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Bolsistas: Geovany Fernandes Patrício
Juarez Cavalcante Brito Júnior
Tutor: Prof. Dr. Daniel Cordeiro de Morais Filho
A irracionalidade de π
A constante mais badalada de toda história da Matemática, o famoso e
mundialmente conhecido número π (pi), razão entre o perímetro de uma circunferência
e seu diâmetro, já era utilizado há milhares de anos, notadamente em grandes
construções e planejamentos de obras de engenharia (vide[1]). Essa constante, inclusive,
aparece em passagens na Bíblia: “Fez também um mar de fundição de dez côvados,
duma borda à outra, redondo em toda a volta, a sua profundidade era de 5 côvados e
cingia-o um corsão de trinta côvados.” (I Reis, 7: 23).
Vários matemáticos e cientistas, como Arquimedes (287 – 212 a.C.) e Tsu
Chung- Chi (430 – 501), ao decorrer do tempo, tentaram encontrar métodos numéricos
para calcular as casas decimais de π. Hoje, com o avanço de programas computacionais,
já são conhecidos bilhões de dígitos desse número.
Certamente, todas as pessoas com conhecimento básico em Matemática já
ouviram falar que o número 𝜋 = 3,1415926 … é um número irracional, isto é, não pode
𝑎
ser escrito na forma , com a e b inteiros.
𝑏
Muitos repetem e conhecem esse fato, que permeia os livros que permeia os
livros desde o Ensino Básico, mas, incrivelmente, poucos viram a demonstração desse
fato, mesmo os alunos que concluem cursos de Matemática.
Apresentaremos aqui, uma clássica e brilhante demonstração da irracionalidade
de π, extremamente construtiva, feita pelo matemático Ivan Niven (1915 – 1999) (vide
[2] e [3]).
A demonstração usa ideias básicas de Cálculo Diferencial e Integral (vide[4]) e é
uma das demonstrações mais elementares da irracionalidade de π. A demonstração é
feita por contradição.
𝑎
Suponhamos que π é um número racional, ou seja, π = , sendo 𝑎 e 𝑏 inteiros
𝑏
positivos.
Consideremos agora as funções polinomiais:
𝑓(𝑥) =
𝑥 𝑛 (𝑎−𝑏𝑥)𝑛
𝑛!
e
𝐹(𝑥) = 𝑓(𝑥) − 𝑓 (2) (𝑥) + 𝑓 (4) (𝑥) − … + (−1)𝑛 𝑓 (2𝑛) (𝑥),
𝑛 ∈ ℕ e 𝑓 (𝑖) (𝑥) com i = 1, 2, 4, 6,...,𝑛 são as i-ésimas derivadas de 𝑓(𝑥), o número n
será escolhido posteriormente.
Observemos que 𝑓(𝑥) e 𝑓 (𝑖) (𝑥) possuem valores inteiros para 𝑥 = 0 e também
𝑎
para 𝑥 = 𝜋 = , uma vez que, (utilizando a regra do Produto e a regra da Cadeia),
𝑏
𝑓 ′ (𝑥) =
−𝑏𝑥 𝑛 (𝑎−𝑏𝑥)𝑛−1 +𝑛𝑥 𝑛−1 (𝑎−𝑏𝑥)𝑛
𝑛!
