Dumping Social Na Perspectiva Atual Da Justiça

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BARBOSA JUNIOR, J.R.; LEAO CABRERA, R. de P. O DUMPING SOCIAL NA PERSPECTIVA ATUAL DA
JUSTIÇA DO TRABALHO
Revista Objetiva VIII – ISSN 2317-0034
O DUMPING SOCIAL NA PERSPECTIVA ATUAL DA JUSTIÇA DO
TRABALHO1
2
José Raimundo Barbosa Júnior
3
Rosângela de Paiva Leão Cabrera
Resumo
O artigo aborda o reconhecimento e aplicação do dano moral coletivo às
relações de trabalho, o denominado dumping social trabalhista. A pesquisa foi
desenvolvida através da técnica de coleta de dados: documental indireta
(documental e bibliográfica), com o objetivo de promover o aprofundamento
conceitual e teórico. Num primeiro momento destaca-se o aspecto introdutório
do recente instituto do Direito Brasileiro, seus aspectos conceituais, a própria
concepção da Justiça do Trabalho com relação a este novo desdobramento do
dano moral coletivo, os requisitos essenciais para a sua configuração, a
disciplina legal invocada pela justiça laboral para fundamentar as medidas
protetivas contra a prática do dumping social na preservação dos direitos
trabalhistas. Num segundo plano, são explanados os fatores que levaram a
Justiça do Trabalho a intervir no sentido de coibir e punir os agentes que dão
causa ao dumping social, apontando os instrumentos processuais empregados
pelo Ministério Público do Trabalho na tutela dos direitos trabalhistas bem
como a atuação de ofício do juiz do trabalho diante da reincidência das
empresas que se baseiam nesta prática como estratégia de mercado, e seus
reflexos na jurisprudência trabalhista. Por fim, apresenta a destinação das
indenizações fruto do trabalho árduo do Ministério Público do Trabalho e da
Magistratura do Trabalho, e as críticas a esta destinação, sobretudo com
relação ao FAT - Fundo de Amparo ao Trabalhado, e ao mesmo tempo
enaltece a criatividade dos juízes e procuradores do trabalho a dar efetividade
nas reparações dos danos sociais ao reverterem às condenações à
comunidade afetada.
Palavras-chave: Dumping Social. Dano Moral Coletivo Trabalhista. Trabalho.
1
Artigo resultante do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) do curso de Direito do
IESRIVER/Faculdade Objetivo realizado no segundo semestre de 2011.
2
Advogado, Graduado em Direito pelo Instituto de Ensino Superior de Rio Verde –
IESRIVER/Faculdade Objetivo.
3
Orientadora, Advogada, Graduada em Direito (Universidade de Rio Verde) e Ciências
Contábeis (FESURV), Especialista em Direito Administrativo Contemporâneo (IDAG).
Professora de Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho no Instituto de Ensino
Superior de Rio Verde – IESRIVER/Faculdade Objetivo.
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JUSTIÇA DO TRABALHO
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1. Introdução
O trabalho humano não deve ser encarado como objeto de livre
disposição, o trabalho é muito mais que isso, é elemento essencial que garante
a sustentação de toda sociedade e da cadeia produtiva de uma nação. Neste
sentido, o Estado que avocou para si a tutela dos litígios e o resguardo dos
direitos, deve criar meios para proteger o trabalhador de forma individual, mas,
sobretudo a sociedade, como um só organismo, que depende da valorização
do trabalho para se desenvolver.
Frente a este aspecto, o Poder Judiciário consciente do seu papel como
parte da sociedade que é, vem atualmente assegurando a proteção jurídica
com vistas à prevenção e a reparação dos danos morais suportados pela
coletividade.
