Monografia - PDF

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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO AMAPÁ
CURSO DE DIREITO
JAIME DA SILVA FERREIRA
CONTRATOS NA RELAÇÃO CIVIL E SEUS EFEITOS NO ORDENAMENTO
JURÍDICO BRASILEIRO E O REFLEXO SOCIAL DE JUSTIÇA
MACAPÁ
2008
Jaime da Silva Ferreira
CONTRATOS NA RELAÇÃO CIVIL E SEUS EFEITOS NO ORDENAMENTO
JURÍDICO BRASILEIRO E O REFLEXO SOCIAL DE JUSTIÇA
Monografia apresentada ao Curso de Direito do
Centro de Ensino Superior do Amapá/CEAP como
requisito parcial à obtenção do título de bacharel em
Direito, sob a orientação do Professor Elias Salviano.
MACAPÁ
2008
Jaime da Silva Ferreira
CONTRATOS NA RELAÇÃO CIVIL E SEUS EFEITOS NO ORDENAMENTO
JURÍDICO BRASILEIRO E O REFLEXO SOCIAL DE JUSTIÇA
Aprovado em ____________________de _____________.
BANCA EXAMINADORA
____________________________________________________________
ORIENTADOR: Prof. Elias Salviano
____________________________________________________________
1° EXAMINADOR
____________________________________________________________
2° EXAMINADOR
DEDICATÓRIA
Aos meus professores e principalmente ao orientador deste
Trabalho de Conclusão de Curso Elias Salviano, os quais
imensamente contribuíram em minha formação.
Homenagem póstuma especial ao meu pai Benedito Guedes
Ferreira.
E especialmente a minha mãe Ana Ramos da Silva Ferreira que
ainda comemora cada vitória alcançada em minha vida.
AGRADECIMENTOS
A minha esposa Katia Luisa da Silva Ferreira, aos meus filhos Igor
da Silva Ferreira e Ingrid Tainá da Silva Ferreira, pelo incentivo e
amor. Motivos pelos quais hoje eu concluo mais uma graduação
com honra e orgulho de ter ao lado pessoas únicas e tão especiais
que nunca me deixaram na mão nem em momentos difíceis.
O meu muito obrigado pelo fato de vocês existirem e serem partes
de minha vida.
RESUMO
Esta pesquisa científica trata-se de um estudo histórico acerca do conceito e da função
do contrato na relação civil das formas mais primitivas até a contemporânea. Para isso,
faz-se um resgate dos tipos, períodos de vigência, normas de regulação, importância e
necessidade da existência dos contratos desde o início dos tempos. Percebe-se com
este que antes mesmos da existência da escrita já existiam relações civis em forma de
contrato e que estas foram evoluindo conforme as mudanças históricas. Como principal
norteadora dos princípios que regem o contrato destaca-se o período pós-guerra, época
em que idéias capitalistas no setor econômico, político e social estavam em ascensão.
Nesta época, ideais de justiça social e igualdade começaram a emergir, não era mais
concebível o uso do poder e força para se sobrepor nas relações contratuais à classe
hipossuficiente. Por isso, houve uma reestruturação nas relações contratuais e o estado
passou a normatizar através da lei, o Código Civil a regulamentação da autonomia da
vontade e obrigatoriedade dos contratos visando o combate a desigualdade entre as
partes.
Palavras-chave: história, contrato, Código Civil, justiça social e igualdade.
ABSTRACT
This scientific research is about a historical study concerning the concept and of the
function of the contract in the civil relationship in the most primitive ways to the
contemporary. For that, it is made a ransom of the types, validity periods, regulation
norms, importance and needs of the existence of the contracts since the beginning of
the times. It is noticed with this before same of existence the writing civil relationships
already existed in contract form and that these went developing according to the
historical changes. As main objective of the beginnings that govern the contract stands
out the postwar period, time where idealize capitalists in the section economical, political
and social were in ascension. In this time, ideals of social justice and equality began to
emerge, it wasn’t more conceivable the use of the power and it forces to put upon the
contractual relationships to the lacking class. Therefore, there was a restructuring in the
contractual relationships and the state passed the established through the law, the Civil
Code, the regulation of the autonomy and compulsory nature of the contracts seeking
the combat to inequality among the parts.
Key-words: history, contract, Civil Code, social justice and equality.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 08
I HISTÓRICO DO DIREITO CONTRATUAL .................................................................. 10
1.1 Evolução Histórica e Concepção Jurídica do Contrato até os dias atuais .... 10
1.2 Perspectiva Civil – Constitucional do Contrato ............................................... 19
1.3 Função Social do Contrato e a Justiça Social .................................................. 23
II ACEPÇÃO, PRESSUPOSTO DE EXISTÊNCIA, EFICÁCIA E VALIDADE DO
CONTRATO ............................................................................................................... 28
2.1 Acepção do vocábulo contrato/negócio jurídico ............................................ 28
2.2 Pressupostos e Elementos Constitutivos do Contrato................................... 31
2.2.1 Existência, Eficácia e Validade ...................................................................... 31
III PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO DIREITO CONTRATUAL ................................ 35
3.1 Princípios Contratuais no Novo Código Civil ................................................... 35
3.1.1 Princípio da Autonomia da Vontade ............................................................... 35
3.1.2 Princípio da Obrigatoriedade do Contrato ..................................................... 36
3.1.3 Princípio da relatividade das partes .............................................................. 37
3.1.4 Princípio da Intangibilidade do contrato e Outros ........................................ 37
3.1.5 Princípio da Boa-Fé.......................................................................................... 38
IV CONTRATOS EM ESPÉCIES .................................................................................. 40
4.1 Contratos no Código Civil ................................................................................. 40
4.2 Regras de Interpretação dos contratos ............................................................ 42
4.2.1 Cláusula Geral – Características .................................................................. 43
CONCLUSÃO .............................................................................................................. 45
REFERÊNCIAS ............................................................................................................. 47
INTRODUÇÃO
Desde os tempos mais remotos a ocorrência de relações na forma de contrato tem
estado presente na sociedade civil. Fato que torna relevante e necessário haver mais
estudos acerca do assunto, principalmente para atender melhor os interesses dos
contratantes.
Então, conhecer as transformações ocorridas historicamente e compreender a
função do contrato na sociedade civil é uma maneira de nortear as formas de se
contratar a partir dos princípios do Direito.
Numa visão sociológica das convenções se atribui ao contrato uma função social
que emergiu historicamente após a segunda guerra mundial. Pois, neste período
ocorreram mudanças políticas, econômicas e sociais que nortearam não só as
mudanças na estrutura, função, princípios, entre outros fatores presentes no
fundamento da relação jurídica como dos negócios de uma maneira geral e inclusive na
forma de organização social.
A
preocupação
principal
foi
à
questão
das
cláusulas
abusivas,
que
proporcionavam um enriquecimento de uma classe, em detrimento da exploração de
outra. A força, o poder, então, era sobreposta pela classe dominante aos demais, ou
seja, o capitalismo se revigorava baseado na exploração.
Por isso, houve a necessidade de repensar a tendência individualista e egoísta
que tomava conta dos negócios e na busca do equilíbrio das partes, o estado avançou
doutrinariamente e jurisprudencialmente sobre a função social do contrato civil,
focalizando a justiça social com o intuito de abordar de forma clara e objetiva os
problemas enfrentados quando as obrigações pactuadas não eram cumpridas, de forma
a fornecer um instrumento valioso de segurança, repercutindo na sociedade as
espécies de pactos relevantes e razoáveis.
Assim, o Código Civil foi avançando e de 16 até o Novo Código Civil os preceitos
de cunho moral, boa-fé, probidade, equilíbrio na relação, regras de interpretação foram
substituindo o individualismo exacerbado presente no século XIX e XX.
Sob a ótica da pesquisa bibliográfica aprofundada, este Trabalho de Conclusão
de Curso de natureza básica se fundamentou, solidificando os estudos e análises
baseados na bibliografia disponível e na jurisprudência.
Para após as leituras e reflexões exclarecer como a ação contratual é organizada
na relação civil brasileira considerando seus aspectos e efeitos no sistema jurídico do
país e sua repercussão social.
I HISTÓRICO DO DIREITO CONTRATUAL
1.1 Evolução Histórica e Concepção Jurídica do Contrato até os dias atuais
Nas antigas e primitivas civilizações é possível verificar a existência de contratos.
Isso porque nessa época remota da história o homem já vivia em comunidade com seu
semelhante. Nesse tempo, o direito primitivo se estabelecia pelo costume e tradições
chamados de leis consuetudinárias, estas regulavam os contratos e eram concebidos
naquele tempo como acordos realizados, ou seja, verdadeiros pactos. Tal situação
ocorria mediante as condições que o homem se deparava e diante das dificuldades que
enfrentavam.
Deste modo, perceberam que essas dificuldades poderiam ser superadas por
meio de contratos, os acordos recíprocos. A razão da existência destes contratos partiu
da necessidade de adquirir produtos que alguns tinham, mas outros não. Então,
pensaram em fazer o escambo, a troca de mercadorias para suprir a necessidade por
determinados produtos. Assim, uma tribo, para fornecer produtos ou cessão de um
direito, era representada pelos seus chefes ou comissários e estes pactuavam em
nome da tribo. Resultava que todo o grupo-credor poderia exigir o cumprimento do
grupo que desobedecia ao que houvera acordado previamente.
Formas específicas de contratos foram identificadas na antiga Mesotâmia, a
partir das leis escritas, primeiros enunciados conhecidos acerca dos contratos. Estas
leis eram chamadas de Leis de Eshnunna, promulgadas provavelmente entre os anos
de 1825 e 1787 a.c., período que realizavam compra, venda, arrendamento de bens e
empréstimos a juros, ou seja, tratava-se de um povo que vivia do comércio.
