UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO EXTINÇÃO DA OBRIGAÇÃO ALIMENTÍCIA APÓS A MAIORIDADE DOS FILHOS : UMA DISCUSSÃO À LUZ DO ATUAL DIREITO BRASILEIRO. VIVIANE BOHN Itajaí (SC), junho de 2010. UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO EXTINÇÃO DA OBRIGAÇÃO ALIMENTÍCIA APÓS A MAIORIDADE DOS FILHOS: UMA DISCUSSÃO À LUZ DO ATUAL DIREITO BRASILEIRO VIVIANE BOHN Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientadora: Professora Msc. Emanuela Cristina Andrade Lacerda Itajaí (SC), junho de 2010 ii “Mas é claro que o sol Vai voltar amanhã Mais uma vez, eu sei... Escuridão já vi pior De endoidecer gente sã Espera que o sol já vem... Nunca deixe que lhe digam: Que não vale a pena Acreditar no sonho que se tem Ou que seus planos Nunca vão dar certo Ou que você nunca Vai ser alguém... Quem acredita Sempre alcança” (Renato Russo/ Flávio Venturini) AGRADECIMENTO À minha irmã Vanessa Bohn por todo o amor, o incondicional apoio, carinho, e amizade, agradeço eternamente. À minha amiga Nivia Daiane por todo o apoio, que segurou a minha mão nos momentos difíceis, não me deixou desistir, que me incentivou a resistir e me deu forças pra caminhar. Por sua amizade serei sempre grata. À amiga Grazi, que muitas vezes nas horas difíceis me fez abrir aquele sorriso. Que usou de palavras doces e sutis para me encorajar. À professora Emanuela, que me orientou, que com paciência me incentivou e deu apoio na hora necessária, agradeço a atenção dispensada. A todos que acreditaram e que de alguma maneira me incentivaram a realizar esse sonho. DEDICATÓRIA A minha mãe Juraci Bohn, por ser meu anjo da Guarda, uma pessoa especial, razão da minha existência e a que terá meu amor eterno, Ao meu pai Claudenor Rodolfo Bohn, pela preocupação, pelo amor e pelo incentivo para que eu pudesse chegar até aqui. Especialmente a Deus, por me orientar pelo caminho mais certo, por ter estado sempre comigo, nos dias de chuva, nos dias de tristeza, nos dias das tempestades e nos dias de sol, que me guiou tantas vezes, tantas noites na estrada, mas que me deu a mão e disse, não importa o que acontecer, Viviane, você vai conseguir! Somente ele sabe tudo que passei para chegar até aqui, tantas pessoas que passaram pelo meu caminho e me deixaram e que eu precisava que permanecesse comigo, mas agradecer também pelas pessoas valiosas que permaneceram comigo, só Deus sabe e a ele devo a vida, a ele sempre irei agradecer. TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente Trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo. Itajaí (SC), junho de 2010 Viviane Bohn Graduanda PÁGINA DE APROVAÇÃO A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Viviane Bohn, sob o título extinção da obrigação alimentícia após a maioridade dos filhos: uma discussão à luz do atual direito brasileiro foi submetida em 09/06/2010, à banca examinadora composta pelos seguintes professores: Msc. Emanuela Cristina Andrade Lacerda (presidente) e Msc. Cláudio José Pinheiro (examinador) e aprovada com a nota 10 (dez). Itajaí (SC), junho de 2010 Profa. MSc. Emanuela Cristina Andrade Lacerda Orientadora e Presidente da Banca Prof. MSc. Antônio Augusto Lapa Coordenador do NPJ ROL DE CATEGORIAS Rol de categorias que a Autora considera estratégicas à compreensão do seu Trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais. PODER FAMILIAR Poder Familiar é o conjunto de direitos e deveres atribuídos aos pais, no tocante à pessoa e aos bens dos filhos menores1. ALIMENTOS Alimentos são prestações para satisfação das necessidades vitais de quem não pode provê-los por si. Têm por finalidade fornecer a um parente, cônjuge ou companheiro o necessário à sua subsistência. Quanto ao conteúdo, abrangem o indispensável ao sustento, vestuário, habitação, assistência médica e instrução (CC, art.1920).2 OBRIGAÇÃO ALIMENTAR Entre pais e filhos menores, cônjuges e companheiros, não existem propriamente obrigação alimentar, mas dever familiar, respectivamente de sustento e de mútua assistência. A obrigação Alimentar também decorre da lei, mas não é fundada no parentesco, ficando circunscrita aos ascendentes, descendentes e colaterais até o segundo grau, com reciprocidade3. MAIORIDADE A maioridade refere-se à idade em que a pessoa física passa a ser considerada capaz para os atos da vida pública, sendo assim sujeito de direito e obrigações. 1 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de família. Sinopses Jurídicas. 12. ed., rev. Atual. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 2. p. 128. 2 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de Família. p. 157 3 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de Família. p. 160 ix Segundo o atual Código Civil a maioridade passou dos 21(vinte e um) anos para 18 (dezoito) anos4. DEVER DE SUSTENTAR Os pais têm o dever de sustento quanto aos filhos menores. Dever de sustentar é dar alimentos até que os filhos tenham a capacidade de se desenvolver na vida profissional e que assim por si só possam suprir suas necessidades vitais5. EXTINÇÃO DO PODER FAMILIAR O poder familiar extingue-se pela morte dos pais ou do filho; no primeiro caso, desaparece o titular do direito; e, no segundo, a razão de ser do instituto, que é a proteção do menor. Extingue-se o poder familiar quando atinge-se a maioridade, pois a lei presume que quando o individuo atinge a capacidade civil, 18 (dezoito) anos, este não mais precisa da proteção conferida pelos pais.6 SUSPENSÃO DO PODER FAMILIAR Suspender o poder familiar representa medida menos grave, assim extinta a causa que a gerou o juiz pode cancelá-la. É verificada através do comportamento dos pais, se estes, de um modo ou de outro prejudicam os filhos, o ordenamento jurídico reage e, conforme a sua gravidade, maior ou menor gravidade extinguese ou suspende-se o poder familiar.7 4 ARAÚJO, Harilson da Silva. A maioridade no sistema do novo Código Civil. As alterações nas formas de aquisição da capacidade civil plena da pessoa natural e suas conseqüências. 5 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de Família. p.168 6 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito de família. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2004. v. 6. p.373. 7 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito de família. p.368. SUMÁRIO RESUMO ............................................................................................ IX INTRODUÇÃO....................................................................................10 CAPÍTULO 1.......................................................................................12 DO PODER FAMILIAR.......................................................................12 1.1 FATOS E CONCEITO QUE MARCAM O PODER FAMILIAR ....................... 12 1.2 PODER FAMILIAR UMA RELAÇÃO ENTRE O CÓDIGO CIVIL DE 1916 E O ATUAL CÓDIGO CIVIL ........................................................................................ 17 1.3 EXERCÍCIO DO PODER FAMILIAR .............................................................. 18 1.4 SUSPENSÃO DO PODER FAMILIAR ........................................................... 21 1.5 EXTINÇÃO DO PODER FAMILIAR ............................................................... 25 CAPÍTULO 2.......................................................................................31 DOS ALIMENTOS ..............................................................................31 2.1 ASPECTO HISTÓRICO DA OBRIGATORIEDADE DE DAR ALIMENTOS .. 31 2.2 CONCEITO DE ALIMENTOS ......................................................................... 38 2.3 ESPÉCIE DE ALIMENTOS............................................................................. 46 2.3.1 Quanto à natureza ...................................................................................... 47 2.4 ALIMENTOS E OS DITAMES DA SÚMULA 358 DO STJ ............................. 49 CAPÍTULO 3.......................................................................................53 A OBRIGATORIEDADE DE SE PAGAR ALIMENTOS APÓS A MAIORIDADE ......................................................................53 3.1 DA OBRIGATORIEDADE DE SE PRESTAR ALIMENTOS APÓS A MAIORIDADE PARA FILHOS ESTUDANTES .................................................... 55 3.2 DA OBRIGATORIEDADE DE SE PRESTAR ALIMENTOS APÓS A MAIORIDADE PARA FILHOS INCAPAZES ........................................................ 68 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................75 REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS............................................78 RESUMO Com esta Monografia pretende-se estudar quando realmente cessa o direito dos pais de sustentar os filhos. Discutindo e levando em consideração se realmente aos 18 anos completos, quando acaba a menoridade os pais ainda tem o dever de manter o sustento dos filhos. Considerando o que reporta o art. 5° do Código Civil, que o dever de sustento dos filhos menores se encerra, com relação aos pais, quando aqueles completam a maioridade, coincidindo com a cessação do Poder Familiar. O motivo do presente estudo é analisar se a Súmula 358 do STJ que conclui que esse dever não cessa, está em choque com a disposição civilista. Este tema é de grande importância porque discute não só a cessação do Poder Familiar como o cessar do direito de Sustentar dos Pais com a maioridade dos filhos. Através da abordagem acerca das causas que fazem cessar o Poder Familiar procura-se discutir se realmente o direito aos alimentos igualmente se extingue. INTRODUÇÃO A presente Monografia tem como objeto discorrer os aspectos destacados do Poder Familiar, Alimentos e precisamente a Extinção do dever de dar alimentos. O seu objetivo é identificar quando cessa o Poder Familiar e a extinção de os pais em sustentar os filhos. Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, a caracterização jurídica do Poder Familiar, uma relação entre o Código Civil de 1916 e o atual Código Civil e as considerações acerca da história do Poder Familiar desde os primórdios tempos. Será conceituado o Poder Familiar e as mudanças com a implementação do vigente Código Civil na terminologia bem como também, a figura da mulher como detentora também deste. Buscar-se-á auferir a importância constitucional em relação ao Código Civil e o Estatuto da Criança e do Adolescente do Poder Familiar, por qual razão o Estado deve intervir para guardar o direito de menores e manter estes em prol de toda a sociedade. E por fim será observado os casos de suspensão e extinção do Poder Familiar. No Capítulo 2, analisar-se-ão precipuamente o aspecto histórico da obrigatoriedade de dar alimentos considerando quando foi seu marco inicial, conceituando em seguida a palavra Alimentos para assim poder caracterizar as espécies de alimentos e quais efeitos jurídicos da implementação da Súmula 358 do Superior Tribunal de Justiça na questão dos alimentos. No Capítulo 3, serão verificados os contornos jurídicos quanto à legislação nacional atinente. Serão apontados casos práticos ocorridos no Brasil nos diversos Tribunais. Observar-se-ão quais as alternativas encontradas e os aspectos diferenciados sobre a obrigação de dar alimentos a filhos maiores estudantes e ou incapazes. O presente estudo monográfico se encerra com as Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados. 11 Para a presente monografia foram levantadas as seguintes hipóteses: • O dever dos pais em sustentar os filhos cessa depois de alcançada a capacidade civil? Com a maioridade cessa o dever dos pais de sustentar os filhos, mas esse se prolonga se o filho não atingiu capacidade suficiente de se manter sozinho. A capacidade civil é a aptidão para exercer os atos da vida sozinho, e este se adquire com a maioridade de fato, mas a realidade vai um pouco mais além. • Após a maioridade, tem os pais o dever de sustento do filhos? Após a maioridade os pais tem o dever de sustentar os filhos se estes estudam e não conseguiram um meio digno de adquirir seu próprio sustento e se manter dentro dos padrões em que viviam enquanto menores. Mas se os filhos já maiores demonstrarem que são incapazes para gerar seu próprio sustento, o dever dos pais não cessa perfazendo talvez, por toda a vida. Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase de Investigação foi utilizado o Método Indutivo, na Fase de Tratamento de Dados o Método Cartesiano, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente Monografia é composto na base lógica Indutiva. Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas, do Referente8, da Categoria9, do Conceito Operacional10 e da Pesquisa Bibliográfica. 8 “REFERENTE é a explicação prévia do motivo, objetivo e produto desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para uma atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa.” In: PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica – idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito, p. 62. 9 “Categoria é a palavra ou expressão estratégica a elaboração e/ou expressão de uma idéia”. In: PASOLD, César Luiz. p. 31. 10 Conceito operacional (=cop) é uma definição para uma palavra e expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos. PASOLD, César Luiz, p. 56. CAPÍTULO 1 DO PODER FAMILIAR 1.1 FATOS E CONCEITO QUE MARCAM O PODER FAMILIAR Poder Familiar é aquele exercido pelos pais em relação aos filhos, tido como essencialmente acerca dos deveres de assistência, auxílio e respeito mútuo, como dirigi-los na vida civil, sustentá-los, educá-los, ter estes em sua companhia e guarda até atingirem a maioridade ou após isso. Ele surgiu com a constituição da família e ao longo do tempo vem sofrendo sociais mudanças. Para melhor caracterizar o Poder Familiar em consonância com a lei civil em vigor, importa aclarar a evolução do Pátrio Poder. Quadro 1 – Comparativo Poder Familiar11/12 Direito Romano Direito Germânico Direito das Ordenações (Revolução Francesa – Código Napoleônico) Cristianismo 11 12 Características O pai ocupava posição de chefe absoluto sobre a vida dos filhos. O pai tinha tantos poderes que podia decidir sobre a vida ou morte do filho. Patriarcalismo – Pátria Potestas Características Abrandamento dos poderes do chefe, os filhos ao ingressar no exército libertavam-se dos poderes do pai. Caráter Dúplice da relação - Pai e mãe tinham o direito de criar e educar e este cessavam com a capacidade do filho Características Adota-se direito costumeiro Temporariedade do cargo do poder familiar Exercício da mãe na falta do pai Possibilidade dos filhos terem bem. Características Forte influência na mudança de lei Dever Paternal em primeiro plano Maior respeito aos filhos e à mulher no casamento RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: Lei n° 10.406, de 10.01.2002. p.600. RODRIGUES, Silvio. Direito civil. Direito de família. 28 ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p.354. 13 Notadamente, constata-se que o Pátrio Poder sofreu mudanças em suas bases, já que noutros remotos tempos este era calcado, principalmente, no poder do Homem, da figura masculina da família, que era a responsável pelo sustento, moral, ética etc. No entanto, com as mudanças ocorridas e premente necessidade da mulher contribuir financeiramente para o sustento da família, o Pátrio Poder sofreu drásticas mudanças, já que não raro nos dias atuais é a mulher também conhecida como “chefe de família”, a pessoa responsável por sustentar e prover a família, motivo pelo qual o Código Civil de 200213, alterou a terminologia Pátria Poder para Poder Familiar. Insta destacar que a terminologia foi alterada face que no antigo Pátrio Poder o assunto, era exercido exclusivamente pelo pai e como verificado no texto da Lei hoje ele é exercidos por ambos os pais, deixando de ser prerrogativa somente do pai14. Conforme é o entendimento de Rizzardo15: Tanto isto que se alterou a própria denominação do instituto, passando para ‘poder familiar’, o que retrata a prevalência das relações entre os membros do conjunto familiar, o que não afasta a autoridade não mais do pai, mas do pai e da mãe. Mas sempre poder. Apesar de toda a evolução dos sistemas de educação e formação de novas gerações, não se desvincula o poder, ínsito á natureza humana na condução dos filhos, que veio consagrado no art. 1.630 do Código de 2002, e que, no particular, manteve a onticidade do art. 379 do Código anterior: “ Os filhos estão sujeitos ao Poder Familiar, enquanto menores. Sobre o desenvolvimento histórico e ascensão da mulher no poder familiar pode-se destacar Lobo16: 13 BRASIL. Novo Código Civil. Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Aprova o novo código civil brasileiro. Brasília, DF, 2002. 14 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: Lei n° 10.406, de 10.01.2002. p.600. 15 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: Lei n° 10.406, de 10.01.2002. p.600. 16 LÔBO, Paulo Luiz Netto. Do poder familiar. Direito de Família e o novo Código Civil. 3. ed., rev. atual. e ampl., Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 179. 14 as vicissitudes por que passou a família, no mundo ocidental, repercutiram no conteúdo do poder familiar. Quanto maiores foram a desigualdade, a hierarquização e a supressão de direitos, entre os membros da família, tanto maior foi o pátrio poder e o poder marital. À medida que se deu a emancipação da mulher casada, deixando de ser alieni júris, á medida que os filhos foram emergindo em dignidade e obtendo tratamento legal isonômico, independentemente de sua origem, houve redução do quantum, despótico, restringindo esses poderes domésticos. Do exposto denota-se que no Brasil foram necessários mais de 462 anos, para que a mulher casada começasse a ser vista na sociedade como sujeito de direitos e obrigações. Para consolidar esse importante momento e consumar a igualdade de direitos e deveres na família, relata-se na história que 26 anos se passaram com a Constituição da República Federativa do Brasil de 198817, para que fosse colocado fim, em definitivo, ao antigo Pátrio Poder e ao poder marital. Insta destacar o preceituado no art. 226, § 5º, da Constituição da República Federativa de 1988: Art. 226 (caput) A Família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. § 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher. O aludido diploma legal aponta para os direitos e deveres da sociedade conjugal, cujo exercício deve se dar de forma igualitária entre homens e mulheres. Portanto, destitui-se todo e qualquer argumento sobre a superioridade do homem ou da mulher na família, que é a base da sociedade assegurada pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Acerca do Poder Familiar imperioso citar Gonçalves18: Poder Familiar é o conjunto de direitos e deveres atribuídos aos pais, no tocante à pessoa e aos bens dos filhos menores. Não tem mais o caráter absoluto de que se revestia o direito romano. Por isso já se cogitou chamá-lo de “pátrio dever”, por atribuir aos pais mais deveres do que direitos. A denominação “poder familiar” é melhor 17 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Contém as emendas constitucionais posteriores. Brasília, DF: Senado, 1988. 18 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de família. Sinopses Jurídicas. 12. ed., rev. Atual. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 2. p. 128. 