TRIBUNAL DE JUSTIÇA DÉCIMA SÉTIMA CÂMARA CÍVEL

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TRIBUNAL DE JUSTIÇA
DÉCIMA SÉTIMA CÂMARA CÍVEL
Apelação Cível nº. 0096526-41.2011.8.19.0001
Apelante: Amil Assistência Médica Internacional S/A
Apelado: Raul Ricardo Raposo Filho
Relator: Des. Elton M. C. Leme
RELATÓRIO
Adota-se, na forma do permissivo regimental, o relatório
lançado na sentença de fls. 214-217.
Trata-se de ação de obrigação de fazer proposta por Raul
Ricardo Raposo Filho, em face de Amil Assistência Médica Internacional
S/A, pelo rito sumário, alegando o autor, em síntese, que é beneficiário do
plano de saúde da ré e se encontra em dia com as mensalidades. No entanto,
precisou fazer tratamento psiquiátrico imediato, sendo encaminhado pelo seu
médico para sessões de eletroconvulsoterapia (fls. 76), sendo que tal
tratamento não foi autorizado pela ré. Requereu a inversão do ônus da prova e
a antecipação da tutela.
A decisão de fls. 109 deferiu a antecipação dos efeitos da
tutela para que a ré autorizasse e custeasse as 20 sessões de
eletroconvulsoterapia e outras que se fizerem necessárias, de acordo com o
laudo médico, incluindo todos os custos da internação na Clínica da Gávea e
demais despesas dela decorrentes, com todos os materiais e equipamentos
necessários, englobando medicamentos, exames médicos e laboratoriais e tudo
o mais que se fizer necessário no curso das sessões e da internação, sob pena
de multa diária de R$ 500,00 até o patamar de R$ 50.000,00.
ELTON MARTINEZ CARVALHO LEME:000015384
Assinado em 17/10/2013 19:19:32
Local: GAB. DES ELTON MARTINEZ CARVALHO LEME
Audiência de conciliação, a fls. 124, sem possibilidade de
acordo.
Contestação a fls. 125-145, sustentando a ré, preliminarmente,
carência de ação, na medida em que não lhe foi negado a autorização para o
procedimento, pois este jamais foi requerido pelo autor. No mérito, reiterou a
ausência de negativa de autorização para realização do tratamento e que não
há previsão contratual para a realização de eletroconvulsoterapia, que não está
previsto no rol da ANS por ser considerado experimental. Alegou
impossibilidade de inversão do ônus da prova e da antecipação da tutela.
Discorreu acerca do dever do Estado de prestação de assistência à saúde e
requereu a improcedência do pedido.
Réplica às fls. 201-206.
A sentença proferida a fls. 214-217 julgou procedente o
pedido, confirmando a decisão que concedeu a antecipação de tutela, para
condenar a ré a suportar todas as despesas necessárias para a realização do
tratamento do autor, inclusive no que tange às despesas com medicamentos,
equipamentos, exames e internação na Clínica da Gávea, relativos a 20 sessões
de eletroconvulsoterapia. Por fim, condenou a ré a pagar custas e despesas
processuais e honorários advocatícios, estes fixados em R$ 500,00.
Apelou a ré a fls. 218-228, ressaltando que jamais teve
conhecimento da necessidade do autor de ser submetido a tratamento de
eletroconvulsoterapia e que esse tratamento não é coberto pelos planos de
saúde. Requer a reforma da sentença e a revogação da tutela antecipada.
O recurso foi recebido no duplo efeito, salvo quanto à tutela
antecipada. (fls. 232).
Não foram apresentadas contrarrazões.
É o relatório. Peço dia.
Rio de Janeiro, 4 de outubro de 2013.
Des. Elton M. C. Leme
Relator
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
DÉCIMA SÉTIMA CÂMARA CÍVEL
Apelação Cível nº. 0096526-41.2011.8.19.0001
Apelante: Amil Assistência Médica Internacional S/A
Apelado: Raul Ricardo Raposo Filho
Relator: Des. Elton M. C. Leme
APELAÇÃO CÍVEL. OBRIGAÇÃO DE FAZER. PLANO DE
SAÚDE.
ELETROCONVULSOTERAPIA.
NEGATIVA
DE
AUTORIZAÇÃO. INDICAÇÃO MÉDICA. AUSÊNCIA DE
ÓBICE CONTRATUAL À COBERTURA DO TRATAMENTO.
MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. 1. Trata-se de Ação de
Obrigação de Fazer, tendo como causa de pedir a negativa de
custeio,
por
parte
da
seguradora
ré,
de
tratamento
de
Eletroconvulsoterapia (ECT) prescrito por médico ao autor. 2.