Anos depois, por volta dos 1.800 a.c. a 1758 a.c foi editado o Código de
Hamurabi no Império Babilônico, e neste, também previa-se dispositivos semelhantes à
lei de Eshnunna. O Código regulamentava alguns contratos específicos: entre eles o
arrendamento de terras, de mútuo de dinheiro, da prestação de dinheiro, etc. As taxas
de juros cobradas, assim como o preço de certos serviços prestados eram prescritas no
parágrafo 268 do citado código que: “Se um homem alugou um boi para semear um
grão, seu aluguel era de 2 sutu de cevada”, o que equivalia a 20 litros de cevada. Neste
código também era fixada a taxa máxima de juros.
Então, se observa nas leis escritas da época que se dava uma garantia a mais
aos contratantes, entretanto, as leis, até o momento não eram sistematizadas, ou seja,
coesas e coerentes. O que se podia notar nesses códigos é que continham um conjunto
de normas, as quais podiam ser interpretadas literalmente, isto é, gramaticalmente, sob
uma interpretação superficial, porque não se estendia além das letras escritas e frases
isoladas.
O Direito Romano Antigo foi o primeiro a sistematizar e a regulamentar o
contrato, criando algumas categorias de contratos já inventadas por outros povos
antigos, anterior aos romanos. Assim, os aperfeiçoaram, inovando as relações jurídicas
estipuladas por meio de contrato. Este ato submetia o devedor ao poder do credor por
causa da forte presença dos dogmas religiosos, fazendo-os temer os castigos dos
deuses. O cumprimento do contrato, portanto, era questão de honra e o vínculo jurídico
era pessoal e em caso do devedor não cumprir com a obrigação, o credor poderia
inclusive atingir o corpo do devedor fisicamente, inclusive poderia escravisá-lo. Deste
modo, estava implementada a justiça privada, e, o vínculo, evidentemente, tinha caráter
extremamente pessoal.
Assim, os contratos, como todos os atos jurídicos, tinham caráter rigoroso e
sacramental. As formas eram obedecidas, ainda que não expressassem exatamente à
vontade internas das partes, ou seja, o querido ou pretendido. Na época da Lei das XII
Tábuas, por volta de 449 A.C., a intenção das partes estava materializada no que se
expressavam verbalmente e corretamente à vista dos interessados, ou seja, dos que
firmavam no contrato, e deste fazendo parte.
No Direito Romano Clássico se evidenciava a utilização de três vocábulos para
distinguir fenômenos iguais, entretanto estes tinham para o direito da época suas
particularidades. Estas eram a convenção, o contrato e os pactos, formas de contrato
que os romanos adotaram por muito tempo.
A Convenção trata-se do gênero e, assim, qualquer relação contratual era uma
convenção que tinha como espécie o contrato e o pacto. Estes contratos se firmavam
em convenções normatizadas e era protegida pelo chamado Ius Civilis, que tratava-se
de uma ação judicial destinada a solucionar possíveis litígios previstos pelo direito civil
romano.
Estas espécies contratuais se subdividiam em três: a) Litteris, espécie de
contrato em que consistia em transcrever literalmente o que as partes falavam no
momento da contratação, o que exigia registro no livro do credor, codex, que se tratava
de um tipo de livro caixa; b) ré, que consistia na realização contratual pela tradição, isto
é, pela entrega efetiva da coisa, objeto do contrato e c) verbis, espécie que consistia em
celebrar o contrato pela troca de expressões orais no ato da celebração, solenemente,
como em um ritual religioso.
Havia outra categoria de convenção, denominava-se pacto, espécie de acordo
não previsto em lei, o qual além de não exigir formalidades, não era protegido pela ação
judicial.
Excetuando-se os pactos mais importantes, como os de venda, locação,
mandato e sociedade, estes são os contratos consensuais para os quais se criou tal
proteção.
Foram os pretores, magistrados de alçada inferior à de juiz de direito que tinham
como função distribuir a justiça, que começaram a proteger os pactos através de Editos.
Estes se tratavam de parte de lei em que eram preceituadas algumas regras,
publicadas por meio de decretos, ordem judicial e mandatos em anúncios ou editais,
motivo pelo qual foi elevado à categoria de contratos e tinha como fundamento o
consensualismo das partes na realização dos mesmos. Tais contratos envolviam venda,
locação, mandato e sociedade, declarando-se a vontade sem qualquer formalidade.
Seguindo a trajetória do contrato na evolução histórica, chega-se a Idade Média,
período em que a forma de contratos recebeu influência do Direito Germânico. Estes se
preocupavam com a inadimplência na obrigação contratual e se ensejava a escravidão
ou a prisão do devedor.
As práticas medievais evoluíram e se transformaram nas traditio cartae, as cartas
de entregas, que é a materialização pelo documento. A forma escrita passa, então, a ter
predominância e a influência da Igreja e do Renascimento dos estudos romanos na
Idade Média influenciou o sentido obrigatório do contrato.
Na idade média o direito feudal era elaborado e aplicado pelo senhor feudal em
seus feudos, onde era pressuposto um contrato prévio firmado entre o senhor feudal e
o vassalo, neste ambas as partes assumiam obrigações recíprocas. O vassalo recebia
do senhor feudal uma determinada porção de terra para cultivar, mediante o pagamento
de uma parcela da produção que seria colhida. Por outro lado, o vassalo devia ao
senhor feudal a fidelidade, ou seja, abster-se da prática de quaisquer atos hostis ou de
natureza perigosa contra, devia também o auxílium, que se tratava da disponibilização
de homens e armamentos em caso de guerras sem nenhuma remuneração. Isto
ocorreria sempre que o senhor se sentisse ameaçado ou lesado por outros senhores ou
vassalos e o consilium espécie de conselho, o obrigava auxiliar seu senhor quando
convocados.
Estes contratos na idade média foram denominados de feudo-vassálico, um ato
simbólico de extremo formalismo. Para sua efetivação era preciso que a parte fizesse a
entrega da coisa, ou de algo que a representasse, esta era a condição para que o
contrato ocorresse e tivesse validade, caso contrário ele nem existiria, ou seja, a
formalidade era obrigatória à sua realização.
As modificações nos contratos eram submetidas ao Direito Canônico e a vontade
era sobreposta como fonte do direito contratual. A palavra consignada fazia lei entre as
partes. Na época, o contrato não era somente questão jurídica, mas também, religiosa.
Então, ao realizar um determinado contrato pela vontade das partes, estas
consignavam suas palavras, que fazia lei, declarando-as, respeitando-se as regras
eclesiásticas, as que tinham poder sobre o povo, que temia ser condenado pela igreja
pelo perjúrio, ou seja, juramento falso. Assim, a boa-fé era essencial à realização do
contrato pelo juramento em nome de Deus. A fundamentação deste contrato nascia de
um ato de vontade materializado pela declaração das partes. Desta forma, o direito
canônico se estabelece em contraposição ao direito romano, no seu extremo
formalismo adotando princípios dogmáticos de que só o consentimento obriga, mas não
correspondia a realidade, pois o sentido era outro, só o consentimento obriga, não
dispensando as formalidades para provar a existência desse consentimento.
Nos séculos XIII e XIV, costumes locais nas cidades da Itália, França e outros
Países baixos da Europa admitiram o consensualismo no direito contratual. Então, para
que houvesse a celebração de contratos, os interessados teriam que, primeiramente,
estabelecer comum acordo de vontades, o que se iria tratar no contrato e ao final
chegava-se a um consenso, assim a palavra consignada continha respeito que tornava
o contrato realizado uma obrigação moral.
A idéia que repercutiu na sociedade moderna no início do séc. XVIII foi o
jusnaturalismo que era fundada na razão, nesta o homem é senhor de seus atos e não
deve se submeter a nenhuma autoridade exterior. Assim, o contrato se tratava de
norma criada pelo próprio homem, sendo esta legitimada pela vontade das partes que
sem nenhuma objeção, ou seja, livremente pactuavam. E a vontade foi eleita como
fundamento desta sociedade, da formação do Estado e da fundamentação do direito.
Na realização deste, se estipulavam deliberadamente o contrato, o qual já não era mais
fonte das obrigações, e, sim, da vontade das partes.
Com o surgimento da classe burguesa, formada de comerciantes da Idade
Média, o Estado foi encarado como um obstáculo para o crescimento econômico. E
para manter o Estado afastado das intervenções econômicas, se assumiu o
jusnaturalismo racionalista no XVIII. Período em que o direito privado passou a ser
alicerçado pelo dogma da vontade e o contrato tratado como fundamento da sociedade
capitalista. Assim, as relações privadas ocorriam a partir da vontade individual firmada
em qualquer relação contratual. Uma vez que ao assumir certa obrigação, o indivíduo
restringe a sua liberdade, porém por meio de sua própria vontade soberana.
No século XVIII, quando a burguesia assumiu o poder econômico, e, por
conseguinte, político e social surgiu o Estado Liberal, se contrapondo ao Estado
Absoluto. A partir deste movimento social burguês se assegurava ao indivíduo a
liberdade da vontade em detrimento ao absolutismo estatal reinante. O que possibilitou
o surgimento de uma nova realidade, pois o Estado Liberal tinha como característica:
poder social limitado nos direito individuais e políticos; a defesa da livre iniciativa e da
livre concorrência e a não intervenção do Estado na economia, o que impulsionou o
nascimento do Estado liberal consolidado pelo regime capitalista de produção.
Sobre este fato Adam Smith, um dos principais pensadores do Liberalismo,
declara em que: “[...] É suficiente que deixemos o homem abandonado em sua iniciativa
para que ao perseguir seu próprio interesse promova o dos demais. O interesse privado
é o motor da vida econômica (SMITH, apud DERANI, p.32).”
Esta ideologia burguesa, portanto, consistia na crença de que a atividade
econômica do homem deve ser livre, por meio autônomo da vontade em promover algo
de acordo com seus interesses, não necessitando da tutela estatal para desenvolver-se
na atividade econômica. A qual, sem dúvida foi à precursora da vida econômica.
A atividade econômica sempre despertou o interesse dos indivíduos,
principalmente porque estes estão integrados por um objetivo comum de gerar riqueza
e através dela a satisfação de seu bem-estar particular.
