o B-SPG também apresentou correlação
negativa significativa, com magnitude moderada (rho=-0,45; p=0,016), porque, apesar de
ambas as tarefas envolverem percepção visual, a tarefa perceptiva do Screening é apenas
reconhecer figuras iguais, e a tarefa do B-SPG implica organização perceptiva e reprodução
perceptomotora.
No entanto, mesmo parecendo ser tarefa simples, no Screening de Percepção
registraram-se muitos erros nos participantes, que se dividiram entre os que acertavam tudo
e os que acertavam quase nada, conforme visto nos dados estatísticos descritivos. Inclusive,
ele não diferenciou grupos no B-SPG, a partir de análise feita com seus quartis. Isso
192
ocorreu muito provavelmente em função da diagramação da tarefa. A folha apresentada
para execução da atividade não contém divisórias suficientes para que os indivíduos
autistas possam se apropriar das pistas visuais, atingindo assim a compreensão da instrução.
Para muitos, a instrução verbal não era significativa e, mesmo com todas as mediações
feitas, sugeridas inclusive no manual do Teste (Brannigan & Decker, 2003), eles não
conseguiam entender o que era para ser feito. Esse fato pode estar relacionado com a
dificuldade na força coesiva central explicada por Frith (2003), pois eles não conseguiam
ver as linhas como um todo, e que ali deveriam ser encontradas duas figuras iguais, mas
puderam entender o conceito de igualdade que estava implícito nos outros testes.
Assim, cabe aqui, também, a sugestão de ajustes nesta tarefa. As linhas que contêm
os estímulos deveriam ter um espaço de separação entre si, e a figura modelo, com a qual se
comparam as outras figuras, deveria ser emoldurada. Mais uma vez se observa que a
organização visual da tarefa a ser solicitada pôde induzir os participantes ao erro, em
função da não compreensão do que estava sendo pedido. A dificuldade não era na
compreensão da instrução verbal apenas, era na integração entre o que estava sendo dito e o
que eles tinham que entender olhando para a tarefa. Pode ter ocorrido, então, numa
explicação mais complexa do funcionamento cognitivo, falha no processamento sensorial,
conforme descrito por Rapin (2009) acerca dos autistas, afetando a percepção, a atenção
seletiva, a alocação de recursos cognitivos para o cumprimento da tarefa.
Outro fator também observado neste teste foi a rotação das figuras. Na escolha da
resposta correta, alguns participantes julgavam adequado assinalar figuras alternativas que
eram semelhantes, mas não estavam na mesma posição espacial que a figura-modelo. Às
vezes assinalavam várias semelhantes, como que compreendendo todas sendo iguais. Esse
mesmo comportamento foi visto na execução do TONI-3, no qual também havia a
possibilidade de escolha de figuras em rotação, mas o TONI-3 contém uma fase de treino,
193
na qual é possível esclarecer situações como essa, e a matriz de referência é composta por
mais elementos servindo de modelo. É importante lembrar que a mediação na avaliação foi
usada em ambos os testes. Os estudos referentes ao comprometimento magnocelular no
autismo apontam a dificuldade generalizada na percepção de movimentos, inclusive o de
rotação (Milne, 2005), o que pode estar relacionado com o que foi observado nestes
participantes.
Acredita-se, assim, que dificuldades instrucionais atreladas à diagramação confusa
deste Teste de Percepção, para os participantes desta amostra, comprometeram a
compreensão deles sobre a execução da tarefa, e isso pode justificar a correlação não
significativa entre este instrumento e o QI do TONI-3, e entre este instrumento e a
pontuação total do TONI-3 também, pois era esperada correlação entre eles. Muitas
pranchas do TONI-3, sobretudo as primeiras, referem-se à identificação de igualdade entre
figuras, por isso a expectativa de maior convergência na correlação entre esses
instrumentos.
Quanto ao B-SPG, este foi o teste que menos exigiu ajustes na sua aplicação. A
tarefa a ser cumprida por ele estava clara, e a execução dos participantes foi realmente
sobre aquilo que eram capazes de fazer. Não foi observado nenhum empecilho na
compreensão da tarefa, até mesmo porque, inclusive nas produções mais confusas, era
possível reconhecer alguma caracterização das figuras. Apenas com um único participante
foi preciso, nas duas primeiras figuras, que a pesquisadora ensaiasse a cópia junto com ele,
no papel, mas a partir daí ele mesmo se organizou para fazer o restante. Pode-se concluir
que, se a média de erros no B-SPG foi alta, equiparada à média de erros prevista para a
idade-piso da amostra normativa brasileira, isso não deve ser atribuído a dificuldades na
aplicação, mas sim a uma dificuldade perceptomotora própria que esta amostra clínica
manifestou. Nem mesmo a análise de figuras fáceis, médias ou difíceis pôde seguir uma
194
gradação maturacional no desempenho da maioria dos participantes, considerando-se ainda
as normas brasileiras. Apenas os de idades mais tenras (cinco a sete anos) cursaram essa
trajetória.
Esse fato torna sui generis a produção perceptomotora da amostra avaliada, até
mesmo porque não foi significativa a correlação entre o B-SPG e a escala PDDAS-SQ que
investigou os graus de comprometimento autístico. Não havendo convergência na
correlação entre os erros no B-SPG e a intensidade de comprometimento dos participantes,
assim como tendo ocorrido uma aplicação sem intercorrências neste teste, para todos os
avaliados, pode-se olhar de forma especial para as características perceptomotoras
observadas neles. As frequências de erro em cada figura revelaram o que qualitativamente
foi visto como dificuldade na execução dos hexágonos, das curvas sinuosas, e da
organização de pontos e círculos. Além disso, de forma também qualitativa, foi observado:
afastamento dos hexágonos da figura 7 (19 fizeram isso), separação das linhas da figura 6
(seis participantes), linhas retas no lugar de pontos (10 participantes), e inscrição
obrigatória do losango no hexágono da figura 8.
Uma análise mais específica e qualitativa das figuras, seguindo os princípios
oferecidos pela Gestalt, poderia enriquecer a proposta de um perfil perceptomotor para os
autistas, a partir do Teste de Bender, desde que a amostra contasse com um número maior
de indivíduos. Mas os dados que puderam ser coletados nesta pesquisa já foram claros ao
demonstrar a alta frequência em distorção da forma que os participantes apresentaram em
todas as figuras. As investigações nessa área, conforme foi visto, não têm sido voltadas
para a reprodução gráfica do estímulo percebido, mas apenas para o reconhecimento de
forma. Os estudos de Bertone e cols. (2005), Lahaie e cols. (2006), e todos os estudos
revistos por Dakin e Frith (2005) exploraram a capacidade dos autistas em reconhecer
formas, detalhes de figuras, rostos, ou seja, apenas a capacidade perceptiva visual básica.
195
Mas o que pôde ser visto no B-SPG destes participantes foi dificuldade na integração dessa
percepção às funções motoras e o resultado sugere que essa questão seja investigada com
mais profundidade pelos estudiosos do assunto.
Comparando-se as porcentagens de acertos dos participantes, em cada figura, com
as porcentagens previstas por idade, nas normas brasileiras, observa-se qu, nas figuras A, 1,
5, 6, 7A, 7B e 8, os valores desta amostra estão próximos à idade de 6 anos ou menos. As
figuras 2 e 4 aproximam-se das porcentagens indicadas para 8 anos, e a figura 3 aproximase das referentes à idade de 9 anos. Por isso, os participantes de 10 anos ou mais tiveram
suas pontuações significativamente diferenciadas da média de erros esperada para esta
idade, de acordo com essas normas, pois nenhuma figura teve porcentagem de acerto
suficiente para equiparar-se à idade-teto.
É preciso considerar que, embora menos defasados, os participantes com idade
abaixo de nove anos encontram-se em situação de risco, e este fato torna-se de extrema
importância para a vida acadêmica desses indivíduos. Retome-se aqui o estudo de Suehiro e
Santos (2006), que demonstrou haver melhor desempenho perceptomotor, medido pelo BSPG, em crianças sem dificuldades de aprendizagem. Sendo assim, intervenções adequadas
para a minimização da defasagem perceptomotora tornam-se fundamentais para o processo
de inclusão escolar destes participantes.
A análise da varredura visual forneceu dados interessantes que podem auxiliar nas
intervenções. As diferenças de média mostraram que a varredura direcionada esteve
presente nas médias mais altas dos Screenings e na média mais baixa do B-SPG, sugerindo
que os participantes que conseguiram um nível de sistematização na busca do estímulo
puderam se sair melhor nessas tarefas. Essa informação tem relevância para o planejamento
das estratégias de intervenção, sobretudo para os participantes que não tiveram bom
rendimento nestes testes.
196
Finalizando este item, ainda que tenha havido dificuldade na execução do B-SPG,
por parte dos autistas desta amostra, encontrou-se correlação significativa entre ele e o
Teste de Atenção por Cancelamento (exceto a Parte 1, um minuto) e entre ele e o TONI-3
Forma A, considerando-se a pontuação total. Ficou claro, portanto, que a habilidade
perceptomotora, os processos atentivos e a capacidade para o raciocínio lógico e solução de
problemas estiveram relacionados de forma significativa, na execução destes participantes.
Pode-se pensar que ficou representado, nesta amostra, o comentário de Pessoa, Kastner e
Ungerleider (2003), de que a atenção amplia a sensibilidade perceptiva, sendo isso
determinante ou suporte para as funções cognitivas complexas.