15 que “pátrio poder” utilizada pelo código de 1916, mas não é a mais adequada, porque ainda se reporta ao “poder”. Algumas legislações estrangeiras bem como a francesa e a norte-americana, optaram por “autoridade parental”, tendo em vista que o conceito de autoridade traduz melhor o exercício de função legítima fundada no interesse de outro indivíduo e não em coação física ou psíquica, inerente ao poder. Assim o poder familiar é exercido por titulares recíprocos de direitos e obrigações. O Estatuto da Criança e do Adolescente19 traz que o poder familiar deve ser exercido pelo pai e pela mãe. Conforme descreve-se : Art. 21. O pátrio poder será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a legislação civil, assegurado a qualquer deles o direito de em caso de discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a solução da divergência. Também sobre o conceito De poder Familiar cabe citar Maria Helena Diniz20: O poder familiar pode ser definido como um conjunto de direitos e obrigações, quanto à pessoa e bens do filho menor não emancipado, exercido, em igualdade de condições, por ambos os pais, para que possam desempenhar os encargos que a norma jurídica lhes impõe, tendo em vista o interesse e a proteção do filho. Ambos tem, em igualdade de condições, poder decisório sobre a pessoa e bens de filho menor não emancipado. Se porventura, houver divergência entre eles, qualquer deles poderá recorrer ao juiz a solução necessária, resguardando o interesse da prole. Como já visto anteriormente sendo o poder familiar mais dever e menos poder, este então passou a ser um poder natural dos pais com relação aos filhos, essa transformação se deu gradativamente com a evolução da sociedade, passando para um poder natural em relação aos filhos que conforme o Estatuto da Criança e o adolescente21 tem direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos 19 BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei 8069 de 13 de julho de 1990. Dispões sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Brasília: Senado Federal, 1990. 20 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. Direito de família. 18.ed. 5 São Paulo: Saraiva, 2002. v. 5. p.447. 21 Art. 15. BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. 16 civis, humanos e sociais que estão garantidos na Constituição da República Federativa do Brasil. Neste liame entende Lobo22 “O poder familiar dos pais é ônus que a sociedade organizada a eles atribui, em virtude das circunstâncias da parentalidade, no interesse dos filhos. O exercício do múnus não é livre, mas necessário no interesse de outrem.” É também necessário falar que o poder familiar se estende aos filhos adotivos e aqueles havidos ou não da relação do casamento23. A separação judicial, o divórcio e a dissolução da união estável não alteram o poder familiar24. Assim o Estatuto da Criança e do Adolescente em seu art. 20 trata que estes terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação. Gonçalves25 traz oportunamente menção ao fato conforme segue: “Preceitua o art. 1630 do Código Civil que os filhos estão sujeitos ao poder familiar, ”enquanto menores”. O dispositivo abrange os filhos menores não emancipados, havidos ou não no casamento, ou resultantes de outra origem, desde que reconhecidos, bem como os adotivos.” Enfim, insta destacar o conceito acerca do poder familiar de Cahali “O Poder Familiar representa, nos tempos modernos, uma instituição destinada a proteger o filho e, desse modo, certos poderes ou certas prerrogativas são outorgadas aos pais, para, com isto, facilitar-lhes o cumprimento daqueles deveres26“. 22 LÔBO, Paulo Luiz Netto. Do poder familiar. Direito de Família e o novo Código Civil. p. 180. 23 Art. 6, BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 24 Art. 1632. BRASIL. Novo Código Civil. Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Aprova o novo código civil brasileiro. Brasília: Senado Federal, 2002. 25 26 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de família. p. 129. CAHALI, Yussef Saad, Dos Alimentos. 5 ed. São Paulo. Revista dos Tribunais, 2007, p.349 17 1.2 PODER FAMILIAR UMA RELAÇÃO ENTRE O CÓDIGO CIVIL DE 1916 E O ATUAL CÓDIGO CIVIL O vigente Código Civil em quase nada foi alterado em relação a sua redação, apenas adaptando-se aos princípios determinantes pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Assim salienta Lobo27: do confronto entre os dois textos (o antigo e o novo códigos), chegase à surpreendente conclusão de que a estrutura legal do antigo pátrio poder foi mantida intacta, com modificações tópicas de redação. A ordem, a seqüência e o conteúdo dos artigos permaneceram, como se a mudança da denominação e dos titulares (do pai para o pai e a mãe) e a exclusão das referências a filhos ilegítimos fosse suficientes. Houve, apenas, duas inclusões ao texto de 1916: a) outro tipo de extinção de poder familiar (por decisão judicial; b) outro tipo de perda do poder familiar, por ato judicial (incidir, reiteradamente, em falta aos deveres inerentes aos pais). Nota-se que a alteração foi em referência ao exercício do Poder Familiar pelo pai e pela mãe, conforme já antecipado no Estatuto da Criança e do Adolescente, é atenuante dizer que em relação à aplicação do direito este tem como alicerce a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, portanto o código deve sempre ser interpretado a partir desta. Neste sentido esclarece Lobo28: o advento do novo código Civil traz à baila essas demarcações conceituais, imprescindíveis à sua interpretação adequada. Significa dizer que suas normas hão de ser interpretadas em conformidade com os princípios e regras que a constituição estabeleceu para a família no ordenamento jurídico nacional, animados de valores inteiramente diferentes dos que predominavam na sociedade brasileira, na época em que se deu a redação do capítulo relativo ao pátrio poder do Código de 1916, que em grande medida, manteve-se no capítulo destinado ao poder familiar para a família do século XXI. As palavras utilizadas pelo legislador de 1916, reaproveitadas pelo legislador do novo código, são apenas signos, cujos conteúdos 27 LÔBO, Paulo Luiz Netto. Do poder familiar. Direito de Família e o novo Código Civil. p. 180. 28 LÔBO, Paulo Luiz Netto. Do poder familiar. Direito de Família e o novo Código Civil. p. 182. 18 deverão ser hauridos dos princípios e regras estabelecidos pela constituição. A alteração da redação do então antigo Pátrio Poder para o Poder Familiar que antes dava ênfase ao poder exercido apenas pelo pai sobre os filhos foi reestruturado como já comentado para o poder que os dois, pai e mãe exercem sobre os filhos, dever destes em sustentá-los, dar assistência moral, emocional, e educacional e aos filhos, cabe obediência e respeito. Uma outra alteração foi à exclusão relativa ao Pátrio Poder quanto aos bens dos filhos, transferido para o título II no atual Código, destinado ao Direito Patrimonial. Conforme muito bem expressa Lobo29 a alteração de monta foi a exclusão de toda a Seção III do Código de 1916, relativa ao pátrio poder quanto aos bens dos filhos, transferida para o Título destinado ao Direito Patrimonial, na forma de subtítulo II deste, com a denominação de “ Do usufruto e da Administração dos Bens dos Filhos menores” A matéria, todavia, diz respeito ao poder familiar. O novo código civil mantém o usufruto legal dos bens dos filhos em favor dos pais. Tal alteração é de cunho patrimonial relacionado com a administração e ao direito de usufruto, são os pais administradores legais dos bens dos filhos, se estes não o fizerem com zelo, se assim não for e sua comprovação for feita, podem estes sofrer intervenção judicial. 1.3 EXERCÍCIO DO PODER FAMILIAR Encontra-se disposto no Código Civil: Art. 1630 Caput. Os filhos estão sujeitos ao poder familiar, enquanto menores. 29 LÔBO, Paulo Luiz Netto. Do poder familiar. Direito de Família e o novo Código Civil. p. 181. 19 Esse artigo pode colocar em questão vários aspectos a serem discutidos em relação quem são as pessoas que exercem o Poder Familiar. Para Dias30 “O Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece que o poder familiar será exercido pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a legislação civil”. O vigente código refere-se à titularidade dos pais, durante o casamento ou a união estável, restando silente quanto às demais entidades tuteladas explícita ou implicitamente pela constituição. O Estatuto da Criança e do Adolescente trata de que é ensejo aos pais o sustento a educação e a guarda dos filhos menores. A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 faz menção aos inúmeros direitos da criança e do adolescente, cabe ao pai e a mãe e a quem for intitulado através do juízo fazer valer esses direitos, no exercício do poder familiar. É irrenunciável o Poder Familiar, não é permitida aos pais a transferência deste, visto tratar-se de “direito personalíssimo” inerente a pessoa. Em observância ao exposto comenta Rizzardo31 : É o Poder Familiar indispensável para o próprio desempenho ou cumprimento das obrigações que tem os pais de sustento, criação e educação dos filhos. Assim, impossível admitir-se o dever de educar e cuidar dos filhos, ou de prepará-lo para a vida, se tolhidos o exercício de certos atos, o cerceamento da autoridade, da imposição ao estudo, do afastamento de ambientes impróprios etc. Assim, o exercício do Poder Familiar é incumbência de ambos os pais. O menor não tem a capacidade para exercer o ato jurídico, por isso cabe a figura da representação dos filhos enquanto menor ou impossibilitado de exercer os atos da vida jurídica. É necessário que haja alguém responsável para conduzir os atos da vida civil até que o menor atinja a maioridade ou a capacidade que lhe de por si só praticar tais atos. Neste sentido extrai-se ensinamento de Rizzardo32: 30 LÔBO, Paulo Luiz Netto. Do poder familiar. Direito de Família e o novo Código Civil. p. 183. 31 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: Lei n° 10.406, de 10.01.2002. p.602. 20 A representação é uma das atribuições mais importantes, não se impondo que o seja através do pai. Como o poder familiar é incumbência de ambos os progenitores, a qualquer um deles permite-se a representação ou assistência nos atos da vida civil. Se, porventura, o outro discordar, resta-lhe a impugnação judicial, a fim de evitar a perpetração do ato ou procurar a sua anulação. O Poder Familiar, assim, é conferido simultaneamente e igualmente a ambos os pais, levando em consideração a hipótese-padrão, onde os pais estão vivos, unidos pelo casamento ou pela união estável, sendo os dois plenamente capazes. Podem existir hipóteses anormais. Quando na união estável ou casamento se o pai não poder exercer o Poder Familiar, se for suspenso ou destituído o múnus público, este só será exercido pela mãe. No caso de morte de um dos conviventes na União estável, aplica-se a solução por analogia. Na separação judicial ou no divórcio a relação pais e filhos podem ser alterados por atribuir a guarda a um deles ao outro fica o direito de visitas. No caso de morte de um dos pais o outro ficará com o consorte sobrevivente, mesmo que este venha a casar-se novamente33. Maria Helena Diniz34 comenta a respeito de alguns casos anormais que podem ocorrer no exercício do Poder Familiar, no qual transcreve-se: Na família não-matrimonial quando (a) o filho for reconhecido pelos dois genitores, simultânea ou sucessivamente, estabelecendo, assim, o parentesco, ficará sujeito ao exercício do poder familiar de um deles, se não viverem em união estável, tendo o outro o direito de visita, a não ser que, no interesse dele, o juiz decida de modo contrário; (b) o filho for reconhecido apenas por um dos pais, sujeitarse-á ao poder familiar de quem o reconheceu. Na família civil quando (a) o filho adotivo for adotado pelo casal, como se equipara ao filho matrimonial, aos pais adotivos competirá o exercício do poder familiar; (b) o filho adotivo for adotado só pelo marido, a este caberá o exercício exclusivo do poder familiar; e (c) o filho adotivo for adotado apenas pela mulher, a esta há de competir, exclusivamente, o poder familiar. 32 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: Lei n° 10.406, de 10.01.2002. p.607. 33 BRASIL. Novo Código Civil. Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Aprova o novo código civil brasileiro. Brasília, DF, 2002. 34 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. Direito de família. p. 451. 21 Deste modo na falta do pai ou da mãe, assume em caráter excepcional apenas um deles ou se pai e mãe impossibilitados de exercer o Poder Familiar o magistrado nomeará tutor ou curador para exercê-lo35. Assim, para bem destacar, sempre que a figura da justiça entrar na questão a se resolver, far-se-á o que for melhor para o menor, sempre procurando resguardar os direitos previstos na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 1.4 SUSPENSÃO DO PODER FAMILIAR Se o pai ou a mãe abusar de seu poder, faltando com seus deveres ou colocando em risco os bens dos filhos tem-se a suspensão do poder familiar. Cabe destacar Rizzardo36: Na suspensão do poder familiar, encontram-se presentes graves rupturas dos deveres dos pais para com os filhos. Há, no art. 1637 (art. 394 do Código Revogado), regra específica concernente à matéria: Se o pai, ou a mãe, abusar de sua autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo algum parente, ou o Ministério Público, adotar à medida que lhe pareça reclamada pela segurança do menor e seus haveres, até suspendendo o poder familiar, quando convenha. Assim se os pais através de seu comportamento prejudicar os filhos, no que se refere aos interesses pessoais ou materiais o Estado não pode pactuar, devendo então, agir de maneira a solucionar o conflito. É o que pensa Pereira37: Dá-se a ”suspensão do poder familiar” por ato de autoridade, após a apuração devida, se o pai ou a mãe abusar de seu poder, faltando aos seus deveres ou arruinando o bem do filho. A imposição da 35 BRASIL. Lei 8069 de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente. 36 37 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: Lei n° 10.406, de 10.01.2002. p.609 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. Direito de família. 14.ed, Rio de Janeiro: Forense, 2004. v 5. p.434 22 pena de suspensão é deixada ao prudente arbítrio do juiz, que tem a liberdade de não aplicar, posto que provado o fato determinante, se for prestada caução idônea de que o filho receberá do pai (ou mãe) o tratamento conveniente. Como a expressão legal sugere, a suspensão das prerrogativas maternas e paternas dá-se pro tempore. O juiz através de requerimento de um dos parentes ou por representação do Ministério Público suspende o poder familiar, esta suspensão não tem o intuito de punir, mas sim, resguardar e proteger o menor. Sublinha-se também o entendimento jurisprudencial38: DIREITO DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE. SUSPENSÃO LIMINAR DO PODER FAMILIAR. CRIANÇA EXPOSTA À SITUAÇÃO DE RISCO. NEGLIGÊNCIA DOS PAIS QUANTO AOS CUIDADOS BÁSICOS SUFICIENTEMENTE COMPROVADA DESCUMPRIMENTO DOS DEVERES A ELES ATRIBUÍDOS NOS ARTIGOS 229 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E 22 DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. EXEGESE DO ART. 1.638, III E IV, DO CÓDIGO CIVIL. INTERLOCUTÓRIO MANTIDO. RECURSO DESPROVIDO. Muito além do intuito punitivo dos pais, a finalidade da suspensão do poder familiar repousa na sublime atitude do cauteloso magistrado de proteger os interesses maiores de crianças e adolescentes que se encontram em situação de risco ou na iminência de vivenciarem uma situação desta natureza. (...) Em seu parecer, o Procurador de Justiça destaca que "as provas carreadas aos autos bem demonstram e justificam a suspensão do poder familiar, tendo em vista a incapacidade dos genitores de cuidarem de seus filhos e garantir seus direitos fundamentais, demonstrando a impossibilidade da permanência da infante no seio familiar. Inescapável põe em risco principalmente a garantia do direito à integridade física e ao desenvolvimento psicossocial saudável e compatível com a moral e os bons costumes" (fl. 180). (...) O poder familiar é, antes de tudo, um múnus público irrenunciável, indelegável e imprescritível e que, em princípio, deverá ser exercitado com o maior denodo possível pelos pais, significando dizer que estes não estão à vontade para dele desistirem ou renunciarem, assim como não lhes é dado o direito de transferi-lo a outra pessoa, a não ser na forma excepcional do artigo 166 do Estatuto da Criança e do Adolescente. 38 TJSC. BRASIL. Agravo de Instrumento N. 2008.054245-4 Relator: MARCUS TÚLIO SARTORATO. Data do Julgamento: 21/07/2009. Data da Publicação: 25/08/2009. 23 Ao fazer uma análise verifica-se assim, que o Poder Familiar é um instituto de extrema importância, face a importância da Família, pois denota que os pais absorvem uma importância vital da vida de seus filhos quando acompanham e exercem os seus direitos de maneira correta que constitui segundo Rodrigues39 “o próprio alicerce da sociedade. Neste Liame a jurisprudência que esta sendo analisada ainda 40 nos traz : Se os pais se mostram inaptos para o exercício de tão grave e importante dever, dele deverão decair, por determinação judicial. Para isto há o remédio da extinção do poder familiar, que poderá ser administrado, passando ou não pelo instituto da suspensão, na dependência sempre da menor ou maior gravidade da situação a que os pais exponham os filhos (AC n.° 2004.001280-2, rel. Des. Carlos Freyesleben). (...)Consoante o Estatuto da Criança e do Adolescente, é imperativa a observância ao melhor interesse da criança (art. 1º da Lei nº 8.069/90). In casu, demonstra-se indispensável a decretação de perda do poder familiar, porquanto denota-se que os infantes encontravam-se relegados ao abandono. A destituição do poder familiar não se funda na situação econômica dos genitores, eis que a miserabilidade da família, não consta no rol disposto no art. 23 do Estatuto da Criança e do Adolescente, mas sim na ocorrência de nítido descaso com as condições mínimas necessárias ao desenvolvimento adequado da criança, seja afetiva, psicológica, moral, educacional ou material (AC n.° 2003.015956-8, rel. Desª. Salete Silva Sommariva). Considerando que a negligência acentuada dos genitores em relação aos filhos constitui motivo suficiente para a suspensão liminar do poder familiar, correta foi a solução adotada pelo ilustre Magistrado a quo. (...). Pelo exposto, nota-se que é importante que todos estejam voltados pra proteção do menor e para seu bem estar. Que quando pôr o menor em risco deve ser sim, tomadas medidas para que afastem estes, de quem detém o 39 RODRIGUES. Silvio. Direito civil: direito de família. 28 ed. São Paulo: Saraiva, 2004. v. 6. p.368 40 TJSC. BRASIL. Agravo de Instrumento N. 2008.054245-4 Relator: MARCUS TÚLIO SARTORATO. Data do Julgamento: 21/07/2009. Data da Publicação: 25/08/2009. 