Diante desse quadro econômico, o contrato era considerado um instrumento de
circulação de riquezas, constituindo-se em um legítimo mecanismo para que a classe
dominante burguesa obtivesse com sucesso bens jurídicos pertencentes à classe
aristocrática em decadência. O contrato, portanto, era visto como fundamento da
sociedade capitalista e através deste se garantia liberdade e igualdade jurídica, uma
vez que estas eram oriundas da própria vontade dos contratantes. Esta liberdade se
efetivava pela auto-regulação de interesses, predominando a igualdade formal.
Então, por trás da teoria da vontade vislumbrava-se a idéia de superioridade da
vontade sobre a lei. Uma vez que as normas legais ficavam restritas apenas a fornecer
parâmetros para a interpretação da vontade dos contratantes e ainda, ofereciam regras
supletivas para as situações em que as partes não haviam regulamentado certos
pontos dos direitos e obrigações assumidas no contrato.
Mas, foi a partir do advento da Revolução Francesa que basicamente
predominou o conceito de autonomia da vontade. Conceito idealizado durante muitos
séculos e planejado por aproximadamente um século, realmente sob a ânsia de uma
burguesia que apesar de rica se encontrava à margem da política, pois o poder político
ainda estava sob poder da nobreza. Entretanto, esta classe em ascensão necessitava
de segurança jurídica e política para fortalecer ainda mais a sua atividade econômica.
Por isso, ao assumir o poder, a burguesia tratou logo de introduzir modificações
na sociedade através de idéias fundamentais que implementaram realmente, no plano
histórico, a sua concepção de liberdade e sua noção de propriedade. À extrema noção
de liberdade era radical, era necessário um Estado que não interferisse na economia.
Mas, foi com a Revolução Francesa que se inaugurou e desenvolveu-se na
época moderna, o individualismo, a partir do Código Napoleônico. Período em que
predominou o individualismo e a pregação de liberdade em todos os campos, inclusive
no contratual.
Entretanto, na primeira e segunda guerra mundial se alteraram os
valores do individualismo que, a largo espaço foi substituído pelo valor social.
Foi através da ascensão da classe burguesa que se assumiu o domínio da
sociedade e a continuação do poder social ocorreu justamente nos corpos legislativos
e, mais ainda, o da ordem jurídica, que a moldou, para que viesse assegurar, de forma
contínua e permanente seus interesses.
No entanto, foi no Século XIX que o direito contratual forneceu meios mais
simples e seguros proporcionando maior eficácia a todos os acordos de interesses.
Nesta época optou-se pela eliminação quase completa do formalismo e o coeficiente de
segurança das transações abriu espaço à lei da procura e da oferta. O que restringiu a
liberdade de estipular, mas deixou de proteger socialmente os mais fracos na relação
contratual, criando oportunidades amplas para os fortes economicamente, os que
emergiam de todas as camadas sociais.
Todos estes fatores contribuíram para instauração de um novo panorama no
campo político, econômico e social. Os Estados Liberais foram consolidados,
fundamentados por uma ideologia individualista pautada na Revolução Francesa e no
estabelecimento
do
regime
capitalista
de
produção.
A
Revolução
Industrial
proporcionou grandes transformações de caráter sócio-econômico na vida econômica
dos indivíduos e os contratos revelam-se instrumentos de grande valia da vida
econômica desta época: pois garantiam a regulação de interesses individuais e de
igualdade entre as partes contratantes. A partir dessa ideologia liberal denominada
modelo clássico de contrato foi consubstanciada nas acepções de ampla liberdade de
contratar e total subordinação de seus termos, ou seja, se fazia a lei entre as partes.
Como princípios norteadores desses contratos predominaram a igualdade das
partes, a obrigatoriedade dos contratos, autonomia da vontade (liberdade contratual), a
relatividade dos contratos (efeitos restritos às partes), e a intangibilidade destes. O que
não correspondia à realidade de fato, pois ao exercer tal liberdade levada ao extremo,
observou-se que esse modelo, em vez de libertar, cada vez mais escravizava a parte
social ou economicamente mais fraca na relação contratual. Assim, a isonomia que se
pretendia entre as partes enfraquecia diante do poderio econômico das grandes
indústrias em desenvolvimento, as que impunham unilateralmente suas condições.
Desta forma, a liberdade em escolher com quem contratar aos poucos ia sendo
mitigada pela impossibilidade de satisfação das necessidades dos indivíduos em
adquirir bens do grande produtor.
Essa realidade em particular, nas relações trabalhistas, levou o Estado a adotar
medidas mais participativas, passando a intervir nas relações privadas em três aspectos
do regime contratual: criando, através de lei, uma superioridade jurídica que
compensasse a inferioridade econômica e social da parte mais fraca; reconhecendo e
apoiando grupos organizados de representação ou impondo certo conteúdo a alguns
contratos, condicionando sua validade à autorização do poder público.
A Revolução Industrial funcionou como uma mola propulsora de verdadeira
“Revolução” na concepção, libertando-o do seu paradigma clássico, individualista,
formalmente igualitário e privado para incorporar uma interferência estatal. Um
instrumento de equilíbrio social necessário para coibir possíveis abusos da parte social
e economicamente mais forte e, a sobrepor o interesse social ao privado, momento em
que surge o Estado Social.
Após a Segunda Guerra Mundial, uma nova concepção de contrato foi proposta
pelo Estado Social. A vontade perde o seu valor fundamental da relação contratual,
surgindo elemento estranho às partes, porém básico para a sociedade do século XX
como um todo: o interesse social. Esta concepção de contrato apresenta
eminentemente uma função social, pois agora não só o momento da manifestação do
consenso importa, mas também e, principalmente os efeitos do contrato na sociedade
serão levados em conta.
Sob este prisma, o Estado Social, na ótica do direito, deve ser entendido como
aquele que acrescentou à dimensão política do Estado Liberal, a dimensão econômica
e social mediante a limitação e controle dos poderes econômicos e sociais privados e a
tutela dos mais fracos. Ele se revela pela intervenção legislativa, administrativa e
judicial nas atividades privadas.
As Constituições Sociais são assim compreendidas ao regularem a ordem
econômica e social, com maior rigor, para evitar os abusos daqueles mais fortes
economicamente em detrimento dos mais fracos. O que normalmente se constatava
nos negócios jurídicos sob a vigência do Estado Liberal que tinha função
exclusivamente individual no contrato, sendo esta incompatível com o Estado Social,
resultante das transformações sociais, econômicas e políticas do século XX. Período
em que surgem os novos preceitos no direito contratual que rege as atuais figuras
vigentes no mundo contemporâneo, no que se refere à contratação de massa,
conseqüência da massificação social e das relações sociais.
O paradigma do contrato paritário e do livre acordo entre as partes, praticamente
não existe mais. Isto quer dizer que na modernidade prevalecem os contratos de
adesão e neste a vontade de apenas uma das partes é livre, restando ao aderente a
contratação em bloco, sem discussão de cláusulas, ou não se contrata.
A industrialização permitiu a concentração de grandes capitais e a formação de
grandes empresas, a produção em larga escala cresceu; tais fatos também marcaram o
início de uma profunda transformação no sistema de bens e serviços, que atingiu da
mesma forma o campo contratual. Então, dificilmente se poderia falar em vontade livre,
onde uma das partes impunha as condições ao contratar. Tudo isso contribuiu para
liberação
do
paradigma
clássico,
individualista,
formalmente
igualitário
e
predominantemente privado para incorporar a interferência estatal, necessária
observada como instrumento de equilíbrio social, o qual prioriza o interesse social ao
privado.
1.2 Perspectiva Civil – Constitucional do Contrato
No Código Civil de 1.916 o direito privado brasileiro revelou com bastante ênfase
uma índole individualista e voluntarista que era prevista no corpo sob a influência do
Código Napoleônico e de diversas outras codificações do século XIX. Assim, as
principais relações jurídicas tuteladas na virada do XVIII para o século XIX restringiamse ao sujeito contratante e ao proprietário. Estes eram consagrados como valor jurídico
de proteção e tinham ampla liberdade para contratar, circular riqueza e adquirir bens e
serviços, como uma forma de representação da ampliação da própria inteligência e da
personalidade, sem intervenção legal.
Entretanto, tratou-se de regular, sob o ponto de vista formal, a atuação dos
sujeitos de direito. E apesar do Código Civil Brasileiro ser a Constituição do Direito Civil
o modelo de contrato, cujo principal fundamento era a autonomia da vontade, não
conseguiu dar resposta satisfatórias aos anseios da sociedade atual. Isto, porque
priorizavam apenas o interesse de uma elite em ascensão, a qual ocorria de forma
injusta e desigual, onde os menos favorecidos eram explorados por ser o lado mais
fraco.
O contrato em sua formação tradicional caracterizou-se como um instrumento de
exercício de poder. A liberdade constituía um elemento simplesmente formal e hábil
para a expansão capitalista e para a espoliação dos indivíduos hipossuficientes. A idéia
apontou para a necessidade de se repensar o instituto do contrato, através da
constituição, modificando o comportamento do contrato, no âmbito coletivo, para que se
concretizasse a justiça social constitucional, dando maior ênfase à sua funcionalização.
O que ocasionou a derrubada de dogmas, como a autonomia da vontade e relatividade
dos efeitos dos contratos dando nova orientação sobre o direito contratual e seu papel
na efetivação da justiça contratual.
No Brasil, a partir dos anos 20, inicia-se o declínio da era de segurança e
estabilidade que o Código Civil Brasileiro de 1916 instituiu ao sujeito de direito nas suas
relações econômicas. Como reflexo de diversos fatos históricos, dentre os quais se
destacam: a Primeira Guerra Mundial, que resultou na falta de mercadorias e em
agitações populares; os movimentos sociais de reivindicações; e, o processo de
industrialização crescente do Século XIX. Ante a este quadro de insegurança social e
instabilidade jurídica imediatamente após a promulgação Código Civil de 1916, inicia-se
a primeira fase intervencionista do Estado. Em que se promovem leis extravagantes
com o objetivo de reequilíbrio do quadro social. Essas novas leis que se dizia serem
editadas em caráter excepcional, por ter introduzidos princípios que não os
consagrados no código de 1916, permitiam que determinadas situações pudessem ser
reguladas pelo Estado. Entretanto, sem que fosse alterada substancialmente a
centralidade e a exclusividade do referido código.