Sobre o Teste de Inteligência Não-Verbal – Forma A – TONI-3
A aplicação do TONI-3 Forma A nestes participantes permitiu verificar, assim como
foi visto em outros instrumentos, aspectos interessantes decorrentes da relação da amostra
com a estrutura do teste. Primeiramente, uma das principais razões para a escolha do TONI3 nesta pesquisa referiu-se ao fato de ele ser não-verbal, considerando que a amostra
escolhida seria de indivíduos autistas e que alguns autores sugerem que os testes verbais
não são os mais adequados a esses indivíduos (Mottron, 2006; Klinger, O’Kelley &
Mussey, 2009). Acoplado a isso estava o fato de ele ter instruções também não-verbais, o
que poderia ir ao encontro das necessidades de alguns participantes, de acordo também com
dados de literatura (Sampedro, 2006).
No entanto, o aspecto relacionado às instruções não-verbais não foi considerado
relevante nesta pesquisa. Ao contrário do que se esperava, os participantes cobravam, de
alguma forma, a instrução verbal da pesquisadora, tanto os que tinham domínio da fala
quanto os que não o tinham. Ficou claro que eles não buscavam compartilhamento da
ausência da fala e esperavam a verbalização da pesquisadora. Os que não dominavam a
197
fala, principalmente, olhavam rapidamente para os olhos da pesquisadora e depois para a
boca, esperando que ela lhes falasse algo. Se nada lhes era dito e só o gesto acontecia, eles
imitavam o gesto, mas não demonstravam entender o que era para fazer. Apenas fala e
gesto puderam dar sentido à compreensão deles na execução da tarefa. Isso é compatível
com a experiência de Edelson, Schubert e Edelson (1998) que, ao aplicarem o TONI-2 em
autistas, também registraram que muitos não compreendiam os gestos, o que fez com que
tais pesquisadores oferecessem instruções verbais aos examinandos.
As dificuldades com o apontar as figuras (pointing) foram percebidas em alguns dos
participantes, mas o treino proposto no TONI-3 foi muito importante para a checagem da
possibilidade de resposta que o examinando poderia ter. Alguns obtiveram a compreensão
no momento do treino, mas dois deles não compreenderam que o apontar era a forma de
decidir sobre a resposta. Sendo assim, optou-se por uma adaptação do teste, usada para
esses dois participantes, que consistiu em recortar as alternativas de resposta e permitir que
eles escolhessem uma delas, colocando-a no espaço vazio da matriz, conforme já foi
explicado anteriormente no método. Isso significa que foi preciso criar uma forma de
resposta ajustável às condições deles, para que sua expressão de raciocínio pudesse
acontecer. Sabe-se que há muita diferença entre observar alternativas, imaginando uma
delas completando o espaço da matriz, e ter um feedback visual imediato, concreto, ao
colocar a peça sobre o espaço vazio. No entanto, o que estava sendo requerido era a
possibilidade de compreensão da tarefa para análise das respostas, e essa adaptação do
material pôde mostrar que é preciso fazer ajustes no esquema de avaliação, quando se
pretende investigar o processo e não apenas o produto.
Este tipo de adaptação não foi encontrado em nenhum estudo revisto em literatura,
mas Klinger, O’Kelley e Mussey (2009), ao proporem diretrizes clínicas para avaliação de
autistas, sugerem adequação dos instrumentos a cada caso avaliado, para que a capacidade
198
intelectual desses indivíduos não seja subestimada e haja, de alguma forma, compreensão
de suas forças e fraquezas cognitivas. Além disso, como esta avaliação também foi pautada
numa proposta dinâmica, a adaptação do instrumento pode ser considerada uma forma de
mediação, na qual os estímulos foram reorganizados pela mediadora para favorecer a
compreensão do mediado sobre a tarefa (Feldman, 2006). Um outro exemplo de ajuste ao
esquema de avaliação refere-se ao fato de que um dos participantes precisou desenhar as
respostas numa folha à parte, para considerar sua tarefa cumprida. Ele apontava a resposta
escolhida na prancha do teste e em seguida desenhava essa figura numa folha sulfite. Esses
arranjos, na avaliação de autistas, precisam contar com a flexibilidade do avaliador e a
consciência que ele deve ter daquilo que quer alcançar na tarefa avaliativa que lhe cabe
cumprir.
Os resultados quantitativos deste teste puderam ser analisados, inicialmente, a partir
de sua pontuação bruta, e especial atenção deve ser dispensada à maior concentração de
pontos que os participantes fizeram, ou seja, entre os totais de 11 e 12. É interessante
perceber que, se a interrupção do teste se dá mediante três erros em cinco itens
consecutivos, uma pontuação de 11 ou 12, conforme visto no gráfico de frequências de
pontos, pode estar relacionada à mudança na propositura das pranchas. De fato, até o item 9
a proposta se concentra em matrizes de 2x2, mudando para matriz de 2x3, depois para
grupo de 5 faltando 4 e para matriz de 3x3. O 13º e o 14º itens retornam à matriz de 2x2,
mas depois há uma série de 4 itens com mudanças novamente nas estruturas das propostas.
A análise correlacional entre essas estruturas e os resultados totais dos participantes,
considerando as 45 pranchas, mostrou que a matriz de 2x2 foi a que mais se correlacionou
com os acertos totais, seguida da matriz de 3x3.
Compreendendo que as mudanças na estrutura não ocorrem à parte da gradação das
dificuldades, há dois fatores que merecem reflexão, a partir dessa observação de aumento
199
de erros após as trocas. Em primeiro lugar, é possível pensar que isso ocorre pela
característica de inflexibilidade que o autista tem, apresentando dificuldades frente a
qualquer mudança de regras (Frith, 2003). Em segundo lugar, pode-se considerar que o
aumento gradativo da quantidade de atributos do estímulo (forma, dimensão, contiguidade,
tamanho etc.), nas sequências das pranchas, solicita do examinando que a cada proposta
nova seja repensada a regra organizadora ou a relação lógica entre as figuras, aumentando
também as combinações de habilidades ou estratégias cognitivas exigidas para a resolução
da tarefa. É claro que essa gradação de dificuldade é o que permite evidenciar o diferencial
intelectual entre as pessoas, que o teste se propõe medir. Por outro lado, um conjunto de
mudanças inesperadas pode ser desfavorável a um indivíduo que tem dificuldades para se
reorganizar quando muda o foco de atenção.
De todos os formatos contidos no teste, um deles, o do Grupo de 5 faltando 4, foi o
que se mostrou mais difícil para os participantes, principalmente aos não-verbais. Eles não
entendiam que era para escolher um grupo de estímulos juntos que combinasse com uma
única figura-modelo. Muitos apontavam para uma figura apenas, dentro de um grupo
alternativo, a que mais se parecia com o modelo, entendendo a tarefa como sendo
identificação de igualdade ou de semelhança. A correlação das pontuações totais dos
participantes com este tipo de propositura foi a mais baixa de todas, muito embora
significativa.
A riqueza que esses dados oferecem requer um estudo à parte, inclusive com análise
dos erros, pois muitas escolhas feitas pelos participantes demonstraram ter lógica, e
precisariam ser categorizadas. Porém, seria também necessário que a amostra fosse maior
para um estudo desse porte, o que não ocorreu nesta pesquisa. Por ora, fica a observação
sobre as rotações, que apareceram de forma muito intensa nas respostas dos participantes,
inclusive podendo ser mais explicitamente percebidas na avaliação dos que se valeram do
200
TONI-3 adaptado. Estes, ao olharem as peças distribuídas a sua frente, muitas vezes
escolhiam uma alternativa em rotação, mas a colocavam de forma correta na matriz,
deixando aqui uma indagação: se isso também não ocorreu com outros participantes que
pontuaram erro nas rotações, mas estavam representando a resposta correta, mentalmente.
Conforme já foi visto, estudos mais específicos sobre as vias magnocelulares deverão
esclarecer essas questões de rotação observadas no desempenho dos autistas (Milne, 2005).
Apesar de todas essas observações acerca das dificuldades dos participantes na
compreensão da proposta do TONI-3 Forma A, não apenas os obstáculos puderam ser
vistos. Ao contrário, os resultados de QI mostraram que mais da metade da amostra ocupou
as classificações de nível mediano, que se situa entre o QI 80 e o 120, conferindo-lhes uma
condição satisfatória de funcionalidade cognitiva. Vale lembrar que a estimativa de QI foi
feita a partir das normas americanas. Se o nível de funcionalidade desta amostra fosse
considerado a partir do limite de QI 70, adotado pela maioria dos clínicos, apenas três
participantes seriam de baixo funcionamento. Se, no entanto, o nível de funcionalidade
fosse pautado no limite sugerido por Baron-Cohen (2008), ou seja, de QI 85, apenas 12
seriam de alto funcionamento, e 13 participantes estariam no segundo desvio-padrão
inferior.
Ainda que compreendendo a justificativa de Baron-Cohen sobre o reflexo do limite
proposto por ele nas diretrizes educacionais para os autistas, não se pode pensar que apenas
o aspecto cognitivo deva ser relevado nas questões referentes à vida acadêmica desses
indivíduos. De acordo com Edelson, Schubert e Edelson (1998), o número de sintomas
autísticos e a severidade desses sintomas são dimensões que também precisam ser avaliadas
no autista, e não somente seu funcionamento cognitivo. Além de avaliadas, todas as três
dimensões devem ser consideradas ou ponderadas quando se pensa numa proposta
educacional para esses indivíduos. Outro fator importante a se pensar é o de que todos os
201
autistas precisarão, em maior ou em menor grau, de suporte educacional para que sua vida
acadêmica seja bem sucedida.