Diante desta atual conjuntura social que prima pela supremacia dos
interesses sociais, a Justiça do Trabalho inova, ao passo que amolda à seara
trabalhista os fundamentos do dumping social dando efetividade nas
reparações às lesões suportadas pelos trabalhadores e, ao mesmo tempo,
responsabilizando as empresas que dão causa a essas lesões, aplicando-lhes
sanções civis de caráter pecuniário associadas na maioria das vezes a
obrigações de fazer, capazes de prevenir novas reincidências.
A legislação brasileira contempla instrumentos processuais próprios a
promoverem a defesa de interesses difusos, individuais homogêneos e
coletivos, agregados com a postulação de reparação de danos morais, nos
termos do artigo 1º, IV da Lei nº 7.347/85, artigo 5º, V e X da Constituição
Federal de 1988 e artigo 6º, VI da Lei nº 8.078/90.
A reparação de danos em razão da prática de dumping social tem seu
principal fundamento na prevalência dos direitos coletivos em sobreposição aos
direitos individuais. A condenação de empresas que adotam essa prática como
estratégia de mercado vem tornando-se uma conquista na preservação dos
direitos coletivos.
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2. Considerações Preliminares Acerca Do Dumping Social No Direito Do
Trabalho
A valorização do trabalho elencado no rol dos fundamentos da República
Federativa do Brasil vem, no contexto atual assumindo dado grau de
importância frente às garantias de afirmação dos direitos humanos,
fortalecendo o significado do Estado Democrático de Direito.
O trabalho é sem dúvida parte integrante dos elementos da dignidade da
pessoa humana, e sendo assim a condição de trabalhador no contexto das
relações de trabalho deve ser reconhecido como função social por analogia à
condição de exercício pleno de cidadania.
No direito brasileiro já se encontra pacificado o cabimento do dano moral
em seu aspecto individual, vez que o texto constitucional de 1988 em seu artigo
5°, incisos V e X, assegura a reparação civil quando da violação de certos
direitos.
Como o direito e a sociedade não estáveis, o seu dinamismo cria novas
necessidades de acordo e ao tempo em que os acontecimentos vão se
desencadeando. A sociedade, pela sua natureza política é constituída, na sua
maioria, por grupos que se organizam por inúmeros motivos, e que em
decorrência desta união compartilham de direitos e obrigações comuns, ou
seja, são sujeitos passivos de agressões que refletem socialmente em toda a
sociedade.
De fato, partindo desse pressuposto, deve-se reconhecer o
cabimento e a tutela do dano moral em seu aspecto coletivo.
Assim, o reconhecimento do dumping social pela justiça brasileira pautase pela existência perceptível de uma moral decorrente de uma coletividade
exposta e propicia a lesão, no sentido que direitos básicos são violados, vez
que o sentimento de coletivização dos direitos oriundos da sociedade de massa
solidifica-se a cada dia dentro do contexto social atualmente instituído.
Nesta perspectiva de pensamento que a teoria do dumping social, no
âmbito da Justiça do Trabalho, teve sua origem, sob o contexto de globalização
da economia, da ampliação dos mercados e da concorrência entre empresas
frente à proteção individual e coletiva dos trabalhadores.
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A ANAMATRA (Associação Nacional dos Magistrados Trabalhistas), ao
analisar a questão do dumping social, estabeleceu, em seu Enunciado n° 4 da
1ª Jornada do Direito e Processo do Trabalho:
As agressões reincidentes e inescusáveis aos direitos trabalhistas
geram um dano à sociedade, pois com tal prática desconsidera-se,
propositalmente, a estrutura do Estado social e do próprio modelo
capitalista com a obtenção de vantagem indevida perante a
concorrência (ANAMATRA, 2007).
A doutrina também vem acompanhando a transferência do dano moral
para a esfera coletiva. Acerca do instituto, leciona Bittar Filho (1994, p. 45)
conceituando dano moral coletivo como:
A injusta lesão da esfera moral de uma dada comunidade, ou seja, é
a violação antijurídica de um determinado círculo de valores coletivos.