Mas, foi a partir dos anos 30 que o Direito Civil brasileiro recebeu a atenção da
política legislativa do Welfare State (Estado Providência) e se respaldou na Constituição
de 1934, cuja expressão, na teoria das obrigações, se constituía no fenômeno do
dirigismo contratual. O Estado, nesta década passou a intervir com maior freqüência e
intensidade na ordem jurídica, mediante a criação de uma quantidade de leis
extracodificadas que não apresentavam um caráter emergencial, estas tutelavam uma
gama de situações não abordadas pelo Código Civil de 1916.
A nova concepção ampliou o alcance das leis excepcionais abrindo espaço para
as chamadas leis especiais com caráter regulador de matéria específica, apresentando
um contexto legal técnico, objetivo e finalista. Fato que abalou a exclusividade do
Código Civil na aplicação do direito nas relações privadas.
Uma terceira fase na ordem jurídica brasileira iniciou com a Constituição de
1946, nesta fase o Estado acompanhou as tendências das Cartas Políticas e
Constituições do pós-guerra e inseriu normas e princípios que instituía deveres sociais
no desenvolvimento da atividade privada, passando a limitar sua autonomia, a
propriedade e ao controle dos bens.
Esta profunda alteração ocorreu por causa da preocupação que o legislador teve
em estabelecer um modelo jurídico que protegesse o sujeito do direito, garantido a
estabilidade e segurança das normas nas relações de natureza privada. Principalmente
considerando a nova realidade de interesses sociais e econômicos e preestabelecidos
pelo Estado nos seus textos constitucionais, os quais passaram a incorporar e definir
princípios pertinentes as matérias antes abordadas apenas pelo Código Civil.
Durante o século XIX, quando se afirmaram os fenômenos constitucionalistas e
de codificação, a relação que havia entre os dois demonstrava uma estrutura muita
precisa. A Constituição e o Código formavam dois instrumentos de direito distintos, mas
paralelos, que se relacionavam sob o aspecto formal, isto é, quando uma determinada
norma da Constituição tivesse um sentido que contrariasse a regra codificada ocorreria,
e ainda ocorre, o fenômeno da revogação, pela incompatibilidade entre a norma
hierarquicamente inferior com a superior, único ponto de ligação entre a Constituição e
Código Civil. Assim, este era levado à categoria superior como “Carta” constitucional.
A Constituição foi instaurada na época como um documento político com a
finalidade de definir normas de organização e competência estatal, não incidindo sobre
os demais ramos do direito, exceto em situações excepcionais, diante do momento
histórico em que predominava a instabilidade política.
O Direito Civil era identificado como lócus normativo privilegiado do indivíduo.
Nenhum ramo do direito era mais afastado do direito constitucional do que ele, era visto
como um documento estável e permanente, que demonstrava ser “firme e imutável”
para o direito comum. A Constituição fazia parte do Direito Público, por outro lado o
Código integrava o Direito Privado (autônomo, irretocável e auto-suficiente).
Ao contrário, atualmente identificam-se inúmeros pontos entre o público e o
privado sem que se precise uma delimitação entre ambos, confundindo-se interesse
público e interesse privado. Esta integração se manifesta em todos os campos do
ordenamento jurídico; seja na elaboração da categoria dos interesses difusos, seja nos
institutos privados na atribuição de função social à propriedade, no estabelecimento
imperativo do conteúdo de negócios jurídicos, na objetivação da responsabilidade ou na
obrigação de contratar.
Esta constitucionalização do Direito Civil importou na emigração dos princípios
básicos contidos no Código de 1916 para a Constituição Federal de 1988, passando a
ocupar posição central dentro do sistema jurídico. A Lei Maior de 1988 produziu uma
inversão ao eleger a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado Social
Democrático de Direito quando destituiu o direito civil de seu caráter eminentemente
patrimonialista, individualista incorporado no século XIX e inspirado no Código Civil de
1916. Então, o patrimônio deve submeter-se à pessoa, somente se legitimando,
enquanto meio de realização desta. E entre os princípios que balizaram a sociedade
contemporânea brasileira destacam-se os da dignidade da pessoa humana e da livre
iniciativa (art.1º, III e IV, da CF/88).
Na Constituição Federal de 1988 pode-se observar a coexistência dos princípios
da liberdade e da igualdade em idêntica hierarquia dentro do ordenamento jurídico,
devendo, ambos, ser interpretados e aplicados levando em consideração última a
dignidade da pessoa humana. A Constituição, portanto, provoca um repensar, em
decorrência das transformações nos antigos lares do Direito Civil, dentre elas está o
Contrato. A Constituição a todos vincula: o legislador, o intérprete, o juiz, o órgão
administrador e o cidadão. Segundo Gustavo Tepedino, Apud Geraldo, (2004, p. 8182):
[...] A adjetivação do Direito Civil, dito constitucionalizado, socializado,
despatrimonializado ressalta o trabalho que incumbe ao intérprete de reler a
legislação civil à luz da Constituição, de forma a privilegiar os valores nãopatrimoniais, a dignidade da pessoa humana, o desenvolvimento de sua
personalidade, os direitos sociais e a justiça distributiva, à qual deve se
submeter a iniciativa econômica privada e as situações jurídicas patrimoniais.
Embora se tratando do Código Civil de 1916, à leitura do atual Código Civil, também
segue a mesma diretriz em defesa da justiça social sob a ótica da dignidade do ser
humano em busca da equidade nas relações jurídicas, submetendo a autonomia
privada da vontade das partes à lei do país. A citada releitura implica no distanciamento
do individualismo e da patrimonialidade do direito contratual, mas não no sentido de
revogar tal posição, porém recondicioná-la aos direitos e garantias constitucionais que
se submetem à proteção a dignidade da pessoa humana.
Através da Constitucionalização do Direito Civil se buscou investigar a inserção
do direito civil na Constituição e estabelecer os fundamentos de validade jurídica. Deste
modo, a Constituição é o vértice máximo, norteador de toda e qualquer criação,
interpretação e aplicação da legislação civil. Ou seja, pode-se inferir que deve o jurista
interpretar o Código Civil segundo a Constituição e não a Constituição segundo o
Código, como ocorria com freqüência anteriormente. O Código Civil não pode ser visto
como uma categoria superior de “Carta” Constitucional como acontecia nos diplomas
jurídicos do século XIX.
1.3 A Função Social do Contrato e o Valor da Justiça Social
As transformações do direito contratual contemporâneo resultaram das
mudanças econômicas do século XX com o advento da produção de bens e serviços
em massa que se avolumou diante da inferioridade dos contratantes. Especialmente
dos consumidores, inferiorizados pela organização de grandes aglomerados industriais,
financeiros, que por conta de suas posições sociais impõem sua vontade, diante da
inferioridade marcante do outro contratante; no dizer de George Ripert (2002, p.24) e
Heloísa Carpena (2001, p.25), que reconheciam uma vontade demasiado poderosa
submetida a uma vontade enfraquecida.
A profunda transformação atingiu também o campo do contrato, pois a
desigualdade impunha a uma das partes condições que dificilmente se poderia
considerar vontade livre.
O livre-arbítrio dos contratantes sofre, assim, as ingerências legislativas,
permitindo o intervencionismo nas relações contratuais. Os tribunais começam a admitir
a Teoria da Imprevisão, a resolução por excessiva onerosidade, abuso do direito,
caindo por terra à antiga intangibilidade do pacta sunt servanda (os contratos são para
serem cumpridos). Como resultado o contrato como instituto jurídico sofre influência da
organização político-social em cada momento histórico, o que ressalta a relatividade de
todo instituto jurídico, em especial o do contrato.
Estudos recentes dos civilistas têm demonstrado a falácia da visão estática,
atemporal, não ideologizada do Direito Civil, que deve refletir e ser apto a responder
aos anseios da sociedade vigente. Trabalha-se com a idéia de sistema jurídico,
conceituado
como
uma
rede
hermenêutica,
axiológica
(valores
humanos)
e
hierarquizada de princípios e valores jurídicos e de decisões jurisprudenciais, que tem
como função evitar ou superar antinomias, dar cumprimento aos princípios do Estado
Democrático de Direito, assim como estão previstos de forma explicita ou implícita na
Constituição Federal do Brasil de 1988.
Sendo que a Constituição de 88 produziu uma inversão ao eleger a dignidade da
pessoa humana como fundamento do Estado Social Democrático de Direito, destituindo
o direito civil de seu caráter puramente patrimonialista, herdado do século XIX e
inspirado no Código Civil de 1916.
Essa nova concepção veio submeter o patrimônio à pessoa, somente
legitimando este como meio de idealização desta.
Na verdade, no período pós-guerra, as transformações sociais profundas do
século XX influenciaram completamente o mundo jurídico, houve mudanças intensas e
significativas na forma de se contratar, através da nova forma de pensar. E as idéias e
concepções sobre o contrato passaram a desenvolver uma função social e por meio de
seus doutrinadores influenciaram o mundo. Ocorre então uma completa alteração do
eixo interpretativo do contrato. Este, ao invés de ser visto como resultado da intenção
das partes e da satisfação de seus interesses passa a representar um instrumento de
convívio social e de preservação dos interesses da coletividade, ou seja, é o interesse
público sobrepondo-se sobre o privado, em consideração a dignidade da pessoa
humana, sendo esta última o núcleo do negócio jurídico.
No Código Civil de 2002, art. 421 é previsto que “ä liberdade de contratar será
exercida em razão e nos limites da função social do contrato”. Logo, percebe-se que, na
verdade, funcionalizou a liberdade de contratual e não o contrato em si. O princípio da
função social do contrato se localiza no texto constitucional, especificamente no art.