(*)
Sendo
𝐹(𝑥) = 𝑓(𝑥) − 𝑓 (2) (𝑥) + 𝑓 (4) (𝑥) − ⋯ + (−1)𝑛 𝑓 (2𝑛) (𝑥), vê-se que
𝐹 ′′ (𝑥) = 𝑓 (2) (𝑥) − 𝑓 (4) (𝑥) + 𝑓 (6) (𝑥) − ⋯ + (−1)𝑛 𝑓 (2𝑛+2) (𝑥)
e daí, temos que
𝐹(𝑥) + 𝐹 ′′ (𝑥) = 𝑓(𝑥)
(**)
Assim, pelo Cálculo Diferencial, e usando (*) e (**), temos
𝑑 ′
𝑑
𝑑
{𝐹 (𝑥)𝑠𝑒𝑛(𝑥) − 𝐹(𝑥) cos(𝑥)} =
{𝐹 ′ (𝑥)𝑠𝑒𝑛(𝑥)} −
{𝐹(𝑥) cos(𝑥)} =
𝑑𝑥
𝑑𝑥
𝑑𝑥
= 𝐹 ′′ (𝑥)𝑠𝑒𝑛(𝑥) + 𝐹 ′ (𝑥) cos(𝑥) − (𝐹 ′ (𝑥) cos(𝑥) − 𝐹(𝑥)𝑠𝑒𝑛(𝑥) =
= 𝐹 ′′ (𝑥)𝑠𝑒𝑛(𝑥) + 𝐹(𝑥)𝑠𝑒𝑛(𝑥) = [𝐹 ′′ (𝑥) + 𝐹(𝑥)]𝑠𝑒𝑛(𝑥) = 𝑓(𝑥)𝑠𝑒𝑛(𝑥).
Portanto, pelo Teorema Fundamental do Cálculo, e usando o fato de que 𝐹(𝜋),
𝐹(0), 𝐹 ′ (𝜋) e 𝐹 ′ (0) são iguais a zero, (uma vez que 𝑓(𝜋), 𝑓(0), 𝑓 ′ (𝜋) e 𝑓 ′ (0) são
iguais a zero), temos
𝜋
∫ 𝑓(𝑥)𝑠𝑒𝑛(𝑥)𝑑𝑥 = [𝐹 ′ (𝑥) − 𝐹(𝑥) cos(𝑥)]𝜋0 =
0
= [𝐹 ′ (𝜋)𝑠𝑒𝑛(𝜋) − 𝐹(𝜋) cos(𝜋)] − [𝐹 ′ (0)𝑠𝑒𝑛(0) − 𝐹(0) cos(0)]
= 𝐹(𝜋) + 𝐹(0)
(***)
Note que 𝐹(𝜋) + 𝐹(0) é um inteiro, pois, 𝑓 (𝑖) (𝜋) e 𝑓 (𝑖) (0) são inteiros.
Agora, usando o fato de que os pontos críticos da função 𝑓(𝑥)𝑠𝑒𝑛(𝑥) são 𝑥 = 0,
𝜋
𝑥 = 1 e 𝑥 = , este último ponto sendo ponto de máximo da função, vê-se que
2
𝜋
𝑎𝜋 𝑛 1
𝑓( ) = ( )
2
4 𝑛!
Logo, para 0 < 𝑥 < 𝜋, temos
𝑎𝜋 𝑛 1
)
4 𝑛!
0 < 𝑓(𝑥)𝑠𝑒𝑛(𝑥) < (
o que implica
𝜋
𝜋
𝜋
𝑎𝜋 𝑛 1
)
𝑑𝑥
4 𝑛!
∫ 0 𝑑𝑥 < ∫ 𝑓(𝑥)𝑠𝑒𝑛(𝑥)𝑑𝑥 < ∫ (
0
0
0
donde, (usando (***)),
𝑎𝜋 𝑛 1
)
𝜋
4 𝑛!
0 < 𝐹(𝜋) + 𝐹(0) < (
Assim, se considerarmos um valor de 𝑛 suficientemente “grande”, encontraremos
um número inteiro entre 0 e 1. Absurdo!
Logo, provamos que 𝜋 é um número irracional, como queríamos demonstrar.
Referências Bibliográficas
[1] EVES, Howard. Introdução à História da Matemática. Campinas, SP: Editora da
Unicamp, 2004.
[2] FIGUEIREDO, D. G. Números Irracionais e Transcendentes. Rio de Janeiro, RJ:
Sociedade Brasileira de Matemática, 3 ed, 2002.
[3] NIVEN, Ivan. “A simple proof that 𝜋 is irrational”Bulletin of American
Mathematical Society53 (6): 509, 1974.
[4] THOMAS, G. B. Cálculo. São Paulo, SP: Addison Wesley, Volume 1, 2009.
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