Quando se fala em dano moral coletivo, está-se fazendo menção ao
fato de que o patrimônio valorativo de uma certa comunidade (maior
ou menor), idealmente considerado, foi agredido de maneira
absolutamente injustificável do ponto de vista jurídico: quer isso dizer,
em última instância, que se feriu a própria cultura, em seu aspecto
imaterial.
O dumping social ou dano moral coletivo deve ser entendido como
sendo a violação de direitos de grupos sociais determinados ou, até mesmo
devido ao grau e a extensão dos direitos violados, da própria sociedade como
um só organismo.
É imperioso ressaltar que a ideia de dumping social nas relações de
trabalho é decorrente do reconhecimento dos direitos sociais frente à
sociedade como um só corpo detentora de direitos e obrigações. Assim, tem-se
que esta prática pode atingir tanto os indivíduos considerados como parte
integrante de um grupo quanto os direitos cuja titularidade o grupo em si
detêm.
Partindo da análise destes conceitos, empregados pela Justiça do
Trabalho, pode-se extrair a essência deste instituto. Assim, tem-se que a lesão
moral coletiva decorre não somente da violação de direito difuso ou coletivo,
mas de toda violação legal cuja gravidade faça transbordar efeitos para além
das fronteiras do individualismo, causando indignação social.
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Ainda assevera Bittar Filho (1994, p. 55), para que o dano moral coletivo
esteja caracterizado é indispensável à presença dos seguintes requisitos:
(1) a conduta antijurídica (ação ou omissão) do agente, pessoa física
ou jurídica;
(2) a ofensa significativa e intolerável a interesses extrapatrimoniais,
identificados no caso concreto, reconhecidos e inequivocamente
compartilhados por uma determinada coletividade (comunidade,
grupo, categoria ou classe de pessoas titular de tais interesses
protegidos pela ordem jurídica);
(3) a percepção do dano causado, correspondente aos efeitos que,
este fato, emergem coletivamente, traduzidos pela sensação de
desvalor, de indignação, de menosprezo, de repulsa, de inferioridade,
de descrédito, de desesperança, de aflição, de humilhação, de
angústia ou respeitante a qualquer outra consequência de apreciável
conteúdo negativo;
(4) o nexo causal observado entre a conduta ofensiva e a lesão
socialmente apreendida e repudiada.
Interessante se faz esclarecer que o dumping social não está adstrito
somente à dor e ao sofrimento que a conduta causa à Sociedade. A sua
extensão vai, além disso, vez que as condutas abarcam toda e qualquer ação
que, de algum modo, prejudique o desenvolvimento regular da sociedade ou
vise à incitação na instauração de conflitos dentro do grupo social.
A prática contumaz do dumping social pelas empresas tem evidenciado
uma reação positiva da Justiça do Trabalho, ao entender que esta conduta
configura dano moral coletivo, caracterizando ato ilícito por exercício arbitrário
dos direitos sociais e econômicos nos termos dos artigos 186, 187 e 927 do
Código Civil Brasileiro (CC). Desta forma, através deste entendimento, embora,
infelizmente o Brasil não disponha de legislação específica destinada a coibir a
conduta explanada alhures, desde 2007 a ANAMATRA vem recomendando a
aplicação de indenizações suplementares nos moldes do parágrafo único do
artigo 404/CC, como sendo alternativa eficaz e pedagógica, vislumbrando punir
empresas adeptas das agressões aos direitos trabalhistas, coibindo desta
forma a sua reincidência.
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3. Dumping Social Na Perspectiva Atual Da Justiça Do Trabalho
A Ação Civil Pública de iniciativa do Ministério Público do Trabalho
(MPT) e a fixação de ofício pelo juiz de indenizações suplementares, nos
termos do parágrafo único do artigo 404/CC em face de reparação de danos
coletivos trabalhistas são os veículos que garantem o repúdio estatal a prática
de dumping social na esfera trabalhista.