Cabe aqui uma análise qualitativa para essa questão, que pode ser pensada a partir
da Teoria Triárquica de Sternberg (2000; 2008). O comportamento inteligente dos autistas
desta amostra, que de alguma forma se aproximou do comportamento de indivíduos com
desenvolvimento típico (conforme visto na distribuição de QIs), poderia encontrar respaldo
na subteoria componencial, cujos componentes são responsáveis pela resolução de
problemas. Por outro lado, o comportamento inflexível, de alguns autistas, em não
conseguirem lidar com situações novas, poderia ser justificado pela subteoria experiencial e
essa contradição refletiria as incertezas, registradas em literatura, no que se refere à
capacidade intelectual desses indivíduos. É importante pensar que ao mesmo tempo que os
testes devem ser ajustados às condições de resposta do autista, precisa ocorrer o olhar sobre
os processos mentais que interferem na resolução de problemas, contidos nesses testes, que
podem apontar as dificuldades cognitivas que esses indivíduos têm. Só assim uma
avaliação de inteligência terá sentido para uma população tão atípica em seu perfil
intelectual.
Um outro dado importante para ser discutido diz respeito à correlação divergente
entre a idade e o QI que esta amostra apresentou (rho=-0,53; p=0,004), indicando que as
faixas etárias mais novas tenderam a dominar os maiores valores referentes à capacidade
intelectual. Edelson, Edelson e Jung (1998) também encontraram esse dado em seu estudo.
Se isso for pareado com a constatação de que muitas pontuações foram interrompidas no
11º e no 12º item, é possível levantar a hipótese de que alguns participantes mais velhos
estacionaram em estratégias mais simples de raciocínio. Independentemente da justificativa
para essa possibilidade, a questão precisa ser refletida de maneira prospectiva para os
autistas mais novos, para que as intervenções, quer sejam clínicas, quer sejam educacionais,
202
possam contemplar a estimulação ao desenvolvimento de estratégias mais complexas de
raciocínio.
A habilidade em lógica, como foi visto, diferenciou grupos em nível significativo no
TONI-3, mantendo a média mais alta quando presente, mesmo com apenas cinco
participantes. As outras habilidades não diferenciaram grupos significativamente, mas no
estudo de Bölte e Poutska (2004), em que os autores avaliaram autistas savants e nãosavants, as habilidades apresentadas pelo grupo de savants também não interferiram nos
resultados comparativos referentes ao nível intelectual. Vista aqui a inteligência a partir das
teorias hierárquicas, é possível pensar que provavelmente o que alguns autistas apresentam
seja habilidades específicas e altamente especializadas; porém, de acordo com FloresMendoza (2010), o que garante a melhor adaptação ao meio é a inteligência geral, extraída
de uma matriz de correlações entre uma série de testes de habilidades. Se g subentende um
conjunto de fatores, alguns autistas podem estar desenvolvendo capacidades representativas
desse fator mais amplo; ao mesmo tempo, outros autistas podem não estar diversificando
suas capacidades, e é preciso admitir que ter uma habilidade específica não é o suficiente
para garantir autonomia cognitiva.
Analisando o parecer dos psicólogos acerca da funcionalidade cognitiva e do grau
de comprometimento autístico destes participantes, verificou-se que a discriminação entre
alto e baixo funcionamento cognitivo foi reconhecida pelos profissionais. A ausência de
significância entre os graus de comprometimento e os QIs do TONI-3, em diferença de
médias, demonstrou que estes profissionais também não estabelecem associação definida
entre os graus de comprometimento e a capacidade cognitiva, concordando com Gilberg
(2005).
O índice de correlação dos QIs do TONI-3 com o B-SPG não foi significativo, até
mesmo porque esta amostra teve um desempenho comprometido na tarefa perceptomotora,
203
de um modo geral, e principalmente porque o B-SPG, nesta análise, foi utilizado com sua
pontuação bruta e não relacionada ao desempenho por idade, como no QI. No entanto, a
correlação da pontuação total do TONI-3 com o B-SPG, tendo sido significativa, indicou
que a maturidade perceptomotora está de alguma forma relacionada a tarefas não-verbais de
raciocínio lógico. Em relação à capacidade atencional, a alternância de foco, sem
consideração do fator tempo, foi a única tarefa que apresentou convergência significativa
com os QIs do TONI-3, indicando que esta função é a que mais está associada à capacidade
intelectual dos participantes. Porém, excetuando-se a pontuação do TAC 1, um minuto,
todas as outras tarefas se correlacionaram com a pontuação total do TONI-3, indicando que
seletividade simples e complexa também são recrutadas nos raciocínios exigidos neste teste
não-verbal.
No que diz respeito à varredura visual observada no TAC 1, os estudos estatísticos
mostraram que ela também diferenciou grupos neste teste de inteligência. A esse respeito,
um fato observado na execução de alguns participantes foi o de não olharem para todas as
alternativas contidas nas pranchas. Se a mão ou o braço deles estivesse sobre alguma figura,
eles não os tiravam para olhar todas as opções, ou seja, não exploravam o campo todo de
possibilidades. Era preciso que a pesquisadora organizasse o campo de busca para eles.
As mediações para sugestão de nova varredura foram as mais frequentes, para todos
os participantes. Alguns pediram feedback verbal, preocupados com o acertar. Foi possível
perceber no comportamento de todos os examinandos, pelo menos até o item de teto, as
etapas das estratégias para resolução de problemas propostas no próprio TONI-3 (Brown,
Sherbenou & Johnsen, 2006), ou seja, compreender a natureza do problema, analisar seus
componentes, buscar estratégias de resolução tentando encontrar a relação lógica ou a regra
organizadora, determinar a escolha e partir para o próximo item. Um dos participantes
verbalizou as etapas do seu raciocínio em todas as pranchas. Os dois participantes que se
204
valeram do TONI-3 adaptado, ao terminarem cada prancha recolhiam as peças e as davam
para a pesquisadora. A intencionalidade e a reciprocidade na mediação foram possíveis,
portanto, de serem atingidas na avaliação como um todo. Os parâmetros de transcendência
e de significado na mediação não estavam previstos para esta pesquisa (Feuerstein,
Feuerstein, Falik & Rand, 2002).
Uma observação que decorre desses últimos dados relatados é a de que, no estudo
de Williams, Goldstein e Minshew (2006), a escolha dos participantes autistas foi feita
sobre o valor de QI. Os autores escolheram autistas com QI maior que 80, justificando que
esses indivíduos cooperariam com a testagem. Isso não foi visto no presente estudo, pois
todos puderam cooperar da forma como lhes foi possível. Os arranjos propostos para o
processo avaliativo e a intencionalidade presente na postura da pesquisadora talvez tenham
garantido a reciprocidade dos participantes, mesmo que a característica principal desse
transtorno seja a dificuldade na interação social recíproca.
Todas essas discussões não encerram dúvidas em relação ao funcionamento
cognitivo desses indivíduos autistas; muito pelo contrário, tiveram o intuito de levantar
questões a esse respeito, de trazer à reflexão aspectos que têm sido discutidos acerca do
autismo, mas não sob esta perspectiva. Todos os temas aqui levantados são muito
complexos, a começar do próprio diagnóstico de autismo, mas espera-se que este trabalho
possa ser visto como um incentivo a outros pesquisadores que também se interessam pelo
tema. Seguem as considerações finais deste estudo.
205
206
207
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os resultados alcançados nesta pesquisa demonstram a riqueza dos dados que
podem ser coletados a partir de uma investigação psicológica básica a respeito da
funcionalidade cognitiva de indivíduos autistas. A avaliação aqui proposta permitiu que
fossem analisados alguns detalhes importantes, tanto da execução dos participantes, quanto
dos arranjos que podem e devem ser feitos num processo avaliativo de clientela especial. A
questão não foi encontrar valores numéricos que enquadrassem os autistas neste ou naquele
rótulo, mas compreender pormenores do processamento da informação desses indivíduos,
valendo-se de instrumentos psicológicos comuns à pratica clínica profissional.
Avaliar autistas tem sido um desafio ao psicólogo, no Brasil, pois, tanto a falta de
instrumentos específicos de investigação desse transtorno (escalas, inventários,
questionários), quanto a insuficiência de diretrizes que orientem mais detalhadamente o
processo avaliativo especial, são empecilhos para o cumprimento dessa tarefa. No entanto,
o conhecimento do funcionamento cognitivo desses indivíduos é fundamenta, para seja
traçado um plano de atendimento eficaz que considere as necessidades especiais de cada
um e oriente pais e educadores no processo de inclusão escolar e social. As diretrizes para
avaliação vêm sendo aos poucos divulgadas, a partir do que já se conhece sobre o
transtorno, por exemplo, garantia de condições especiais do ambiente, preferência por testes
não-verbais, uso de pistas visuais; no entanto, a variabilidade com que os sintomas de
autismo se apresentam no espectro interfere na determinação de quais indivíduos são
testáveis e quais ainda não o são, do ponto de vista cognitivo, porque os aspectos
comportamentais mascaram essa viabilidade.
208
Os participantes desta pesquisa, apesar de apresentarem, em sua maioria,
comprometimento moderado em relação ao autismo, puderam responder de forma
participativa a um conjunto de testes psicológicos neles aplicados. Independentmente do
desempenho de cada um nesses testes, houve possibilidade de se coletar muitos dados sobre
o funcionamento individual e sobre a performance do grupo, mesmo que esse grupo se
constituísse como heterogêneo em relação a uma série de variáveis. Ficou claro que o
importante não era o produto final alcançado, mas o olhar sobre detalhes do processo e as
relações que emergem entre o examinando e a tarefa a ser executada. Não há certo ou
errado em relação aos instrumentos; não há certo ou errado no comportamento dos autistas.