Tratando-se de tratamento indispensável à saúde e vida do segurado
e constando do contrato relativo ao plano de saúde cobertura para
“tratamento de doenças psiquiátricas em regime ambulatorial”, bem
como inexistindo cláusula excluindo o referido tratamento, não se
afigura razoável afastar a responsabilidade da ré pela cobertura do
custeio de tal procedimento. 3. A Resolução n° 1.640/2002 do
Conselho
Federal
eletroconvulsoterapia
de
Medicina
é
tratamento
reconheceu
“eficaz,
que
a
seguro
e
internacionalmente reconhecido e aceito”. 4. Não se pode limitar a
autorização de procedimentos às listagens oficiais, porquanto
somente o médico é profissional habilitado e com capacidade
técnica para prescrever o adequado tratamento para cada caso,
consoante enunciado 24 do Aviso 94/2010 do TJRJ. 5.
Desprovimento do recurso.
ACÓRDÃO
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação
Cível nº 0096526-41.2011.8.19.0001, julgada na sessão de 17/10/2013,
originária da 29ª Vara Cível da Comarca da Capital, em que é apelante Amil
Assistência Médica Internacional S/A e Raul Ricardo Raposo Filho.
ACORDAM,
por
unanimidade
de
votos,
os
Desembargadores que compõem a Décima Sétima Câmara Cível do Tribunal
de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, em negar provimento ao recurso,
nos termos do voto do relator.
ACÓRDÃO apresentado na data da sessão.
VOTO
Trata-se de Ação de Obrigação de Fazer, tendo como causa de
pedir a negativa de custeio, por parte da seguradora ré, de tratamento de
Eletroconvulsoterapia (ECT) indicado pelo médico ao autor.
O tema é relativo a plano de saúde, sendo aplicável à hipótese
o Código de Defesa do Consumidor, estando as partes litigantes escudadas
pelo conceito de consumidor e fornecedor dos artigos 2º e 3º do referido
diploma legal.
Na declaração médica de fls. 76 foi prescrito ao autor
tratamento imediato de eletroconvulsorerapia: “Apresenta um quadro grave
de mania psicótica com ideações suicidas. Precisa realizar sessões de
ELETROCONVULSOTERAPIA devido a sua instabilidade, qu poderia leva-lo
a suicídio. Necessita de acompanhamento intensivo por longo período de
tempo e um tratamento contínuo sem previsão de alta e necessita fazer 20
aplicações (ELETROCONVULSOTERAPIA) nesse momento. CID F: 30.2
Episódio maníaco grave com sintomas psicóticos.”
A ré limitou-se a afirmar que não houve requerimento do
tratamento e, por isso, não houve recusa, como alega o autor. Afirma também
que se trata de procedimento experimental, não coberto pelo plano. Por outro
lado, o autor comprovou a sua qualidade de segurado do plano de saúde,
conforme documentos de fls. 22 e 74 e a urgência da realização do
procedimento, sob o risco de suicídio.
A controvérsia consiste em saber se o tratamento indicado ao
autor tem caráter experimental e, em caso positivo, se está excluído da
cobertura securitária.
Tratando-se, assim, de tratamento indispensável à saúde e vida
do autor, constituindo parte integrante do mesmo, e constando do contrato
relativo ao Plano de Saúde cobertura para “tratamento de doenças
psiquiátricas em regime ambulatorial” (fls. 40), bem como inexistindo
cláusula excluindo o referido tratamento (fls. 35), não se afigura razoável
afastar a responsabilidade da ré pela cobertura do custo de tal procedimento.
Destarte, a realização do tratamento médico indicado ao autor,
com a utilização de todos os componentes necessários ao seu êxito, constitui o
próprio cumprimento da obrigação assumida pelo plano de saúde, mesmo
porque a interpretação contratual não pode se afastar da evolução científica ao
combate das doenças.
Ainda que se reconheça como válida a cláusula limitativa de
riscos como meio destinado a manter o equilíbrio contratual, no sentido de
excluir da cobertura tratamentos médicos não contemplados no contrato, é
forçoso concluir que o indicado ao autor (“ELETROCONVULSOTERAPIA”) é
apontado no Relatório Médico de fls. 76 como necessário à recuperação da
patologia do demandante (CID F: 30.2 Episódio maníaco grave com sintomas
psicóticos).
Nas relações de consumo, o contrato deve ser interpretado de
maneira mais favorável ao consumidor e de modo a não comprometer sua
natureza e finalidade. No contrato de assistência médica e hospitalar um
contrato genérico e de adesão, os seus termos devem ser claros, de modo a
facilitar sua compreensão pelo consumidor, sendo certo que as cláusulas
limitativas do direito do consumidor deverão ser redigidas em destaque
permitindo sua imediata e fácil compreensão, motivo pelo qual, não estando
claramente assinalada a ausência de cobertura, há de se concluir sempre em
favor do consumidor, na forma do § 4º, do art. 54 do Código de Defesa do
Consumidor.