24 Poder Familiar, para que se possam dar melhores condições e proteger os interesses das crianças e dos adolescentes, conforme prevê a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diante do exposto, enumeram-se algumas hipóteses que podem ser instituto de suspensão do poder familiar conforme o entendimento de Rizzardo41: a) Abuso de autoridade. b) Falta aos deveres pelos pais, por negligência, incapacidade, impossibilidade de seu exercício, ou omissão habitual no cumprimento. c) Ruína ou delapidação dos bens dos filhos. d) Condenação por sentença irrecorrível, em virtude de crime com pena de prisão superior a dois anos. Cumprida, porém, a pena, restaura-se o poder familiar, se nada mais de grave aparecer contra os pais. Basta, em face da redação do dispositivo legal, que haja a condenação, mesmo que não se dê o cumprimento da pena em regime carcerário, mas em regime de substituição de pena, ou que se suspenda a pena mediante o cumprimento de determinadas condições. Não importa, outrossim, que a pena aplicada constitua de detenção ou reclusão. Indispensável, no entanto, que haja o trânsito em julgado, e que se imponha o cumprimento. Se decretada a prescrição da pena em concreto, não decorre o motivo de suspensão. É que, se para fins penais não resultam efeitos, com mais razão na esfera civil. Não obstante ainda trata do assunto, como duas hipóteses de suspensão, Silvio Rodrigues42: Suspende-se o exercício do pátrio poder do progenitor que, por maus-tratos ou privação de alimentos ou de cuidados indispensáveis, puser em perigo a saúde do filho (Lei n° 4.242/21, art.3°). Suspende-se, também, o referido exercício se o progenitor empregar o filho em ocupação proibida ou manifestamente contrária à moral e aos bons costumes, ou que lhe ponha em risco a saúde, a vida, a moralidade (Lei n° 4.242/21, art. 3°). 41 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: Lei n° 10.406, de 10.01.2002. p.610 42 Apud RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: Lei n° 10.406, de 10.01.2002. p. 610. 25 Washington de Barros Monteiro43 cita que o Poder Familiar, além dos casos transcritos acima, pode ser também suspenso quando houver crueldade, maus exemplos, exploração ou perversidade e também quando são comprometidos a saúde, a segurança e amoralidade do filho. Assim quando se tratar de graves motivos que põem em risco à integridade, a moral, a educação dos filhos o juiz poderá envolver, em sua decisão todos os poderes inerentes ao poder familiar ou limitá-los, para que dentro de prazo estipulado possam estes ajustar sua conduta ou serem submetidos sob pena extinção do poder familiar. O Estatuto da Criança e do Adolescente frisa que, apenas a falta ou carência de recursos materiais não é motivo suficiente para suspender o poder familiar, tendo que para suspender o poder familiar os pais incorrem em alguns dos preceitos descritos anteriormente. Se estes motivos apresentarem-se de maneira mais grave pode-se até extinguir o poder familiar conforme será discutido a seguir. 1.5 EXTINÇÃO DO PODER FAMILIAR Opera-se de plano que a extinção do poder familiar ocorre quando houver: a) morte dos pais ou do filho b) emancipação do filho c) maioridade do filho d) adoção e) decisão judicial decretando a perda do poder familiar pela forma do art. 1638 do Código Civil44. 43 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil. ‘Direito de Família’, p.285. 44 BRASIL. Novo Código Civil. Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002: Art. 1638. – Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que: I – Castigar imoderadamente o filho; 26 Conforme Rizzardo45 elucida a respeito da extinção do poder familiar colaborando que: A extinção é a forma menos complexa, verificável por razões decorrentes da própria natureza, independentemente da vontade dos pais, ou não concorrendo eles para os eventos que a determinam. Assim, as hipóteses são capituladas expressamente em lei, e dificilmente encontram-se outras. Neste sentindo é o entendimento do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina46: CIVIL. FAMÍLIA. AÇÃO DE DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR. NEGLIGÊNCIA E ABANDONO COMPROVADOS. SITUAÇÃO DE RISCO A RECOMENDAR O ARREBATAMENTO DO PODER FAMILIAR. INTELIGÊNCIA DO ART. 24 DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE E DO ART. 1.638 DO CÓDIGO CIVIL COLOCAÇÃO DAS CRIANÇAS À DISPOSIÇÃO DE FAMÍLIAS SUBSTITUTAS. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. O poder familiar é, antes de tudo, um múnus público irrenunciável, indelegável e imprescritível, devendo, em princípio, ser exercitado com o maior denodo possível pelos pais. Porém, se estes se mostram inaptos para o exercício de tão grave e importante dever, dele devem decair, por determinação judicial. Para isso há o remédio da extinção do poder familiar, que pode ser administrado passando ou não pelo instituto da suspensão, na dependência sempre da menor ou maior gravidade da situação a que os pais exponham os filhos. Muito se estuda a importância, de os pais passarem por uma análise, sobre as condições que levam a extinção por completa do Poder Familiar. Assim é o entendimento da Digníssima Representante do Ministério Público que II – deixar o filho em abandono; III – praticar atos contrários à moral e aos bons costumes; IV – incidir, reiteradamente, nas faltas previstas, no artigo antecedente. 45 46 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: Lei n° 10.406, de 10.01.2002. p. 607 TJSC. BRASIL. Apelação Cível N. 2008.069963-6 Relator: LUIZ CARLOS FREYESLEBEN. Data do Julgamento: 07/08/2009. Data da Publicação: 31/08/2009. 27 bastante abrilhanta a questão sobre quando não mas se faz capaz de os pais manterem o Poder Familiar. (...)O Ministério Público, por sua digna representante, promotora de justiça Helen Crystine Corrêa Sanches, deflagrou ação de destituição de poder familiar contra R. J. de O. e S. F. A., após constatar a negligência com que criam e educam a prole, mormente a pequena P. A. de O., nascida em 20-2-2008. Para tanto, destacou que, conforme informações colhidas na Secretaria de Assistência Social e no Serviço Social do Ministério Público, pôde verificar que os filhos do casal, em particular P. A. de O., vêm sendo vítima do descuro paterno e materno, que abandonaram a menor, sem se preocuparem com o seu regular desenvolvimento físico e psicológico. Ademais, constatou que os requeridos omitem-se quanto aos deveres dimanados do poder familiar, sequer esboçando vontade ou interesse de reformularem seus comportamentos, ainda que tenham sido orientados, muitas vezes, pela rede de proteção à criança, com vistas a que atendam com maior zelo à filha. Entretanto, nada surtiu efeito até agora, porquanto constatado que seguiram tratando os filhos com o já costumeiro desrespeito. É claro que, se os pais se mostram inaptos para o exercício de tão grave e importante dever, dele deverão decair, por determinação judicial. Para isso há o remédio da extinção do poder familiar, que poderá ser administrado passando ou não pelo instituto da suspensão, na dependência sempre da menor ou maior gravidade da situação a que os pais exponham os filhos e da capacidade materno-paterna de rever seus maus hábitos e suas práticas perniciosas perante os filhos menores47. Se os pais se mostram incapazes de orientar sua prole em consonância com a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, o Código Civil de 2002 e o que prevê o Estatuto da Criança e do Adolescente não se vê outra solução a não ser a extinção do poder familiar. Neste sentido é o entendimento da Representante do Ministério Público e da câmara que decidiu pela extinção do Poder Familiar, conforme continua-se a analisar através da Jurisprudência em questão: O processo é revelador das dificuldades econômico-financeiras dos apelantes, com ganhos mensais de apenas R$ 300,00, advindos do trabalho realizado pelo pai da criança como "chapa" (fl. 50). Essa circunstância, ainda que possa influenciar no conjunto da prova a ser examinado pelo Juiz para definição da situação da infante e para livrá-la de riscos a que não se deva sujeitar, por si só, não é razão bastante para a decretação da suspensão ou da extinção do poder 47 TJSC. BRASIL. Apelação Cível N. 2008.069963-6 Relator: LUIZ CARLOS FREYESLEBEN. Data do Julgamento: 07/08/2009. Data da Publicação: 31/08/2009 28 familiar, nos termos do artigo 23 do Estatuto da Criança e do Adolescente, cabendo ao Estado incluir crianças e adolescentes e as respectivas famílias carentes em seus programas oficiais de assistência ou auxílio, de sorte que essas medidas (suspensão e extinção do poder familiar) são remédios amargos, subministrados pela Justiça apenas em situações extremas. (...)Nesta Câmara decidiu-se, sob a relatoria do eminente desembargador Mazoni Ferreira, acompanhado pelo voto deste Relator e do voto do eminente desembargador Monteiro Rocha, da seguinte forma: ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE - AÇÃO DE DESTITUIÇÃO DE PÁTRIO PODER - MENORES SOB A GUARDA DE TERCEIRA PESSOA - MÃE BIOLÓGICA QUE NÃO REÚNE CONDIÇÕES PSICOLÓGICAS E MATERIAIS PARA ASSUMIR A GUARDA DAS FILHAS - AUSÊNCIA DE CONDIÇÕES ESSENCIAIS AO PLENO DESENVOLVIMENTO DAS INFANTES ABANDONO CARACTERIZADO - INTELIGÊNCIA DO ART. 395 DO CC - DESEJO MANIFESTO DAS INFANTES EM PERMANECER COM OS GUARDIÃES - SUPREMACIA DOS INTERESSES DA CRIANÇA - RECURSO PROVIDO. A destituição do pátrio poder é justificável quando demonstrado que os pais biológicos não reúnem condições psicológicas suficientes e não proporcionam a seus filhos, de tenra idade, o mínimo de condições para seu desenvolvimento saudável e com dignidade, deixando de ministrar-lhes assistência material adequada e submetendo-os a maus tratos, com prejuízos irreversíveis para a sua boa formação (Ap. Cív. n. 2000.010453-1, de Blumenau, j. 5-122002). Como visto, é de concluir-se que os pais apelantes não reúnem condições de ter a filha P. A. de O. sob seu poder familiar, caracterizadas que estão as ofensas aos dispositivos de lei já mencionados no corpo desta decisão. Em face disso, conheço do recurso de apelação e nego-lhe provimento.(...)48. A extinção do poder familiar se dá por inúmeros fatos conforme já visto anteriormente, todos os casos de extinção do poder familiar estão postuladas no Código Civil no art. 1638. Obstante também citar, que extinto o Poder Familiar os filhos são colocados à disposição da adoção, que surge como bem destaca Rodrigues49 48 TJSC. BRASIL. Apelação Cível N. 2008.069963-6 Relator: LUIZ CARLOS FREYESLEBEN. Data do Julgamento: 07/08/2009. Data da Publicação: 31/08/2009. 49 RODRIGUES. Silvio. Direito civil: direito de família. p.335 29 “para assegurar a continuidade da família”. Assim o instituto da adoção surge para que a família que adota uma criança de continuidade ao processo de formação da mesma. Para Rizzardo50, quanto à adoção, comenta: Entrementes, a adoção é concebida se os pais renunciarem ao poder familiar, ou se houver sentença declarando a perda ou extinção. Não se autoriza a adoção com a permanência do poder familiar, sob pena de duas pessoas diferentes, sem nenhum liame conjugal, exercerem concomitantemente o múnus. Por conseguinte a perda do poder familiar também pode acontecer em razão da conduta dos pais, como por exemplo: castigo imoderado dos pais, abandono dos filhos, prática de atos contrários à moral e aos bons costumes. Quanto aos castigos moderados vale ressaltar entendimento de Lobo51: Quanto ao castigo imoderado, por sua relevância, merece ser destacado abaixo. A moral e os bons costumes são aferidos objetivamente, segundo Standards valorativos predominantes na comunidade, no tempo e no espaço, incluindo as condutas que o Direito considera ilícitas. Não podem prevalecer os juízos de valor subjetivos do juiz, pois constituíram abuso de autoridade. Em qualquer circunstância, o supremo valor é o melhor interesse do menor, não podendo a perda do poder familiar orientar-se, exclusivamente, no sentido de pena ao pai faltoso. Perder o poder familiar é um fato de extrema gravidade, assim somente deve ser decidida se realmente ocorrer e for provado que este coloque em perigo a segurança e dignidade do filho. Por fim cabe destacar o ensinamento de Pereira52: A perda do poder familiar é a mais grave sanção imposta ao que faltar aos seus deveres para com o filho, ou falhar em relação a sua condição paterna ou materna. O Código Civil estabelece as hipóteses em que perderá o poder familiar o pai ou a mãe ou 50 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: Lei n° 10.406, de 10.01.2002. p.608 51 LÔBO, Paulo Luiz Netto. Do poder familiar. Direito de Família e o novo Código Civil. p. 188 52 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. Direito de família. p.434 30 ambos, se comprovados a falta, omissão ou abuso em relação aos filhos. Insta, finalmente, que o poder familiar é um instituto de extrema importância, hoje regulado pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, tendo amparo no Estatuto da Criança e do Adolescente e o Código Civil Brasileiro. Cabe destacar que a perda do poder familiar é permanente, mas pode os pais recuperá-la desde que comprovem o fim das causas que o provocaram. Ao encontro de desenvolver com mais amplitude o tema a ser estudado, tratar-se-á a seguir dos Alimentos que no tocante ao objetivo do assunto é de grande relevância como parte integrante do objeto do estudo. CAPÍTULO 2 DOS ALIMENTOS 2.1 ASPECTO HISTÓRICO DA OBRIGATORIEDADE DE DAR ALIMENTOS O dever de prestar alimentos advém dos primórdios da civilização, sendo que naqueles tempos tal obrigatoriedade era um dever moral do homem. Nesse sentido há notícias que remotam o século XIII a.C., aproximadamente, donde os herdeiros já conheciam o dever de provisão de alimentos por parte dos genitores. Contudo, naquela época na qual se vivia numa sociedade patriarcal, o dever de prestar alimentos era pressuposto da figura do homem, até mesmo porque à mulher não era conferido qualquer tipo de direito sobre os filhos. Enfim, não havia regra jurídica, o que existia era uma imposição moral de prestação alimentícia denominada pietatis causa.53 No que se refere à obrigatoriedade de prestar alimentos incidir desde os primórdios da humanidade, bem leciona Buzzi54: Em Gêneses, primeiro livro da Bíblia, está relatado que quando o Egito passava pelo segundo dos sete anos de fome, José, senhor sobre toda aquela terra, destacado homem de confiança do faraó, forneceu víveres aos seu pais, irmãos e a toda sua família. Posteriormente, já no grande Império Romano e após a queda deste, também se prenunciava a obrigatoriedade de sustento familiar, aonde a figura de paterfamilias, que era a figura que possuía o poder familiar, o comando do clã, 53 BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Alimentos transitórios: Uma obrigação por tempo certo. Curitiba: Juruá, 2004. p. 26 54 BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Alimentos transitórios: Uma obrigação por tempo certo. p. 25. 32 detinha também a função de administrador da família e provedor do sustento desta55. No entanto, também nessa fase da história das civilizações não havia contornos jurídicos acerca da obrigatoriedade de prover alimentos, tal dever era previsto como uma espécie de solidariedade àqueles que necessitavam de provisão alimentícia, isto é, não era um direito propriamente dito, conforme caracterizado no Direito moderno56. Assim entende Cahali57 sobre a evolução histórica dos alimentos no direito romano: O direito romano terá conhecido a obrigação alimentícia fundada em várias causas: a) na convenção; b) no testamento; c) na relação familiar; d) na relação de patronato; e) na tutela. É sabido que na estrutura social romana da antiga civilização até o final do primeiro período da história desta, àquele que exercia o poder familiar paterfamilias eram também avassalados no poder daquele além da esposa e filhos, os escravos e agregados. Contudo, a estes não era conferido qualquer tipo de poder atinente ao dever de prover alimentos58. 55 BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Alimentos transitórios: Uma obrigação por tempo certo. p. 26 56 BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Alimentos transitórios: Uma obrigação por tempo certo. p. 28. 57 58 CAHALI, Yussef Saad, Dos Alimentos. 5 ed. 2007. p. 43. BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Alimentos transitórios: Uma obrigação por tempo certo. p. 27. 33 Acerca das regulamentações jurídicas do dever de prestar alimentos à época do Império Romano, bem leciona Cahali59: Em realidade, a doutrina mostra-se uniforme no sentido de que a obrigação alimentícia fundada sobre as relações de família não é mencionada nos primeiros momentos da legislação romana. Segundo se ressalta, essa omissão seria reflexo da própria constituição da família romana, que substitui durante todo o período arcaico e republicano; um direito a alimentos resultante de uma relação de parentesco seria até mesmo sem sentido, tendo em vista que o único vínculo existente entre os integrantes do grupo familiar seria o vínculo derivado do pátrio poder; a teor daquela estrutura o paterfamilias concentrava em suas mãos todos os direitos, sem que qualquer obrigação o vinculasse aos seus dependentes, sobre os quais, aliás, tinha, ius vitae et necis; gravitando à sua volta, tais dependentes não poderiam exercitar contra titular da pátria potestas nenhuma pretensão de caráter patrimonial. Considerando isso, é possível constatar que a partir do período do direito Justiniano à obrigatoriedade/dever de prover alimentos àqueles que necessitam, sejam eles filhos, ascendentes ou até mesmo ex-cônjuges, rompeu um estereótipo de pensamento arraigado tão apenas no poder centrado na figura do Pai – homem e iniciou intensas mudanças60. Desta feita, em decorrência de todas as transformações ocorridas no âmbito moral e legal à época, a obrigatoriedade adquiriu status de direito subjetivo, tanto que um pouco mais a frente na história é possível constatar, no Direito os Papiros, contratos matrimoniais que referenciavam a obrigatoriedade de prestação alimentícia à esposa e filhos, inclusive, os adotivos61. Após, observa-se a mesma obrigação no Código de Hamurabi, no Direito Germânico e Lombardo. Entretanto, a idéia apregoada no direito moderno, ou seja, aquela em que os membros que compõem uma mesma estrutura familiar 59 CAHALI, Yussef Saad, Dos Alimentos. 5 ed. 2007. p. 38. 60 BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Alimentos transitórios: Uma obrigação por tempo certo. p. 27. 61 BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Alimentos transitórios: Uma obrigação por tempo certo. p. 29. 34 detém a obrigação de dar alimentos reciprocamente, apareceu, naturalmente, através dos tempos, conforme delineia Buzzi: 62 Entretanto, a idéia de que os membros de uma mesma família se devem amparo recíproco, surge, naturalmente, como forma de preservar o próprio grupo, cuja existência é importante para o ser humano, considerando-se a sua condição de animal social. Ainda que não haja um marco preciso do momento histórico a partir da qual restou reconhecido o dever de alimentos, inclusive no contexto da família, todavia, parece segura a conclusão de que foi naquelas fontes, antes aqui referidas, que se estruturou a obrigação alimentar e, foi no direito romano que ela, considerada até então apenas um dever moral (officium pietatis), cristalizou-se como obrigação jurídica derivada do parentesco e disciplina pelo legislador. No entanto, há correntes que apontam que a modificação em comento surgiu com a reorganização social e política ocorrida por meio do Império romano. Quanto a isso, leciona Cahali63: (...) teria sido a partir do principado, na organização social e política romana, que os alimentos deixaram de ser considerados como um dever de ordem exclusivamente moral. A partir de então, o próprio conceito de família modificou-se, não sendo mais compreendida como o agrupamento de pessoas submetidas ao mesmo líder, passando a ser reconhecida, exclusivamente entre aqueles com vínculo de sangue comum, assistindo-se, então, a transformação do dever moral de socorro substituído pela obrigação jurídica própria, passível de tutela através da cognitivo extra ordinem. Enfim, matéria das mais controvertidas sempre foi à questão atinente à obrigatoriedade de prestar alimentos à esposa e filhos, já que historicamente os povos eram regidos por sociedades dominadas por homens e o sentimento de posse que preponderava em relação à mulher, filhos e escravos. Dito isso, e ainda analisando os contornos históricos afeitos à obrigação de dar alimentos, verifica-se que o exato ponto de partida no que se refere 62 BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Alimentos transitórios: Uma obrigação por tempo certo. p..28 63 CAHALI, Yussef Said. Dos alimentos. 