O papel do psicólogo é coordenar esse arranjo de forma a ajustar o material de avaliação às
possibilidades de resposta do examinando e atingir o objetivo de investigar suas forças e
suas fraquezas cognitivas. É importante entender que a determinação do grau de
funcionamento cognitivo dos autistas precisa começar a ser feito a partir de avaliações
psicológicas efetivas, e não de inferências sobre seu comportamento manifesto.
Nesta investigação, tanto a aplicação dos testes, requisitando adaptações
diversificadas às instruções, quanto a própria execução dos autistas, registrada nas tarefas
efetuadas, ofereceram pistas de que ajustes devem ser feitos para a avaliação dessa
clientela, sem comprometer aquilo que se quer avaliar, é claro. Se há uma dificuldade na
interação social, na representação mental e na comunicação, independentemente do grau
que esses comprometimentos ocupem no quadro geral do autista, é possível pensar que a
apreensão da instrução necessitará, muitas vezes de uma adaptação do examinador para que
o examinando a compreenda. Essa flexibilização na aplicação dos testes talvez tenha sido a
maior contribuição desta pesquisa para a área de avaliação psicológica e de avaliação de
autistas.
209
A adaptação feita aqui, no próprio teste TONI-3, foi um exemplo de ajuste
necessário para que dois participantes pudessem mostrar o quanto seriam capazes de
compreender o propósito daquela tarefa, desde que não precisassem apontar a resposta. A
experiência decorrente dessa atitude foi comprovadora das necessidades que surgem no
momento da avaliação, determinando arranjos para que seu propósito seja cumprido. Seria
interessante se outras crianças que não puderam responder ao teste, ou que responderam
com dificuldades na execução da tarefa, fossem (re)avaliadas por meio desse novo formato
do TONI-3, a fim de se verificar se essa condição de resposta poderia ser mais compatível
com suas respectivas características de execução. Um outro aspecto que poderia ser
explorado em pesquisa seria o de mesclar a ordem das pranchas, para verificar se o
raciocínio inicial sobre matrizes 2x2 teria realmente gerado dificuldade de ajuste, dos
participantes, às mudanças subsequentes em proposituras diversificadas.
A análise de erros no TONI-3 também é uma proposta a ser desenvolvida, pois
muito mais conhecimento acerca do raciocínio dos autistas poderá ser adquirido por meio
dessa investigação. Seria possível determinar quais arranjos eles estão fazendo dos
estímulos observados e quais estratégias são utilizadas para resolução dos problemas. Isso
teria implicações, tanto clínicas quanto educacionais, e serviria de estímulo para o
planejamento de programas voltados especificamente ao desenvolvimento de estratégias de
raciocínio para o indivíduo autista.
A riqueza de possibilidades observadas na avaliação da capacidade intelectual
desses indivíduos traz uma reflexão importante sobre os dados que, durante muitos anos,
vieram enquadrando os autistas como deficientes mentais, em sua grande maioria. Foi
possível constatar que uma avaliação realizada sob diretrizes específicas a essa clientela
pode modificar esse panorama conforme, inclusive, já vem sendo registrado em literatura
recente sobre o transtorno. O uso de valores em QI, feito neste estudo, mesmo pautado em
210
normas americanas, teve o intuito de mostrar que os autistas transitam pela curva normal e
não se acumulam nos valores menores que 70. A avaliação assistida interferiu nesses
resultados, mas apenas no sentido de controlar a impulsividade ou direcionar a varredura
utilizada pelos participantes, não enviesando o valor geral sobre o raciocínio deles.
Em relação à escala PDDAS-SQ, reafirma-se a necessidade de estudos de precisão
para esse instrumento e revisão em sua forma de pontuação. Essa escala tem um valor
diferenciado de outras que também avaliam TEA: possibilidade de classificação dos itens
como resolvido. Foi possível observar como alguns sintomas do autismo, presentes em
determinadas idades, não se perpetuaram ao longo do desenvolvimento desses indivíduos.
Essas mudanças nos sintomas não estão mencionadas nos sistemas classificatórios como o
DSM-IV-TR ou o CID 10. Há menção de pequenas nuances, mas não de um perfil
comportamental diferenciado em determinadas etapas do desenvolvimento do autista.
Talvez o uso dessa escala possa contribuir para um olhar menos estático em relação aos
sintomas presentes nesses indivíduos. É preciso seguir com os estudos que conduzam à
futura disponibilização da escala para uso clínico.
Pensando nas implicações educacionais dos dados aqui coletados, algumas questões
merecem reflexão. O fato de as habilidades motoras e perceptomotoras estarem tão
defasadas nesta amostra indica a necessidade de que os programas educacionais voltados
aos autistas possam comportar atividades que estejam dirigidas para o desenvolvimento
desses aspectos. Não basta constatar que essa é uma desabilidade deles; é preciso criar
condições para que eles possam atingir um nível satisfatório de execução grafomotora e
perceptomotora. O mesmo ocorre com o raciocínio complexo visto no teste de inteligência.
Os índices intelectuais foram mais altos em crianças menores, sendo preciso refletir, pois,
sobre as ações clínicas e educacionais que estão sendo oferecidas ao indivíduo autista.
Provavelmente essas ações não estão garantindo que o potencial manifestado por eles
211
acompanhe seu desenvolvimento acadêmico, ou seja, faz-se necessário rever o processo de
inclusão dessa população especial. O ambiente precisa favorecer as oportunidades de
adaptação desses indivíduos ao meio social, não apenas cuidando dos aspectos
comportamentais comprometidos, ou mantendo-os junto a grupos sociais típicos, mas
também estimulando o seu raciocínio, sua flexibilidade e autonomia, visando a sua
funcionalidade futura.
Um outro item investigado que merece consideração é o fator tempo. Ficou
confirmado que este é um aspecto importante a ser considerado nas tarefas avaliativas
oferecidas aos autistas, mas deve ser também estendido às intervenções. Impor tempo de
execução em atividade solicitada a um indivíduo com autismo pode ser um empecilho a sua
execução. A organização da atividade com direcionamento dos passos a serem seguidos
facilitarão a apreensão do conteúdo e a emissão de resposta à tarefa.
Por fim, é preciso considerar que em relação às teorias da inteligência, há muito
ainda a ser explorado na contribuição que elas podem oferecer à compreensão do
comportamento do autista, em tarefas que exigem funções cognitivas complexas. Não há
uma em especial que explique melhor o perfil intelectual desses indivíduos, mas as duas
escolhidas para subsidiar os achados desta pesquisa fornecem alguma possibilidade de
exploração do enigma que faz com que eles apresentem habilidades cognitivas evidentes, e
que, no entanto, não consigam colocar essas habilidades a serviço de uma boa
adaptabilidade ao mundo. Um estudo mais aprofundado a respeito seria fundamental para
que suas habilidades fossem reconhecidas, mas sem desconsideração a sua patologia.
Este trabalho pretendeu ampliar a compreensão do autismo em áreas consideradas
vulneráveis, ou atípicas, nesse transtorno, como a atenção, a percepção e a inteligência,
buscando levantar pistas para a investigação mais detalhada desses aspectos. Cada fator
212
observado merece um estudo mais aprofundado, o que permite pensar que um espectro de
possibilidades de pesquisa pode e deve ser explorado nessa área.
213
214
215
REFERÊNCIAS
Aguiar, C. L. C. (2005). A tradução da ADI-R, Entrevista Diagnóstica de Autismo
Revisada, “Autism Diagnostic Interview – Revised”. Dissertação de Mestrado em
Distúrbios do Desenvolvimento. Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo.
Akshoomoff, N. (2005). The cerebellum and control of attention in autism. Em D. Riva &
I. Rapin (editoras). Autistic Spectrum Disorders. Montrouge: John Libbey Eurotext.
Alfonso, V. C., Flanagan, D. P. & Radwan, S. (2005). The Impact of the Cattell – Horn –
Carroll: Theory on Test Development and Interpretation of Cognitive and Academic
Abilities. Em D. P. Flanagan & P. L. Harrison (editores). Contemporary Intellectual
Assessment: Theories, tests, and issues (pp.185-202). New York / London: The Guilford
Press.
Almeida, L. S. (2002). As aptidões na definição e avaliação da inteligência: O concurso da
análise factorial. Paidéia, 12(23), 5-17.
Almeida. L.S., Guisande, M. A., Primi, R. & Ferreira A. (2008). Construto e medida da
inteligência: contributos da abordagem fatorial. Em A. Candeias; L. Almeida; A. Roazzi; R
Primi. (Orgs.). Inteligência. Definição e medida na confluência de múltiplas concepções.
(pp. 49-80). São Paulo: Casa do Psicólogo.
Almeida. L.S.& Primi. R. (2010) Considerações em torno de medida da inteligência. Em L.
Pasquali Instrumentação psicológica, fundamentos e práticas (pp. 386-410). Porto Alegre:
Artmed.
Almeida, L., Roazzi, A. & Spinillo, A. (1989). O estudo da inteligência: Divergências,
convergências e limitações dos modelos. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 5(2) 217-230.
Anastasi, A. (1977). Testes Psicológicos. São Paulo: EPU.
Anderson, M. (2001). Annotation: Conceptions of Intelligence. Journal of Child
Psychology and Psychiatry. 42(3), 287-298.
Antonucci, R. (1993). Notas sobre alguns aspectos controvertidos do conceito de autismo
infantil. Temas Sobre Desenvolvimento, 2(11), 14-15.
APA (2002). Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais DSM-IV-TR. Trad.
Cláudia Dornelles. 4. ed. revisada. Porto Alegre: Artes Médicas.