Assim, como assevera de forma precisa Mancuso (1996, p. 47) a ação
civil pública no direito brasileiro deve ser vista no contexto evolutivo dos três
grandes pilares da ciência processual:
[...] a ação, o processo e a jurisdição. A primeira deixa de ter enfoque
exclusivamente individual e passa também a se oferecer como “meio
idôneo para a expressão de relevantes interesses metaindividuais,
nos vastos espaços do universo coletivo”. O segundo se desprende
da ótica tradicional sustentada na ideia da relação jurídica entre o
Estado e o jurisdicionado e passa a servir como instrumento idôneo à
consecução de uma ordem jurídica mais justa e efetiva. A terceira
não mais se restringe ao trinômio Poder-órgão-função com o simples
objetivo de distribuir o serviço judiciário e passa também a operar
como instância estatal mais próxima do jurisdicionado, sensível aos
seus anseios e comprometida com a necessidade de uma resposta
judiciária mais célere e de melhor qualidade.
Com o crescimento das relações de trabalho em concorrência com a
globalização dos mercados, com a busca cada vez mais acirrada pela alta
produção com menores custos, o empreendedorismo de modo geral pautado
pela consecução dos objetivos comerciais vem generalizadamente frustrando
direitos trabalhistas, visando diminuir os atritos da concorrência empresarial
garantindo que os serviços ou produtos postos em circulação sejam mais
competitivos no que tange ao preço vez que custos de produção foram
reduzidos através do desrespeito as normas laborais, acarretando a obtenção
de vantagens indevidas através da redução dos custos de produção,
propiciando lucratividade indevida nas operações de venda ou prestações de
serviços.
Assim sendo, os valores coletivos fruto da amplificação dos valores dos
indivíduos, a ofensa àqueles certamente terá repercussão sobre os indivíduos
integrantes da comunidade lesada, pressupondo o dano coletivo, na medida
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em os interesses coletivos apresentam-se como síntese dos interesses
individuais, expurgados de seu conteúdo egoístico.
Neste diapasão, o dano moral coletivo desponta como sendo a violação
em dimensão transindividual dos direitos da personalidade, ou seja, que
transcende o caráter pessoal, refletindo seus efeitos a um número
indeterminado de sujeitos. Se o particular sofre uma dor psíquica ou passa por
uma situação vexatória, a coletividade vítima de dano moral sofre de
desapreço, descrença em relação ao Poder Público e à ordem jurídica
padecendo a coletividade de intranquilidade e insegurança.
O dumping social se consubstancia quando da produção de mercadorias
mais baratas, com a exploração da mão de obra a baixos custos, mediante a
utilização de formas precárias de trabalho como: jornadas extraordinárias
acima da décima hora diária, ausência do cômputo das horas itinerárias, e
outras verbas trabalhistas que são devidas em decorrência da relação de
emprego, porém sonegadas, agregado a um ambiente de trabalho inadequado,
propício a altos índices de acidentes.
Nesta perspectiva de análise, diante das frustações contumazes dos
direitos trabalhistas a Justiça do Trabalho vem coibindo esta prática ao
conceder indenizações suplementares em ações individuais. É sabido que as
multas previstas na CLT são irrisórias e ineficazes para conter os abusos que
atentam contra os direitos dos trabalhadores.
Nesta conjectura atual, a Justiça do Trabalho em atuação conjunta com
o MPT vem atuando fortemente contra a prática do dumping social. De fato,
quando se identifica a lesão reiterada aos direitos trabalhistas de determinados
grupos de trabalhadores o Judiciário Trabalhista tem realizado uma
interpretação sistemática da legislação trabalhista aplicando sanções de cunho
pedagógico às empresas que adotam o dumping social como estratégia de
mercado, na tentativa de desestimular a reincidência.
Vale dizer, que o descumprimento reiterado dos direitos trabalhistas
inverte e perverte o Estado Democrático de Direito, que no cumprimento da
ordem jurídica seu mais elementar e fundamental pilar, sem o qual nossa
sociedade moderna padece dos sentimentos de impunidade, de impotência, de
perda de valores morais e institucionais e da prevalência “do mais forte sobre o
mais fraco”.