3ed., rev. Ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998. 35 àquela, foi o regramento contido no Direito Justiniano, uma vez que foi a partir deste que se firmaram os limites da obrigatoriedade de se prestar alimentos entre cônjuges, ascendentes, descendentes e irmãos64. Desta feita, nota-se que o que era tido como dever simplesmente moral passou a ter contornos jurídicos e, por fim, tornou a obrigatoriedade um direito subjetivo daquele que detém o direito de receber alimentos. De outra parte, contudo, assinala Covello65, que: (...) é no direito canônico, todavia, que o instituto dos alimentos encontra seu mais largo desenvolvimento, pois tal corpo normativo, inspirado nos princípios evangélicos, estendeu esse direito (até mesmo) à família ilegítima, aos que se vinculam por parentesco meramente civil (adotante e adotado) e, mesmo, espiritual (padrinho e afilhado). Entretanto, foi no Direito Canônico que se destacaram aspectos fundamentais para a implementação de liames jurídicos atinentes à obrigatoriedade de se prestar alimentos, conforme pontua Cahali66: (...)no plano das relações determinadas pelo vínculo de sangue, um texto, que em realidade se referia aos liberi naturales do direito justinianeu, inexatamente interpretado, terá sido o ponto de partida para o reconhecimento do direito de alimentos também aos filhos espúrios em relação ao companheiro da mãe durante o período da gravidez, sem que se pudesse invocar, para excluí-lo, a exceptio plurium concumbentium; a obrigação alimentar poderia originar-se, para alem do vínculo de sangue, de outras relações “quase religiosas”, como o clericato, o monastério e o patronato; a igreja teria a obrigação de dar alimentos ao asilado; questionava-se entre tio e sobrinho, ou entre o padrinho e o afilhado, em razão do vínculo espiritual; pelo direito canônico, definindo-se o casamento como Sacramentum novae legis a Christo institutum quo viro etmulieri fidelibus (...) (deduzindo-se daí) a obrigação alimentar recíproca entre cônjuges. 64 BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Alimentos transitórios: Uma obrigação por tempo certo. p. 40. 65 COVELLO, Sérgio Carlos. Ação de alimentos. 3. ed. São Paulo: Universitária de Direito, 1992. p. 40. 66 CAHALI, Yussef Said. Dos alimentos. 3ed 1998. p. 47. 36 Ainda discorrendo sobre a evolução das disposições legais e jurídicas relativas à obrigação de proporcionar alimentos ao familiar necessitado, observa-se que há corrente que defende que a fonte das modificações ocorridas no âmbito de dar alimentos ocorreu com a instituição propriamente dita da material matrimonial67. Já para outros o marco inicial emana da faculdade imposta ao Estado em impor aos membros de uma mesma comunidade familiar em amparar os mais idosos e/ou aqueles quem em razão de tão tenra idade não tem condições de prover seu sustento e, que, em decorrência poderiam, como ainda podem na atualidade, perecerem, caso o Estado não providenciasse a subsistência material aos necessitados de alimentos68. No tocante entende Rodrigues69: A tendência moderna é a de impor ao Estado o dever de socorro dos necessitados, tarefa que ele se desincumbe, ou deve desincumbir-se, por meio de sua atividade assistencial. Mas, no intuito de aliviar-se desse encargo, ou na inviabilidade de cumpri-lo, o Estado o transfere, por determinação legal, aos parentes cônjuge ou companheiro do necessitado, cada vez que aqueles possam atender a tal incumbência. Num paralelo da construção histórica, observa-se que a obrigatoriedade de dar alimentos surge anteriormente aos preceitos do direito moderno. Registre-se, que o marco inicial da obrigatoriedade jurídica lançado no direito brasileiro teve origem no Direito português70: Quando da descoberta do Brasil, o direito português regia-se pelas Ordenações Manuelinas e, logo depois, pelas Ordenações Filipinas 67 BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Alimentos transitórios: Uma obrigação por tempo certo. p. 43. 68 BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Alimentos transitórios: Uma obrigação por tempo certo. p. 43. 69 70 RODRIGUES. Silvio. Direito civil: direito de família. p.373. BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Alimentos transitórios: Uma obrigação por tempo certo. p. 45. 37 que disciplinaram toda a Península Ibérica e com ela as colônias portuguesas, transmudado o direito brasileiro. Não houve alteração significativa quanto às raízes fincadas sempre no direito canônico e no horror à família ilegítima, em especial à adulterina. Aqui a eficácia da maior parte das Ordenações Filipinas perdurou praticamente até o Código Civil. Vale mencionar o que ensina Ribeiro71: O Brasil foi descoberto pelos portugueses em 1500, ficou sob o jugo de Portugual, quase que continuamente (exceto de 1580 a 1640, período em que perteceu à Espanha), até a data da proclamação da República, ocorrida em 15.11.1889. A legislação reinol perdurou em grande parte, até a promulgação do Código Civil Brasileiro, que entrou em vigor em 01.01.1917, contendo preceitos rígidos no campo do Direito de Família. Noutro prisma, já nas Ordenações Filipinas pontuava-se os elementos afeitos à obrigação de dar, a saber: a)gêneros alimentícios; b) vestuário; c) calçados; d) verbas destinadas à educação das crianças com idade até 12 anos, uma vez que a partir dessa idade o infante deveria prover sua própria subsistência dentro de uma margem referente às suas condições sociais e financeiras72. A esse respeito, Buzzi diz73: Também desse mesmo período é o Assento de 09.04.1772 que, embora proclamado o dever de cada um alimentar e sustentar a si mesmo, estabeleceu, expressamente, as exceções em determinados casos de descendentes legítimos e ilegítimos; ascendentes, transversais, irmãos legítimos e ilegítimos, primos e outros consangüíneos legítimos e ilegítimos. Continuando nessa análise legislativa, observa-se que o aludido assento de 09.04.1772, recebeu contornos legais por meio de alvará em 29.08.1776, apresentando-se de forma minuciosa e detalhista, servindo atualmente tão apenas como documento histórico74. 71 RIBEIRO, Benedito Silvério. A evolução do direito de família e as expectativas para o futuro. Revista da Escola Paulista da Magistratura, São Paulo. p. 46. 72 BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Alimentos transitórios: Uma obrigação por tempo certo. p. 32. 73 BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Alimentos transitórios: Uma obrigação por tempo certo. p. 32-33. 74 BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Alimentos transitórios: Uma obrigação por tempo certo. p. 33. 38 Já no Código Civil de 1916, previa a mútua assistência entre os cônjuges (art. 231, III CC/1916), enquanto o provimento financeiro ao sustento da prole estava previsto no inciso IV, do mesmo diploma legal, e a obrigação entre parentes, companheiros e integrantes da convivência estável eram regulados pelas Leis n. 8.971/94 e 9.278/9675. Desde o momento da sua concepção, o ser humano – por sua estrutura e natureza – é um ser carente por excelência; ainda no colo materno, ou já fora dele, a sua manutenção faz com que se lhe reconheça, por um principio natural jamais questionado, o superior direito de ser nutrido pelos responsáveis por sua geração.76 Enfim, em relação ao paralelo histórico construído no presente estudo monográfico, constata-se que o Código Civil de 2002 estabeleceu alimentos necessários entre familiares, ascendentes, descendentes e filhos, sendo estes adotivos ou não, e até mesmo quando a obrigatoriedade advém de obrigação “moral” assumida, ou seja, aquele que porventura registra filho como seu passa a ter a comprometimento legal e jurídico de prover alimentos àquele, mesmo que comprovada a não existência de laços sanguíneos. 2.2 CONCEITO DE ALIMENTOS Como já visto neste estudo, o termo alimento sugere e remete aos itens necessários para uma boa subsistência humana, bem como denota a imagem daquele que deve pagar os alimentos (alimentante) e daqueles que estão propensos a receber a verba alimentar (alimentado). Assim remete-se a Gonçalves77 que entende quanto aos pressupostos para obrigação alimentar: 75 BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Alimentos transitórios: Uma obrigação por tempo certo. p. 33. 76 CAHALI, Yussef Said. Dos alimentos. 3ed 1998. p. 30 77 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de família. p. 166 39 São pressupostos da obrigação alimentar:a) existência de um vinculo de parentesco; b) necessidade do reclamante; c) possibilidade da pessoa obrigada; d) proporcionalidade. Preceitua o art. 1.695 do Código Civil: São devidos os alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria mantença, e aquele, de quem se reclamam, pode fornecê-los, sem desfalque do necessário ao sustento. Gonçalves78 relata sobre a matéria que: Os alimentos decorrem também de dever familiar, como ocorre na relação entre os pais e os filhos menores, entre cônjuges e companheiros ou conviventes. O dever de sustentar os filhos menores é expresso no art. 1.566, IV, do Código Civil e é enfatizado nos arts. 1.634, I, e 229, este da Constituição. Decorre do poder familiar e deve ser cumprido incondicionalmente, não concorrendo os pressupostos da obrigação alimentar. Subsiste independentemente do estado de necessidade do filho, ou seja, mesmo que este disponha de bens recebidos por herança ou doação. Cessa quando o filho se emancipa ou atinge a maioridade, aos dezoito anos de idade. Nestas hipóteses, deixa de existir o dever alimentar decorrente do poder familiar, mas pode surgir a obrigação alimentar, de natureza genérica, decorrente do parentesco (CC, art. 1.694). Frise-se que é pacifico o entendimento atual tanto doutrinário quanto jurisprudencial no que se refere àquilo que deve compreender os alimentos, ou seja, hoje são analisadas as necessidades básicas exclusivas do alimentado e também àquelas atinentes a indispensável subsistência, devendo ser consideradas, a tanto, a situação social de quem paga e de quem recebe79. Exemplo disso poder-se-ia citar-se aquele filho que convive num meio social aonde lhe é propiciado bons colégios, cursos de idiomas, prática de exercícios físicos, viagens, planos médico, dentário e hospitalar, enquanto inserido num contexto familiar formado pela figura do pai e da mãe. Em ocorrendo à separação destes, todo o contexto social no qual esteja àquele arraigado, não poderá o alimentado ter benefícios suprimidos em razão da separação dos pais. 78 79 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de família. p. 167 BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Alimentos transitórios: Uma obrigação por tempo certo. p. 38. 40 Nesse caminhar, Cahali80 esclarece: (...) adotada no direito para designar o conteúdo de uma pretensão ou de uma obrigação, a palavra “alimentos” vem a significar tudo o que é necessário para satisfazer aos reclamos da vida; são as prestações com as quais podem ser satisfeitas as necessidades vitais de quem não pode provê-las por si; mas amplamente, é a contribuição periódica assegurada a alguém, por um titulo de direito, para exigi-la de outrem, como necessária à sua manutenção. Enfim, os alimentos com o passar dos tempos passaram de um dever simplesmente moral para uma obrigação imposta por lei, aonde uma pessoa mantém a subsistência de outra, visando à satisfação desta última. Destaca Buzzi81, Portanto, seja sob a ótica de um direito especializado ou não, os alimentos devem ser entendidos como coisa básica, recurso elementar, responsável por propiciar a manutenção da vida, esta última considerada bem de maior grandeza, seja qual for a escala, o parâmetro, a ciência através da qual se possa fazer sua abordagem. Noutras palavras, importa dizer que as sociedades modernas, principalmente as politicamente organizadas, sobretudo as do mundo ocidental, regraram juridicamente, o dever de prestar alimentos, sendo que o sentimento de solidariedade, pode provir dos elos de parentesco sanguíneo ou não, casamento ou laços de convivência social entre um homem e uma mulher82. Buzzi83 destaca: Portanto, seja sob a ótica de um direito especializado ou não, os alimentos devem ser entendidos como a coisa básica, recurso elementar, responsável por propiciar a manutenção da vida, esta 80 CAHALI, Yussef Said. Dos alimentos. 3ed 1998. p. 16. 81 BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Alimentos transitórios: Uma obrigação por tempo certo. p. 21 82 BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Alimentos transitórios: Uma obrigação por tempo certo. p. 20-21 83 PEREIRA, Sérgio Gischkow. A união estável e os alimentos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1990. p. 20 83 CAHALI, Yussef Saad, Dos Alimentos. 5 ed. 2007. p. 510. 41 última, considerada bem de maior grandeza, seja qual for a escala, o parâmetro, a ciência através da qual se possa fazer sua abordagem. Para Pereira84, “o direito a alimentos diz com o direito mais fundamental e essencial de todos, o que é o direito à vida e à vida com dignidade. Estamos aí diante de um princípio universal, não apenas moral, mas também jurídico”. Ainda, denota-se que os alimentos num primeiro momento decorrem da possibilidade de se prestar alimentos e da necessidade de receber estes, ou seja, binômio necessidade/possibilidade. Cahali bem comenta sobre o assunto85: Para além da existência do vínculo de família, a exigibilidade da prestação alimentar pressupõe que o titular do direito não possa manter-se por si mesmo, ou com o seu próprio patrimônio; assim, só serão devidos alimentos quando aquele que os reclama não tem bens, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria mantença (Código Civil, art. 1.695). (...) O pressuposto da necessidade do alimentando somente se descaracteriza se referidos bens de que é titular se mostram hábeis para ministrar-lhe rendimento suficiente a sua mantença; ou não se mostra razoável exigir-lhe a conversão de tais bens em valores monetários capazes de atender aos reclamos vitais do possuidor. Sobre o binômio necessidade/possibilidade decidiu o TJSP86 em acórdão recentemente que traz-se para esclarecer sobre atual matéria: VOTO DO RELATOR EMENTA - ALIMENTOS PROVISÓRIOS – Demanda ajuizada em face do avô paterno - Arbitramento que se mostrou elevado, na hipótese dos autos - Fixação dos provisórios que deve atender ao binômio necessidade/possibilidade - Necessidades do credor 86 TJSP. BRASIL. Agravo de Instrumento N. 990.10.047733-1 Relator: SALLES ROSSI. Data do Julgamento: 28/04/2010. Data de Registro: 06/05/2010. Tribunal de Justiça de São Paulo. http://www.tj.sp.gov.br/. acesso em 08 de maio de 2010. 42 presumidas, em razão da menoridade - Provisórios, que, por seu turno, representam a urgência do crédito e que só a instrução do feito poderá demonstrar o desacerto do seu arbitramento - Redução cabível (em parte), diante da comprovação de que o agravante presta alimentos a outros três netos - Cabível a redução dos provisórios para um salário mínimo (ao invés de 15% dos rendimentos líquidos do agravante, que ultrapassam o montante de R$ 1.100,00) - Montante que, ao menos em sede de cognição sumária, atende às necessidades da menor - Obrigação que, ademais, possui aqui caráter subsidiário (art. 1.696 do Código Civil) - Genitor do agravado – Paradeiro desconhecido - Genitora que, por seu turno, também deve contribuir para o sustento do filho (que, ao que se infere dos autos, estuda em escola pública) – Decisão reformada - Recurso parcialmente provido. Contudo ao analisar sobre dar alimentos é necessário que seja levado em consideração o binômio em discussão, devido que, uma análise criteriosa deve ser feita sobre a necessidade de quem vai receber e a possibilidade de quem vai pagar os alimentos. No mesmo sentindo ainda refere-se o acórdão do Tribunal de 87 Justiça de São Paulo : Em se cuidando de alimentos, cabe fazer prova tanto da necessidade dos alimentos que se reclama quanto das possibilidades do prestador da obrigação. Aliás, YUSSEF SAID CAHALI, na obra "Dos Alimentos", 2002, 4a Edição, Ed. RT, págs. 723 e ss., cita julgado da 7ª Câmara de Direito Privado, desse Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo, contido na RT 751/264, que assim se expressa: "Não basta prova quanto a necessidade e pressupostos da obrigação alimentar, porquanto os alimentos devem ser fixados de acordo com o binômio necessidade possibilidade a tornar exeqüível a obrigação pela existência de capacidade econômica do sujeito passivo de poder ele prestar alimentos sem lhe faltar o mínimo necessário à sua própria sobrevivência." Nesse aspecto, em se tratando de alimentos provisórios e, portanto, em sede de cognição sumária, está demonstrada a necessidade dos alimentos provisórios, em especial diante da menoridade do agravado. (...) É certo que no curso da instrução do feito, será possível ao Juízo apreciar com mais efetividade se os provisórios arbitrados representam, de fato, a melhor expressão da capacidade do alimentante e da necessidade do ora agravado. 87 TJSP. BRASIL. Agravo de Instrumento N. 990.10.047733-1 Relator: SALLES ROSSI. Data do Julgamento: 28/04/2010. Data de Registro: 06/05/2010. 43 Sobre a possibilidade bem nos reporta o art. 1695 do Código Civil de 2002 88 que deve pagar alimentos àquele que tem a capacidade de fazê-lo, que não prejudique a sua própria mantença. Assim se o alimentante não tem como se manter devendo se levar em conta os rendimentos e não os bens do alimentante, não há porque este pagar alimentos a outrem. Sobre a matéria comenta Cahali89: Do mesmo modo, aquele que dispõe de rendimentos modestos não pode sofrer a imposição de um encargo que não está em condições de suportar; pois se a justiça obrigasse quem dispõe apenas do indispensável para viver, sem sobras, e mesmo com faltas, a socorrer outro parente que está em miséria, ter-se-ia uma partilha de misérias. Atualmente já trata-se de um trinômio necessidade/proporcionalidade/possibilidade, onde vários doutrinadores já trazem que para decidir em matéria de alimentos deve ser levado em conta estes três aspectos para que nem alimentando, nem alimentante saiam prejudicados. Extrai-se da Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo90 o entendimento que negou provimento ao filho que pediu alimento ao pai: REVISIONAL DE ALIMENTOS - Observância do art. 1.699 do Código Civil - Respeitado o trinômio proporcionalidade-necessidadepossibilidade – Recurso desprovido. 1. Trata-se de ação revisional de alimentos julgada parcialmente procedente pela r. sentença de fls. 575/580 (3o vol.), de relatório adotado, que fixou "(...) o valor da pensão alimentícia devida pelo requerido ao requerente em um salário mínimo, enquanto o autor estiver cursando universidade, com vencimento todo dia 10. " (fls. 579/580 - 3o vol.). E determinou que o réu suportasse "(...) os custos das mensalidades e matrículas da 88 Art. 1696. O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros. 89 CAHALI, Yussef Saad, Dos Alimentos. 5 ed. 2007. p. 516. 90 TJSP. BRASIL. Apelação N. 596.966.4/5-00 Relator:GUIMARÃES E SOUZA. Data do Julgamento: 22/09/2009. Data de Registro: 06/10/2009. 