Araújo, C. A. (2000). O Processo de Individuação no Autismo. São Paulo: Memnon.
Arnheim, R. (1980). Arte e percepção visual: uma psicologia da visão criadora. São Paulo:
Pioneira/EDUSP.
216
Assumpção Jr., F. B; Kuczynski, E.; Gabriel, M.R. & Rocca, C. C. (1999). Escala de
avaliação de traços autísticos (ATA): validade e confiabilidade de uma escala para a
detecção de condutas autísticas. Arquivos de Neuropsiquiatria, 57(1), 23-29.
Assumpção Jr., F. B., Sprovieri, M. H., Kuczynski, E. & Farinha, V. (1999).
Reconhecimento facial e autismo. Arquivos de Neuro-Psiquiatria, 57(4), 944-949.
Baldini, S. M. & Assumpção Jr., F. B. (2002). Teoria da mente: comparação entre autistas
e
deficientes
mentais.
[On-line].
Disponível
em:<http://www.apaag.hpg.ig.com.br/teoria.html>.
Barbosa, A. C. C. (2007). Busca por evidências de validade do teste de inteligência nãoverbal TONI-3 para escolares surdos. Dissertação de Mestrado em Distúrbios do
Desenvolvimento. Universidade Presbiteriana Mackenzie. São Paulo.
Baron-Cohen, S. (2004). Diferença Essencial: A verdade sobre o cérebro de homens e
mulheres. Rio de Janeiro: Objetiva.
______. (2008). Autism and Asperger Syndrome. New York: Oxford.
Baron-Cohen S. & Bolton, P. (2003). Autismo: Una guía para padres. Madrid: Alianza
Editorial.
Barthold, C. H. & Egel, A. L. (2001). Stimulus overseletivity and generative language
instruction for students with autism: An issue that needs to be revisited. The Behaviour
Analyst Today.
Bertone, A., Mottron, L., Jelenic, P. & Faubert, J. (2005). Enhanced and diminished visuospatial information processing in autism depends on stimulus complexity. Brain, 128, 24302441.
Bölte, S. & Poustka, F. (2004). Comparing the intelligence profiles of savant and nonsavant
individuals with autistic disorder. Intelligence, 32, 121-131.
Bosa, C. A. (2001). As relações entre autismo, comportamento social e função executiva.
Psicologia: Reflexão e Crítica, 14(2), 281-287.
Bosa, C. A. (2002). Autismo: atuais interpretações para antigas observações. Em C. R.
Baptista, C. A. Bosa. Autismo e Educação: reflexões e propostas de intervenção. Porto
Alegre: Artmed.
Brannigan, G. G. & Decker, S. L. (2003). Bender-Gestalt II Examiner’s Manual. Itasca:
Riverside Publishing.
Brickenkamp, R. (2000). Teste d2: Atenção concentrada. Manual. São Paulo: Centro Editor
de Testes e Pesquisas em Psicologia.
217
Brown, L. (2003). Test of Nonverbal Inteligence. Em McCALLUM, R.S. Handbook of
nonverbal assessment. (pp. 191-222). New York: Library of Congress Cataloging in
Publication Data.
Brown, L., Sherbenou, R. J. & Johnsen, S. K. (2006). TONI-3 (Forma A): Teste de
Inteligência Não-verbal: Uma medida de habilidade cognitiva independente da linguagem
– Manual do Examinador. São Paulo: Vetor: Austin / Pro-ed.
Cabarcos, J. L. & Simarro, L. (2002). Función Ejecutiva y Autismo. [On-line]. Disponível
em: <http://www.autismo.com/acripts/articulo/smuestra:idc?n=fejecutivas>.
Carneiro, E. G. P. & Ferreira, I. C. N. (1992). Avaliação da inteligência nas pesquisas
brasileiras segundo diferentes modelos: A situação atual. Arquivos Brasileiros de
Psicologia, 44(3/4), 157-193.
Carroll, J. B. (2005). The Three-Stratum Theory of Cognitive Abilities. In D. P. Flanagan
& P. L. Harrison (editores). Contemporary Intellectual Assessment: Theories, tests, and
issues. New York/London: The Guilford Press.
Cavalheira, C., Vergani, N. & Brunoni, D. (2004). Genética do Autismo. Revista Brasileira
de Psiquiatria. São Paulo, 26(4), 270-272.
CEGH, (2009). Projeto Genoma estuda genes relacionados ao autismo. Boletim da Agência
Brasil.
Divulgação
Científica.
[On-line].
Disponível:
<http://genoma.ib.usp.br/pesquisas/doencas_autismo.php>
Conselho Federal de Psicologia (CFP). Resoluções. [On line]. Disponível em:
<http://www.pol.org.br/legislacao/leg_resolucoes.cfm>.
Courchesne, Townsend, Akshoomoff, Saitoh, Yeung-Courchesne, Lincoln, James, Haas,
Schreibman e Lau (1994). Impairment in Shifting Attention in Autistic and Cerebellar
Patients. Behavioral Neuroscience, 108(5), 848-865.
Cruz, V. O. (2008). Cognitive Assessment System e o Paradigma da Avaliação Dinâmica.
Em A. Candeias; L. Almeida; A. Roazzi; R Primi. (Orgs.). Inteligência: definição e medida
na confluência de múltiplas concepções ( pp. 395-427). São Paulo: Casa do Psicólogo.
Dancey, C. P. & Reidy, J. (2006). Estatística sem matemática para psicologia. Porto
Alegre: Artmed.
Dakin, S. & Frith, U. (2005). Vagaries of visual perception in autism. Neuron, 48, 497-507.
Dalgalarrondo, P. (2008). Psicopatologia e semiologia dos transtornos mentais. Porto
Alegre: Artmed.
Dias, M. G. B. B. (1993). O desenvolvimento do conhecimento da criança sobre a mente.
Psicologia: Teoria e Pesquisa, 9(3), 587-600.
218
Dias, M. G. B. B., Roazzi, A., O`Brien, D. & Braine, M. D. S. (2002). A lógica da
suposição e a compreensão do faz-de-conta por parte das crianças. Psicologia: Reflexão e
Crítica, 15(1), 27-34.
Diez- Cuervo, A. & Martos, J. (1989). Definición y Etiologia del autismo. Extraído del
libro: Interventión Educativa en Autismo Infantil (Tema 1). Ministério da Educación y
Ciencia.
[On
line].
Disponível
em:
<http://www.autismo.com/acripts/articulo/smuestra.idc?n=mescld>.
Domingues, S. F. S. & Maluf, M. R.. (2008). Compreendendo estados mentais:
procedimentos de pesquisa a partir da tarefa original de crença falsa. Em T. M. Sperb & M.
R. Maluf. Desenvolvimento Sociocognitivo. São Paulo: Vetor.
Edelson, M. G. (2005). A car goes in the garage like a can of peas goes in the refrigerator:
Do deficits in real-world knowledge affect the assessment of intelligence in individuals
with autism? Focus on autism and other developmental disabilities, 20(1), 2-9.
Edelson, M. G., Schubert, D. T. & Edelson, S.M. (1998). Factors predicting intelligence
scores on the TONI in individuals with autism. Focus on autism and other developmental
disabilities, 13(1), 17-26.
Edelson, M. G., Edelson, S. M. & Jung, S. (1998). Assessing the intelligence of individuals
with autism: a cross-cultural replication of the usefulness of the TONI. Focus on autism
and other developmental disabilities, 13(4), 221-227.
Eysenck, M. W. & Keane, M. T. (1994). Psicologia Cognitiva: um manual introdutório.
Porto Alegre: Artes Médicas.
FAPESP (2009). Gene do autismo é descoberto. Boletim da Agência Fapesp. Divulgação
Científica.
[On-line],
Disponível:
<http://www.agencia.fapesp.br/materia/10421/divulgacao-cientifica/gene-do-autismo-edescoberto.htm>
Feldman, C. (2006). Modificabilidade Cognitiva: O Olhar Psicopedagógico. Em C. B.
Mello; C. M. Miranda; M. Muskat, Neuropsicologia do Desenvolvimento. São Paulo:
Memnon.
Feuerstein, Falik & Rand, (2002). The Dynamic Assessment of Cognitive modifiability.
Jerusalem: The International Center for the Enhancement of Learning Potential.
Filho, G. J. (2000). Gestalt do objeto: sistemas de leitura visual da forma (pp.19-37). São
Paulo: Escrituras.
Flores-Mendoza, C. E. Inteligência Geral. Em Malloy-Diniz, F. L, Fuentes, D., Mattos, P.,
Abreu, N. (2010). Avaliação Neuropsicológica (pp. 58-66). Porto Alegre: Artmed.
Flores-Mendoza, C. E. & Nascimento, E. (2001). Inteligência: O construto melhor
investigado em psicologia. Boletim de Psicologia, 51(114), 37-64.
219
Frith, U. (2003). Autism: Explaining the enigma. Malden: Blackwell.
Gadia, C. A., Tuchman, R. & Rotta, N. T. (2004). Autismo e doenças invasivas de
desenvolvimento. Jornal de Pediatria, 80(supl2), 83-94.
Gallese, V. (2007). Commentary on “Toward a neuroscience of empathy: Integrating
affective and cognitive perspectives”. Neuropsychoanalysis, 9(2), 146-151.
Gallese, V., Keysers, C. & Rizzolatti, G. (2004). A unifying view of the basis of social
cognition. Cognitive Sciences, 8(9), 398-403.
Gauderer, C. (1997). Autismo e outros atrasos do desenvolvimento: Guia prático para pais
e professores. Rio de Janeiro: Revinter.
