língua: uma produção social

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LÍNGUA: UMA PRODUÇÃO SOCIAL
Andreia Angela de Oliveira1
Elza Sabino da Silva Bueno2
Resumo
O presente trabalho tem por objetivo apresentar um estudo sobre a concepção de língua, linguagem e sua
relação com a sociedade, pois a língua é um fato social (SAUSSURE, 1989) uma vez que é produzida
socialmente, pelos falantes no seio da comunidade onde ele vive, refletindo características inerentes a esta
comunidade, sejam elas social, cultural, regional que demarcam e definem os grupos classificando-os, às
vezes, até mesmo de forma pejorativa, o que pode gerar preconceito linguístico (BAGNO, 2007),
principalmente com o falar das pessoas das camadas sociais menos favorecidas. Compreendendo que língua
é um código utilizado por um grupo de indivíduos capazes de manter uma comunicação/interação com
demais membros da comunidade, faz-se necessário enfatizar que a língua está assim como a sociedade, de
forma geral, em um processo contínuo de transformação influenciado por diferentes fatores sejam
linguísticos ou sociais em que o resultado destas mudanças é denominado variação, o que acarreta um
processo bastante complexo, uma vez que elas, às vezes, não são aceitas por todos os falantes da
comunidade como um fenômeno inerente às línguas vivas e que pode funcionar como um registro da própria
identidade do falante. Muitas pessoas geram inúmeros preconceitos a respeito destas variações. Num país
como o Brasil, por exemplo, com uma cultura complexa, oriunda das influências de outros povos, e de outras
culturas, as variações presentes na língua falada são o resultado da miscigenação dos diversos grupos,
crenças e costumes, que representam a grande dimensão territorial do país. É essencial saber empregar e
respeitar as diversidades linguísticas sem gerar preconceitos para com o falante seja este representante de
qualquer classe social, religião, etnia, uma vez que cada um carrega consigo características que devem ser
valorizadas e respeitadas, lembrando que aceitar e respeitar a maneira de falar do outro é, acima de tudo,
respeitá-lo como cidadão.
Palavras-chave: Língua, Cultura e Identidade.
Introdução
1
Mestranda do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Letras da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul UEMS/Campo Grande, Professora da Rede Pública de Ensino em Sidrolândia- MS, E-mail: [email protected]
2
Docente do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Letras da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul UEMS/Campo Grande, Coordenadora do Programa de Mestrado Profissional em Letras – PROFLETRAS da
UEMS/Dourados-MS, e Professora dos cursos de Graduação em Letras da UEMS/Dourados, E-mail: [email protected]
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Com o passar do tempo surgem estudos voltados às novas descobertas a cerca da língua e dos
inúmeros fatores que contribuem para a sua variação e para a influência dela no comportamento linguístico
da sociedade, pois ao depararmos com uma pessoa que fala de forma diferente surge uma grande
preocupação, por parte dos pesquisadores, que desejam descobrir quais fatores influenciam a fala de
determinada pessoa, grupo ou comunidade de fala, da qual essas pessoas fazem parte, como falantes de um
mesmo código linguístico.
Esta característica presente na fala espontânea aparece como um divisor de águas, de grupos, que
muitas vezes são redistribuídos e organizados na sociedade brasileira, como uma classe menos privilegiada e
uma classe mais culta, com uma maior ascensão, onde a língua é empregada de acordo com as normas
estabelecidas pela escola e no âmbito profissional, contrárias às formas agramaticais, menos prestigiosas
oriundas e pertencentes às classes menos favorecidas da sociedade.
Diante do exposto e considerando a linguística como o estudo científico da linguagem humana, tendo
o genebrino Ferdinand de Saussure como seu precursor (SAUSSURE, 1989), vale ressaltar que o estudo
entre a língua e a sua articulação com a sociedade recebeu, a partir dos anos 60 o nome de sociolinguística e
tem como um de seus precursores o americano William Labov (2008) cujo principal objetivo é estudar as
línguas e sua relação com as comunidades que as usam como meio de comunicação, mostrando que toda e
qualquer língua é formada por diversas formas de uso, a depender de quem a usa, da idade, do contexto
social, da região, da sua faixa etária, do gênero, do nível de escolarização, entre outros fatores
influenciadores.