44 faculdade que o autor vem cursando até sua conclusão, cessando a obrigação em caso de repetência. (fl. 580 – 3°vol.). (...) Inconsistente o recurso, porquanto adequadamente sopesado a trinômia proporcionalidade-necessidade-possibilidade. Assim, sopesado o trinômio proporcionalidade/necessidade/possibilidade (moderna construção doutrinária que utiliza o princípio da proporcionalidade como diretriz para mensurar os critérios da necessidade-possibilidade - cfr.: DIAS, Maria Berenice. Manual das Famílias. 4a ed., R1(, São Paulo: 2007 - pág7482), cabível manter os alimentos conforme fixados na r. sentença. ( Relator(a): Guimarães e Souza – Comarca: Santos Órgão julgador: 1° Câmara de Direito Privado Data do julgamento: 22/09/2009 Data do Registro: 06/10/2009 Ementa: Revisional de Alimentos – Observância do art. 1699 do Código Civil – Respeitado p trinômio proporcionalidadenecessidade-possibilidade – Recurso desprovido. O artigo 1694 do Código Civil prevê que os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada. Bem relata sobre o assunto Cahali91: “mas, se a obrigação alimentar não se presta somente aos casos de necessidade, devendo-se considerar a condição social do alimentado, ter-se-á em conta, põem, que é imprescindível a observância da capacidade financeira do alimentante, para que não haja desfalque do necessário ao seu próprio sustento (...)”. Percebe-se que o caráter de dar alimentos está intrinsecamente ligado com a possibilidade, proporcionalidade e necessidade de pais e filhos oriundos do Poder Familiar e não só da obrigação alimentar. Conforme relata Gonçalves92: Entre pais e filhos menores, cônjuges e companheiros, não existe propriamente obrigação alimentar, mas dever familiar, respectivamente de sustento e de mútua assistência (CC, arts. 1.566, III e IV, e 1.724). A obrigação alimentar também decorre da lei, mas é fundada no parentesco (art. 1694), ficando circunscrita aos ascendentes, descendentes e colaterais até o segundo grau, com reciprocidade. É transmissível e divisível. 91 CAHALI, Yussef Saad, Dos Alimentos. 5 ed. 2007. p. 518. 92 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de família. p. 161 45 Pertinente a situação do alimentando e as condições do alimentante destaca Rizzardo93: Tem-se em conta, sempre quando possível, que as necessidades de cada um são variáveis em função da idade, saúde, da condição social do alimentando, o que encontra respaldo no art.1694 e em seu §1°(arts. 396 e 400 do Código de 1916), cuja combinação conduz a compreender a necessidade em função da condição social da pessoa que precisa de alimentos, inclusive para atender às necessidades de sua educação. A redação peca pela precariedade. Já que levou em conta como critério a condição social, não carecia que incluísse o atendimento das necessidades da educação, eis que resta óbvia a mesma. Desde que destacou um campo da necessidade, deveria referir também os outros, como a alimentação, a moradia, a recreação, a saúde etc. Várias as necessidades conforme a situação de cada pessoa alimentada. No que respeita à obrigação alimentar, de forma distinta daquelas advindas de dívidas civis, Rizzardo94 aponta que “Merecem os alimentos um tratamento especial, pois dizem respeito à própria vida da pessoa. Funda-se num princípio de direito natural, que transcende o ser humano, pois, na forma instintiva, existe até nos irracionais”. No que tange ao conceito de alimentos pode-se citar 95 Gonçalves : Alimentos são prestações para satisfação das necessidades vitais de quem não pode provê-las por si. Têm por finalidade fornecer a um parente, cônjuge ou companheiro o necessário à sua subsistência. Quanto ao conteúdo, abrangem o indispensável ao sustento, vestuário, habitação, assistência médica e instrução (CC, art. 1920). Por fim, em virtude do que foi mencionado, insta destacar que os alimentos são essenciais à vida, pois talvez possa se afirmar que o primeiro direito fundamental do ser humano seja o de sobreviver96. 93 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: Lei n° 10.406, de 10.01.2002. p. 742. 94 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: Lei n° 10.406, de 10.01.2002. p. 620. 95 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de família. p. 158 46 2.3 ESPÉCIE DE ALIMENTOS Observando o arcabouço legislativo vigente no país acerca da obrigatoriedade de se prestar alimentos, observa-se que existem diferentes espécies, razão pela qual se faz mister analisar àquelas para a melhor compreensão do tema do presente estudo monográfico. Nesse sentido, Buzzi ilustra97: Distintas as causas geradoras do direito a alimentos, múltiplas também são as estruturas jurídicas internas (materiais), que as disciplinam, bem como os expedientes destinados a dinamizar sua exigibilidade. A diversidade de tratamento e regramento da matéria leva em conta a obrigação alimentar quanto à sua natureza, sua causa jurídica, sua finalidade e o momento da sua prestação. Outra espécie de dar alimentos é àquela disposta na constituição do usufruto vitalício com destinação alimentar, contudo, nesta admite-se a cláusula rebus sic stantibus, para proteger o bem comum em relação ao social, para garantir o equilíbrio contratual98, após o trânsito em julgado, firmando, assim, até a fixação de alimentos entre os ex-cônjuges e conviventes99. No ponto, necessário frisar que a palavra alimentos nos remete a uma categoria que abrange tudo o que é indispensável à manutenção da saúde e vida dos seres humanos, englobando gêneros alimentícios, roupas, calçados, habitação, tratamento médico, criação e educação. 96 RODRIGUES. Silvio. Direito civil: direito de família. p.373. 97 BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Alimentos transitórios: Uma obrigação por tempo certo. p. 33-34. 98 Rebus Sic Stantibus pode ser lido como "estando as coisas assim" ou "enquanto as coisas estão assim". Deriva da fórmula contractus qui habent tractum sucessivum et dependentium de futuro rebus sic stantibus intelliguntur. http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id, acesso em 08/02/2010 escrito por: Nelson Zunino Neto advogado em Florianópolis (SC). 99 BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Alimentos transitórios: Uma obrigação por tempo certo. p. 34. 47 No que tange as diferentes espécies de alimentos, Buzzi destaca que 100 : Como já enfatizado, a palavra alimento tem, em direito, uma acepção técnica compreendendo, juridicamente, tudo o que for necessário ao sustento, à habitação, à roupa (vestimento, calçado), ao tratamento de moléstias e, se o alimentário for menor, todo o indispensável às despesas de criação e educação. Os alimentos são de várias espécies conforme Gonçalves101. Quanto à natureza podem ser naturais ou civis. Quanto à causa jurídica divide-se em legais ou legítimos e voluntários. Quanto à finalidade, classificam-se em alimentos definitivos, provisórios e provisionais. Quanto ao momento que são reclamados os alimentos classificam-se em pretéritos, atuais e futuros. No tocante apresentar-se-á no título a seguir um breve relato sobre as espécies de alimentos mais utilizadas no tocante ao pagamento de alimentos de pais e filhos nos ditames do Poder Familiar a respeito deste estudo monográfico. 2.3.1 Quanto à natureza Fator preponderante para a melhor análise do tema estudado no presente estudo monográfico e verificação dos alimentos acerca da sua natureza. Nesse sentido, observando o disposto no Código Civil de 2002, nota-se que os alimentos foram divididos em naturais e civis, há doutrinadores que apontam aqueles como côngruos e estes como necessários. Buzzi102 leciona sobre o conceito de alimentos naturais ou côngruos que: são aqueles que se referem às necessidades elementares do alimentando, ao básico à mantença da vida da pessoa, observando 100 BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Alimentos transitórios: Uma obrigação por tempo certo. p. 35. 101 102 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de família. p. 158. BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Alimentos transitórios: Uma obrigação por tempo certo. p. 37. 48 os limites das carências primárias. São os estritamente exigidos para a mantença da vida. Os alimentos civis ou necessários segundo também Buzzi103: Abrangem, além das necessidades básicas, indispensáveis, elementares, naturais, também as intelectuais e morais, inclusive a recreação do beneficiário, e assim, o necessarium personae, sendo estabelecidos segundo a qualidade do alimentando e os deveres da pessoa obrigada. Cabe destacar que muitos autores não mais utilizam esta terminologia, mas que bastante ainda se é tratada pela jurisprudência quando da na análise do assunto. A respeito dos alimentos indispensáveis, salienta Buzzi 104. (...) nos moldes dos seus arts. 1.694, § 2°, e 1.704, parágrafo único, o novo Código Civil institui, ao lado dos alimentos civis (necessários), e no âmbito dos naturais ( côngruos), os indispensáveis, em favor daquele que, mesmo considerado culpado pelo rompimento da vida em comum, entre o casal, careça de meios para a própria subsistência, não contando com parentes, recursos ou rendimentos capazes de lhe propiciar o provimento, nem reúna condições para obter o próprio sustento pelo trabalho. Pode-se citar Gonçalves que entende, quanto à natureza da obrigação alimentar105: A obrigação alimentar é também divisível, e não solidária, porque a solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes (CC, art. 264). Não havendo texto legal impondo a solidariedade, é ela divisível, isto é, conjunta. Cada devedor responde por sua quota-parte. Havendo quatro filhos em condições de pensionar o ascendente, não poderá este exigir de um só deles o cumprimento da obrigação por inteiro. Os alimentos legítimos são aqueles que se classificam em razão de uma imposição legal, são aqueles decorrentes das relações de parentesco 103 BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Alimentos transitórios: Uma obrigação por tempo certo. p. 37. 104 BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Alimentos transitórios: Uma obrigação por tempo certo. p. 38. 105 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de família. p. 162 49 ou familiares e voluntários aqueles devidos por força de uma declaração de vontade106. Segundo Gonçalves107: “os alimentos definitivos são aqueles de caráter permanente, estabelecidos pelo juiz na sentença ou em acordo das partes devidamente homologado. Provisórios são os fixados liminarmente no despacho inicial proferido na ação de alimentos e provisionais são os determinados e medida cautelar”. Para esclarecer sobre os alimentos futuros e pretéritos importante citar Buzzi108 quanto a esses conceitos: Esta classificação em alimentos futuros ou pretéritos tem significação ou relevância, quando se pretende determinar o termo a quo a contar do qual os alimentos passam a ser exigíveis e, assim, se são devidos desde a sua fixação, isto é, do estabelecimento para o futuro, ou se englobam termo já passado. Alimentos futuros são os devidos a contar do estabelecimento deles em acordo, ou determinação judicial, a partir de tais marcos. Alimentos pretéritos são aqueles estabelecidos em momento anterior ao acordo de vontades ou à determinação judicial. Dado o exposto verifica-se que a terminologia quanto à natureza dos alimentos é importante no tocante que estes imperam quanto à discussão do tema de dar alimentos e resolvem questões na qual encontra-se no dia-a-dia. 2.4 ALIMENTOS E OS DITAMES DA SÚMULA 358 DO STJ Ainda, de extrema relevância para o presente estudo monográfico, é a verificação da implementação da Súmula 358 do STJ. Pois bem. Inicialmente, constata-se que os alimentos são uma obrigatoriedade legal prevista no art. 1.694 do Código Civil, que dispõe: 106 BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Alimentos transitórios: Uma obrigação por tempo certo. p. 39. 107 108 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de família. p. 158 BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Alimentos transitórios: Uma obrigação por tempo certo. p. 42. 50 Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação. Parágrafo Primeiro: Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada. Parágrafo Segundo: Os alimentos serão apenas os indispensáveis à subsistência, quando a situação de necessidade resultar de culpa de quem os pleiteia. Analisando o texto do diploma legal supra transcrito, é possível constatar-se que o legislador deixou uma lacuna no que se refere ao término da obrigação de pagar alimentos aos filhos maiores de 18 (dezoito) anos, motivo pelo qual foi editada a verbete sumular n. 358 do STJ, com o seguinte texto: “O cancelamento de pensão alimentícia de filho que atingiu a maioridade está sujeito à decisão judicial, mediante contraditório, ainda que nos próprios autos”. Acerca do tema enfocado pela Súmula em comento, Narezi109 delineia: Como se sabe, a súmula nada mais é que a consolidação da posição de um tribunal acerca de determinada matéria, considerando a existência de repetidos julgamentos onde a mesma é discutida, de forma a orientar as instâncias inferiores. A súmula citada se aplica nos casos em que a maioridade do alimentado (filho) é, no entender do alimentando, causa para a cessação do direito ao percebimento de pensão alimentícia, posto que existem situações em que o acordo ou a decisão que os estabelece não fixa o termo final para tal obrigação. Importa salientar que o Código Civil de 2002 diminuiu a maioridade civil de 21 (vinte e um) anos para 18 (dezoito) anos, permitindo, inclusive, que adolescentes de 16 (dezesseis) anos sejam emancipados, fazendo, desta forma, crescer a premissa de que os jovens podem se auto-sustentar a partir de 16 ou 18 anos, levando em consideração que o competitivo mercado de trabalho não vislumbra que tais “adultos” aufiram renda mensal suficiente para que tenham necessidade de prover sozinhos seus alimentos – nestes englobados todos àqueles itens necessários à sobrevivência pessoal, social e cultural. 109 NAREZI. Paulo Roberto. Os alimentos e a Súmula 358 STJ. Disponível em: http://www.parana-online.com.br/colunistas/237/60204/. Acesso em: 26 nov. 2009. 51 Sobre a matéria leciona Rizzardo110: “A necessidade é o aspecto de maior relevância, ou o primeiro requisito a ser examinado, posto que dele depende o exame dos demais. Em principio, considera-se em estado de necessidade quem não pode satisfazer as exigências da vida por seu trabalho, ou com o rendimento de seus bens”. Portanto, o que é possível verificar a partir da edição da Súmula em análise, é que o simples fato de um indivíduo atingir a maioridade civil não obsta o seu direito de receber alimentos automaticamente, sendo necessário instar o Poder Judiciário para que este, embuído de sua competência, análise as circunstâncias que permeiam caso a caso e decida da forma mais equânime possível. Sobre este aspecto bem disserta Narezzi111: Até porque, como é de praxe em processos de separação ou divórcio, o menor, diretamente favorecido com a fixação de pensão alimentícia, tem seu direito fiscalizado pelo Ministério Público e Pelo Judiciário, não sendo crível admitir-se, por antecipação, que o alcance da maioridade, por si só, é garantia de que o mesmo já tem condições de auto sustentar-se. Muitas vezes, no processo de separação ou divórcio, a fixação dos alimentos é feita até mesmo antes do alimentado completar 1 (um) ano de vida. Além do mais, é fato notório que na idade da maioridade civil, o jovem, corretamente enquadrado na cadeia educacional, deve ter apenas e tão somente iniciado seu curso de graduação, sendo exceção à regra aqueles que já conseguem se manter sem dependência junto à família. Assim é que, alcançada a maioridade, o interessado (alimentante) poderia requerer ao Juízo competente (Vara de Família) a redução ou até mesmo a exoneração do ônus de alimentar fixado ou homologado em sentença. Isto pode ser feito tanto no próprio processo onde foi fixada a verba alimentar, como em autos próprios, onde a pretensão seria a de revisão ou a de exoneração de alimentos. Nesta hipótese caberá ao Juiz analisar a capacidade e a necessidade, respectivamente do alimentante e do alimentado, para basear a sua decisão de manutenção, redução ou até mesmo exoneração da obrigação anteriormente fixada. Contudo, se a sentença que homologar ou fixar a pensão alimentícia, estabelecer previamente de forma expressa e 110 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: Lei n° 10.406, de 10.01.2002. p. 738. 111 NAREZI. Paulo Roberto. Os alimentos e a Súmula 358 STJ. Acesso em: 26 nov. 2009. 52 inequívoca, como termo final da referida obrigação a maioridade do alimentado, quer nos parecer que tal condição deve prevalecer, já que a coisa julgada, ainda que formal, só poderia ser alterada mediante nova provocação do Poder Judiciário. Outrossim, vale dizer que da mesma forma que a legislação relativa a alimentos no país dispõe que o alimentante não pode pura e simplesmente extinguir o pagamento dos alimentos, à revelia do Judiciário, onde é respeitado o contraditório, de igual forma, não pode o alimentado, sem o devido processo legal – ação de alimentos, requerer seja mantido o direito garantido por lei até a maioridade civil ou a nova fixação de patamar, sem movimentar a máquina do Judiciário112. O mesmo se pode dizer em relação à comprovação da necessidade de o alimentado continuar a receber o benefício e, noutro ponto, do alimentante comprovar as hipóteses competentes para se ver livre obrigatoriedade lhe imposta por lei, ou seja, deve o Poder Judiciário ser instado 113 da . 112 NAREZI. Paulo Roberto. Os alimentos e a Súmula 358 STJ. Acesso em: 26 nov. 2009. 113 NAREZI. Paulo Roberto. Os alimentos e a Súmula 358 STJ. Acesso em: 26 nov. 2009. CAPÍTULO 3 A OBRIGATORIEDADE DE SE PAGAR ALIMENTOS APÓS A MAIORIDADE Notadamente, das maiores problemáticas existentes nas sociedades modernas, é o fato dos pais separados entenderem que o valor pago a título de pensão alimentícia não se destina a custear “luxo” ou outras compras do excônjuge ou ex-companheiro, mas sim a adimplir com o sustento de seu dependente. Neste sentido escreve Oliveira114: De acordo com o princípio constitucional de igualdade de tratamento dos filhos nascidos dentro e fora do casamento (art.227, §6°, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988), o pai e a mãe devem prover, portanto, ao sustento e à educação da criança. Esta obrigação começa com o nascimento, mesmo que a filiação só se estabeleça mais tarde115, e dura até a maioridade do filho. Contudo, sopesando tal preceito com as condições econômicas que se tem no Brasil, onde a média salarial de um trabalhador orbita atualmente em torno de R$ 510,00 (quinhentos e dez reais) (um salário mínimo) e as uniões, mesmo que estáveis, são um costume, o pagamento de verbas alimentícias se torna uma espécie de “fardo”. Assim pode-se dizer que há uma certa “explicação” para algumas condutas equivocadas acerca da obrigatoriedade de se pagar alimentos. Porém, partindo dessa ótica, vale mencionar que, desde que foi instituída a obrigatoriedade legal de se pagar alimentos aos filhos “menores”, aquele genitor que fica com esta incumbência (isso quase na integralidade dos casos) acredita que aquela cessa quando o alimentando completa a maioridade civil; ou seja, 18 114 OLIVEIRA, José Lamartine Corrêa de. Curso de direito de família. 4 ed. 4ª tir. Curitiba: Juruá, 2004. p.75 115 Art. 229. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 54 (dezoito) anos de idade, pouco importando, se aquele detém ou não condições de se sustentar com suas economias, ou mesmo, se possui esta. É assim também que a doutrina salienta no entendimento de Cahali116: o dever do sustento se extingue com a maioridade, ou mesmo com a emancipação do filho: ao romper-se o vínculo do poder familiar, cessam os efeitos pessoais do mesmo, entre os quais o dever de sustento do filho, e surge como única e autônoma a prestação legal de alimentos, condicionada, agora, esta, ao estado de necessidade do filho e à possibilidade do genitor. Mas, considerando os dispositivos do Código Civil de 2002, facilmente verifica-se que o entendimento arraigado no costume do país não tem qualquer alicerce do ponto de vista legal. Cahali117 afirma: (...) a maioridade extingue o poder familiar, com ela desapareceria, de pleno direito, o dever de sustento; ou, como assinalava Pontes de Miranda, aquele dever, originado do Poder Familiar, “cessa quando cessa por inteiro o [então] pátrio poder”. (...) em realidade, nesta sede, algumas concessões podem ser feitas sem que se descaracterize a tese da cessação automática do dever de sustento pela cessação do poder familiar, afirmando-se que “somente em casos especialíssimos, entre eles o dos filhos maiores inválidos, persiste o dever alimentar dos pais (...) É que, tratando-se de filho acometido de grave enfermidade, não propicia a exoneração do encargo alimentar a extinção do poder familiar pela aquisição da maioridade, eis que a necessidade de recebimento dos alimentos não deriva mais da faixa etária e sim de seu precário estado de saúde tal entendimento tem sido geralmente adotado naqueles casos em que o filho encontra-se cursando escola superior. Isso porque, o art. 1.695 do Código Civil de 2002118, claramente regulamenta que os alimentos são devidos àqueles que não podem prover com seu trabalho a própria subsistência: Art. 1.695. São devidos os alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria 116 CAHALI, Yussef Saad, Dos Alimentos. 5 ed. 2007. p.352 117 CAHALI, Yussef Saad, Dos Alimentos. 5 ed. 2007. p.457-460. 118 BRASIL. Novo Código Civil. Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Aprova o novo código civil brasileiro. Brasília, DF, 2002. 55 mantença, e aquele, de quem se reclamam, pode fornecê-los, sem desfalque do necessário ao seu sustento. Em suma, o genitor (alimentante) que detém a obrigação de prestar alimentos ao filho (alimentado), não se desincumbe daquela pelo simples fato deste completar 18 (dezoito) anos, pois, mesmo que ao completar a maioridade, o direito se perpassa em alguns casos previstos no ordenamento jurídico pátrio, conforme se desdobrará a partir deste ponto do presente estudo. 3.1 DA OBRIGATORIEDADE DE SE PRESTAR ALIMENTOS APÓS A MAIORIDADE PARA FILHOS ESTUDANTES Com a entrada em vigor do Código Civil de 2002, um dos temas controversos que passaram a fazer parte do bojo legal deste e do cotidiano da sociedade brasileira como um todo, é a obrigatoriedade de se pagar alimentos aos filhos, pois, a controvérsia surge exatamente quanto ao tempo que tal verba é imperativa, isto é, o dever de sustento cessa aos 18 anos, aos 21 anos, aos 24 anos, ou quando efetivamente? Pois bem. O dever de sustento dos pais para com os filhos está previsto no ordenamento jurídico pátrio em inúmeros instrumentos normativos, a iniciar pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (art. 229, 1ª parte), passando pela Lei. 8.069/90 – Estatuto da Criança e do Adolescente (art. 22), e atingindo o disposto no Código Civil de 2002 (arts. 1566, IV e 1724). Neste liame entende Oliveira119: É pacifico, na maioria dos sistemas jurídicos, que a obrigação de sustento se prolongue além da maioridade sempre que o filho não tenha terminado seus estudos ou sua formação profissional. A duração dessa sobrevivência vem apreciada em cada caso concreto segundo as circunstâncias. A jurisprudência francesa exige a realização de quatro condições: ausência de recursos do filho e existência de recursos dos pais; que a instrução ou ensino seja útil ao filho e que ele esteja apto. a formação profissional ou o estudo 119 OLIVEIRA, José Lamartine Corrêa de. Curso de direito de família. p.75 56 deve estar de acordo com as aptidões físicas, psíquicas e intelectuais do filho. No entanto, nenhum dos mencionados dispositivos preconiza expressamente que a obrigatoriedade de se prestar alimentos descontinua a partir dos 18 (dezoito) anos. Em verdade, é possível constatar-se que, sopesando o disposto no art. 5º c/c art. 1.635, III, do Código Civil de 2002, que o primeiro mecanismo jurídico trouxe a redução da maioridade civil e, por conseqüência, o segundo a antecipação da extinção do poder familiar, de modo que o entendimento nos tribunais pátrios e da sociedade como um todo se deu no sentido de que, os alimentos deveriam ser pagos aos filhos tão apenas até os 18 (dezoito) anos de idade. Noutras palavras, o que houve foi uma imposição legal de forma tácita conforme se observa nos entendimentos dos tribunais e doutrinadores. Oliveira120 também estuda sobre a maioridade dos filhos que estudam e traz considerações no tocante ao tema: Assim, os pais estão obrigados a assumir as despesas de sustento e de educação, nos limites de seus reais recursos, sempre que o filho carecido não tenha recebido instrução necessária ao exercício profissional, ou não tenha adquirido instrução suficiente para exercer uma profissão capaz de permitir que se sustente com seu trabalho, ou, se com a aprovação dos pais, iniciou estudos universitários de longa duração, que ainda não terminou na altura em que atingiu a maioridade. No mesmo sentido entende Rizzardo121 que “(...) o atingir da maioridade não faz cessar, automaticamente, o encargo do sustento, máxime se os filhos se encontram estudando, mostrando disposição de alcançarem uma profissionalização universitária, o que é aceito de praxe pelos tribunais”. Por outro lado, contudo, necessário frisar que, muito embora o costume de exoneração por parte daquele genitor que detém a obrigatoriedade de prestar alimentos ao filho esteja arraigado na premissa que tal se dá com a maioridade, ou seja, aos 18 (dezoito) anos, há que se mencionar que o próprio Código Civil de 2002 traz em seu texto legal um dispositivo que fulmina por completo 120 OLIVEIRA, José Lamartine Corrêa de. Curso de direito de família. p.76 121 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: Lei n° 10.406, de 10.01.2002. p.755. 57 esta equivocada concepção cultural, a saber: o art. 1.694, que, por sua vez, prevê que os alimentos devem prover as necessidades relativas com a educação. Portanto, surge com isso, o ponto motriz do presente estudo monográfico, pois, se esta expresso no Código Civil de 2002 que os alimentos devem suster também as necessidades adstritas à educação, por certo que a obrigatoriedade de se pagar alimentos não se encerra aos 18 (dezoito) anos nos casos em que o alimentando não constitua renda suficiente para se sustentar, bem como prover sua educação e ingressar no mercado de trabalho que nos dias atuais é de extrema relevância e apresenta enorme dificuldade. O entendimento de Rizzardo122 esclarece: A matéria, presentemente, revela contornos diferentes de tempos pretéritos. É de todos conhecida a dificuldade em se conseguir uma colocação no mercado de trabalho. Pouco importa que o filho se encontre habilitado a exercer uma profissão, se não se lhe são abertas as portas para desempenhar a profissão. Quem ignora o número excedente de pessoas aptas para toda espécie de trabalhos, que exige alguma habilitação? Ademais, longos anos de tentativa e prática se exige antes de conseguir qualquer profissional liberal alguma solidez econômica na carreira escolhida. De sorte que, nos tempos que concorrem, persiste a obrigação enquanto não se concretizarem as perspectivas de segurança econômica. Assim, o alimentando comprovando eficazmente (documentalmente) que aos 18 (dezoito) anos é estudante e não dispõe de recursos financeiros suficientes para manter sua subsistência mais os estudos, ao passo que o alimentante possui condições econômicas de continuar a lhe prestar alimentos, é assente o entendimento nos tribunais pátrios de que a verba recebida por aquele e paga por este mensalmente deverá perdurar até a conclusão dos estudos e inserção no mercado de trabalho, que, em regra, se dá aos 24 (vinte e quatro) anos. A propósito, este colhe-se da jurisprudência do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo123: Ementa - Ação de Exoneração de Pensão – Credora que atingiu a maioridade - Fato que, por si só, não autoriza a exoneração — Inteligência da Súmula 358 do STJ - Demonstração de que a credora ingressou em curso universitário - Inexistência de razão 122 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: Lei n° 10.406, de 10.01.2002. p.761. 123 TJSP. BRASIL. Apelação Cível N. 990.10.043486-1 Relator: LUIZ ANTONIO COSTA. Data do Julgamento: 24/03/2010. Data do Registro: 05/04/2010. 58 para prefixação em data certa do término da obrigação – Não demonstração da redução da capacidade financeira do credor capaz de tornar insuportável o encargo — Sentença reformada — Pensão mantida tal como anteriormente fixada — Recurso Provido. O fundamento principal do pedido formulado na inicial vem na maioridade alcançada pela Apelante que, como cediço, não mais se admite como fundamento único à exoneração, sendo necessário dar-lhe oportunidade de comprovar que ainda necessita da verba para sua manutenção, aí incluída a necessidade de pagamento de seus estudos, conforme autoriza a Súmula 358, do E. STJ, verbis "O cancelamento de pensão alimentícia de filho que atingiu a maioridade está sujeito à decisão judicial, mediante contraditório, ainda que nos próprios autos. Também entendo que não se sustenta a fixação de data fixa para o término da obrigação que, in casu, não guarda qualquer relação com os fatos e os fundamentos discutidos nos autos, pois comprovado que a necessidade há de perdurar até que cesse a necessidade, como tem sido reiteradamente decidido nesta Corte e nos Tribunais Superiores. Assim, proponho a reforma da decisão para que a ação seja julgada improcedente, mantendo-se a verba alimentar tal como vigente até que cesse a necessidade demonstrada nos autos (conclusão do curso superior). Isto posto, dou provimento ao recurso. Em igual sentido é o entendimento da corte gaúcha124 que negou provimento a apelação de pai com condições de colaborar a título de pensão alimentícia com seus filhos que ao atingirem a maioridade estão ingressando em escola de nível superior e com seu trabalho não se subsistem por si só: APELAÇÃO CÍVEL. FAMÍLIA. EXONERAÇÃO DE PENSÃO ALIMENTÍCIA. FILHOS MAIORES. CABIMENTO DA VERBA ALIMENTAR NO CASO CONCRETO. POSSIBILIDADE E NECESSIDADE. Não há falar em exoneração da obrigação alimentar do alimentante em relação aos alimentados tão só pelo fato de que estes são maiores de idade e trabalham, porquanto freqüentam curso técnico e curso superior, não podendo prescindir do auxílio paterno. À desobrigação do alimentante deve concorrer prova da desnecessidade dos alimentados. Recurso Desprovido. Apelação Cível – Oitava Câmara Cível. N° 70011639895 Comarca de Passo Fundo – Apelante : JCSS Apelados: D.R.S.E.R.S Conheço do recurso, porque adequado e tempestivo. 124 TJRS – N. 70011639895/2005. Relator. Dês. JOSÉ S. TRINDADE. Data de Julgamento: 09/06/2005. Data da publicação: 01/07/2005. 59 No mérito, sopesando os elementos constantes dos autos, não merece provimento o apelo do autor Inicialmente, cumpre lembrar que é entendimento pacífico deste Tribunal que a maioridade do filho, por si só, não é causa automática extintiva da obrigação alimentar dos pais, sobretudo considerando-se que o Novo Código Civil, ao disciplinar a matéria, estabeleceu que os parentes podem pedir alimentos uns aos outros, inclusive para atender às necessidades de educação, sem limitação à maioridade civil (art. 1.694). Ensina Regina Beatriz Tavares da Silva que “O instituto dos alimentos entre parentes compreende a prestação do que é necessário à educação independentemente da condição de menoridade, como princípio de solidariedade familiar. Pacificou-se na jurisprudência o princípio de que a cessação da menoridade não é causa excludente do dever alimentar. Com a maioridade, embora cesse o dever de sustento dos pais para com os filhos, pela extinção do poder familiar (art. 1.635, III), persiste a obrigação alimentar se comprovado que os filhos não têm meios próprios de subsistência e necessitam de recursos para a educação”125 Neste contexto a Jurisprudência que esta sendo analisada, apresenta entendimento que se os filhos, mesmo que atingidos a maioridade pelo vigente Código Civil de 2002, que estiverem trabalhando, mas mesmo assim não terem condições de arcar com seu próprio sustento e continuar os estudos e tendo os pais condições de pagar alimentos é o entendimento, que seja mantido a prestação a título de colaboração até que estes possam ter condições. No tocante a todo o exposto decidiu o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, sobre o caso em tese126: (...) Portanto, o dever dos pais de sustentar o filho menor é decorrente do poder familiar, presumindo-se a necessidade em face da incapacidade. A maioridade civil, por sua vez, extingue o dever de sustento dos pais, mas não a obrigação alimentar, que poderá subsistir se, presentes as necessidades, o interessado não puder prover, pelo seu trabalho, a própria mantença (art. 1.695 do CC). (...) Quanto ao apelante, tem-se que não demonstrou sua impossibilidade de arcar com a verba alimentar. Em síntese, do compulsar do processo o que salta aos olhos é a total carência de elementos sinalizadores da desnecessidade alimentar dos recorridos ou da falta de condições do alimentante (já que este se limitou a respaldar seu pleito na maioridade dos filhos com condições de desempenhar atividades profissionais). Ante o exposto, o voto é pelo desprovimento da apelação. 125 126 in “Novo Código Civil Comentado”/coordenador Ricardo Fiuza, São Paulo, Saraiva, 2002, p. 1503. TJRS – N. 70011639895/2005. Relator. Dês. JOSÉ S. TRINDADE. Data de Julgamento: 09/06/2005. Data da publicação: 01/07/2005. 60 Colaciona-se da jurisprudência do tribunal mineiro127 que entende no mesmo sentido: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE ALIMENTOS - PRELIMINAR REJEIÇÃO - FILHO MAIOR - FIXAÇÃO - OBSERVÂNCIA DO BINÔMIO. NECESSIDADE/POSSIBILIDADE - SENTENÇA MANTIDA. - Com a maioridade extingue-se o poder familiar, cessando o dever dos genitores de prover o sustento do filho. Entretanto, a obrigação de prestar alimentos poderá ter continuidade com fundamento no dever de parentesco, desde que comprovada a necessidade do alimentando e a possibilidade do alimentante. - Ao filho que, embora tenha atingido a maioridade, não tenha completado sua formação universitária, mormente porque os genitores devem apoiar os filhos na busca de sua profissionalização, para que posteriormente possam se manter dignamente, é devida a verba alimentar. - Os alimentos devem ser fixados com base no binômio necessidade/possibilidade, na medida em que, no mesmo instante em que se procura atender às necessidades daquele que os reclama, há que se levar em conta o limite da possibilidade do responsável por sua prestação. Em arremate, colhe-se da jurisprudência catarinense128 que, comprovada pela filha a necessidade de pensão alimentícia devido aos estudos vota pelo desprovimento do recurso do alimentante, e confere efeito retroativo a decisão que revogou o pagamento na qual segue: Ementa: ALIMENTOS. EXONERAÇÃO. ATINGIMENTO, PELA ALIMENTANDA, DA MAIORIDADE CIVIL. IRRELEVÂNCIA, NO CASO, POSTULAÇÃO REJEITADA. REQUERIDA QUE AINDA ESTUDA. GANHOS MENSAIS PARCOS. RECONHECIMENTO PELO AUTOR, NA AUDIÊNCIA CONCILIATÓRIA, DA NECESSIDADE DA ALIMENTÁRIA. SENTENÇA CONFIRMADA. APELO DESATENDIDO. Comprovado nos autos que a alimentanda, embora tenha atingido a maioridade civil, ainda se dedica aos estudos, freqüentando cursos preparatórios para concursos vestibulares, bem como que, conquanto exerça ela atividade laborativa, seus ganhos mensais são insuficientes, tendo o alimentante, ademais, reconhecido expressamente na audiência conciliatória necessitar sua filha Dos alimentos que recebe, insubsistente juridicamente é a pretensão do pai de alcançar a exoneração da verba. Noutro prisma, todavia o genitor que possui o encargo de prover alimentos ao filho menor, e este ao completar a maioridade civil alega necessitar continuar recebendo a verba alimentar em razão da educação, para que aquele se desobrigue de 127 TJMG – N. 1.0105.07.242249-3/001 (1). Relator: ELIAS CAMILO. Data do julgamento: 03/12/2009. Data da publicação: 16/12/2009. 128 TJSC – N. 2008.037090-1. Relator: TRINDADE DOS SANTOS. Data do Julgamento: 21/10/2008. Data da Publicação: 25/11/2008. 61 tal incumbência, deverá argüir e comprovar cabalmente que sua situação financeira foi modificada e não detém condições de arcar com o custo de um eventual curso universitário, circunstância esta que justifica sim o redimensionamento do valor arbitrado a título de alimentos, ou, até mesmo a sua exoneração completa. Necessário registrar, ainda, neste ponto do presente estudo monográfico que, não há o que confundir entre os institutos do dever de sustento, que está vinculado ao poder familiar, e a obrigação de se prestar alimentos, pois este tem seu fundamento na necessidade de quem os pleiteia e na possibilidade de quem irá prestar os alimentos, não ficando a verba adstrita a preceitos legais taxativos ou mesmo idade limite, como visto. A esse respeito, extrai-se da jurisprudência do tribunal paulista129: Ação de exoneração de alimentos pai em relação ao filho que atingiu a maioridade sentença que deu pela procedência parcial, com a redução do encargo, que se afigura correta alimentando que cursa faculdade, mas já trabalha e pode arcar com algumas despesas inerentes ao próprio sustento alimentante que constituiu nova família, e tem dois outros filhos menores para sustentar inegável aumento de despesas, com a conseqüente redução da possibilidade viabilidade da diminuição. Sentença mantida. Apelo improvido. (...) De fato, conquanto rebele-se o alimentando atualmente com 21 anos de idade, alegando que é universitário e, por isso, necessita continuar recebendo a verba alimentar tal como anteriormente estipulada, é certo que restou demonstrado que ele já trabalha e recebia mensalmente, no ano de 2.007, cerca de R$ 400,00 mensais, podendo arcar com algumas despesas inerentes ao próprio sustento. O alimentante, sargento da Polícia Militar, por seu turno, constituiu nova família, tendo dois outros filhos menores para sustentar, estes com 10 e 5 anos de idade, além de pagar aluguel no imóvel em que reside, arcando com todas as despesas inerentes ao novo lar. Assim, o que se tem é que, ainda que o requerido, a despeito de sua maioridade civil, necessite do socorro financeiro do autor para continuar cursando a universidade, é certo que denota-se que o genitor teve sua situação financeira modificada, para pior, após a fixação da verba alimentícia, circunstância que justifica o seu redimensionamento. Destarte, conquanto se cuide de ação exoneratória a solução que, de fato, melhor se amolda à espécie é a redução dos alimentos, na forma preconizada na r. sentença 129 TJSP – Apelação 994080271780 (577344800). Relatora: TESTA MARCHI. Comarca: Santos. Órgão julgador: 10ª Câmara de Direito Privado. Data do julgamento: 23/03/2010. Data de registro: 15/04/2010. 