CÁLCULO I Prof. Edilson Neri Júnior | Prof. André Almeida Aula no 05: Limites Laterais. Teorema do Confronto. Teorema do Valor Intermediário. Limite Fundamental Trigonométrico. Limite da Função Composta Objetivos da Aula • Denir limites laterais de uma função em um ponto de seu domínio; • Utilizar os limites laterais para vericar a existência de um limite; • Exibir o Teorema do Confronto e sua utilidade para vericar a existência de uma limite; • Enunciar o Teorema do Valor Intermediário e suas aplicações; • Apresentar o Limite Fundamental Trigonométrico. 1 Limites Laterais Ao discutirmos a ideia intuitiva de limite de uma função f num ponto a na aula passada, zemos questão de sempre exibir uma tabela tomando valores maiores que a (à direita de a) e menores que a (à esquerda de a). Essa preocupação pode ser exemplicada no seguinte exemplo: Exemplo 1. Considere a função de Heaviside, denida por H(t) = 1 se t ≥ 0 0 se t < 0 é possível calcular limt→0 H(t)? Utilizando o gráco da função H(t) Figura 1: Gráco de Função de Heaviside 1 Cálculo I Aula n o 05 Antes de responder a essa questão, devemos entender que considerar pontos x à direita de um número real a, signica dizer que estamos nos aproximando de a por valores maiores que ele. Sempre que zermos isso, utilizaremos a notação x → a+ . Analogamente, se considerarmos pontos x à esquerda de um número real a, signica que estamos nos aproximando de a por números menores que ele, e isso será denotado por x → a− . No caso da função de H(t), notamos que limx→0+ H(t) = 1 e limx→0− H(t) = 0. Formalizando essa ideia: Denição 1. Dizemos que L é o limite à direita da função f (x) quando x → a+ e escrevemos lim f (x) = L x→a+ se para todo ε > 0, existe δ > 0 tal que se 0 < x − a < δ então |f (x) − L| < ε. Denição 2. Dizemos que L é o limite à esquerda da função f (x) quando x → a− e escrevemos lim f (x) = L x→a− se para todo ε > 0, existe δ > 0 tal que se 0 < a − x < δ então |f (x) − L| < ε. Como não existe um único número real para o qual a função H(t) se aproxima quando t → 0, dizemos que lim H(t) não existe e esse fato é enunciando no nosso próximo teorema, que relaciona a denição de t→0 limite com as denições de limite à esquerda e à direita: Teorema 1. lim f (x) = L se, x→a e somente se lim f (x) = L = lim f (x) x→a− x→a+ Portanto, o teorema acima é um bom critério para sabermos se o limite de uma função existe ou não, como podemos observar nos seguinte exemplos: Exemplo 2. Calcule o valor de lim |x|, se existir. x→0 Solução: Por denição, f (x) é dada por f (x) = x se x ≥ 0 −x se x < 0 Observemos que f (x) = x se x → 0+ e f (x) = −x se x → 0− . Logo, calculando os limites laterais, temos que lim f (x) = lim x = 0 x→0+ x→0+ E lim f (x) = lim −x = 0 x→0− x→0+ Logo, pelo teorema 1, lim |x| = 0 x→0 Exemplo 3. Vamos vericar que o limite lim x→0 |x| não existe. x Note que |x| x = lim = lim 1 = 1 x→0+ x x→0+ x x→0+ |x| −x lim = lim = lim −1 = −1 x→0− x x→0− x x→0− lim Como lim+ f (x) 6= lim− f (x) então, pelo teorema ??, temos que lim x→0 x→0 Prof. Edilson Neri | Prof. André Almeida x→0 |x| não existe. x 2 Cálculo I 2 Aula n o 05 Teorema do Valor Intermediário Apresentaremos a seguir, uma propriedade importante das funções contínuas Teorema 2 (do Valor Intermediário). Suponha que f seja contínua em um intervalo fechado [a, b] e seja N um número qualquer entre f (a) e f (b), em que f (a) 6= f (b). Então existe um número c em (a, b) tal que