Gazzaniga. M. S. & Heatherton, T. F. (2005). Ciência psicológica: Mente, cérebro e
comportamento. Porto Alegre: Artmed.
Gazzaniga, M. S., Ivry, R. B. & Mangun, G. R. (2006). Neurociência cognitiva: A biologia
da mente. Porto Alegre: Artmed.
Gilberg, C. (2005). Transtornos de Espectro do Autismo. [On-line]. Disponível em:
<http://www.caleidoscopio-olhares.org/artigos/Palestra%20Gillberg%2020051010.pdf>.
Gikovate, C. G. (1999). Problemas Sensoriais e de Atenção no Autismo: uma Linha de
Investigação. Dissertação de Mestrado Psicologia, Pontífica Universidade Católica do Rio
de Janeiro. Rio de Janeiro.
Goldstein, G., Johnson, C. R. & Minshew, N. J. (2001). Attentional process in autism.
Journal of Autism and Developmental Disorders, 31(4), 433-440.
Goldstein, S. & Ozonoff, S. (2009). Historical Perspective and Overview. Em S. Goldstein,
J. A. Naglieri & S. Ozonoff. Assessment of Autism Spectrum Disorders (pp. ) New York /
London: The Guilford Press.
Grandin, T. (1996). Thinking in pictures: And other reports from my life with autism. New
York: Doubleday.
Grossmann, R. (2004). Pervasive Developmental Disorder Assessment Scale / Screening
Questionnaire. [On-line]. Disponível em: <http://www.childbrain.com/pddassess.html>.
Happé, F. (1997). El autismo: entender la mente y componer las piezas. [On-line].
Disponível em: <http://www.autismo.com/scripts/articulo/smuestra.idc?n=happe>.
Happé, F., Frith, U. (1991). Is Autism a Pervasive Developmental Disorder? Journal of
Child Psychology and Psychiatry, 32(7), 1167-1168.
Horn, J. L. & Blankson, N. (2005). Foundations for better understanding of cognitive
abilities. Em D. P. Flanagan & P. L. Harrison (editores). Contemporary Intellectual
Assessment: Theories, tests, and issues. New York / London: The Guilford Press.
220
Iacoboni, M., Molnar-Szakacs, I. M., Gallese, V., Buccino, G. & Mazziotta, J. C. (2005).
Grasping the intentions of others with one’s own mirror neuron system. PLoS Biology,
3(3): 0001-0007.
Ibarra, M. M. & Pereira, M. I. (1999). Evaluación Psicológica Integral en el Autismo. [Online].
Disponível
em:
<http://www.autismo.com/acripts/articulo/smuestra.idc?n=marianela>.
Institute for Applied Psychometrics (2002). Datasets analyzed by J. B. Carroll to be
included
in
C-HCA
Project.
[On-line].
Disponível
em:
<
http://www.iapsych.com/chchcacds.htm >.
Institute for Applied Psychometrics (2004). “Potential” new datasets identified for possible
analyses
in
HCA
Project.
[On-line].
Disponível
em:
<http://www.iapsych.com/chchcapds.htm>.
Jorge, L. M. (2003). Instrumentos de Avaliação de Autistas: Revisão de literatura.
Dissertação de Mestrado. Instituto de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de
Campinas, Campinas, São Paulo.
Jou, G. I. & Sperb, T. M. (1999). Teoria da Mente: diferentes abordagens. Psicologia:
Reflexão e Crítica, 12(2), 287-306.
Kamphaus, Winsor, Rowe e Kim (2005). A history of intelligence test interpretation. Em D.
P. Flanagan; P. L. Harrison. Contemporary Intellectual Assessment, New York / London:
The Guilford Press.
Kanner, L. (1971). Autistic Disturbances of Affective Contact. In: J. G. Howells. Modern
Perspectives in International Child Psychiatry. New York: Brunner/Mazel.
Klinger, L. G., O’Kelley, S. E. & Mussey, J. L. (2009). Assessment of Intellectual
Functioning in Autism Spectrum Disorders. In S. Goldstein, J. A. Naglieri & S. Ozonoff.
Assessment of Autism Spectrum Disorders. New York / London: The Guilford Press.
Klin, A., Chawarska, K., Rubin, E. & Volkmar, F. (2006). Avaliação clínica de crianças
com risco de autismo. Educação, 1(58), 255-297.
Kohler, E., Keysers, C., Umiltà, M. A., Fogassi, L., Gallese, V. & Rizzolatti, G. (2002).
Hearing sounds, understanding actions: Action representation in mirror neurons. Science,
297, 846-848.
Lahaie, A., Mottron, L., Berthiaume, C., Jemel, B., Arguin, M. & Saumier, D. (2006). Face
perception in high-functioning autistic adults: Evidence for superior processing of face
parts, not for a configural face-processing deficit. Neuropsychology, 20(1), 30-41.
Lemos, G. C. E. M. (2006). Habilidades cognitivas e rendimento escolar entre o 5º e 12º
ano de escolaridade. Tese de Doutorado. Departamento de Psicologia da Universidade do
Minho, Portugal.
221
Lezak, M. D., Howieson, D. B. & Loring, D. W. (2004). Neuropsychological Assessment.
New York: Oxford University Press.
Lima, R. F. (2005). Compreendendo os mecanismos atencionais. Ciência & Cognição,
6,13-122.
Linhares, M. B. M. (1995). Avaliação assistida: Fundamentos, definição, características e
implicações para a avaliação psicológica. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 11, 23-31.
Linhares, M. B. M., Escolano, A. C. M. & Enumo, A. R. F. (2006). Avaliação Assistida:
Fundamentos, Procedimentos e Aplicabilidade. São Paulo: Casa do Psicólogo.
Luria (1979). El cérebro em accion. Barcelona: Fontanella.
Machado, M. G., Oliveira, H. A., Cipolotti, R., Santos, C. A. G. M., Oliveira, E. F., Donald,
R. M. & Krauss, M. P. O. (2003). Alterações anátomo-funcionais do sistema nervoso
central no transtorno autístico. Arquivos de Neuropsiquiatria, 61(4), 957-961.
Mader. M. J., Thais, M. E. R. O. & Ferreira, M. G. R. (2004) Inteligência: um conceito
amplo. Em V. M. Andrade, F. H. Santos, O. F. A Bueno. Neuropsicologia Hoje, (pp.6176). São Paulo: Artes Médicas.
Martins, A. S. G., Preussler, C. M. & Zavaschi, M. L. S. (2002). A psiquiatria da infância e
da adolescência e o autismo. Em C. R. Baptista & C. A. Bosa. Autismo e Educação:
reflexões e propostas de intervenção. (pp. 41-50) Porto Alegre: Artmed.
Martos, J. (2002). Diagnóstico y evaluación in autismo. I Simposio internacional sobre
detectión temprana em autismo (ALBORAN). [On-line]. Disponível em: <http://psicologiaonline.com/alboran/autismo/diagnostico.htm>.
Mayers, S. D. & Calhoun, S. L. (2003). Analysis of WISC-III, Stanford-Binet:IV, and
Academic Achievement Test Scores in children with autism. Journal of Autism
Developmental Disorders, 33(3), 329-341.
McCleery, J. P., Allman, E., Carver, L. J. & Dobkins, K. R. (2007). Abnormal
magnocellular pathway visual processing in infants at risk for autism. Biological
Psychiatry, 62(9), 1007-1014.
McGrew, K. S. (2005). The Cattell-Horn-Carroll Theory of Cognitive Abilities: Past,
Present, and Future. Em D. P. Flanagan & P. L. Harrison (editores). Contemporary
Intellectual Assessment: Theories, tests, and issues. New York / London: The Guilford
Press.
______. (2009) CHC Theory and the Human Cognitive Abilities Project: Standing on the
Shoulders of the giants of psychometric intelligence research. Intelligence. 37, 1-10.
222
Menezes, C. G. L. & Perissinoto, J. (2008). Habilidade de atenção compartilhada em
sujeitos com transtornos do espectro autístico. Pró-Fono Revista de Atualização Científica.
São Paulo, 20(4), 273-278.
Mercadante, M. T., Gaag, R. J. V. der & Schwartzman, J. S. (2006). Transtornos Invasivos
do Desenvolvimento não-autísticos: Síndrome de Rett, Transtorno Desintegrativo da
Infância e Transtornos Invasivos do Desenvolvimento Sem Outra Especificação. Revista
Brasileira de Psiquiatria, 28(supl), 12-20.
Milne, E. (2005). Motion Perception and autistic spectrum disorder: A review. Current
Psychology of Cognition, 23(1-2), 3-33.
Minshew, N. J., Turner, C. A. & Goldstein, G. (2005). The application of short forms of de
Wechsler intelligence scales in adults and children with high functioning autism. Journal of
Autism Developmental Disorders, 35 (1), 45-52.
Montiel, J. M. & Capovilla, A. G. S. (2007). Avaliação da atenção: Teste de Atenção por
Cancelamento. Em A. G. S. Capovilla & F. C. Capovilla. Avaliação Neuropsicológica. São
Paulo: Memnon.
Morato, P. F. S. & Fernandes, F. D. M. (2009). Correlatos entre o Perfil Comunicativo e
Adaptação Sócio – Comunicativa no espectro Autítisco. Revista CEFAC, 11(2), 227-239.
Mottron, L. (2006). L’autisme: Une autre intelligence. Sprimond: Mardaga.
Mottron, L., Burack, J. A., Iarocci, G., Belleville, S. & Enns, J. T. (2003). Locally oriented
perception with intact global processing among adolescents with high-functioning autism:
Evidence from multiple paradigms. Journal of Child Psychology and Psychiatry, 44(6),
904-913.