62 apelada, de modo a readequar-se a verba, ante os novos encargos assumidos pelo genitor com a constituição de nova família e o aumento da prole, estando demonstrado que este não tem meios de continuar a fornecê-la na forma anteriormente estipulada, a qual se mostrou incompatível com a sua atual possibilidade financeira, observando-se, ainda, que o alimentando trabalha e tem condições de arcar com parte de suas despesas. Ante o exposto, nega-se provimento ao apelo. Com efeito, em relação a isso, frise-se que, comprovada a necessidade do alimentado, bem como as condições econômicas do alimentante, não há interferência legal que obste o pagamento da verba alimentar, passando a ser esta a partir de então uma exceção130. A esse respeito, merecem destaque os apontamentos de Reis131: (...) A doutrina majoritária e a jurisprudência dos tribunais nacionais vêm entendendo que devem ser concedidos alimentos aos filhos que atingiram a maioridade, enquanto estudantes, mormente em curso superior regular. Francisco José Cahali, observa que o primeiro aspecto a ser examinado, especialmente na obrigação alimentar dos pais em relação aos filhos menores, não está no capítulo dos alimentos, mas decorre da redução da capacidade civil para 18 (dezoito anos). Entende o culto jurista, que a prestação de alimentos, enquanto decorrência do dever de sustento inerente ao poder familiar não mais subsiste até 21 (vinte e um) anos. Mas, assim como já fazia a melhor orientação, deve-se em princípio prolongar a obrigação até os 24(vinte e quatro) anos do "maior" estudante.7 No entanto, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, negou provimento ao recurso de filha maior que pleiteava alimentos não para satisfazer a continuidade dos estudos, mas para mantença de padrão de vida. Levando em consideração tantas decisões a respeito do pagamento de pensão após a maioridade é necessário frisar-se que este entendimento é unânime desde que comprovada a continuação dos estudos em Graduação e que esta não fique caracterizada apenas para mantença do padrão de vida. 130 REIS, Roberto Henrique dos. Exoneração de alimentos e o novo Código Civil.Jus Navigandi, Teresina, a 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3536 . Acesso em: 01 maio 2010. 131 REIS, Roberto Henrique dos. Exoneração de alimentos e o novo Código Civil.Jus Navigandi, Acesso em: 01 maio 2010. 63 Assim continua descrevendo Reis132 sobre o assunto relatando diversos tribunais em sua pesquisa que conferem tal entendimento: (...) TJRJ – AC 99.001.06389 – 1ª C.Cív. – Relª Desª Maria Augusta Vaz – J. Existe, por certo, corrente doutrinária que autoriza a exoneração automática do vínculo alimentar, com o advento da maioridade civil, a ser requerida em simples petitório entranhado no próprio processo onde os alimentos foram fixados. Do lado oposto, há aqueles que vêem a obrigatoriedade do aforamento de uma ação específica de exoneração dos alimentos, como acima comentado, sob o argumento do advento da capacidade civil como causa extintiva do poder familiar e, por conseguinte, do liame alimentar. O Tribunal de Justiça da Bahia, decidiu que comprovada nos autos a maioridade civil, desnecessária a produção de provas, cabendo o julgamento antecipado da lide. Desnecessária a comprovação de que os filhos maiores já se mantêm. Com a maioridade civil cessa o pátrio poder e conseqüentemente o dever de sustento. Decidiu também sobre a matéria, o Tribunal de Justiça da Bahia na pesquisa de Reis133: TJBA – AC 47.073-3 – 1ª C.Cív. – Rel. Des. Carlos Alberto Dultra Cintra – J. 24.03.199903.24.1999). É na contestação de uma ação de exoneração que o credor de alimentos já civilmente emancipado precisará justificar e comprovar a impossibilidade de prover o seu sustento, seja pela necessidade de dar prosseguimento em seus estudos em nível superior, quer porque seja portador de alguma doença que o inabilite ao trabalho. A exigência de nova ação, defendida por uma das correntes doutrinárias traz o temor da injustiça, motivado pela circunstância de onerar um dos pólos da relação jurídica, com o prosseguimento de uma obrigação que não mais lhe comete, pois a ser compelido a prosseguir pagando alimentos talvez indevidos, enquanto ainda é sobrecarregado pela obrigatoriedade de promover uma ação exoneratória, da qual deverá aguardar toda a tramitação pelo rito comum ordinário, para somente ao final e se procedente o pedido, com seu trânsito em julgado, ver cessada a sua obrigação alimentar.O fato de o descendente ter conseguido um emprego, no qual percebe um salário mensal, não é suficiente para caracterizar a desnecessidade ao percebimento dos alimentos, pois pode estar pretendendo complementar o quantum recebido a título de verba alimentar, objetivando melhorar sua situação financeira, senão vejamos: "Não se considera modificação das condições estabelecidas em separação judicial, para efeitos de 132 REIS, Roberto Henrique dos. Exoneração de alimentos e o novo Código Civil.Jus Navigandi, Acesso em: 01 maio 2010. 133 REIS, Roberto Henrique dos. Exoneração de alimentos e o novo Código Civil.Jus Navigandi, Acesso em: 01 maio 2010. 64 exoneração da obrigação de alimentar, o fato de o alimentando passar a exercer alguma profissão, de acordo com sua formação e condições intelectuais, fato já previsível quando da fixação dos alimentos, não se verificando, pois, qualquer ocorrência de acontecimento extraordinário de modo a justificar a alteração" (TJSP - RT - 610/73). Enfim, é possível extrair do majoritário entendimento doutrinário e jurisprudência vigente no país que, em regra, a obrigatoriedade de se pagar alimentos cessa com a maioridade civil, ou seja, aos 18 (dezoito) anos. Contudo, como se vê, há casos em que mesmo o alimentando não sendo incapaz (exceção prevista no Código Civil de 2002) é possível que o alimentante continue a pagar a verba alimentar, desde que tal se ocorra fundado na necessidade daquele em receber alimentos para prover sua educação134. Noutras palavras, significa dizer que o filho poderá sim continuar a receber a pensão alimentícia paga por seu genitor (a) após completar 18 (dezoito) anos, desde que regularmente matriculado em curso superior ou outro destinado à formação de sua educação e que não disponha de meios financeiros próprios capazes de manter seu sustento e custear seus estudos. Porém, essa nova obrigatoriedade agora não mais decorre de um dever legal, mas sim moral e depende também das condições econômicas do alimentante. Visto isso, necessário mencionar que com a cessação da menoridade não prescinde o alimentante ingressar em juízo para requerer a exoneração, para só com a declaração desta, estar dispensando de prover alimentos ao filho que atingiu a maioridade, mas sim incumbe a este requerer que a obrigatoriedade antes advinda do pátrio poder seja procrastinada em razão de sua necessidade educacional e nos moldes da obrigação alimentar135. Também válido, é contar com o entendimento de Rizzardo136 no seguinte sentido: No pertinente aos filhos maiores, não é o Poder Familiar que determina a obrigação, mas sim a relação de parentesco. Quanto aos pais, de idêntica forma, se sobressai tal liame, ordenado pelo 134 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: Lei n° 10.406, de 10.01.2002. p.76. 135 CAHALI, Yussef Said. Dos alimentos. 3ed 1998. p. 689. 136 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: Lei n° 10.406, de 10.01.2002. p.761. 65 sentimento de solidariedade que deve imperar no meio de certas pessoas ligadas pelo jus sanguinis. Nessa Ordem de recíproca assistência, tão simplesmente os requisitos da necessidade do alimentando e da possibilidade do alimentante é que hão de se fazer presentes, a fim de firmar o comando sentencial. De outra banda, contudo, registre-se que a exoneração do dever de prestar alimentos não é automática, uma vez que esta pode ser mantida por meio da existente relação de parentesco entre alimentante e alimentando, alicerçada ainda na necessidade deste. Nesse perfilhar é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ)137: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. REEXAME DE PROVA. SÚMULA N. 7/STJ. ALIMENTOS. EXONERAÇÃO AUTOMÁTICA COM A MAIORIDADE DO ALIMENTANDO. IMPOSSIBILIDADE. 1. Aplica-se a Súmula n. 7 do STJ na hipótese em que a tese versada no recurso especial reclama a análise dos elementos probatórios produzidos ao longo da demanda. 2. Com a maioridade cessa o poder familiar, mas não se extingue o dever de prestar alimentos, que passam a ser devidos por força da relação de parentesco. 3. Agravo regimental desprovido. (...) O entendimento adotado pela Corte estadual está em consonância com a jurisprudência do STJ perfilhada no sentido de que a exoneração do dever de prestar alimentos não é automática, podendo a obrigação ser mantida por força da relação de parentesco, uma vez demonstrada a necessidade do alimentando, segundo demonstram os precedentes abaixo: 'Direito civil. Família. Recurso especial. Execução de alimentos. Maioridade das filhas. Exoneração automática. Impossibilidade. Prescrição da pretensão ao pagamento das parcelas vencidas há mais de cinco anos. - Não tem lugar a exoneração automática do dever de prestar alimentos em decorrência do advento da maioridade do alimentando, devendo-se propiciar a este a oportunidade de se manifestar e comprovar, se for o caso, a impossibilidade de prover a própria subsistência. Isto porque, a despeito de extinguir-se o pode familiar com a maioridade, não cessa o dever de prestar alimentos fundados no parentesco. Precedentes. - A prescrição qüinqüenal prevista no art. 178, § 10, inc. I, do CC/16, aplicável à espécie, opera-se com relação a cada prestação alimentícia atrasada que se for tornando inadimplida e não reclamada. Recurso especial conhecido e provido. 137 AgRg no Ag 1101390 / SP. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. 2008/0217619-6. Relator. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA. Órgão julgador: T4 – QUARTA TURMA. Data do julgamento: 04/06/2009. Data da Publicação: Dje 15/06/2009. 66 No sentido continua relatando o Superior Tribunal de Justiça138 condizente com os outros entendimentos que a maioridade cessa o poder familiar, mas no tocante a todos os assuntos pertinentes e já discutidos continuam a ser devidos pela força da relação de parentesco. Neste Liame continua-se descrevendo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça139: (REsp n. 896.739-RJ, Terceira Turma, relatora Min. Nancy Andrighi, DJ de 29.6.2007.) 'DIREITO CIVIL. FAMÍLIA. ALIMENTOS. EXONERAÇÃO AUTOMÁTICA COM A MAIORIDADE DO ALIMENTANDO. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. 1. Com a maioridade cessa o poder familiar, mas não se extingue, ipsofacto, o dever de prestar alimentos, que passam a ser devidos por força da relação de parentesco. Precedentes. 2. Antes da extinção do encargo, mister se faz propiciar ao alimentando oportunidade para comprovar se continua necessitando dos alimentos. 3. Recurso especial não conhecido."(REsp n. 688.902-DF, Quanta Turma, relator Min. Fernando Gonçalves, DJ de 3.9.2007.) Incide na espécie o enunciado da Súmula n. 83 deste Sodalício. III – Conclusão. Ante o exposto, nego provimento ao agravo. Publique-se" (fls. 124/125). Afigura-se inequívoca a aplicação do enunciado da Súmula n. 7/STJ, pois não há como chegar a outra conclusão sem reexaminar os elementos fáticos considerados pela Corte. O entendimento adotado pela Corte estadual está em consonância com a jurisprudência do STJ perfilhada no sentido de que a exoneração do dever de prestar alimentos não é automática, podendo a obrigação ser mantida por força da relação de parentesco, uma vez demonstrada a necessidade do alimentando. E, antes da extinção do encargo, mister se faz propiciar ao alimentando oportunidade para comprovar se continua necessitando dos alimentos. Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental. Ainda, denota-se que a exoneração automática da obrigatoriedade de se prestar alimentos foi extirpada por completo com a edição da Súmula 358 do STJ140, pois, com esta, de forma expressa delimitou-se por assim dizer a questão. 138 STJ. BRASIL. www.stj.jus.br. Acesso em 01 de maio de 2010. 139 STJ – BRASIL. Recurso Especial n.896.739 Relatora: Min. NANCY ANDRIGHI. Data do Julgamento: 14/06/2007. Data da publicação: 29/06/2007 140 Súmula 358 – STJ o cancelamento de pensão alimentícia de filho que atingiu a maioridade está sujeito à decisão judicial, mediante contraditório, ainda que nos próprios autos. www.stj.jus.br. Data do julgamento 13/08/2008. Data da Publicação 08/09/2008. 67 Além disso, observa-se que com a Súmula 358 do STJ, concede ao alimentando o direito ao contraditório com o término da menoridade, para que este comprove sua impossibilidade de prover seu próprio sustento141. Recorde-se, todavia, que a pensão alimentícia segue na esteira do binômio necessidade e possibilidade, de modo que evidentemente deverá ser o alimentante instado a se manifestar acerca da alegada necessidade do alimentando, efetivando, assim, o contraditório realizado entre as partes, fator essencial à justiça da decisão142. Vale mencionar acerca do contraditório, inerente ao postulado da ampla defesa, o ensinamento de Alexandre Moraes143: Por ampla defesa, entende-se o asseguramento que é dado ao réu de condições que lhe permitam trazer para o processo todos os elementos que tendentes a esclarecer a verdade ou mesmo de omitir-se ou calar-se, se entender necessário, enquanto o contraditório é a própria exteriorização da ampla defesa, impondo a condução dialética do processo (par conditio), pois a todo ato produzido pela acusação, caberá igual direito da defesa de opor-selhe ou de dar-lhe a versão que melhor se apresente, ou, ainda, de fornecer uma interpretação jurídica diversa da que foi dada pelo autor. Levando em consideração todos os aspectos demonstrados através do estudo das jurisprudências apresentadas no decorrer do assunto, no sentido da obrigatoriedade de se prestar alimentos após a maioridade, é importante ressaltar que é pacífico o entendimento que a maioridade extingue o Poder Familiar, mas o dever de pagar alimentos não cessa se comprovado a necessidade da prole de não se manter perante estudo universitário, mesmo que trabalhe e com este não possa se prover. Entretanto trata-se-a no seguinte tópico do estudo monográfico, da obrigação de se prestar alimentos após a maioridade em relação aos filhos 141 FERREIRA, Gabriela Gomes Coelho. Superior Tribunal de Justiça edita Súmula nº 358: pensão alimentícia de filhos não cessa automaticamente com a maioridade. Publicado em 18/08/2008. Disponível em: http://www.lfg.com.br/public_html/article.php?story=20080818114157913. Acesso em 01 mai. 2010. 142 FERREIRA, Gabriela Gomes Coelho. Superior Tribunal de Justiça edita Súmula nº 358: Acesso em 01 mai. 2010. 143 MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 117 68 incapazes, no qual a pesquisa se delineará no sentido de trazer o entendimento dos Tribunais de Justiça e também dos doutrinadores. 3.2 DA OBRIGATORIEDADE DE SE PRESTAR ALIMENTOS APÓS A MAIORIDADE PARA FILHOS INCAPAZES Como já visto, o dever de sustento encerra-se com a maioridade, ou seja, aos 18 (dezoito) anos. No entanto, comprovada a hipossuficiência financeira, pode o alimentado requer alimentos para as necessidades educacionais até completar 24 (Vinte e quatro) anos, todavia, esse instituto não mais é o de dever de se prestar alimentos vinculados ao Poder Familiar, mas sim interligada à relação de parentesco. Considerando então que a obrigação alimentar é algo mais abrangente e nasce exatamente quando cessada a menoridade, bem como não encontra limitação temporal, impõe-se afirmar que esta espécie de obrigação de dar é aquela apta a embasar o pedido de continuidade de pagamento da verba alimentar do filho maior e incapaz. Nesse sentido, colhe-se do ensinamento de Rizzardo144: Especialmente aos filhos menores, ou incapazes, a obrigação de prestar alimentos é um dos deveres inerentes ao poder marital – mais apropriadamente, pode-se dizer, do Poder Familiar, e que decorre do próprio direito natural, porquanto é inerente ao instinto humano a tendência de criar, amparar e preparar para o futuro a prole – fenômeno este que é comum nos seres animais em geral. Eis a justificação de Yusser Said Cahali: “ todos os esforços dos pais devem ser orientados no sentido de fazer do filho por ele gerado um ser em condições de viver por si mesmo, de desenvolver-se e sobreviver sem o auxílio de terceiros, tornando à sua vez capaz de ter filhos, em condições de criá-los”. Assim, o dever de sustento cessa com a maioridade, em regra, porém, em relação aos filhos incapazes surge a obrigação recíproca dos pais de prestar alimentos de natureza diversa, conforme leciona Cahali145: 144 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: Lei n° 10.406, de 10.01.2002. p. 752. 145 CAHALI, Yussef Said. Dos alimentos. 3ed 1998. p. 351. 69 Efetivamente, com a maioridade, pode surgir obrigação alimentar dos pais em relação aos filhos adultos, porém de natureza diversa, fundada no art. 1.694 do Código Civil; essa obrigação diz respeito aos filhos maiores que, por incapacidade ou enfermidade, não estão em condições de prover à sua própria subsistência. Essa estrita obrigação alimentar entre pais e filhos, resultante da relação de parentesco em linha reta, terá como pressuposto o estado de necessidade do alimentário e a correlata possibilidade do alimentante de ministrá-la, sem com isso desatender às suas próprias necessidades e de sua família. Assim a obrigação alimentar do art. 1.696 do Código é proporcional, segundo o art. 1.694, § 1°, à capacidade econômica de quem os deve e às necessidades de quem os reclama; trata-se, pois, de uma obrigação de conteúdo variável e contingente, enquanto o dever de sustento dos filhos menores, imposto aos genitores, caracteriza-se como sendo absoluto, sem qualquer consideração às respectivas fortunas. Isso porque, efetivamente, provada a necessidade de continuar a pagar a verba alimentar em razão de doença que torna o alimentando incapaz, a maioridade, por si só, não exonera o encargo daquele em conjugação ao disposto nos artigos 1.694 c/c 1.695 e 1.696 do Código Civil de 2002, bem como por existir a relação de parentesco entre o alimentante e o alimentando: Art. 1694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação. § 1.° Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada. § 2.° Os alimentos serão apenas os indispensáveis à subsistência, quando a situação de necessidade resultar de culpa de quem os pleiteia. Art. 1.695. São devidos os alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria mantença, e aquele, de quem se reclamam, pode fornecê-los, sem desfalque do necessário ao seu sustento. Art. 1.696. O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta dos outros. Nesse sentido colhe-se do entendimento jurisprudencial do Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul146: 146 TJRS - Apelação Cível Nº 70023793953, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Ataídes Siqueira Trindade, Julgado em 05/06/2008)" (fls. 178/179). 