Neste artigo fazemos uma reflexão acerca do papel da sociolinguística e como esta auxilia no
entendimento da heterogeneidade da língua portuguesa falada no Brasil, lembrando que a sociolinguística é a
ciência que tem por objeto de estudo a Língua, a Cultura e a Sociedade e a intersecção entre esse tripé. Seu
maior enfoque é a relação destes três elos da cadeia, e como as manifestações destes constroem e
reconstroem no dia a dia uma língua cada vez mais brasileira, que muda com as transformações e com as
influências oriundas de diferentes idiomas, de diferentes povos e épocas.
Não se pode estudar a língua e suas inúmeras manifestações como se esta fosse algo pronto e acabado
(BAGNO, 2007), pelo contrário ela é inacabada e talvez nunca esteja pronta, perfeita para ser apresentada ao
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mundo. A língua deve ser explorada como um lugar de descobertas e aventuras inovadoras, pois por mais
simples que seja uma manifestação linguística, considerada como nova, ela com certeza, trará uma bagagem
cultura e social aliada a sua real significação, lembrando que o objetivo das transformações da língua no
tempo e no espaço, sejam elas linguísticas ou sociais é para auxiliar os falantes no processo de comunicação,
com vistas a facilitar a sua interação.
O que é de conhecimento de todos é que existe uma língua portuguesa, e que esta possui inúmeras
variações, tantas que se pode afirmar que há uma heterogeneidade presente no português falado nas
diferentes regiões do país, com traços e características tão peculiares que a faz uma das línguas mais ricas do
mundo. A estas particularidades dar-se o nome de variações linguísticas que são o reflexo de uma série de
fatores, entre eles o regional, histórico, estilístico, socioeconômico, social e outros.
Sociolinguística: uma breve história da dimensão dos estudos sociolinguísticos
Para compreender os pressupostos teóricos e metodológicos dos estudos sociolinguísticos, há a
necessidade de contextualizar a história e os estudos da linguagem no século XX, iniciando pelos linguistas
Ferdinand de Saussure e Avran Noam Chomsky.
Saussure, no início do século XX, com seu Curso de linguística geral, inaugura a linguística
moderna, delimitando e definindo o objeto de estudo dessa nova ciência, sendo considerado um marco na
história da linguística estruturalista, em que a língua é tomada em si mesma, separada de fatores externos,
sendo vista como uma estrutura autônoma, valendo pelas relações de natureza linguística que se estabelecem
entre seus elementos. Saussure (1989) acreditava que a língua não pertencia aos indivíduos, mas era um
fenômeno social, de todo o grupo, contudo, ele não estava interessado nas relações entre língua e a
sociedade, mas sim nas relações internas da língua com os signos linguísticos.
Já nos Estados Unidos, a partir da década de 1960, para Avran Noam Chomsky e a corrente
gerativista, a língua é concebida como um sistema de princípios universais e tida como um conhecimento
intuitivo que as pessoas têm da sua língua materna. Esse conhecimento é denominado de competência,
Chomsky acreditava que esse conhecimento (competência) era estável, diferente da performance de um
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falante que poderia variar de um momento para outro. Tanto Saussure como Chomsky, acreditavam que as
línguas eram estáveis para permitir que fossem descritas como sistemas perfeitos e invariáveis.
Assim, tanto na abordagem estruturalista para Saussure como na gerativista para Chomsky a língua é
vista como uma realidade abstrata, desvinculada de fatores históricos e sociais. Como uma reação a essas
duas correntes, a Sociolinguística desponta nos Estados Unidos na década de 1960, tendo Labov (2008)
como um de seus maiores precursores. Foi Labov quem sistematizou e insistiu na relação entre língua e
sociedade. Tarallo (2007 p. 07) afirma que “podem ser chamados de sociolinguistas todos aqueles que
entendem por língua um sistema de comunicação, de informação e de expressão entre os indivíduos da
espécie humana”. Para Tarallo, mesmo Willian Labov não sendo considerado por muitos como o primeiro
sociolinguista a surgir no cenário da investigação linguística, outros modelos do passado, certamente o
inspiraram na concepção dessa nova teoria, nesta vertente, Tarallo afirma que Ferdinand de Saussure
também pode ser classificado como um sociolinguista.