f (c) = N . O Teoreoma do Valor Intermediário (TVI) estabelece que uma função contínua assume todos os valores intermediários entre os valores de f (a) e f (b). Geometricamente, o TVI diz que se for dada uma reta horizontal qualquer y = N entre y = f (a) e y = f (b), como mostra a gura abaixo, então o gráco de f intercepta a reta y = N pelo menos uma vez. Figura 2: Ilustração geométrica do Teorema do Valor Intermediário Observação 1. É importante que a função f do TVI seja contínua. O Teorema do Valor Intermediário não é verdadeiro em geral para funções descontínuas. Um caso particular do Teorema do Valor Intermediário será apresentado a seguir. É o Teorema de Bolzano (ou do Anulamento). Teorema 3 (de Bolzano ou do Anulamento). Se f for contínua e f (a) e f (b) assumirem assumirem sinais contrários, então existirá c ∈ (a, b) tal que f (c) = 0. Uma importante aplicação do TVI é a localização das raízes de equações. A seguir, apresentaremos alguns exemplos. Exemplo 4. Mostre que existe uma raiz da equação 4x3 − 6x2 + 3x − 2 = 0 entre 1 e 2. Solução: Seja f (x) = 4x3 − 6x2 + 3x − 2. Queremos encontrar um c entre 1 e 2, tal que f (c) = 0. Tomando a = 1 e b = 2 e N = 0, pelo Teorema do Valor intermediário, temos: f (1) = −1 < 0 f (2) = 12 > 0. Logo, f (1) < 0 < f (2), isto é N = 0 é um número entre f (1) e f (2). Como f é contínua, por ser um polinômio, o TVI arma que existe um núero c entre 1 e 2 tal que f (c) = 0. Em outras palavras, a equação 4x3 − 6x2 + 3x − 2 = 0 tem pelo menos uma raiz c no intervalo (1, 2). Gracamente, temos: Prof. Edilson Neri | Prof. André Almeida 3 Cálculo I Aula n o 05 Exemplo 5. Mostre que a equação x3 − 4x + 8 = 0 admite pelo menos uma solução real. Solução: Considerando a função f (x) = x3 − 4x + 8, temos f (0) = 8, f (−3) = −7 e f é contínua, segue do Teorema do Anulamento que existe pelo menos um c em (−3, 0) tal que f (c) = 0, isto é, a equação x 3 − 4x + 8 = 0 admite pelo menos uma raiz real entre -3 e 0. 3 Teorema do Confronto Teorema 4 (do Confronto). Se f (x) ≤ g(x) ≤ h(x) para todo x em um intervalo aberto que contenha a (exceto possivelmente a) e lim f (x) = lim h(x) = L, x→a x→a então lim g(x) = L. x→a A mensagem do Teorema do confronto é que se uma função que está no meio de outras duas funções que tem o mesmo limite, então obrigatoriamente a função que está no meio terá o mesmo limite das outras duas, daí este teorema é também chamado de Teorema do Sanduíche. Exemplo 6. Seja f uma função denida em R tal que para todo x 6= 1, temos: −x2 + 3x ≤ f (x) ≤ x2 − 1 . x−1 Calcule lim f (x) e justique. x→1 Solução: Como: • lim −x2 + 3x = 2 x→1 x2 − 1 =2 x→1 x − 1 • lim temos, pelo Teorema do Confronto: x2 − 1 ⇐⇒ 2 ≤ lim f (x) ≤ 2. x→1 x − 1 x→1 lim −x2 + 3x ≤ lim f (x) ≤ lim x→1 x→1 Portanto: lim f (x) = 2. x→1 Prof. Edilson Neri | Prof. André Almeida 4 Cálculo I Aula n o 05 1 Exemplo 7. Mostre que lim x .sen = 0. x→0 x 2 Solução: Como 1 ≤1 −1 ≤ sen x Multiplicando por x2 a desigualdade, temos: 1 −x ≤ x .sen ≤ x2 x 2 2 Como lim −x2 = lim x2 = 0, pelo Teorema do Confronto, temos: x→0 x→0 1 = 0. lim x .sen x→0 x 1 2 Gracamente, note que que a função f (x) = x .sen é limitada superiormente pela função g(x) = x x2 e limitada inferiormente pela função h(x) = −x2 . 