Naglieri, J. A. & Chambers, K. M. (2009). Psychometric issues and current scales for
assessing Autism Spectrum Disorders. Em S. Goldstein, J. A. Naglieri & S. Ozonoff.
Assessment of Austism Spectrum Disorders (pp. 55-90). New York / London: The Guilford
Press.
Nahas, T. R. & Xavier, G. F. (2004). Atenção. Em V. M. Andrade, F. H. dos Santos (Orgs.)
Neuropsicologia hoje (pp. 77-100) São Paulo: Artes Médicas.
OMS (1993). Classificação de Transtornos Mentais e de Comportamento da CID-10:
Descrições Clínicas e Diretrizes Diagnósticas – Trad. Dorgival Caetano. Porto Alegre:
Artes Médicas.
Orsati, F. T., Schwartzman, Brunoni, Mecca e Macedo (2008). Novas Possibilidades na
Avaliação Neuropsicológica dos Transtornos Invasivos do Desenvolvimento: análise dos
Movimentos Oculares. Avaliação psicológica, 7(3), 281-290.
Ostrosky-Solís, F. & Gutiérrez, A. L. (2006). Reabilitação neuropsicológica da atenção e da
memória. Em J. Abrisqueta-Gomez, F. L. dos Santos. Reabilitação Neuropsicológica: Da
teoria à prática (pp. 227- 240). São Paulo: Artes Médicas.
223
Pacanaro, S. V. (2007). Avaliação de habilidades cognitivas e viso-motoras em pessoas
com Síndrome de Down. Dissertação de Mestrado, Universidade São Francisco. Itatiba, São
Paulo.
Pacanaro, S. V., Santos, A. A. A. & Suehiro, A. C. B. (2008). Avaliação das Habilidades
Cognitiva e Viso-motora em Pessoas com Síndrome de Down. Revista Brasileira de
Educação Especial, 14(2). 311-326.
Pasquali, L. (2010). Histórico dos instrumentos psicológicos. Em L. Pasquali.
Instrumentação Psicológica, fundamentos e práticas (pp. 11-47). Porto Alegre: Artmed.
Pessoa, L., Kastner, S. & Ungerleider, L. G. (2003). Neuroimaging studies of attention:
From modulation of sensory processing to top-down control. The Journal of Neuroscience,
23(10), 3990-3998.
Pereira, A. M. (2007). Autismo Infantil: Tradução e validação da CARS (Childhood Autism
Rating Scale) para uso no Brasil. Dissertação de Mestrado em Ciências Médicas,
Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, Rio Grande do Sul.
Primi, R. (2002). Avanços na concepção psicométrica da inteligência. Em F. C. Capovilla,
(org.). Neuropsicologia e aprendizagem: uma abordagem multidisciplinar (pp. 77-86). São
Paulo: Sociedade Brasileira de Neuropsicologia.
______. (2003). Inteligência: avanços nos modelos teóricos e nos instrumentos de medida.
Avaliação Psicológica, 2(1), 67-77.
Ramachandran, V. S. & Oberman, L. M. (2006). Espelhos quebrados: Uma teoria sobre o
autismo. Scientific American, 55, 53-59.
Ramus, F. (2005). Motion perception déficit: Risk factor or non-specific marker for neurodevelopmental disorders? Current Psychology of Cognition, 23(1-2), 180-188.
Rapin, I. (2009). Responsabilidade Sensório-perceptiva Atípica. Em I. Rapin, F. R.
Tuchman Autismo: abordagem neurobiological (pp. 218-248). Porto Alegre: Artmed.
Rapin, I. & Tuchman, R. F. (2009) Onde Estamos: Visão Geral e Definições. Em ______.
Autismo: abordagem neurobiológica (pp. 17-34). Porto Alegre: Artmed.
Ring, H. A., Baron-Cohen, S., Wheelwright, S., Williams, S. C. R., Brammer, M., Andrew,
C. & Bullmore, E. T. (1999). Cerebral correlates of preserved cognitive skills in autism: A
functional MRI study of embedded figures task performance. Brain, 122, 1305-1315.
Rizzolatti, G., Fogassi, L. & Gallese, V. (2006). Mirrors in the mind. Scientific American,
295(5), 54-61.
Roazzi, A. & Santana, S. M. (1999). Teoria da mente: efeito da idade, do sexo e do uso de
atores animados e inanimados na inferência de estados mentais. Psicologia: Reflexão e
Crítica, 12(2) 1-20.
224
Rocha, P. S. (1997). Autismos. São Paulo: Escuta.
Sampedro T., M. E. (2006). Escalas de evaluación em autismo. Acta Neurológica
Colombiana, 22, 106-111.
Santos, A. A. A. & Jorge, L. M. (2008). Teste de bender com disléxicos: Comparação de
dois sistemas de pontuação. PsicoUSF, 12(1), 13-22.
Santos, A. A. A, Noronha, A. P. P & Sisto, F.F. (2005). Teste de inteligência R1-Forma B e
G-36: Evidência de validade convergente. Estudos de Psicologia, 10(2), 191-197.
Schelini, P. W. (2002). Bateria Multidimensional de Inteligência Infantil: Proposta de
instrumento. Tese de Doutorado. Instituto de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica
de Campinas, Campinas. S.P.
Schelini, P. W. & Wechsler, S. M. (2006). Estudo da estrutura fatorial da Bateria
Multidimensional de Inteligência Infantil. Estudos de Psicologia, 23, 105-112.
Scheuer, C. I. & Andrade, R. V. (2007). Teorias Cognitivas do Autismo. Em F. B.
Assumpção Jr. & E. Kuczynski. Autismo Infantil: Novas tendências e perspectivas (pp. 8190). São Paulo: Atheneu.
Schwartzman, J. S. (2003). Autismo Infantil. São Paulo: Memnon.
Shah, A. & Frith, U. (1993). Why do autistic individuals show superior performance on the
block design task? Journal of Child Psychogogy and Psychiatry, 34(8), 1351-1364.
Sigman, M. & Capps, L. (2000). Niños y niñas autistas. Madrid: Morata.
Sisto, F. F., Bartholomeu, D. Rueda, F. J. M., Santos, A. A. A. & Noronha, A. P. P (2008).
Relações entre os Testes de Bender e Matrizes Progressivas Coloridas de Raven na
Avaliação da Inteligência. Interação em Psicologia, 12 (1), 11-19.
Sisto, F. F., Noronha, A. P. P. & Santos, A. A. A. (2005). Teste Gestáltico Visomotor de
Bender: Sistema de Pontuação Gradual (B-SPG). São Paulo: Vetor.
Souza, A. M. M., Desprebiteris, L. & Machado, O. T. M. (2004). A Medicação como
Princípio Educacional: Bases Teóricas das Abordagens de Reuven Feuerstein. São Paulo:
Senac São Paulo.
Spencer, J., O’Brien, J., Riggs, K., Braddick, O., Atkinson, J. & Wattam-Bell, J. (2000).
Motion processing in autism: evidence for a dorsal stream deficiency. NeuroReport, 11(12),
2765-2767.
Sperb, T. M. & Carraro, L. (2008). A relação entre o faz-de-conta e a teoria da mente:
Controvérsias teóricas e empíricas. Em T. M. Sperb & M. R. Maluf (Org.).
Desenvolvimento Sociocognitivo (pp. 163-190). São Paulo: Vetor.
225
Sperb, T. M. & Maluf, M. R. (2008). Desenvolvimento Sociocognitivo. São Paulo: Vetor.
Sternberg, R. J. (1992). As capacidades intelectuais humanas: Uma abordagem em
processamento de informações. Porto Alegre: Artes Médicas.
______. (2000). Psicologia Cognitiva. Porto Alegre: Artmed.
______. (2005). The Triarchic Theory of Successful Intelligence. Em D. P. Flanagan & P.
L. Harrison (editores). Contemporary Intellectual Assessment: Theories, tests, and issues.
New York / London: The Guilford Press.
______. (2008). Psicologia Cognitiva. Porto Alegre: Artmed.
Suehiro, A. C. B & Santos, A. A. A. (2006). Evidência de validade de critério do Bender Sistema de Pontuação Gradual. Interação em Psicologia, 10(2), 217-224.
Tamanaha, A. C., Chiari, Perissinoto & Pedromônico, (2006). A atividade lúdica no
autismo infantil. Distúrbios da Comunicação, 18(3), 307-312.
Trevarthen, C., Aitken, K., Papouli, D. & Robarts, J. (1998). Children with autism:
Diagnosis and interventions to meet their needs. Philadelphia: JKP
Trevathan, E. & Shinnar, S. (2009). Epidemiologia dos transtornos do espectro autista. Em
R. Tuchman, I. Rapin. Autismo (pp. 35-53). Porto Alegre: Artmed.
Tulimoschi, M. E. G. F. (2003). O autismo no estado de São Paulo: O que fazem as Apaes?
Temas sobre Desenvolvimento, 12(71), 36-42.
Volker, Lopata, Vujnovic, Smerbeck, Toomey, Rodgers, Schiavo & Thomeer (2009).
Comparison of the Bender Gestalt-II and VMI-V in Samples of Typical Children and
Children with High-functioning Autism Spectrum Disorders. Journal of Psychoeducational
Assessment Online First, 28, 1-14.
Wasserman, J. D. & Lawhorn, R. M. (2003). Nonverbal Neuropsychological Assessment.
Em Mccallum, R. S. Handbook of nonverbal assessment. New York: Library of Congress
Cataloging in Publication, 15, 315- 360.
Wasserman, J. D. & Tulsky, D. S. (2005). A History of intelligence assessment. Em D. P.