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Sobre a questão relativa ao dumping social, vale trazer o entendimento
brilhante
exarado
na
fundamentação
exposta
pelo
Excelentíssimo
Desembargador Paulo Pimenta, em seu voto norteador do acórdão proferido no
Processo TRT – RO – 0122900-41.2009.5.18.0002, na Sessão de Julgamento
do dia 03 de março de 2010, verbis:
O dano social consiste em um prejuízo à sociedade gerado por
empresa que reiteradamente descumpre normas trabalhistas de
modo que esta atitude não gera apenas prejuízo aos seus
empregados, mas à coletividade, em virtude de violar os direitos
humanos, a livre concorrência e, ainda, mover o Poder Judiciário, por
diversas vezes, acerca das mesmas infrações em que incide com
contumácia, podendo tal dano ser de ordem patrimonial ou imaterial.
Assim, quando a violação de direitos ocasionarem importante
repercussão social, a indenização assume a função de desestimular o
ilícito, inibindo a continuidade da prática. (BRASIL, 2010b).
Como já dito alhures, as penalidades impostas pela CLT, em razão do
seu valor ínfimo, não são capazes de coibir a conduta do dumping social. Em
razão disso, e pelo fato do crescente aumento das lesões aos direitos
trabalhistas pertencentes a grupos determinados de trabalhadores, o Poder
Judiciário do Trabalho adjudicou para si a responsabilidade de coibir tais
práticas.
Nesta linha de raciocínio a jurisprudência obteve papel de destaque
como meio eficaz de prevenir o dumping social no Brasil. Assim, o judiciário
trabalhista consciente do seu papel enquanto agente de transformação social
vem apresentando uma interpretação integrada de toda a legislação pátria no
sentido de promover a reparação adequada ao dano moral social na órbita
coletiva.
A atuação de ofício pelo juiz do trabalho na condução do processo
trabalhista, como detentor do poder de adequar o direito material à realidade
social, vem contribuindo eficazmente com a diminuição da ocorrência da
prática de dumping social. Pautado por este entendimento, a magistratura
trabalhista vem lançando mão da aplicação de indenizações suplementares
com fundamento jurídico na prevalência dos direitos fundamentais como
mecanismo de orientação do exercício do poder.
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O parágrafo único do artigo 8°/CLT autoriza a Justiça do Trabalho utilizar
o direito comum como fonte subsidiária do Direito de Trabalho desde que os
dispositivos não sejam incompatíveis com os princípios do direito do trabalho.
Neste rol de instrumentos jurídicos está a aplicação de ofício pelo juiz
das prerrogativas do parágrafo único do artigo 404/CC, ao processo trabalhista,
sobretudo diante da configuração das elementares do dumping social.
Defensor desta atuação mais ativa dos juízes do trabalho o magistrado
Maior (2007, p. 8), afirma que:
Já passou, portanto, da hora do Judiciário trabalhista brasileiro tomar
pulso da situação e reverter esse quadro, que não tem similar no
mundo. Há algum tempo atrás, mesmo que indevidamente, porque
alheio a uma análise jurídica mais profunda, até se poderia sustentar
que a culpa pela situação vivida nas relações de trabalho, quanto ao
descumprimento da legislação trabalhista, não seria dos juízes, mas
de uma legislação frágil, que não fornecia instrumentos para correção
da realidade. Hoje, no entanto, essa alegação alienada não se
justifica sob nenhum aspecto. Como visto, o próprio Código Civil, com
respaldo constitucional, apresenta-se como instrumento de uma
necessária atitude contrária aos atos que negligenciam,
deliberadamente, o direito social e, portanto, aplicando-se normas e
preceitos extraídos da teoria geral do direito, a atuação dos juízes
para reparação do dano social sequer pode ser reprimida
retoricamente com o argumento de que se trata da aplicação de um
direito retrógrado originário da “mente fascista de Vargas”.