2 Exemplo 8. Suponha f uma função contínua e suponha que para todo x, |f (x)| < x2 . (a) Calcule, caso exista, lim f (x). x→0 (b) f é contínua em 0? Por quê? Solução: (a) Pelas propriedades de módulo, temos: |f (x)| ≤ x2 ⇐⇒ −x2 ≤ f (x) ≤ x2 . Como lim −x2 = 0 = lim x2 , segue pelo Teorema do Confronto que x→0 x→0 lim f (x) = 0. x→0 (b) Segue de (a) que f será contínua em 0 se f (0) = 0. Pela hipótese, |f (x)| ≤ x2 para todo x, logo, |f (0)| ≤ 0 e, portanto, f (0) = 0. Assim, lim f (x) = 0 = f (0), x→0 ou seja, f é contínua em 0. O próximo exemplo nos diz que se f tiver limite 0 em p e se g for limitada, então o produto f · g terá limite 0 em p. Prof. Edilson Neri | Prof. André Almeida 5 Cálculo I Aula n o 05 Exemplo 9. Sejam f e g duas funções com o mesmo domínio A tais que lim f (x) = 0 e |g(x)| ≤ M para todo x em A, em que M > 0 é um número real xo. Prove que: x→p lim f (x)g(x) = 0. x→p Solução: Note que: |f (x)g(x)| = |f (x)|.|g(x)| ≤ M.|f (x)|, para todo x em A. Daí, para todo x em A −M.|f (x)| ≤ |f (x)|.|g(x)| ≤ M.|f (x)| Como lim f (x) = 0, segue que lim M.|f (x)| = 0 e lim −M.|f (x)| = 0. Pelo Teorema do Confronto: x→p x→p x→p lim f (x)g(x) = 0. x→p Exemplo 10. Calcule lim x.sen π x x→0 . Solução: Note que lim x = 0 e sen x→0 π ≤ 1. Pelo resultado obtido no Exemplo 9, temos: x π lim x.sen = 0. x→0 x Gracamente, temos: Prof. Edilson Neri | Prof. André Almeida 6 Cálculo I 4 que Aula n o 05 Limite Trigonométrico Fundamental Usando o triângulo retângulo no círculo trigonométrico de raio 1 e o Teorema do Confronto demonstra-se sen x lim x x→0 =1 A demonstração usando a regra do L'Hospital é mais simples que vou deixar para depois da aula de derivadas. Exemplo 11. Calcule lim sen (5x) x x→0 Solução: Note que: . sen (5x) lim = lim 5. x x→0 sen (5x) 5x |{z} x→0 = lim sen 5u u→0 u = 5. u Ou seja: lim sen (5x) x→0 x = 5. Exemplo 12. Calcule lim x→0 1 − cos x . x2 Solução: Note que: 1 − cos x 1 − cos2 x 1 sen 2 x 1 = · = · . 2 2 2 x x 1 + cos x x 1 + cos x Assim: 1 − cos x sen 2 x 1 1 = lim · = , 2 2 x→0 x→0 x x 1 + cos x 2 lim pois lim x→0 sen 2 x x2 1 1 = . x→0 1 + cos x 2 = 1 e lim Exemplo 13. Calcule lim sen (6x) 5x x→0 . Solução: Seja u = 6x. Quando x → 0, temos u → 0 e, como sen (6x) 5x 1 6.sen (6x) 6 sen (6x) 6 sen u = . = . = . . 5 6x 5 6x 5 u Passando o limite, temos: lim sen (6x) x→0 5x 6 sen u 6 = lim . = . u→0 5 u 5 Exemplo 14. Calcule lim tg x x x→0 . Solução: Note que: tg x x Segue que: lim x→0 tg x x = sen x x cos x = 1 sen x . cos x x 1 sen x 1 sen x . = lim . lim =1 x→0 cos x x→0 cos x x→0 x x = lim Exemplo 15. Calcule lim x→π sen x . x−π Prof. Edilson Neri | Prof. André Almeida 7 Cálculo I Aula n o 05 Solução: Fazendo u = x − π , temos: sen x x−π = sen (u + π) u = sen u cos π + cos usen π u =− sen u u . Quando, x → π , temos que u → 0. Portanto: lim x→π sen x x−π = − lim u→0 sen u u = −1. 5 Limite de uma Função Composta Nosso intuito nessa seção é estudar o limite de uma função composta. Apresentaremos dois resultados importantes para o nosso estudo que nos permitirá calcular certos limites que ainda não eram possíveis. Teorema 5. Sejam f, g duas funções tais que Imf ⊆ Dg . Se lim f (x) = b e g é contínua em b, então, a x→a composta g(f (x)) será contínua em a e lim g(f (x)) = g lim f (x) x→a x→a Exibiremos agora alguns exemplos de utilização do resultado anterior. Exemplo 16. Calcule: (a) lim cos x→1 (b) lim r x→1 √ 1− x ; 1−x x2 − 1 ; x−1 (3 − x3 )4 − 16 ; x→1 x3 − 1 √ 3 x+2−1 . (d) lim x→−1 x+1 (c) lim Solução: (a) Um primeiro passo a ser dado é identicar na composta g(f (x)) = cos f (x) e g(u). Nesse caso, ca claro que √ 1− x , qual é