A partir de meados do século XX, a área da linguística passa por mudanças significativas. Neste
impasse surge a chamada virada paradigmática, em que os estudos linguísticos passam a se interessar não só
pelo sistema da língua em si, mas também pelo seu uso, surgindo diversos campos de investigação que
promovem uma relação mais objetiva, onde a linguística articula-se com a filosofia e com outras ciências
humanas como a psicologia, a antropologia, a semiótica, entre outras.
Para a Sociolinguística, o ser humano é por natureza plurilíngue - usa diversas línguas-, pois esta se
apresenta de diversos modos, dependendo da situação à qual o falante esteja inserido, por exemplo, no
ambiente familiar usa-se uma forma para se comunicar já no âmbito do trabalho ou escolar as pessoas são
influenciadas, por ter que interagir com outras pessoas, que por sua vez cultivam outras formas de uso da
língua.
A sociolinguística, sendo uma das subáreas da Linguística, afirma Mollica e Braga (2008. p. 9) “[...]
estuda a língua em uso no seio das comunidades de fala, voltando à atenção para um tipo de investigação
que correlaciona aspectos linguísticos e sociais”. Em suma, a Sociolinguística se ocupa de questões como
variação e mudança linguística, bilinguismo, contato linguístico, línguas minoritárias, entre outras.
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Entre língua e sociedade não existe uma relação de mera casualidade. Já antes mesmo do nascimento,
o falante está cercado por uma série de signos linguísticos e após o nascimento lhe são apresentadas
inúmeras possibilidades comunicativas, o gesto, as expressões faciais, com o tempo a fala, que surge por
meio da imitação ou da assimilação.
A Sociolinguística, ao se ater à relação língua e sociedade, retoma os usos linguísticos de falantes em
distintos contextos sociais e nas mais variadas situações. Para Mollica e Braga (2008. p. 9), “todas as línguas
apresentam um dinamismo inerente, o que significa dizer que elas são heterogêneas [...]”. Assim sendo, o
objeto de análise da Sociolinguística são as variações que ocorrem na língua falada que, diferentemente do
olhar do estruturalismo e do gerativismo, é tomada como entidade concreta e heterogênea, na relação com
seus usuários nos seus diversos contextos.
Concepções de língua e de linguagem
A língua pode ser definida como um sistema abstrato de regras gramaticais em seus múltiplos
seguimentos: fonológico (sons), morfológico (formas), sintático (estruturação frasal), pragmático (uso) e
semântico (significação). Pode ser representada de forma oral, por meio da oralidade ou de forma visual
através da escrita. Em ambos os processos são considerados tanto o emissor quanto o receptor da mensagem
transferida ou pretendida, "a língua é vista como um código, ou seja, como um conjunto de signos que se
combinam segundo regras, e que é capaz de transmitir mensagem e informações de um emissor a um
receptor" (TRAVAGLIA, 2002, p.22), ou seja, o emissor codifica, o receptor decodifica; portanto, ambos
devem dominar o mesmo código para garantir o sucesso da comunicação por meio da transmissão de
informações.
A língua é uma construção humana, desenvolvida por uma sociedade, que está em constante processo
de mudanças e de transformações, renovando-se incessantemente. Utilizada como principal ferramenta de
construção entre as sociedades, seu domínio seja de forma oral ou escrita pode ser classificado como
essencial já que é por meio desta que se desenvolve a comunicação e a troca de informações, colaborando
desta forma para a construção e aperfeiçoamento dos conhecimentos produzidos.
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Uma língua é muito mais do que apenas sua denominação, lexical ou gramatical. É mais do que um
amontoado de palavras ou um conjunto de expressões usadas aleatoriamente. A língua de um indivíduo, de
uma sociedade ou de um grupo social é seu próprio retrato, pois ela é o reflexo das inúmeras transformações
e fatores sociais expostos como o local de origem, a cultura, grau de escolaridade, a posição social entre
outros fatores que se tornam característicos e contribuem para a construção da história de vida de cada
falante refletida na sua língua.