Deste modo, a atuação do juiz se faz imprescindível na prevalência da
ordem jurídica, na afirmação dos direitos transindividuais e, sobretudo na
prevenção das condutas atentatória contra os direitos trabalhistas em especial
àquelas que configuram o dumping social.
4. A Destinação Das Indenizações Por Dumping Social No Direito
Brasileiro
Dentre as formas de reparação dos danos causados pelo dumping social
esta a imposição de multas pecuniárias, como expressão de sanção civil
destinada a desestimular a reincidência de tais práticas. Notoriamente, quando
se fala em aplicação de penalidade expressa em dinheiro tem-se que a forma
de apuração do quantum indenizatório deve ser arbitrado, pelo julgador da
matéria, observadas às circunstâncias específicas do caso, com fulcro na
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equidade e na razão, levando em consideração o sentimento pedagógico da
sanção cujo intuito de desestimular outros casos semelhantes.
Nesta mesma linha de pensamento Ramos (1998, p. 82) preceitua que,
“a quantificação do valor reparatório, destarte, levará em conta a extensão, a
gravidade e a repercussão da ofensa, observando-se o grau de culpa do
ofensor e a intensidade do efeito negativo do dano infligido à coletividade”.
Com se vê não há parâmetros a serem seguidos pelo juiz quando da
fixação da reparação de danos oriundo do dumping social ou qualquer outro
meio capaz de lesar direitos da coletividade. Em virtude dessa omissão
legislativa Mirra (1997, apud LEITE, 2000, p. 449) apresenta entendimento que
merece destaque:
Ante a inexistência, no ordenamento jurídico, de normas legais que
versem sobre as formas específicas de reparação do dano
extrapatrimonial individual ou coletivo, fornecendo critérios que
possibilitem uma melhor apuração do valor a ser indenizado àquele
título, alternativas tiveram de ser buscadas, tanto pela doutrina
quanto pela jurisprudência.
De fato, para que não se deixasse o dano moral sem reparação,
especialmente após o advento da Constituição da República
Federativa do Brasil, em que o mesmo foi erigido à condição de
garantia individual e coletiva de todos os cidadãos, a doutrina
privatista encontrou, dentro do próprio ordenamento jurídico vigente,
uma solução para o impasse. Trata-se da norma contida no art. 1.533
do CC, que, inserido na parte relativa à liquidação das obrigações
resultantes de ato ilícito, dispõe que, nas hipóteses ali não previstas,
se fixará por arbitramento a indenização.
A condenação em pecúnia deve ser empregada com cautela quanto ao
montante imposto, eis que o excesso da medida acaba por desvirtuar seus fins
jurídicos e pedagógicos. Sobre este aspecto ensina de Carvalho (2000, p. 21 e
42):
[...] havendo dano a interesse público ou difuso, perfeitamente
possível a imposição de reparação civil com caráter marcadamente
sancionatório sob a forma de dano punitivo. Contudo, a imposição de
indenização com caráter de sanção deve ser cercada de cuidados
para não exorbitar sua finalidade repressiva e dissuasiva.
[...] A sua aplicação comedida e prudente levaria a uma maior esfera
de proteção ao interesse público e aos novos conceitos de interesse
difuso e coletivo. A reparação, nesses casos, deve ser feita por
arbitramento judicial a exemplo do que ocorre no dano moral
tradicional.
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Uma vez efetivada a condenação, com a devida apuração do valor a ela
atribuída, cabe ao julgador determinar a sua destinação ou a forma de ser
empregado no intuito de reparar e/ou amenizar os efeitos efetivados pelo dano
moral coletivo.
A destinação das indenizações deve estar correlacionada com os
direitos violados, em regra quando da violação de direitos coletivos, a
destinação das indenizações são destinadas para o Fundo de Defesa dos
Direitos Difusos (FDD).