a função 1−x √ 1− x f (x) = 1−x e que g(u) = cos u Agora, devemos vericar se as funções dadas satisfazem as hipóteses do teorema 5. Primeiramente, vamos calcular o seguinte limite limx→1 f (x). Observe que √ 1− x x→1 1 − x lim Prof. Edilson Neri | Prof. André Almeida 1− √ x √ 2 1 − x √ 1− x √ √ = lim x→1 x)(1 + x) (1 − 1 1 √ = = lim x→1 1 + x 2 = lim √ x→1 2 8 Cálculo I Aula n o 05 1 O segundo passo a ser dado é vericar se g(u) é contínua em u = . De fato, pois a função 2 g(u) = cos u é contínua em R. Logo, pelo teorema 5, temos que lim cos x→1 (b) Note que h(x) = r √ √ 1− x 1 1− x = cos lim = cos x→1 1 − x 1−x 2 x2 − 1 = g(f (x)), em que x−1 f (x) = √ x2 − 1 e g(u) = u x−1 Note também que x2 − 1 x→1 x − 1 lim + 1) (x −1)(x x→1 x− 1 = lim = lim x + 1 x→1 = 2 Como a função g(u) = √ u é contínua em 2, então segue do teorema 5 que r r x2 − 1 x2 − 1 √ = lim = 2 lim x→1 x→1 x − 1 x−1 (c) Observe que não podemos enxergar nitidamente que a função h(x) = (3 − x3 )4 − 16 x3 − 1 é a composta de duas outras funções. Para isso, fazemos o seguinte método, chamado mudança de variável no limite. Como o nome diz, devemos mudar a variável x para uma variável u de tal forma que o limite possa ser facilmente resolvido. Dessa forma, façamos u = 3 − x3 Logo, a função h(x) será escrita como q(u) = u4 − 16 2−u Agora, devemos determinar a nova tendência de u. Por uma substituição simples, podemos fazer: u(1) = 3 − 13 = 2 Logo, se x → 1 então u → 2. E assim, calculamos: (3 − x3 )4 − 16 x→1 x3 − 1 lim u4 − 16 u→2 2 − u u4 − 16 = lim u→2 −(u − 2) 3 (u −2)(u + 2u2 + 4u + 8) = − lim u→2 u− 2 3 2 = − lim u + 2u + 4u + 8 = −32 = lim u→2 Prof. Edilson Neri | Prof. André Almeida 9 Cálculo I Aula n o 05 (d) Assim como no exemplo anterior, vamos aplicar a mudança de variável no limite √ 3 lim x→−1 Fazendo u= x+2−1 x+1 √ 3 x+2 temos que se x → −1 então u → 1. Logo, √ 3 lim x→−1 x+2−1 x+1 = u−1 u→1 u3 − 1 = u− 1 2 u→1 (u − 1)(u + u + 1) = lim = lim lim u→1 u2 1 + 2u + 1 1 3 O próximo teorema será útil, pois garante quando a composta de duas funções contínuas também é contínua. Teorema 6. Sejam f, g funções tais que Imf ⊆ Dg . Se f for contínua em a e g for contínua em f (a) então a função composta (g ◦ f )(x) = g(f (x)) é contínua em a. A utilidade desse último resultado é mostrado nos seguintes exemplos: Exemplo 17. Determine o maior subconjunto A de R em que a função h(x) = cos(x2 ) é contínua. Solução: Note que a função h(x) pode ser reescrita como (g ◦ f )(x) em que f (x) = x2 e g(u) = cos u. Note que f é contínua em R e g é contínua em R. Logo, pelo teorema 6, temos que a composta g ◦ f é contínua em A = R. Exemplo 18. Determine o maior subconjunto A de R em que a função h(x) = ln(1 + sen x) é contínua. Solução: Note que a função f (x) = 1 + sen x é contínua em R. Mas, a função g(u) = ln u é contínua em seu domínio que é o conjunto [0, +∞). Sendo assim, devemos tomar os valores de x ∈ Df tais que f (x) > 0, ou seja sen x > −1. Desse modo, a composta não está denida para x = ± a mesma contínua nos outros valores. Portanto, A=R− 3π 7π , ± , ..., sendo 2 2 3π + 2kπ , k ∈ Z 2 Resumo Faça um resumo dos principais resultados vistos nesta aula. Aprofundando o conteúdo Leia mais sobre o conteúdo desta aula nas páginas 85, 86, 97, 115 e 116 do livro texto. Sugestão de exercícios Resolva os exercícios das páginas 88, 90, 98, 99, 117, 118 e 119 do livro texto. 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