Entende-se por língua, na sua essência, um sistema de sons ou de gestos que possuem significados e
são organizados sintaticamente para viabilizar a interação humana (MARTELOTTA, 2008). Não podendo
ser considerada imutável já que ela evolui e se transforma no tempo e no espaço. A língua é o veículo pelo
qual a linguagem se manifesta e se desenvolve, por meio da interação social, com a troca de saberes e o
acesso às informações, juntamente com outros elementos que constroem a cultura do seu povo que a utiliza.
Para Cunha e Cintra (1985 p. 01) “a língua é um sistema gramatical pertencente a um grupo de
indivíduos. É o meio através ao qual uma coletividade se expressa, concebe o mundo e age sobre ele”.
Tomando por base os autores mencionados, é importante ressaltar que estes trazem uma definição de língua
como “sistema gramatical” e na sequência destacam a importância do seu uso pela “coletividade”, ou seja,
sua relação com a sociedade a qual pertence dentro da vertente sociolinguística.
Para Saussure, no início do século XX, a partir da publicação do Curso de Linguística Geral (1989),
onde define o objeto da Linguística, afirmando que a linguística é constituída por todas as manifestações da
linguagem humana. O pesquisador, dentro de seus estudos, faz uma diferenciação na própria linguagem,
considerando a língua como essencial e a fala como secundária no processo da linguagem, exemplificando
seus estudos na definição de langue e parole, sendo a primeira denominada língua como um sistema de
signos interiorizados pelos falantes, já a parole, tida como fala, refere-se ao ato individual de escolha das
palavras para o processo de enunciação.
Saussure (1989) diferenciou a assimilação da língua pelos grupos sociais, afirmando que:
A língua existe na coletividade sob a forma duma soma de sinais depositados em
cada cérebro, mais ou menos como um dicionário cujos exemplares, todos idênticos,
fossem repartidos entre os indivíduos. trata-se, pois, de algo que está em cada um
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deles, embora seja comum a todos e independe da vontade dos depositários (Saussure
1989, p. 27).
Assim, a língua não funciona apenas como um elemento de interação entre o indivíduo e a sociedade
a qual pertence, pois é por meio da língua que toda a realidade se transforma em signo, pela associação de
significantes e significados. Para Saussure, língua não é nada mais que um sistema de valores puros. Uma
vez que o indivíduo não pode criar uma língua, ou modifica-la, compreende-se que a língua é um fato social
“ela não existe senão em virtude duma espécie de contrato estabelecido entre os membros da comunidade”,
Saussure (1989, p. 102).
Para Monteiro (2008), a língua é vista como um conjunto estruturado de normas sociais, sendo assim
ela recebe influências do meio social, constrói a história do povo que a utiliza e que interage por meio desta.
Os PCNs (1998, p. 24) confirmam este enunciado afirmando que “língua é um sistema de signos histórico e
social que possibilita ao homem significar o mundo e a realidade”, o documento justifica seu aprendizado e
assimilação, pois: “aprendê-la é aprender não só as palavras, mas os seus significados culturais e, com eles,
os modos pelos quais as pessoas do seu meio social entendem e interpretam a realidade e a si mesmas”.
A linguagem e suas significações
A linguagem é uma forma de interação entre membros de uma mesma sociedade e deve ser
compreendida como um sistema de comunicação completo, uma espécie de ferramenta no processo da
comunicação que permite o compartilhamento de informações. Existem vários tipos de linguagens e estas
estão presentes nos homens, nos animais e na própria natureza.
Cunha e Fernandes (2015) definem linguagem como um sistema de comunicação natural e artificial
como: a linguagem corporal, as expressões faciais, o vestir, a linguagem dos animais, a linguagem presente
na música, nas artes, na literatura, nos códigos de trânsito e em inúmeras outras formas de defini-la e
representá-la.