Flanagan & P. L. Harrison (editores). Contemporary Intellectual Assessment: Theories,
tests, and issues. New York / London: The Guilford Press.
Williams, D. L., Goldstein, G. & Minshew, N. J. (2006). Neuropsychologic Functioning in
Children with Autism: Further evidence for disordered complex information-processing.
Child Neuropychology, 12(4-5), 279-298.
Wing, L. (1981). The Autistic Spectrum: A parent’s guide to understanding and helping
your child. Berkeley, CA: Ulysses Press.
226
______.(1997). O contínuo das características autistas. Em C. Gauderer. Autismo e outros
atrasos do desenvolvimento (pp. 111-119). Rio de Janeiro: Revinter.
______.(2001). The Autistic Spectrum: A parent’s guide to understanding and helping your
child. Berkeley, CA: Ulysses Press.
______.(2002). The Autistic Spectrum: A guide for parents and professionals. London:
Robinson.
Wing, L., Gould, J. (1979). Severe Impairments of social interaction and associated
abnormalities in children: Epidemiology and classification. Journal of Autism and
Developmental Disorders, 34(1), 11- 29.
Yu, C. T. & Martin, G. L. (2003) Tangibles, pictures, and verbal descriptions: Which
should be used in choice presentations? Journal of Developmental Disabilities, 10(1), 137140.
Zuddas, A. Iacolina, M. G., Anchisi, L., Fois, A., Melis, G. L. & DiMartino, A. (2005).
PDD-associated behavioural disorders: Neurobiology and therapeutic strategies. Em D.
Riva & I. Rapin Autistic Spectrum Disorders (pp. 99-114). Milan: John Libbey Eurotext.
227
ANEXO A
CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS PARA O TRANSTORNO AUTISTA
(DSM-IV-TR – APA, 2002)
A. Um total de seis (ou mais) itens de (1), (2) e (3), com pelo menos dois de (1), um de (2)
e um de (3):
(1) Comprometimento qualitativo na interação social, manifestado por pelo menos
dois dos seguintes aspectos:
(a) comprometimento acentuado no uso de múltiplos comportamentos nãoverbais, tais como contato visual direto, expressão facial, posturas corporais
e gestos para regular a interação social.
(b) fracasso em desenvolver relacionamentos com seus pares apropriados ao
nível de desenvolvimento.
(c) ausência de tentativas espontâneas de compartilhar prazer, interesses ou
realizações com outras pessoas (por ex., não mostrar, trazer ou apontar
objetos de interesse).
(d) ausência de reciprocidade social ou emocional.
(2) Comprometimento qualitativo da comunicação, manifestado por pelo menos um
dos seguintes aspectos:
(a) atraso ou ausência total de desenvolvimento da linguagem falada (não
acompanhado por uma tentativa de compensar por meio de modos
alternativos de comunicação, tais como gestos ou mímica).
(b) em indivíduos com fala adequada, acentuado comprometimento na
capacidade de iniciar ou manter uma conversa.
(c) uso estereotipado e repetitivo da linguagem ou linguagem idiossincrática.
(d) ausência de jogos ou brincadeiras de imitação social variados e
espontâneos próprios do nível de desenvolvimento.
(3) Padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses e atividades,
manifestados por pelo menos um dos seguintes aspectos:
(a) preocupação insistente com um ou mais aspectos estereotipados e
restritos de interesse, anormais em intensidade ou foco.
(b) adesão aparentemente inflexível a rotinas ou rituais específicos e nãofuncionais.
(c) maneirismos motores estereotipados e repetitivos (por ex., agitar ou
torcer mãos ou dedos, ou movimentos complexos de todo o corpo).
(d) preocupação persistente com partes de objetos.
B. Atrasos ou funcionamento anormal em pelo menos uma das seguintes áreas, com início
antes dos 3 anos de idade: (1) interação social, (2) linguagem para fins de comunicação
social, ou (3) jogos imaginativos ou simbólicos.
C. A perturbação não é melhor explicada por Transtorno de Rett ou Transtorno
Desintegrativo da Infância.
228
ANEXO B
CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS PARA O TRANSTORNO DE ASPERGER
(DSM-IV-TR – APA, 2002)
A. Comprometimento qualitativo da interação social, manifestado por pelo menos dois dos
seguintes quesitos:
(1) Comprometimento acentuado no uso de múltiplos comportamentos não-verbais, tais
como contato visual direto, expressão facial, posturas corporais e gestos para regular a
interação social.
(2) fracasso em desenvolver relacionamentos apropriados ao nível de desenvolvimento com
seus pares.
(3) ausência de tentativas espontâneas de compartilhar prazer, interesses ou realizações com
outras pessoas (p. ex., não mostrar, trazer ou apontar objetos de interesse a outras
pessoas).
(4) ausência de reciprocidade social ou emocional.
B. Padrões restritos, repetitivos e estereotipados de comportamento, interesses e atividades,
manifestados por pelo menos um dos seguintes quesitos:
(1) insistente preocupação com um ou mais padrões estereotipados e restritos de interesses,
anormal em intensidade ou foco.
(2) adesão aparentemente inflexível a rotinas e rituais específicos e não funcionais.
(3) maneirismos motores estereotipados e repetitivos (p. ex., dar pancadinhas ou torcer as
mãos ou os dedos, ou movimentos complexos de todo o corpo).
(4) insistente preocupação com partes de objetos.
C. A perturbação causa comprometimento clinicamente importante nas áreas social e
ocupacional ou outras áreas importantes de funcionamento.
D. Não existe um atraso geral clinicamente importante na linguagem (p. ex., utiliza
palavras isoladas aos 2 anos, frases comunicativas aos 3 anos).
E. Não existe um atraso clinicamente importante no desenvolvimento cognitivo ou no
desenvolvimento de habilidades de autocuidados próprios da idade, no comportamento
adaptativo (outro que não na interação social) e na curiosidade acerca do ambiente na
infância.
F. Não são satisfatórios os critérios para um outro Transtorno Global do Desenvolvimento
ou Esquizofrenia.
229
ANEXO C
CARTA DE AUTORIZAÇÃO
Eu_________________________________________________
RG_____________
diretor(a) da _______________________________ da cidade de _______________,
autorizo Lília Maíse de Jorge, regularmente matriculada no Programa de Pós-graduação
Stricto-Sensu em Psicologia da Universidade São Francisco, a desenvolver a pesquisa
“Avaliação de Habilidades Cognitivas de indivíduos em condições especiais de
desenvolvimento. Vale destacar que em nenhum momento da divulgação dos resultados da
pesquisa aqui realizada, quer em congressos ou na literatura especializada, o nome da
entidade poderá ser citado.
________________, _______de______________________de 2009.
________________________________________________
Assinatura do (a) Responsável na Instituição (Carimbo)
230
ANEXO D
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (1ª via)
TÍTULO DA PESQUISA: Avaliação de Habilidades Cognitivas de indivíduos em
condições especiais de desenvolvimento
Eu,______________________________________________________________________
______________________________________________________________ (nome, idade,
RG, endereço) Responsável Legal por __________________________________________,
dou meu consentimento livre e esclarecido para que ele(a) participe como voluntário(a) da
pesquisa supracitada, sob a responsabilidade do (s) pesquisador (es) Lília Maíse de Jorge ,
do Programa de Pós-graduação Stricto-sensu em Psicologia da Universidade São Francisco,
e da Professora Dra. Acácia Aparecida Angeli dos Santos (Orientadora).
Assinando este Termo de Consentimento estou ciente de que:
1. O objetivo da pesquisa é analisar a eficácia de instrumentos de avaliação de habilidades
cognitivas em autistas;
2. Durante o estudo será realizada com os pais a aplicação do PDDAS-SQ (escala de avaliação de
comprometimento autístico, com duração prevista de 1hora); com a criança ou o jovem serão
aplicados os testes: TONI 3 (45 itens com figuras abstratas), o Screening Perceptual e Motor (2
folhas nas quais é preciso unir pontos e discriminar figuras iguais), o Teste Gestáltico Visomotor
de Bender (9 cartões com figuras para serem copiadas em folha sulfite), e o Teste de Cancelamento
(3 tarefas de busca visual de figuras-modelo).
3. Não há riscos conhecidos nos procedimentos previstos e responder a estes instrumentos pode
causar constrangimento a(o) meu filho(a), por isso aceito a sugestão de que permaneça no local de
aplicação do teste um adulto significativo para ele(a);
4. Obtive todas as informações necessárias para poder decidir conscientemente sobre a participação
de meu filho(a) na referida pesquisa e estou livre para interromper a qualquer momento sua
participação nela, bem como ele(a) poderão desistir a qualquer momento;
5. Seus dados pessoais serão mantidos em sigilo e os resultados gerais, obtidos na pesquisa, serão
utilizados apenas para alcançar os objetivos do trabalho, expostos acima, incluída sua publicação na
literatura científica especializada;
6. Poderei contatar o Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade São Francisco para apresentar
recursos ou reclamações em relação à pesquisa através do telefone: 11 - 4534-8040;
7. Poderei entrar em contato com a orientadora do estudo (Dra. Acácia Aparecida Angeli dos
Santos) ou com a aluna autora do projeto (Lília Maíse de Jorge) sempre que julgar necessário pelo
telefone 11 – 4534-8000;
8. Este Termo de Consentimento é feito em duas vias, sendo que uma permanecerá em meu poder e
outra com o (a) pesquisador (a) responsável.
Itatiba,.................................. de 2009.
Assinatura do Responsável Legal: ______________________
Lília Maíse de Jorge
Contato – E-mail: [email protected]
Data: ______________
Download