170, regido pela livre iniciativa à justiça social. E este valor de justiça social, expresso
no texto constitucional, no sentido e nos limites mencionados há de incidir no direito
civil.
Na teoria geral dos contratos se tem como base a noção de equidade, boa-fé e
segurança concretizando a denominada socialização da teoria contratual. Assim,
funcionalizar o contrato implica, sobretudo, atribuir ao instituto jurídico uma utilidade ou
impor-lhe um papel social. Logo, o contrato que não cumpre a sua função social, de
plano, como negócio jurídico é reconhecido por meio da valoração social, gera efeitos
jurídicos (atributivos, circulatórios e existenciais), de modo a ter superado o estrato e
existência. No entanto, os seus efeitos acabam sendo nocivos aos contratantes, ou ao
menos a uma das partes, ou ainda, a interesses gerais, por fim acaba no campo da
invalidade jurídica (nulidade ou anulabilidade).
Não obstante, em plena virada para o século XXI, ainda se sustenta a suma
aplicação do princípio da autonomia da vontade, ou seja, liberdade plena de contratar,
em número reduzido; não se dando a mínima importância a valores e princípios
constitucionais que efetivamente vieram modificar substancialmente a forma do
contrato,
incluindo-se
neste
plano,
a
relativização
das
obrigações,
a
despatrimonialização e as funções sociais do contrato.
O que prevalece atualmente não é mais a exigência pura e simples do
cumprimento das cláusulas contratuais, uma vez que o Estado interventor obriga que as
relações jurídicas sejam pautadas pela confiança, lealdade, boa-fé, não onerosidade
excessiva, sem abuso do direito da parte mais forte economicamente sobre a mais
vulnerável.
Sendo assim, qualquer norma ou cláusula contratual deve espelhar a
normativa constitucional como modo de aplicação e legitimação. Desta forma, vê-se
que novos princípios surgem, entre estes o princípio da boa-fé objetiva, o da tutela do
hipossuficiente e o da equivalência das prestações contratuais, sempre em busca da
igualdade material e da justiça contratual.
Em conformidade a esta corrente, Tartuce (2008 b) entende que a função social
dos contratos traz conseqüências dentro do contrato (intra partes) e também fora do
contrato (extra parte). O autor cita como efeito intra partes o Art. 413 do novo Código
Civil, em que há relativação da força obrigatória do contrato, justamente uma das
conseqüências da função social dos negócios jurídicos. Afirma que por esse dispositivo
o juiz deve reduzir o valor da cláusula penal se a obrigação tiver sido cumprida em
parte ou se entender que a multa é excessivamente onerosa.
Essa posição é ratificada pela própria natureza jurídica do princípio da função
social dos contratos, de ordem pública, conforme prevista no art. 2.035, parágrafo
único, do próprio Código Civil.
Em relação ao efeito extra partes, Tartuce (2008 b) cita um caso em que o
contrato, pelo menos aparentemente, é bom para as partes, entretanto de repercussão
ruim para a sociedade e cita um contrato celebrado entre uma empresa e uma agência
de publicidade. Neste, o contrato é civil e paritário, o que não traz qualquer
desequilíbrio às partes.
No entanto, a publicidade é discriminatória, conforme publicidade abusiva
prevista no art. 37, parágrafo 2 do CDC, o mesmo contendo vício neste ponto, pela
presença do abuso de direito, caracterizando uma forma de contrato que pode ser nula,
nos termos dos arts. 187 e 166, VI, do novo Código Civil.
O Contrato, em sua função instrumental, se liga a propriedade, isto é, a
instituição do contrato é reflexo da instituição jurídica da propriedade, ou seja, uma
relação de índole patrimonial. E nesse aspecto de transmissão de riqueza sua função
social foi primordialmente exercida.
Sob esta nova visão da função social é que o contrato e a propriedade devem
ser analisados em conjunto. De um lado a propriedade, meio de produção, mobiliária e
imobiliária (utilizada para produção de bens e serviços); de outro, a propriedade da
empresa capitalista sob a forma de sociedade, a qual tem sua estrutura fundada em um
contrato de sociedade. E conclui-se, portanto, que fazer parte de uma sociedade é fazer
parte de um contrato.
II ACEPÇÃO, PRESSUPOSTO E CARACTERÍSTICAS DE EXISTÊNCIA, VALIDADE
E EFICÁCIA DO CONTRATO/NEGÓCIO JURÍDICO
2.1 Acepção do vocábulo contrato/negócio jurídico atual
É inquestionável a importância dos contratos nas relações civis negociais para o
desenvolvimento do país, visto que contribui para o crescimento econômico e
conseqüentemente social deste, assim é imprescindível que sua validade esteja
prevista na jurisprudência.
Segundo Geraldo (2004, p. 50-51) o conceito de contrato é tratado da seguinte
forma:
Primeiro, o contrato é um ato de formação, uma operação criadora, ou seja, um
negócio jurídico formado mediante duas ou mais declarações de vontade que
convergem para um determinado fim prático e serve como um fato impulsionador, seja
de uma relação jurídica, seja como um conjunto de normas concretas.
Depois, o contrato pode ser um conjunto de normas previstas pelas partes, para
regular os seus próprios interesses.
E, por último, o contrato pode ser uma fonte de obrigação, representando uma
relação de direito, na qual os sujeitos, ativos e passivos, possuem direitos e deveres
que estabelecem de comum acordo.
Atualmente a doutrina define que o contrato ou se atrela a sua gênese
(voluntarista) ou a sua função (objetiva). Assim, ora o encara como ato de vontade que
visa produzir efeitos jurídicos na formação do ato, à vontade que lhe dá origem
(autonomia da vontade), ora define como um preceito (dito “norma jurídica concreta”),
que retira a sua validade da norma jurídica abstrata imediatamente superior, o que não
desvincula do caráter jurídico de seus efeitos (auto-regramento da vontade).
A autonomia da vontade e o auto-regramento da vontade são distintos, o
primeiro se liga ao momento inicial, à liberdade (“autonomia”) para praticar o ato e o
segundo, ao momento final, aos efeitos (“regras”) que do ato resultam, tutelados pelo
ordenamento jurídico.
As definições voluntaristas são dominantes na doutrina brasileira, aliás, raras
exceções, nem se cogita concepções contrárias; em alguns dos livros mais difundidos
nas faculdades de direito do País: Beviláqua, Franzem, Barros, Rodrigues,
respectivamente, apud (AZEVEDO, 2002, p. 5), assim, o definem:
[...] O ato jurídico deve ser conforme a vontade do agente e as normas de
direito; é toda manifestação da vontade individual, a que a lei atribui o efeito de
movimentar as relações jurídicas. Ato jurídico, portanto, é a manifestação lícita
de vontade, tendo por fim imediato produzir um efeito jurídico. A característica
primordial do ato jurídico é ser um ato de vontade. O ato jurídico é
fundamentalmente um ato de vontade visando a um fim etc.
Entretanto, a instrumentalidade do contrato não é revelada na posição doutrinária
em estudo, pois o contrato, atualmente, como negócio jurídico tem gênese e função,
mas é essencialmente uma estrutura e que apresenta circunstâncias negociais como
elemento definidor do negócio.
Sob a visão da linha de pensamento estrutural do contrato, a que considera as
duas concepções doutrinárias já mencionadas, apesar de criticá-las por serem
imperfeitas e não revelarem a estrutura do negócio jurídico. A voluntarista ora abrange
mais que o definido, ora deixa de abranger o todo definido. No primeiro caso, pensa-se
nas hipóteses teóricas de atos lícitos não negociais realizados por determinada pessoa
que deseja alcançar os efeitos previstos na lei. Nesse caso, se tem um ato de vontade
lícito, que visa produzir efeitos, sem que se esteja diante de um negócio jurídico. Ou
seja, a vontade não é elemento necessário para a existência do negócio, tendo
relevância somente o campo da validade e da eficácia. Quanto ao segundo caso,
quando não abrange a definição do todo definido, se tem a hipótese de conversão
substancial e o negócio que dela resulta, não engloba o que as partes desejam, ou
seja, se o negócio efetivamente realizado for ineficaz (sentido amplo), mas, contiver os
pressupostos para que seja eficaz como outro negócio, não previsto, nem desejado e
se as partes soubessem da ineficácia do negócio realizado, desejariam este outro, que
convertesse nele o negócio realizado, pois este não foi previsto e nem querido, e ainda
assim é um negócio jurídico (AZEVEDO, 2002, p.7).
A idéia fundamental da concepção da função é a transformação do negócio
jurídico em norma jurídica. Isto, porque a ordem jurídica reconhece a autonomia privada
não como fonte da norma jurídica, mas como fonte criadora de relações jurídicas e
estas nunca são normativas. A transformação do negócio em normas jurídicas concreta
é artificial.
De acordo com Azevedo (2002, p.13-14) a idéia de norma jurídica concreta,
somente se pode entender numa sentença judicial, ou outro ato equivalente. Situações
em que os negócios nulos (ou anuláveis, anulados) só podem ser vistos como nãonormas ou não negócio. Sendo considerado negócio por tratar-se de relações
comerciais em que as partes contratantes, através da autonomia da vontade prevista
juridicamente e em respeito as suas regras. De forma que, o negócio nulo somente há
de ser visto como simples fato, ainda que sem os requisitos de validade, continuando a
ser classificado como negócio, seja na doutrina como na jurisprudência.
Sobre isso, Geraldo (2001, p. 116), afirma que o direito obrigacional é
operacionalizado basicamente pelo contrato e, além disso, é exatamente a estrutura
daquilo que foi denominado “ato jurídico”, mas hoje é denominado negócio jurídico e
refere-se à estrutura dos contratos.
Para Azevedo (2002, p.16) o negócio jurídico, estruturalmente, pode ser definido
ou como categoria, isto é, como fato jurídico abstrato, ou como fato, isto é, como fato
jurídico concreto, principalmente porque a lei prevê sua obrigatoriedade, considerando
sua existência, validade e eficácia jurídica.