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A linguagem distingue o homem dos outros animais, pois ela é base do processo de comunicação
interna e externa, necessária ao desenvolvimento das atividades mentais fundamentais ao longo do nosso
processo de interação com os demais seres. É por meio da linguagem que somos capazes de raciocinar e
construir conceitos, favorecendo a capacidade de usar o pensamento para a solução de problemas.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (1998) – PCNs – refere-se ao termo linguagem como:
Uma forma de ação interindividual orientada por uma finalidade específica; um
processo de interlocução que se realiza nas práticas sociais existentes nos diferentes
grupos de uma sociedade, nos distintos momentos da sua história. Dessa forma, se
produz linguagem tanto numa conversa de bar, entre amigos, quanto ao escrever uma
lista de compras, ou ao redigir uma carta (1998, p.22).
A concepção de linguagem abordada pelo documento complementa a informação afirmando que:
“pela linguagem se expressam ideias, pensamentos e intenções, se estabelecem relações interpessoais
anteriormente inexistentes e se influência o outro, alterando suas representações da realidade da sociedade e
o rumo de suas (re)ações” (PCNs, 1998, p.22).
A linguagem é considerada uma atividade de natureza social e dialógica (BAKHTIN, 1997), que se
constitui na interação entre os falantes de maneira verbal ou não verbal. Os indivíduos são os participantes
ativos no fluxo dessa interação, apropriam-se da língua, enquanto linguagem em uso, e, envolvidos no
processo de interação, tomam consciência da língua que usam na interação com os demais falantes. Ao
apropriar-se dela, o sujeito toma posse do seu conteúdo ideológico e da sua história. Desse modo, a
linguagem é um lugar de ação e de comunicação entre os usuários da língua que interagem enquanto sujeitos
ocupantes de lugares e papeis sociais, num contínuo movimento, que faz a língua/linguagem circular entre
sujeitos, discursos, gêneros, estilos e outros.
Linguagem no contexto social de uso da língua
O ser humano sofre uma compulsão natural para agrupar-se em sociedade, para perseguir e
concretizar seus objetivos, pois o homem é um ser social por natureza. É por meio do processo de
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comunicação que os indivíduos aprendem sua função social e adquirem sua identidade cultural. A função
social da linguagem é o instrumento que o homem utiliza para expressar e para manipular as coisas ao seu
entorno. Logo após o nascimento, o falante é inserido num contexto sociocultural e durante sua formação
sofre um processo de socialização que o transforma num falante de uma variedade da língua determinada
pelas inúmeras influências que recebeu ao longo de sua formação cultural.
Dessa forma, os indivíduos aprendem sua função social e adquirem sua identidade cultural por meio
do processo de comunicação, considerando todos os aspectos envolvidos nesta construção como o que se
fala, onde, com quem, em que momento e como dizer. Isso significa que as escolhas feitas ao se comunicar
não são aleatórias, mesmo que possam ser inconscientes, são decorrentes das condições em que essa
comunicação é realizada. Durante o ato da fala, a estrutura social do indivíduo é reforçada, formando a
identidade cultural do falante, uma vez que, seu modus dicendi de expressar é identificado e determinado
pelo seu grupo social, escolaridade, profissão e até local de residência.
Mesmo o ser humano sendo o portador da linguagem, ele não pode ser considerado possuidor dela,
nem mesmo da própria língua utilizada neste processo, ele é apenas um usuário. E, neste uso, pode até
modificar a língua, mas não a detém para si como algo puro, próprio e particular. Isso acontece porque a
língua é considerada um sistema social e não individual. Ela preexiste às pessoas. Falar uma língua não
significa apenas expressar os pensamentos interiores e originais, significa ativar a imensa gama de
significados que já estão embutidos no sistema cultural de uma sociedade.
Essa relação intrínseca entre língua, cultura, sociedade, constitui um arranjo fundamental nas
atividades cotidianas. Dessa forma, as mudanças ocorrem, tanto na cultura como na língua, seja por
eliminação, acréscimo ou modificação de elementos já preestabelecidos e assimilados dentro da
comunidade. Não é algo voluntário, acontece sem que se perceba, de forma ininterrupta. Assim, Bueno
(2003) as pessoas reestruturam aspectos linguísticos sem perceber, mas ninguém, isoladamente, modifica ou
transforma uma língua, uma vez que ela pertence ao conjunto de falantes e responde por seus
comportamentos sociais, culturais, morais, éticos entre outros. Como afirma Monteiro (2008, p. 16),
“devemos ter em mente que a língua não é simplesmente um veículo para transmitir informações, mas é
também um meio para se estabelecer e manter relacionamentos com outras pessoas”.