O FDD previsto na Lei nº 7.347/85, regulamentado pelo Decreto Federal
nº 1.306/94, tem por objetivo a reparação dos danos causados no que tange às
áreas do direito ambiental, consumidor, artístico, estético, histórico, turístico,
paisagístico, entre outros interesses difusos e coletivos. Assim, não teria razão
destinar as indenizações relativas às condenações por dumping social a tal
fundo, haja vista a incompatibilidade dos fins e objetivos do referido fundo com
a natureza dos direitos infringidos pela prática do dumping social.
Portanto, em razão desta ausência de especificidade de aplicação dos
recursos
oriundos
das
condenações
relativas
ao
dumping
social,
a
jurisprudência tem firmado o entendimento de que a destinação das
condenações no caso em tela deve ir para um fundo específico, com relação
direta a proteção dos direitos trabalhistas.
O FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), que foi criado pela Lei nº
7.998/90, e tem por finalidade manter o Programa de Seguro Desemprego, o
pagamento
do
abono
salarial
e
o
financiamento
de
programas
de
desenvolvimento econômico, conforme o artigo 10 da referida lei, tem sido o
destino da maioria das indenizações advindas das punições por dumping
social.
A título de exemplificação tem-se a sentença proferida pelo Juiz do
Trabalho Elias Soares de Oliveira da 1ª VT do Trabalho de Rio Verde/GO, nos
autos do Processo nº 0001082-82-2010-5-18-0101, entre partes: Lúcio Bento
Ferreira, reclamante, Vale do Verdão S/A Açúcar e Álcool, Susana Ribeiro de
Mendonça e outros e Agropecuária Primavera Ltda:
[…] Levando-se em conta tais circunstâncias, considero razoável
arbitrar a indenização por danos morais no mesmo patamar da
vantagem econômica que as reclamadas almejaram auferir com sua
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atitude ilícita, qual seja, oito milhões de reais, a ser revertida ao FAT
(Fundo de Amparo ao Trabalhador), e não ao reclamante, como
pretendido na inicial, pois a lesão perpetrada pelas rés atinge a
sociedade como um todo (inclusive do cidadão contribuinte que paga
seus impostos e os tem direcionados para custeio da atividade
jurisdicional recorrentemente utilizada pelas reclamadas), e não
apenas do trabalhador individualmente considerado, que, na
hipótese, já pleiteia e teve deferida a parcela sonegada, como
também será indiretamente beneficiado pela indenização em FAT,
como trabalhador que é (BRASIL, 2010a).
Assim, a destinação das indenizações resultantes das condenações por
dumping social tem como principal fonte de destinação o FAT. Todavia, esta
destinação não é regra, foi uma forma encontrada pela Justiça do Trabalho
para dar destinação os recursos obtidos, ante a ausência de norma específica.
Tal fonte de destinação é na verdade apenas uma forma, de se fazer funcionar
aquilo que não está pronto, ou pendente de legalização.
Outro aspecto contra a destinação destas indenizações para o FAT é
como entente Melo (2008, p. 114), que afirma não serem satisfatórios os
resultados da aplicação dos recursos pelo FAT, em razão deste ter outras
finalidades precípuas, além do que não há a participação da comunidade nem
do MPT na sua composição, o que de certa forma permite que a destinação
das condenações seja diversa daquela idealizada pelo artigo 13 da Lei nº
7.347/85.
A par de contornar as críticas em razão da destinação dos recursos para
o FAT, outra forma verificada na destinação das indenizações relativas a
dumping social está no campo da conciliação, nos acordos firmados perante a
Justiça do Trabalho, sobretudo, nos autos das ações civis públicas, quando o
valor é transformado em obrigações para o (a) reclamado (a), das mais
diversificadas formas, como a doação de equipamentos e bens a entidades
públicas e privadas de interesse social; financiamento de campanhas
educativas destinadas educação social; edificação de obra que de alguma
forma, amenize os danos sofridos; rateio das indenizações entre entidades que
atuam contra as práticas que deram origem as punições; entre outras que
possam amenizar o sofrimento suportado pela coletividade.