Como categoria é a hipótese do fato jurídico, às vezes dita como suporte fático,
que se fundamenta numa manifestação de vontade como pretendido. Nesta, o contrato
é praticado mediante certas circunstâncias negociais que fazem com que essa
manifestação seja vista, socialmente, como dirigida à produção de efeitos jurídicos e tal
circunstância é o elemento definidor do negócio. A essa declaração de vontade atribuise efeitos constitutivos de direito. Não se trata de uma simples manifestação de
vontade, e sim uma manifestação qualificada.
No caso de fato jurídico concreto, contrato é todo fato jurídico consistente quanto
a declaração de vontade e o ordenamento jurídico atribui efeitos designados como
queridos, considerando os pressupostos de existência, validade e eficácia impostos
pela norma jurídica que incide sobre ele.
2.2 Pressupostos e Caracteres Constitutivos do Contrato/Negócio Jurídico
A idéia da análise sobre o contrato deve ser feita em três planos: existência,
validade e eficácia. Somente quando se completa estes pressupostos para a sua
realização é que o contrato existe, vale e é eficaz, em um determinado ordenamento
jurídico. Então, são indispensáveis à formação e realização de qualquer contrato.
2.2.1 Da Existência, Validade e Eficácia Jurídica
Aos acontecimentos no mundo real, previsto na norma, incide sobre estes fatos,
qualificando-o como fato jurídico passa a ter existência jurídica e a produzir efeitos no
campo do direito, já que esses efeitos estão na dependência dos efeitos manifestados
como queridos pelos contratantes.
O direito, para realizar esta atribuição, exige que a declaração tenha uma série
de requisitos, isto é, exige que a declaração seja válida e para isso os contratantes
precisam estar em pleno gozo de suas faculdades mentais, que as disposições feitas
sejam lícitas e sem vícios e caso a declaração contenha dolo é ele, ao lado do erro e da
coação um dos três vícios da vontade, ou seja, o dolo presente na declaração torna o
negócio jurídico não válido, embora existente.
Entretanto, tal princípio não fica restrito a tal plano. O novo Código Civil também
incluiu a função social no plano da validade, e o fez quando inseriu os artigos 104 e
seus incisos e o 2.035, parágrafo único do Novo Código Civil que estabelece:
Art. 104. A validade do negócio jurídico requer:
I – agente capaz;
II- objeto lícito, possível, determinado ou determinável;
III – forma prescrita ou não defesa em lei.
Segundo o parágrafo único do art. 2.035, nenhuma convenção prevalecerá se
contrariar preceitos de ordem pública, tais como os constantes no mencionado diploma
legal, com a finalidade de assegurar a função social da propriedade e dos contratos.
Não obstante, a ordem pública, em caso de violação, mostra-se suscetível de ser
restaurada.
O magistrado, quando da análise de determinada cláusula contratual, pode fazer
uso do disposto no artigo 51, § 2°, do Código de De fesa do Consumidor - CDC. Ele
pode buscar a manutenção do contrato, mediante leitura interpretativa. Desse modo,
convalidará o contrato, modificando os seus efeitos, em consonância com o art. 184, do
Novo Código Civil – NCC.
No momento em que o novo Código Civil elevou o princípio da função social a
integrante da ordem pública, houve simultaneamente a atribuição a tal função o papel
invalidante. Ao passo que esse é o reflexo da ordem pública nas relações contratuais
de direito interno. Acerca da validade do negócio jurídico (contrato) é pertinente
destacar o que observa Veloso (2003, p. 12):
[...] Validade é o conjunto de requisitos que determinam a vigência de um
contrato, seus elementos constitutivos, em conformidade com o ordenamento
legal. O negócio jurídico é válido quando obedeceu a esses requisitos e inválido
caso contrário, acentuando-se que a invalidade comporta graus, conforme a
gravidade e a intensidade à norma jurídica.
Portanto, a invalidade do contrato ocorre quando é defeituoso e imperfeito, ou
seja, não corresponde aos requisitos previstos em lei como essenciais para a sua
validade.
No plano da eficácia jurídica que é a conseqüência principal do negócio jurídico,
ninguém declara a sua vontade para que não tenha sentido algum nem gere qualquer
efeito. Há casos, todavia, em que, considerando as circunstâncias, a lei recusa efeitos
ao negócio. Nestes casos, a ineficácia não atinge os atos em si, pois eles são válidos,
mas impede que os seus efeitos se projetem a determinadas pessoas.
Este é o motivo pelo qual haverá o maior reflexo da função social, no plano da
eficácia, principalmente em razão da ordem pública ser dotada de conteúdo axiológico,
por causa da atribuição de valores morais, pois assim não será toda voltada ao
princípio da função social, mas à ordem pública.
Pelo conteúdo valorativo, o princípio da função social do contrato pode ser
concretizado em graus, de maneira que, em um caso concreto, possa haver a violação
da função social e não ser atingida a profundidade necessária para haver a violação da
ordem pública, havendo, apenas, a ineficácia do contrato ou da cláusula em questão.
Havendo duas ou mais hipóteses de, satisfatoriamente, executar um mesmo
contrato ou interpretar uma cláusula, dever-se-á escolher a que promova melhores
benefícios sociais, como no caso da proteção ao meio ambiente ou a que
instrumentaliza a geração de mais empregos. Embora de difícil aplicação voluntária
pelas partes, não há a menor dúvida que possa ser trazido ao Poder Público, seja em
atos de licenciamento, seja em atos regulatórios, ou ainda, quando da interpretação do
negócio jurídico pelo magistrado.
Os elementos que constituem o contrato como negócio jurídico é classificados
em três espécies: essenciais, naturais e acidentais. Conforme define BARROS apud
(AZEVEDO, 2002, p. 26)
[ .. . ] O s p r ime ir os s ã o e le me n t os es s en c i a is , a e s t r ut u r a d o a t o;
qu e l he f or m a m a s u bs t â nc ia e se m os q u a is o a t o n ã o ex is t e.
Nu m a c o m p r a e v e n d a , p o r ex e mp lo , o s e le me n t o s e s s e nc ia is s ão
a co is a, o p r eç o e o c o ns e nt im e n t o, f a lt an d o u m d e les , o at o n ão
ex is t e [ . .. ].
Barros Apud (AZEVEDO, 2002, p. 26-27) segue com as definições dos dois
últimos elementos de existência, quais sejam, naturais e acidentais:
Naturais, resulta do próprio negócio, a obrigação que tem o vendedor de
responder pelos defeitos ou vícios do contrato que podem ser redibitórios (art.
1.101 NCC) e pelos riscos da evicção (art. 1.092, ‘b’), caso lhe sobrevenha a
reduções patrimoniais, capaz de afetar o cumprimento da prestação a seu
cargo.
Acidentais, são estipulações que facultativamente se adicionam ao ato para
modificar-lhe uma ou alguma de suas conseqüências naturais, tais como: a
condição, o termo e o modo, ou encargo (arts. 114, 123 e 128 do NCC), como o
prazo para entregar a coisa ou pagar o preço.
Segundo Sílvio Rodrigues apud (AZEVEDO, 2002, p. 27) há distinção entre os
elementos constitutivos e pressupostos de validade: “O Código Civil, em seu art. 82,
menciona quais os pressupostos de validade do ato jurídico, determinando serem: a) a
capacidade do agente; b) o objeto lícito; a forma prescrita em lei [...]”. A doutrina, por
sua vez, diferencia os elementos que constituem o seu conteúdo, ou seja, a sua
estrutura, dos pressupostos de validade, mencionados no referido artigo do código.
Antes, no Código Civil de 1916 denominava-se ato jurídico, hoje, (Código Civil de
2.002) negócio jurídico, sendo que o legislador ampliou a redação no art.104.
III PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO DIREITO CONTRATUAL
Conforme abordagem do capítulo anterior, as novas relações sociais, políticas e
econômicas na modernidade se instauraram no século XIX com a consolidação de
Estados Liberais e estabelecimento do regime capitalista de produção. Período em que
se instalou o modelo clássico de contrato que tinha na autonomia da vontade, na
obrigatoriedade, na relatividade e na intangibilidade os seus princípios basilares.
Estas transformações históricas foram instrumentos de grande valia no
desenvolvimento da vida econômica da época: garantiam a regulação de interesses
individuais com igualdades entre as partes contratantes, ao mesmo tempo que
atendiam as necessidades de ampliação e difusão das relações econômicas. O que
incluiu essas novas situações dos contratos no Código Civil de 1916.
Entretanto, com a constitucionalização do direito civil e a recente entrada em
vigor do novo Código Civil, propõe-se, dessa forma, mitigar o postulado da autonomia
da vontade e a da obrigatoriedade dos contratos e outros, instituindo mecanismo de
combate à desigualdade substancial entre as partes, com assunção de uma postura
mais ativa do Estado, através do dirigismo contratual; em fim, propõe uma
reestruturação do direito obrigacional, especialmente em relação aos contratos.
3.1 Princípios do Direito Contratual no Novo Código Civil
3.1.1 Autonomia da vontade
Sob esta nova visão este princípio ainda serve como essencial a formação da
relação jurídica, pois consiste na liberdade que possuem os contratantes de escolher,
por firmar ou não contratos, de realizá-los com quem melhor lhe aprouver, de
estabelecer seus termos, assim como resolvê-lo ou alterá-lo, o que pode ser
considerado liberdade contratual.
Atualmente, no entanto, considerando a massificação das relações contratuais é
inegável fator de restrição à possibilidade de escolha, quer quanto com quem contratar,
quer quanto ao conteúdo do negócio. Tanto consumidor, como microempresas ou
empresas de pequeno porte que para a sua sobrevivência necessitam se submeter ao
poderio econômico de grandes grupos e conglomerados capitalistas fica evidente que
não se pode falar em paridade no momento da contratação. Essa situação fica bem
ilustrada pela crescente utilização do contrato de adesão em que o Código Civil de
2002 estabeleceu limites expressos à autonomia da vontade, o qual estabelece que seu
exercício deva se limitar à função social do contrato; vedando e tornando anulável
determinados conteúdos que representam desigualdade material entre as partes,
exigindo transparência, lealdade e correção nos negócios.