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É por meio da linguagem que as sociedades transferem e perpassam suas histórias escritas. Desta
forma observa-se, uma estreita relação entre linguagem, cultura e sociedade. Uma é a expressão da outra.
Elas possuem uma relação ampla e complexa entre si, que abrange a consideração de estruturas linguísticas,
a partir de uma situação cultural, de determinados grupos ou comunidades. Sendo assim, a linguagem pode
modificar a cultura e a cultura pode modificar a linguagem, como complementa Monteiro (2008, p. 17), “a
língua pode afetar a sociedade, influenciando ou mesmo controlando a visão de mundo de seus falantes”.
No meio social em que os falantes estão inseridos, os grupos ou comunidades existem modos
próprios e característicos de falar, que traduzem variadas maneiras de viver, e, por sua vez, surgem às
variedades linguísticas. Durante o estudo de uma comunidade linguística, podemos constatar a existência de
uma diversidade, de modo que a característica em comunidade por sua peculiaridade no modo de falar. Há
alterações destas variedades dentro dos limites em diversos fatores, como a idade, a posição social, o grau de
escolaridade, a profissão, que contribuem para a formação destas variedades linguísticas empregadas pelo
falante.
As variedades linguísticas do português falado no Brasil
Segundo Bagno (2007, pag. 09) “existe uma regra de ouro da Linguística que diz: só existe língua se
houver seres humanos que a falem”, pois do que adiantaria a existência de uma dada língua se não houvesse
quem a partilhasse. Nada mais seria a não ser mais uma das inúmeras línguas que se perderam ao longo do
tempo por não existirem mais falantes capazes de transmitir seus ensinamentos sobre a língua a outros
falantes pertencentes a esta cultura, outra razão para equipararmos língua à cultura.
Se não há quem as julgue importantes e quem de fato as transmita com qualidade e segurança aos
seus descendentes, a língua assim como a cultura podem se perder com o tempo. Cada falante carrega
consigo uma bagagem linguística, influenciada por diversos fatores, pois desde criança está exposto a
diferentes situações de comunicação. Assim, o indivíduo carrega uma bagagem cultural herdada no seu
âmbito familiar, outra oriunda das amizades e dos lugares frequentados e uma terceira relacionada à língua
imposta pelo meio social acadêmico.
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Bagno (2007, p. 52) afirma que “em todas as línguas do mundo existe um fenômeno chamado
variação, isto é, nenhuma língua é falada do mesmo jeito em todos os lugares”, pois a variação se trata de um
fenômeno comum e natural a todas as línguas. É quase impossível falar em língua sem pensar em variação.
De acordo com Monteiro (2008) a variação é essencial à própria natureza da linguagem humana e
desta forma, deveria ser a ausência de variação no sistema linguístico um fato a ser estudado, já que não há
como estudar uma língua sem levar em consideração suas variações linguísticas e o resultado destas em sua
construção, além da sua importância para os membros de uma dada comunidade de fala.
Ao se deparar com as inúmeras manifestações destas variações na linguagem, muitas pessoas acabam
por criar e aprofundar o que se conhece por preconceito linguístico, pois tais manifestações nada mais são do
que o resultado da carga linguística do falante, ou seja, ele vai interpretar os fatos da língua de acordo com a
sua experiência de mundo e experiências de leituras anteriores. Assim, podemos analisar a língua falada
como um reflexo que engloba os fatores de identificação social do falante e a relação que este mantém com
sua comunidade.
As variedades linguísticas encontradas nas diferentes formas de falar nas diversas comunidades
linguísticas existentes possuem relevância tanto na análise do léxico empregado como na morfossintaxe, na
fonética e fonologia dessa língua.