Portanto, a melhor forma de destinação aos recursos oriundos das
condenações por dumping social, seria a primeira vista a criação de um fundo
específico com esta finalidade. Assim, o dinamismo do Direito enquanto ciência
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é e será sempre a alternativa mais acertada, ou seja, a criatividade do
magistrado, o seu conhecimento dos aspectos que cercam a comunidade
afetada em virtude de seu contato dia a dia é que irá apontar no momento do
julgamento qual será a melhor destinação da indenização diante da avaliação
das circunstâncias do caso.
5. Considerações Finais
Com o advento da atual Constituição Federal não há mais dúvidas
quanto o cabimento do dano moral originário, característico das relações
individuais, inerente dos direitos da personalidade. Partindo desta premissa,
haja vista o dinamismo da sociedade nas relações envolvendo um número
cada vez maior de sujeitos, sobretudo em relação às relações de consumo,
veio em 1990 à promulgação do Código de Proteção e Defesa do Consumidor
à Lei nº 8.078/90, prevendo em seu conteúdo o dano moral coletivo destinado
à proteção de direitos cuja titularidade pertence a um número indeterminado de
pessoas.
Nesta linha de pensamento, verificou-se que, no Direito do Trabalho em
contraposição com a globalização dos mercados seria um campo fértil para a
ocorrência de danos morais coletivos. Assim, surge o instituto do dumping
social caracterizado pelo descumprimento reiterado de direitos trabalhistas em
detrimento a um número indeterminado de trabalhadores sem prejuízos dos
reflexos sociais deste ato na sociedade.
Diante da contumácia destes atos, os agentes de defesa dos direitos
trabalhistas, em especial o Ministério Público do Trabalho sentiu-se na
obrigação de agir contra esta prática nociva à sociedade. Neste contexto, o
judiciário trabalhista não se manteve inerte. Pelo contrário, age fortemente na
prevenção e punição de empresas que adotam o dumping social como
estratégia de mercado para tornarem-se, mais competitivas no mercado de
consumo.
Assim, consolidou-se um entendimento jurisprudencial robusto de plena
aplicabilidade de sanções, sobretudo pecuniárias, pela prática de dumping
social, com a aplicabilidade de indenizações suplementares, nos termos do
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parágrafo único do artigo 404 do Código Civil, com a destinação destas à
reparação dos danos morais suportados pela coletividade.
Portanto, é essencial que a Justiça do Trabalho, juntamente com o
Ministério Público do Trabalho continue atentos para coibir atos atentatórios
aos direitos trabalhistas, cuja titularidade seja atribuída a sociedade operária.
Instrumentos processuais para esta finalidade são inúmeros deste a própria
Constituição Federal, a Lei da Ação Civil Pública e principalmente
jurisprudência trabalhista.
De fato, quanto mais se reconhecer a prática do dumping social nas
relações de trabalho com a consequente aplicação das penalidades cabíveis
ao caso, ter-se-á a redução desta conduta antissocial, e o fortalecimento da
consciência de valorização do trabalho.
Entretanto, convém ressaltar que somente a aplicação das penalidades
em face do dumping social é suficiente a garantir o respeito pleno aos direitos
trabalhistas entendidos como coletivos. Outro fator que deve ser levado em
consideração é destinação das indenizações, pois, como já dito, a destinação
não tem sido revertida de modo específico na restauração dos efeitos dos
danos coletivos que lhe deram origem.
A criação de fundo específico que gerisse tais recursos com participação
do Poder Público via Ministério Público do Trabalho, juntamente com a
sociedade organizada, e sindicatos, seriam, sem dúvida, a alternativa mais
sensata para que se instituísse um ciclo virtuoso em respeito à dignidade da
pessoa humana, da valorização do trabalho e da sociedade.
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