Outra situação se vê nos monopólios, oligopólios de empresas ou grupos
econômicos, neste caso o Estado intervém no contrato quando, a lesão e o estado de
perigo estão presentes. O novo Código Civil estabelece: “Art. 421- A liberdade de
contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato.”
3.1.2 Obrigatoriedade dos Contratos
Também conhecido como pacta sund servanda, expressão latina que significa
(os pactos devem ser cumpridos), o contrato vale como se fosse lei entre as partes. O
Novo Código Civil, atento a essa tendência de amenização do rigor que este princípio
impõe aos contratantes incorpora expressamente a cláusula rebus sic stantibus,
enquanto as coisas estiverem assim aos contratos de execução são continuados e
diferidos (art. 478 e 480), assim como o estado de perigo (art. 156) e os institutos da
lesão (art. 157), o qual trata da Teoria da Imprevisão, onde se a prestação se tornar
excessivamente onerosa para uma das partes, em razão de acontecimentos
extraordinários e imprevisíveis, em princípio serve de pressuposto para revisão
contratual.
O estado de perigo e a lesão são dois institutos trazidos ao novo Código,
asseguratório
de
justiça
contratual,
onde
a
onerosidade
excessiva
ocorre
independentemente de causa superveniente.
Então, houve uma reestruturação do Princípio da Obrigatoriedade, tornando-o
mais flexível com a interferência do Estado para corrigir os rigores do contrato, ante o
desequilíbrio de prestações e pela alteração radical das condições de seu cumprimento.
3.1.3 Relatividade dos Contratos
Este princípio consiste nos efeitos do contrato que ficam restritos somente entre
as partes contratantes, não atingindo terceiro, exceto quando se estipula no contrato.
Essa concepção clássica é também a posição do Código Civil de 1916, entretanto foi
relativizada no Novo Código Civil, que inspirado no princípio da sociabilidade, não
concebe mais o contrato apenas como instrumento de satisfação de finalidade egoísta
dos contratantes, porém lhe reconhece um valor social. E nesse aspecto, ao se fixar a
função social como limite da liberdade contratual, não poderia deixar de admitir, a
operatividade dos efeitos dos contratos sobre terceiros, no caso, a coletividade. Então,
não há como negar que este princípio foi reestruturado pelo reconhecimento de seus
efeitos a terceiros no cumprimento da função social.
3.1.4 Intangibilidade dos Contratos
Este por decorrência do princípio da obrigatoriedade considerava o contrato
como lei entre as partes, repelia qualquer interferência em seu conteúdo, inclusive a do
próprio Estado. Embora no Código Civil de 1916 não houvesse expressado previsão a
autorizar a aplicação da cláusula rebus sic stantibus, (teoria da imprevisão) em
contratos de execução continuada, os tribunais pátrios já vinham aplicando com
fundamento no princípio da equidade e da boa-fé. Todavia, agora, diante do texto
expresso no novo Código Civil sua aplicação é permissível na forma dos arts. 478 e
480, no caso de cláusula desproporcional ou excessivamente onerosa, possibilitam a
intervenção estatal
Ao lado dos mencionados princípios recepcionados pelo novo Código Civil que
os amenizou visando à função social dos contratos e a dignidade da pessoa humana. A
linha de revalorização das relações humanas afasta o espírito individualista e
pragmático, tutelado pela Constituição Federal. E se inspira propondo renovação nos
princípios e incorporando novos em que está os princípios da boa-fé objetiva (regra de
conduta), da probidade (art. 422 NCC) e da tutela do hipossufiente, em busca da justiça
substancial, com o deslocamento da relação contratual da tutela subjetiva à tutela
objetiva da confiança, visando sempre o interesse social, pois representa no modelo
atual o valor da ética, correção, lealdade, honestidade, sem abuso, sem causar lesão
ou desvantagem excessivas, cooperando para atingir o bom fim das obrigações; o
cumprimento do objetivo contratual e realização do interesse das partes.
Na intangibilidade dos contratos, os seus princípios basilares revelaram-se
instrumentos de grande valia no desenvolvimento da vida econômica da época, pois
garantiam a regulação de interesses individuais com igualdades entre as partes
contratantes, ao mesmo tempo em que atendiam as necessidades de ampliação e
difusão das relações econômicas.
Entretanto, com a constitucionalização do direito civil e a recente entrada em
vigor do novo Código Civil, propõe-se, dessa forma, mitigar o postulado da autonomia
da vontade e a da obrigatoriedade dos contratos e outros instituindo mecanismo de
combate à desigualdade substancial entre as partes, com assunção de uma postura
mais ativa do Estado, através do dirigismo contratual. Enfim, propõe uma reestruturação
do direito obrigacional, especialmente em relação aos contratos.
3.1.5 Princípio da Boa-Fé
O princípio da Boa-Fé emergiu a partir da crise social resultante do
individualismo jurídico e liberalismo econômico do fim do século XIX e início do XX, este
período impulsionou a revalorização das relações humanas, contrária ao modelo
clássico de contrato e que contribuiu para imposição da função social dos contratos,
conforme artigo 421.
Na seqüência, o art. 422 defini como segunda norma que “os contratantes são
obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os
princípios da probidade e boa-fé.” O que relega ao direito privado noções e valores
próprios do público, de forma a priorizar a ética jurídica no novo Código Civil,
perspectivas essenciais a justiça e regra de conduta.
É importante considerar a boa-fé no Código Civil sob o aspecto destacado por
Alípio Silveira apud Bierwagem (2007, p.77).
A boa-fé objetiva pode ser definida, na esfera jurídica, como comportamento
inspirado no senso de probidade, quer no exercício leal e não caviloso dos
direitos e das obrigações que dele derivam, quer no modo de fazê-los valer e de
observá-los, respeitando em qualquer caso o escopo visado pelo ato jurídico, a
harmonia dos interesses das partes e as exigências do bem comum.
Esta evolução a respeito das relações contratuais que invadiu o espaço
reservado e protegido pelo direito passando-o da à livre e soberana manifestação da
vontade das partes para instauração de um instrumento jurídico mais social, controlado
e submetido a uma série de imposições coibentes, mas equitativas.
Nesse horizonte, o resgate de princípios como o da função social e da boa-fé,
ao lado da relativização do direito de propriedade, elevam-se como elementoschave para a convivência social, dando passos largos especialmente na
segunda metade do século XX, quando os direitos humanos entram,
definitivamente, como prioridade na agenda internacional (BIERWAGEN, 2007,
p. 123).
Então, sob o édito da boa-fé não se deve orientar apenas pela vontade dos
contratantes, mas agregar ao contrato a lealdade e honestidade, respeitando os direitos
e deveres estabelecidos pela lei e vontade das partes.
Assim, incorporar o princípio da boa-fé torna-se um inegável avanço na legislação
brasileira aliada a razão e equidade social.
IV CONTRATOS EM ESPÉCIES
Na teoria geral dos contratos e dos contratos em espécie há relações diretas com o
Direito das Obrigações, principalmente porque não existe uma obra própria nem para
os contratos, assim como para os contratos em espécie. O que se tem na realidade
encontra-se na parte especial, o Livro das Obrigações, ou seja, Livro I. Nesse aspecto,
Gonçalves (2006, p.3) conceitua o contrato como fonte de obrigação, sendo a fonte o
fato responsável pela origem desta conforme as regras de direito. Assim, “os fatos
humanos que o Código Civil brasileiro considera geradores de obrigação são: a) os
contratos; b) as declarações unilaterais da vontade; e c) os atos ilícitos, dolosos e
culposos.”
Além disso, aproxima-se da Parte Geral do Código Civil. Com teorias gerais e
conceitos básicos genéricos e abstratos acerca dos elementos da relação jurídica, os
quais especificamente tratam das pessoas, bens e fatos.
4.1 Contratos no Código Civil
A utilização de contratos trata-se de um instrumento jurídico essencial a
circulação de riqueza e transmissão de propriedade. Assim, há uma relação estreita
entre o direito dos contratos e o direito público e esta é regulamentada através de
contratos administrativos subordinados à constituição do país. Pois, conforme
Gonçalves (2006, p.3) “é a lei que disciplina os efeitos dos contratos, que obriga o
declarante a pagar a recompensa prometida e impõe ao autor do ato ilícito o dever de
ressarcir o prejuízo causado.”
[...] uma vez formado o contrato bilateral (plano de existência) e se for válido
(plano de validade), o não-cumprimento posterior da prestação (falta da causa
referida na sua constituição) autoriza a resolução, evitando que a parte inocente
seja obrigada a cumprir a sua prestação, que se tornou sem causa (AZEVEDO,
2002, p.155).
O art. 481 do Código Civil prevê que “Pelo contrato de compra e venda, um dos
contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e, o outro, a pagar-lhe certo
preço em dinheiro”. Com isso, se percebe o caráter obrigacional do contrato tanto para
o comprador como para o vendedor. Conforme Gonçalves (2006, p. 71) estas relações
juridicamente apresentam natureza: a) bilateral, um paga o preço estabelecido e outro
transfere o domínio do objeto; b) consensual, resultante do acordo de vontades; c)
onerosa, tanto para quem paga como a quem recebe a coisa; d) comutativo, através de
vantagens e sacrifícios, quando as coisas estiverem sujeitas a riscos; e) não solene em
alguns casos em que a alienação de imóveis ocorre sem escritura pública.
Apesar da obrigatoriedade reconhecida pelo direito não cabe ao juiz modificar ou
adequar a equidade a vontade das partes manifestadas no contrato, mas respeitá-la,
assegurando que ambas sejam contempladas e atinjam o efeito desejado no ato da
contratação. Entretanto, cumpre ao juiz analisar a posição do contratante individual, o
que é tratado como consumidor e que em nossa sociedade capitalista é encarada como
a pessoa mais importante pelo fato de ser a mais desprotegida na relação negocial.