De acordo com a hipótese de que homens e mulheres não falam da mesma forma em que ocorre a
variação de gênero, tanto pelas diferenças entre ritmo, tom de voz e outras estruturas, estas diferenças entre
gênero e linguagem tem sido investigada pela Sociolinguística, cujos estudiosos têm verificado um
predomínio da forma, socialmente, prestigiada para a fala feminina bem como um aumento no uso do
diminutivo. Outro elemento que prende atenção é a chamada faixa etária – variação de idade – em que numa
análise variacionista, a idade está veiculada à existência ou à escassez de determinados fenômenos. A
mudança na língua ocorre mediante a observação do comportamento linguístico dos falantes de diversas
faixas etárias, em que é possível identificar diferenças entre a linguagem dos idosos e dos adolescentes, por
meio das quais é possível diagnosticar se uma dada variação ocorre em um desses períodos de vida
(MOLLICA e BRAGA, 2008).
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Algumas pesquisas sociolinguísticas apontam a influência do nível escolar do falante – variação de
grau de escolaridade –, uma vez que a norma padrão é ensinada nas escolas, uma pessoa que tenha
frequentado o ensino regular por maior tempo na escola, esteve exposto por mais tempo a esta variedade,
portanto, a fala deste falante apresenta maior probabilidade de se aproximar o máximo possível da
modalidade padrão da língua.
Segundo Bortoni-Ricardo (2004), outro fator determinante e investigado pela Sociolinguística é o
local de origem do falante, que relaciona as diferenças linguísticas distribuídas no espaço físico-geográfico,
observada entre falantes de origens geográficas distintas como brasileiros e portugueses, nordestinos e
gaúchos, em que é possível observar se a variação regional.
A variação Social seria compreendida como um conjunto de fatores que têm a ver com a identidade
dos falantes e com a organização sociocultural da comunidade de fala. Classe social, idade, gênero e
contexto social são fatores que estão relacionados às variações de natureza social, como um advogado e um
ambulante, um médico e um produtor rural que possuem linguagens diferentes, porque exercem papeis
sociais diferentes e moram em locais também distintos.
Considerações finais
Não há dúvida de que a língua portuguesa é rica, assim como as mais de seis mil línguas espalhadas
por todo o mundo. Compreendendo que língua é um código utilizado por um grupo de indivíduos capazes de
manter por meio deste uma comunicação e, que as línguas estão como a sociedade em um processo contínuo
de transformação e de mudanças.
A língua ao contrário da gramática, como afirma Bagno (2007) é um rio que se renova por estar em
constante movimento, a gramática, por sua vez, não passa de um igapó à margem de um rio, que depende
deste para se renovar. Esta metáfora reflete a necessidade de mudança e de transformações que estamos
submetidos ao longo do tempo. Na língua esta mudança ganha o nome de variação e o autor supracitado
ressalta que “não existe língua sem variação” Bagno (2007, p. 52).
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Sabe-se que toda língua sofre mudanças que podem ser influenciadas por diferentes fatores como
meio social, geográfico, político, situacionalidade, faixa etária, entre outros. Tais mudanças (variações) não
são aceitas por todos os membros como uma particularidade presente na fala do indivíduo, que muitas das
vezes, é uma marca de sua própria identidade. Muitos estudiosos, e pessoas com maior prestígio social
geram inúmeros preconceitos oriundos destas variações.
Em um país como o Brasil, onde há culturas riquíssimas, oriundas das muitas influências de outros
povos, de outras línguas e de outras culturas e por meio das miscigenações de diversos grupos distintos é
comum e natural que haja muitas variações presentes na língua portuguesa.
Levando em consideração a grande dimensão territorial do nosso país, e a tamanha desigualdade
social existente em todo o território brasileiro, é evidente que todas as características sejam refletidas na
língua por meio de suas variações, que contam a história do país, do seu povo, da sua cultura. Em todas as
comunidades existem variedades que são consideradas superiores e outras inferiores. “Uma variedade
Linguística ‘vale’ o que ‘valem’ na sociedade os seus falantes, isto é, como reflexo do poder e da autoridade
que eles têm nas relações econômicas e sociais” Gnerre (1998, p. 06).
É essencial sabermos empregar e respeitar as inúmeras variações sem gerar preconceitos para com o
falante seja esse representante de qualquer classe social, religião, etnia, morador da zona rural, da zona
urbana, área central ou da periferia, escolarizado ou analfabeto. Cada um carrega consigo características que
devem ser valorizadas e respeitadas e não diferenças que devem ser geradoras de preconceitos.
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REVISTA AVEPALAVRA
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