70 APELAÇÃO CÍVEL. EXONERAÇÃO DE ALIMENTOS. FILHA MAIOR DE IDADE. PORTADORA DE HIV. Não há falar em exoneração de alimentos devidos à recorrente que, apesar de ter atingido a maioridade, ostenta problemas psicológicos e é portadora do vírus HIV. Tais peculiaridades, por si sós, evidenciam a ausência de condições da apelante de prover o seu próprio sustento. Precedentes. Conforme pacífico entendimento das Câmaras Especializadas em Direito de Família deste Tribunal, a maioridade do filho, por si só, não é causa automática para a exoneração dos alimentos, e o novo regramento sobre a matéria no Código Civil em vigor não dispõe nesse sentido. O filho maior, por exemplo, pode continuar recebendo pensão alimentícia inclusive para atender as necessidades de sua educação (art. 1.694, Código Civil), ou quando não tem condições de prover a sua própria mantença pelo seu trabalho (art. 1.695, CC). Demais disso, essa nova obrigação de alimentar surgida diante da incapacidade do filho poderá perdurar eternamente conforme a incapacidade do filho (a). É neste sentido que continua-se analisando o entendimento do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul: Na espécie, a situação retratada ostenta peculiaridades. Embora a alimentanda não estude e já tenha atingido a maioridade, contando atualmente 21 anos de idade (certidão de nascimento – fl. 09), a quantia que percebe a título de pensionamento do apelado, no valor de 1,5 salários mínimos, ainda é necessária para a sua sobrevivência, porque não apresenta condições de prover o seu sustento. O alimentante, ao ajuizar a demanda exoneratória, sem trazer nenhum dado a respeito de eventual inviabilidade fazendária, respaldou sua pretensão no fato de que “... a filha Taís não estuda, é dependente química e vem provocando diversas fugas de casa, demonstrando não ter nenhum interesse em crescer como pessoa”.(fl. 03). Outrossim, durante a instrução probatória aportaram aos autos subsídios por demais elucidativos que esclarecem o tópico relativo às necessidades da apelante. Na contestação de fls. 34/35, a insurgente divulga que “... está com sua saúde comprometida pois está com HIV positiva e está com graves problemas pois não tem condições de pagar um tratamento de saúde, sendo este o principal motivo para não estudar (...)”147. Continua-se analisar a jurisprudência em questão porque realmente esta abrilhanta o escopo deste trabalho, visto que, a maioridade se 147 TJRS - Apelação Cível Nº 70023793953, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Ataídes Siqueira Trindade, Julgado em 05/06/2008)" (fls. 178/179). 71 extingue pelo Pode Familiar, mas se provado a dependência à pensão alimentícia é mantida. A leitura dos depoimentos das testemunhas ouvidas na audiência de 14/11/2006 (fls. 65/66) ratificam a linha argumentativa supra. ÂNGELA, compromissada, à fl. 67, confirmou que TAÍS “...é doente, já esteve internada no hospital com problemas depressivos e tem o vírus HIV.” Aduziu que a apelante tem um filho de um ano, que é doentinho e que ela não consegue arranjar emprego. A mãe da alimentanda, JUSSARA, ouvida à fl. 68, disse que TAÍS ficou internada no hospital São Pedro, em 2004, “(...) em função de problemas mentais. Taís toma Gardenal, carbazepina e é muito agressiva, sem o uso da medicação. Sua filha tem o vírus do HIV e o seu neto tem problemas de estômago não se desenvolveu. (...) Taís estudou até a quinta série, tentou procurar emprego, mas não conseguiu. Taís tem medo de sair para a rua, não quer ter contato com os outros. (...) Taís toma às vezes o coquetel para o tratamento da AIDS, mas a depoente tem que insistir. Taís prende-se no quarto e chora muito. Taís tentou voltar aos estudos em 2004, no Colégio Salgado Filho, mas era a noite e no meio da aula pedia para sair da sala, soube que inclusive não comparecia às aulas. Taís é depressiva e tem dificuldade de falar as coisas. (...)”. Extraí-se do que está exposto acima que a realidade vivenciada pela recorrente é por demais triste e difícil. Afinal, acometida de doença incurável, padece também de problemas psicológicos e, ainda, possui um filho em tenra idade. Em que pese o dever de sustento para com o filho da ré seja primeiramente do respectivo genitor, o menino precisa de cuidados especiais, pois, conforme constou do depoimento de sua avó, sua saúde é frágil, tem problemas de estômago e seu desenvolvimento está atrasado. Ora, inquestionável que todos esses dados, por si sós, obstaculizam que a alimentanda exerça atividade laboral. A verdade é que pelo simples fato de ser portadora do vírus HIV já traz consigo a necessidade de tomar medicamentos – mesmo que fornecidos pelo Estado – para conter o vírus, e tal fato não pode ser ignorado, como é de conhecimento público relativamente a qualquer portador da doença. Não se pode subestimar, por importante, que sendo a apelante portadora do vírus em referência, tal situação, por si só, lhe traz sérias limitações de vida. Afinal, em regra, para pessoas que enfrentam tal tipo de enfermidade, as oportunidades profissionais, educacionais e o convívio social em geral simplesmente não acontecem148. Cabe destacar aqui que evidente a incapacidade da alimentada em receber pensão, face que esta, não demonstra nenhuma capacidade de manter-se sozinha. Conforme conclui o Egrégio Tribunal analisado segue: 148 TJRS - Apelação Cível Nº 70023793953, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Ataídes Siqueira Trindade, Julgado em 05/06/2008)" (fls. 178/179). 72 Os indivíduos em questão sofrem o estigma decorrentes do preconceito e falta de informação sobre a doença. Ou seja, ignorar que a situação peculiar da apelante lhe fecha as portas é desconhecer a realidade da vida. Portanto, encontrando-se a alimentanda doente e sem condições de exercer atividade laboral, não há falar em privá-la dos alimentos devidos pelo genitor. Assim, inexistindo qualquer prova no sentido de que a recorrente tem condições de prover seu próprio sustento, descabida a pretendida exoneração. Em situações semelhantes outra não tem sido a orientação jurisprudencial: “APELAÇÃO CÍVEL. EXONERAÇÃO DE ALIMENTOS. FILHA MAIOR PORTADORA DO VÍRUS HIV. A maioridade, por si só, não tem o condão de afastar a obrigação alimentar por parte do genitor. O notório preconceito acerca do vírus HIV, limitando o universo de atuação da demandada, é elemento suficiente para a manutenção da verba alimentar, ainda que com a redução operada pela sentença. RECURSO DESPROVIDO.” (Apelação Cível Nº 70022372247, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ricardo Raupp Ruschel, Julgado em 23/04/2008). “ALIMENTOS EM FAVOR DE FILHOS. EXONERAÇÃO. Descabe a exoneração alimentar em relação à filha que, embora tenha atingido a maioridade civil, é surda-muda e portadora do vírus HIV, enfrentando evidentes dificuldades para inserir-se no disputado mercado de trabalho. O alimentante, por sua vez, não comprova a impossibilidade financeira para continuar a arcar com alimentos no patamar de 60% do salário mínimo, em favor de dois filhos. Apelo provido em parte.” (Apelação Cível Nº 70011031580, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Maria Berenice Dias, Julgado em 01/06/2005). Diante do exposto, o voto é pelo provimento da apelação, para JULGAR IMPROCEDENTE a ação de exoneração de alimentos, revigorandose o pagamento da pensão nos termos originalmente acordados149. Observa-se, portanto, que ao filho maior incapaz é devida à verba alimentar enquanto perdurar a necessidade de provisão desta, pois, seria surreal exonerar os pais, reciprocamente, da obrigatoriedade de proverem o sustento de filho acometido de alguma doença que os impossibilita de produzir seu próprio sustento. Em igual sentido é o entendimento do Egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais150: FAMÍLIA. ALIMENTOS. PATERNIDADE. MAIORIDADE. TRABALHO. INCAPACIDADE. OBRIGAÇÃO DEVIDA. 149 TJRS - Apelação Cível Nº 70023793953, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Ataídes Siqueira Trindade, Julgado em 05/06/2008)" (fls. 178/179). 150 TJMG - N.1.0702.06.267483-4/001. Relator: ANTÔNIO SÉRVULO. Data do Julgamento: 02/12/2008. Data da Publicação: 09/01/2009. 73 VALORAÇÃO. BINÔMIO. OBSERVÂNCIA. Malgrado o postulante dos alimentos tenha atingido a maioridade civil, restando comprovada sua incapacidade para o trabalho, faz ele jus ao pensionamento pretendido, fundamentado no 'ius sanguinis'. A delimitação da pensão alimentícia está adstrita à observância do binômio possibilidade do alimentante/necessidade do alimentado, cujos termos foram acatados na espécie. No caso em tela, observa-se que a autora, nascida aos 13/06/1976, já atingiu, há muito, a maioridade civil. É certo ainda que, atingida a maioridade, a pessoa se emancipa e se torna apta para todos os atos da vida civil, mas, atingida tal idade, isso não significa, necessariamente, que o pai não esteja mais obrigado a contribuir para o sustento do filho, se não por força da obrigação decorrente do pátrio poder, mas por força do vínculo de parentesco, com fundamento no ius sanguinis, desde que, por óbvio, aquele ostente capacidade contributiva para tanto, aliada à necessidade do recebimento da prestação, pelo filho, para custear os estudos de graduação em curso de nível superior ou por algum motivo que o incapacite para o trabalho e, por conseguinte, o impossibilite de prover sua própria subsistência. Trago à colação trecho do parecer confeccionado pelo Representante do Ministério Público que atuou em 1º grau de jurisdição, in verbis (fls. 69/73): "A alimentanda é portadora de grave doença neurológica, restando claro através dos atestados médicos de fls. 08, 11, 12 e 13 que está impossibilitada de realizar qualquer atividade laboral”. O Juízo de 1º grau, ao prolatar a sentença, asseverou que "A suplicante logrou comprovar a necessidade dos alimentos, notadamente pelos docs. médicos de fls. 08/19 e 31/33, que atestam ser ela portadora de doença neurológica grave, que a impossibilita de exercer atividade laboral”. Segue decisão do relator sobre o caso em tela que observou os pressupostos estudados, como o binômio necessidade e possibilidade, incapacidade do filho já maior para o trabalho e então negou provimento ao recurso que condenou o réu ao pagamento da pensão, conforme segue: Destarte, resta-nos aferir se a pensão foi delimitada em observância ao binômio de regência. A norma do art. 1.694, § 1º, do novo Código Civil, reguladora da matéria posta nos autos, reproduziu, integralmente, a do art. 400, do Código de 1.916, estabelecendo que os alimentos devem ser fixados observando-se a proporcionalidade entre as necessidades do reclamante e os recursos da pessoa obrigada, atendendo-se, portanto, ao conhecido binômio possibilidade do alimentante/necessidade do alimentado. Ensina a jurista Maria Helena Diniz, em seu Código Civil Anotado, 4ª ed., Editora Saraiva, p. 361, que "imprescindível será que haja proporcionalidade na fixação dos alimentos entre as necessidades do alimentado e os recursos econômico-financeiros do alimentante, sendo que a equação desses dois fatores deverá ser feita em cada caso concreto, levando-se em conta que a pensão alimentícia será 74 concedida sempre ad necessitatem”. Com tais considerações, NEGO PROVIMENTO AO RECURSO151. Outrossim, comprovada a existência de moléstia no alimentando, sem que este tenha condições de realizar atividades laborativas, mesmo tendo atingido há muito a maioridade, revela-se acertada a continuidade do alimentante de prover a subsistência daquele, em observância ao binômio de regência. Finalmente, não estão os pais desobrigados de pagar alimentos apenas quando cessa o Poder Familiar e sim como já demonstrado, mas também ligados a relação de parentesco, aos laços de sangue. Essa obrigação surge com a incapacidade do filho de prover sua própria subsistência sendo porque apresenta alguma enfermidade ou incapacidade permanente. Assim cada ação deve ser analisada diante de seus fatos e as partes ouvidas pra que sejam respeitadas todas as condições sempre observando o binômio possibilidade-necessidade ou podendo-se falar já também, como adotados por alguns juízes e doutrinadores, o trinômio possibilidade-proporcionalidade-necessidade para que assim a Justiça seja alcançada como importante equilíbrio para garantir o melhor para ambos os lados. 151 TJMG - N.1.0702.06.267483-4/001. Relator: ANTÔNIO SÉRVULO. Data do Julgamento: 02/12/2008. Data da Publicação: 09/01/2009 CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente Trabalho Monográfico teve como escopo discorrer acerca da Obrigação Alimentícia após a maioridade dos filhos. Dentre o objetivo que se lançou, qual seja, identificar quando realmente cessa o dever dos pais de sustentar os filhos bem como seu contorno jurídico na atualidade dividiu-se o presente estudo em três capítulos: Assim, no primeiro capítulo tratou-se de realizar apontamentos históricos acerca do Poder Familiar, iniciando com um quadro comparativo sobre o Poder Familiar desde o direito romano todas as suas peculariedades e conceitos. Passou-se a explanar sobre o Poder Familiar uma relação entre o Código Civil de 1916 e o vigente Código Civil de 2002. Outro ponto relevante discorrido no primeiro capítulo foi referente ao exercício do Poder Familiar, os filhos estão sujeitos ao poder familiar, no tocante a isto trazendo conseqüências, deveres e direitos estabelecidos no Estatuto da Criança e do Adolescente, Código Civil de 2002 e o que estabelece a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. No decorrer do mesmo capítulo tratou-se dos conceitos de Suspensão do Poder Familiar, que cessa temporariamente o dever dos pais e da Extinção do Poder Familiar que pode ser por fatos da vida como morte dos pais ou do filho, por decisão judicial, entre outros. No segundo capítulo relatou-se com exclusividade do instituto Alimentos, relatando os aspectos históricos, desde quando este surgiu até sua real aplicação disposta no atual Código Civil. Na seqüência tratou-se de definir o conceito de alimentos que são de extrema importância para satisfazer as necessidades vitais. Num segundo momento foi analisado as espécies de alimentos e todas as suas particularidades, para finalmente poder discorrer sobre a súmula 358 do Superior Tribunal de Justiça que trouxe entendimento pacificando as discussões sobre a matéria. Finalizou-se o Trabalho com o terceiro capítulo voltando-se ao cerne deste discurso: quando cessa a obrigação dos pais de sustentar os filhos, com 76 os 18 (dezoito) anos, assim que atinge a maioridade civil prevista no ordenamento jurídico, com os 24 (vinte e quatro) anos quando estudante de curso superior, desde que comprove a necessidade dos alimentos e permanente enquanto pendurar alguma incapacidade seja doença mental, física que lhe impeça de prover por si só sustento. Apresentou-se para a conclusão do presente estudo monográfico os aspectos legais e jurisprudenciais que puderam elucidar a respeito destes assuntos. As duas hipóteses levantadas no início deste Trabalho restaram ao final confirmadas: • O dever dos pais em sustentar os filhos cessa depois de alcançada a capacidade civil, isto é aos 18 (dezoito) anos. Podendo está se estender até os 24 (vinte e quatro) anos se o filho for “maior” estudante. • Com a extinção do Poder Familiar cessa o dever dos pais de sustentar os filhos, mas esse se pendura caso o filho tenha alguma incapacidade que lhe impeça de prover seu próprio sustento. Em suma, a obrigatoriedade adstrita ao Poder Familiar de dar alimentos, cessa aos 18 anos, com a maioridade civil. Porém, a partir dai nasce o dever de sustento moral, caso o filho seja estudante e não detenha condições de arcar com seu próprio sustento, persistindo aquele até a idade de 24 (vinte e quatro) anos. Assim também este dever de sustento pendura se o filho apresenta alguma incapacidade que lhe impeça de manter seu próprio meio de vida. Por fim, registre-se que não basta a mera alegação de que se necessita receber alimentos até os 24 (vinte e quatro) anos, o alimentando necessita provar que para concluir seus estudos sem prejuízo de sua subsistência, precisa continuar a receber aqueles. Anoto que, tal procedimento deve ser realizado por meio do judiciário, possibilitando ao alimentante o contraditório, visando, justamente, igualar direitos e deveres para não causar prejuízos a nenhuma das partes. 77 REFERÊNCIAS DAS FONTES CITADAS BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Contêm as emendas constitucionais posteriores. Brasília, DF: Senado, 1988. BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei 8069 de 13 de julho de 1990. Dispões sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Brasília: Senado Federal, 1990. BRASIL. Novo Código Civil. Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Aprova o novo código civil brasileiro. Brasília, DF, 2002. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula n° 358. In: http://www.stj.gov.br ARAÚJO, Harilson da Silva. A maioridade no sistema do novo Código Civil. As alterações nas formas de aquisição da capacidade civil plena da pessoa natural e suas conseqüências. Jus Navigandi, Teresina, ano 7,n. 65, maio 2003. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4062>. Acesso em: 23 maio 2010 BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Alimentos transitórios: Uma obrigação por tempo certo. Curitiba: Juruá, 2004. CAHALI, Yussef Saad, Dos Alimentos. 5 ed. São Paulo. Revista dos Tribunais, 2007 CAHALI, Yussef Said. Dos alimentos. 3ed. rev. Ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998. COVELLO, Sérgio Carlos. Ação de alimentos. 3. ed. São Paulo: Universitária de Direito, 1992. DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. Direito de família. 18.ed. 5 São Paulo: Saraiva, 2002. v. 5. FERREIRA, Gabriela Gomes Coelho. Superior Tribunal de Justiça edita Súmula nº 358: pensão alimentícia de filhos não cessa automaticamente com a maioridade. Publicado em 18/08/2008. Disponívelem:http://www.lfg.com.br/public_html/article.php?story=20080818114157913Aces so em 01 mai. 2010. GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de família. Sinopses Jurídicas. 12. ed., rev. Atual. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 2. LÔBO, Paulo Luiz Netto. Do poder familiar. Direito de Família e o novo Código Civil. 3. ed., rev. atual. e ampl., Belo Horizonte: Del Rey, 2003. MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça de Minas Gerais. http://www.tjmg.jus.br. MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil. ‘Direito de Família’. MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2004. NAREZI. Paulo Roberto. Os alimentos e a Súmula 358 STJ. Disponível em: 78 http://www.parana-online.com.br/colunistas/237/60204/. Acesso em: 26 nov. 2009. PASOLD, César Luiz. Momento Decisivo: apresentação e defesa de Trabalho Acadêmico. Florianópolis: Momento Atual, 2003. PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica – idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. OLIVEIRA, José Lamartine Corrêa de. Curso de direito de família. 4 ed. 4ª tir. Curitiba: Juruá, 2004. PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. Direito de família. 14.ed, Rio de Janeiro: Forense, 2004. v 5. PEREIRA, Sérgio Gischkow. A união estável e os alimentos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1990. REIS, Roberto Henrique dos. Exoneração de alimentos e o novo Código Civil.Jus Navigandi, Teresina, a 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3536 . Acesso em: 01 maio 2010. RIBEIRO, Benedito Silvério. A evolução do direito de família e as expectativas para o futuro. Revista da Escola Paulista da Magistratura, São Paulo. RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: Lei n° 10.406, de 10.01.2002. 4.ed, Rio de Janeiro: Forense, 2006. RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. http://www.tjrj.jus.br/. RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. http://www.tjrs.jus.br/. RODRIGUES. Silvio. Direito civil: direito de família. 28 ed. São Paulo: Saraiva, 2004. v. 6. SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. http://www.tj.sc.gov.br/. SÃO PAULO. Tribunal de Justiça de São Paulo. http://www.tj.sp.gov.br/. acesso em 08 de maio de 2010.