É importante destacar que entre as relações de massa não há somente contratos
escritos, porque existe no mesmo patamar dos contratos de adesão, expressos em
formulários os contratos orais, resultantes das consideradas condutas sociais típicas
como os recibos e notas emitidas em caixas automáticos que não devem ser
desprezados. Isto porque são meios vantajosos para empresas que precisam agir com
rapidez, apesar do perigo que representam para os consumidores.
Indivíduos vulneráveis não só ao abuso das empresas, mas às limitações quanto a
liberdade de contratar ou não, já que existe obrigatoriedade em uma série de contratos
de toda espécie, como o de transporte, compra de alimentação, aquisição de jornais,
fornecimento de bens e serviços públicos, entre outros. Além disso, a liberdade de
escolha do outro contratante também sofre restrições, a saber os serviços públicos
concedidos sob regime de monopólio.
E, por último, limitam-se também as cláusulas gerais no estabelecimento do conteúdo
dos contratos, inclusive aquelas relacionadas à função social, boa-fé objetiva e do
Código de Defesa do Consumidor.
O Novo Código Civil de 2002, que está em vigor desde 2003 destina uma parte
exclusiva para tratar do assunto contratos. Embora submetido a muitas críticas, existe
uma aproximação maior deste com a nossa realidade. Sobre isso Venosa (2007, p.1)
observa que “se o Código não é perfeito e completamente atual, é mais técnico e mais
adequado ao nosso tempo.”
A partir do artigo 421, destinado aos contratos em geral se apresenta avançada técnica
legislativa de enunciação que contém expressões semânticas relativamente vagas, com
princípios e máximas do conceito jurídico indeterminado, os quais permitem uma
infinidade de hipóteses concretas de condutas tipificáveis. Motivo que justifica o termo
intérprete usado por Bierwagen (2007, p.6) para definir o aplicador do direito em busca
de respostas e ainda acrescenta questões como:
Em que hipóteses o novo Código Civil aplica-se ao contrato celebrado na
vigência da lei anterior? Na sua vigência, pode-se executar a sentença proferida
em conformidade com o Código Civil de 1916? Se o novo diploma regula
parcialmente determinada matéria disciplinada por lei especial, há revogação
apenas das disposições conflitantes ou de todo diploma?
A mesma autora também divide este objeto de lei em estudo em quatro grupos.
O primeiro sobre as regras relativas à vigência e obrigatoriedade da lei, constante do
art. 1° ao 3°; segundo as de interpretação e integr ação das normas, dos arts. 4° e 5°,
em terceiro lugar as regras de eficácia da lei no tempo, encontrada especificamente no
art. 6° e em quarto e último as regras de eficácia da lei no espaço presentes do art. 7°
até o 19.
4.2 Regras de interpretação dos contratos
Dentre os critérios de interpretação dos contratos podemos interpretar contra o
predisponente em contratos por adesão, julgar de acordo com a boa-fé e os costumes,
voltar-se de forma restrita à contratos gratuitos ou benéficos, pela conservação do
contrato, etc.
Bierwagen (2007, p.119) afirma ser comum ocorrer divergências em contratos de
adesão, assim as dúvidas decorrentes da interpretação da avença decorrem do fato
das partes não expressarem com clareza sua vontade, gerando contradições, dúvidas,
ambigüidades e até obscuridades.
Por causa das dificuldades em compreender a real intenção das partes é mister
interpretar o contrato de forma que ocorra a conciliação da vontade dos envolvidos.
Para isso, o intérprete poderá usar todos os critérios presentes na lei, tanto nos
consagrados pela doutrina e jurisprudência, assim como em regras interpretativas
previamente prefixadas pelo legislador e também à princípios gerais e métodos de
interpretação tradicional, ou seja, apoio histórico, gramatical, entre outros, de forma que
este conjunto alcance as expectativas das partes. Neste aspecto Gonçalves (2006,
p.15) menciona que o próprio Código Civil estabelece regras para interpretação dos
negócios.
Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias,
dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente (art.423); a
transação interpreta-se restritivamente (art.843); a fiança não admite
interpretação extensiva (art. 819); sendo a cláusula testamentária suscetível de
interpretações diferentes, prevalecerá a que melhor assegure a observância da
vontade do testador (art. 1.899).
Assim, sempre prevalecerá o objetivo de proteção ao hipossuficiente. Para isso,
observa-se a adoção de alguns critérios técnicos quanto à interpretação dos contratos.
Dentre estes, Gonçalves (2006, p.15) destaca; a maneira de apurar a intenção dos
contratantes através do modo pelo qual vinham executando de comum acordo; a que
seja menos onerosa para o devedor; a não interpretação de cláusulas do contrato de
forma isolada e sim dentro do contexto em que se insere; e em relação aos contratos
de adesão, as cláusulas duvidosas devem ser julgadas sempre a favor dos aderentes.
4.2.1 Cláusula Geral – Características
A técnica legislativa de enunciação denominada conceitos jurídicos
indeterminados existentes no momento ou previstas para o futuro ocorrem por meio de
expressões semânticas relativamente vagas, princípios e máximas que compreendem e
recepcionam uma diversidade de hipóteses concretas quantos às condutas tipificáveis.
De acordo com Gonçalves e Venosa (2007, p.1) estas espécies formulam
hipóteses legais através do emprego de conceitos que apresentem significados abertos
e vagos, tais como urgência, ordem pública, justo preço, calamidade pública, medidas
adequadas ou proporcionais, necessidade pública, utilidade pública e interesse público.
É propósito dos estudantes de direito, advogados, intérpretes da lei,
jurisprudência e doutrina a tarefa manter a legalidade de contratos que surgiram após o
Novo Código Civil, tornando-os vivos e adequados aos valores que a eles se inserem,
respeitando as transformações históricas, relações sociais e individuais.
Assim, a Teoria Geral dos Contratos limita a autonomia das vontades quanto
às regras estipuladas nas obrigações contratuais baseadas na lei privada, tendência
moderna das legislações ocidentais como técnica legislativa de estipulação da cláusula
geral.
Então, para que se possa compreender a relação contratual é importante
perceber os motivos do declínio da autonomia da vontade e os limites da ingerência do
Estado no âmbito da lei privada. Isto porque esta foi à tendência moderna adotada pelo
Novo Código Civil, inovando através da limitação na liberdade de contratar em
detrimento da função social do contrato, disposta no artigo 421 onde “a liberdade de
contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato”. Ou seja,
este é o princípio da conduta em direitos e obrigações de que trata a Norma Restritiva
da autonomia Contratual.
Assim, o novo Código Civil rompe com o modelo dogmático formalista anterior e
a partir das cláusulas gerais torna-se mais prático e condizente com a nova realidade
do sistema social, menos morosa. Além disso, o resgate de princípios como o da boa-fé
apresenta-se como um elemento central para as relações sociais em que os direitos
humanos são prioridade na agenda internacional.
CONCLUSÃO
O contrato é o meio mais eficaz pelo qual se podem solucionar conflitos sociais
decorrentes da falta de cumprimentos das obrigações de fazer, de compromissos e
promessas do acordo firmado. É a forma de garantir aquele que se sentir ameaçado ou
lesado de seu direito possa recorrer ao Estado, órgão responsável pela tutela
jurisdicional.
Assim, uma promessa instrumentalizada por meio da adesão, ou não constante na
formalidade que um contrato exige no mundo jurídico se pode garantir aos contratantes
o cumprimento dos deveres previstos em lei.
Para isso, algumas regras foram institucionalizadas pelo Novo Código Civil de 2002,
algumas limitações na autonomia da vontade das partes foram adotadas visando a
diminuição do individualismo da patrimonialidade do direito contratual e proporcionando
direitos e garantias constitucionais que primam pela proteção da pessoa humana, de
forma a minimizar o desequilíbrio social.
Então, o caráter social do contrato provoca mudanças em que a noção de equidade, de
boa-fé e de segurança e por que não de justiça passam a ser princípios da teoria
contratual.
Como resultado desta nova ótica presente no contrato, ocorreu uma completa
modificação no eixo interpretativo dos contratos, pois este passa a representar um
instrumento de convívio social em defesa de interesses coletivos e autonomia da
vontade é submetida antes as regras legais.
Embora o objetivo das relações contratuais estejam inseridas no contexto de justiça
social, na prática a teoria nem sempre é aplicada. Principalmente pelo fato do
contratante ser o lado mais fraco e ter a necessidade de contratar, o que deixa uma
visível vantagem ao lado mais forte da negociação, já que ele estabelece as condições
do contrato.
Apesar do Novo Código Civil ainda ser imperfeito e não corresponder na prática a
função social necessária a realidade moderna, as mudanças ocorridas eram
imprescindíveis considerando-se o momento histórico presente. Alem do mais, o
princípio da autonomia privada foi suavizado, evitando que a disparidade ocorra por
meio de proveito injustificado de uma parte em detrimento da outra.
É indiscutível que o contrato é um instrumento central na geração de riquezas, fato que
torna ainda mais relevante a necessidade de haver regulação no interesse das partes
vinculada ao contexto social, pois o contrato na relação jurídica contribui para a
distribuição de bens suscetíveis de valoração econômica. Ou seja, na sociedade pósmoderna, o contrato é um instrumento capaz de proteger os interesses socialmente
relevantes.
Desta forma, o Estado Social, fundamentado na dignidade do ser humano, estabelece
que a autonomia da vontade precisa estar aliada a liberdade de princípios como a boa-
fé objetiva e da tutela do hipossuficiente para alcançar a justiça priorizando o interesse
social.
No atual modelo de contrato, a boa-fé representa os valores éticos como lealdade,
correção e veracidade em contraposição ao voluntarismo jurídico. A obrigação
contratual busca equilíbrio entre as partes contratantes.
Portanto, o contrato na sociedade pós-moderna deve ser encarado com um novo
enfoque, tanto direta quanto indiretamente ligado aos interesses coletivos e não como
um negócio destinado a satisfação pessoal e privada. Neste, a vontade das partes é
regulada em razão da função social, priorizando a valorização da dignidade humana,
conforme o art. 1° da Constituição Federal, devendo prescrever a ordem econômica e
jurídica.
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