A Resolução n° 1.640/2002 do Conselho Federal de Medicina,
reconheceu que o método indicado é “eficaz, seguro e internacionalmente
reconhecido e aceito”, impondo que se faça em ambiente hospitalar e que haja
consentimento do paciente ou, em caso de incapacidade, de seu representante.
RESOLUÇÃO CFM nº. 1.640/2002
Dispõe
sobre
a
eletroconvulsoterapia
e
dá
outras
providências. O Conselho Federal de Medicina no uso das
atribuições que lhe confere a Lei n. 3.268, de 30 de setembro
de 1957, regulamentada pelo Decreto n. 44.405, de 19 de
julho de 1958, e CONSIDERANDO que a Lei n. 10.216, de 6
de abril de 2001, assegura os direitos e a proteção das
pessoas acometidas de transtorno mental sem qualquer forma
de discriminação;
(...)
Art 1º - A eletroconvulsoterapia (ECT), como método
terapêutico eficaz, seguro, internacionalmente reconhecido e
aceito, deve ser realizada em ambiente hospitalar.
É certo que nem sempre o rol da ANS está atualizado e por
isso compreende todas as hipóteses de tratamento. O que interessa é que há
recomendação médica específica para a eletroconvulsoterapia, como
tratamento urgente e imprescindível em razão dos graves transtornos porque
vem passando o autor, ora apelado, inclusive, em risco de sua própria vida.
Ademais, não se pode limitar a autorização de procedimentos
às listagens oficiais, porquanto somente o médico é profissional habilitado e
capaz de saber qual é o medicamento que deve ser ministrado, em cada caso
específico, para o eficaz tratamento do doente. Este Tribunal de Justiça
aprovou o enunciado de nº 24 do Aviso 94/2010, no Encontro dos
Desembargadores de matéria de competência cível, que dita: “havendo
divergência entre o seguro saúde contratado e o profissional responsável pelo
procedimento cirúrgico, quanto à técnica e ao material a serem empregados,
a escolha cabe ao médico incumbido de sua realização”.
Por fim, importante destacar que este é o reiterado
entendimento deste Tribunal de Justiça:
DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
Agravo de instrumento interposto de decisão que, em ação
proposta por consumidor em face de operadora de plano de
saúde, deferiu a antecipação de tutela para determinar que a
ré
autorizasse
a
realização
de
sessões
de
eletroconvulsoterapia indicadas pelo médico responsável pelo
tratamento. 1. A apresentação de declaração médica
indicando a necessidade do tratamento não excluído
expressamente da cobertura de plano de saúde, aliado ao
risco de ineficácia do provimento final autoriza a antecipação
dos efeitos da tutela para determinar que a ré autorize o
procedimento sob pena de multa (CDC, art. 84, caput, e §§ 3.º
e 4.º). 2. Não demonstrada objetivamente a exasperação, há
manter as astreintes cominadas, somente exigíveis em caso de
descumprimento da determinação judicial. 3. Recurso ao qual
se nega seguimento com fulcro no art. 557, caput, do CPC.
(0011326-98.2013.8.19.0000
-
AGRAVO
DE
INSTRUMENTO - DES. FERNANDO FOCH LEMOS Julgamento: 20/03/2013 - TERCEIRA CÂMARA CÍVEL)
Agravo interno. Apelação Cível. Direito do Consumidor.
Recusa ilegítima da operadora de plano de saúde em fornecer
tratamento psiquiátrico denominado eletroconvulsoterapia.
Alegação de que o procedimento tem caráter experimental.
Reconhecimento pelo Conselho Federal de Medicina de que o
método terapêutico é "eficaz, seguro e internacionalmente
reconhecido e aceito". Obrigação de arcar com o tratamento.
Dano
moral
Aplicação
de
configurado.
multa.
Desprovimento
do
recurso.
(0256005-41.2009.8.19.0001
–
APELAÇÃO - DES. ALEXANDRE CAMARA - Julgamento:
31/10/2012 - SEGUNDA CÂMARA CÍVEL)
APELAÇÕES CÍVEIS. Ação cautelar de obrigação de fazer e
ação indenizatória apensadas. Rito Ordinário. CABERJ.
Plano de Saúde. (...) Autor portador de problemas
psiquiátricos que apresenta quadro depressivo grave com
sintomas psicóticos, o qual foi submetido a tratamento de
eletroconvulsoterapia no Hospital da Gávea, integrante da
rede credenciada. Risco de vida. Recusa de autorização sob o
argumento de que o referido tratamento não consta do rol de
procedimentos elencados pela Agência Nacional de Saúde,
sustentando que o motivo seria o fato de ser um método
agressivo, de aceitação não unânime entre os especialistas, a
desautorizar a cobertura pelo plano. Alegação afastada pela
disposição da Resolução de nº 1.640/2002, do Conselho
Federal de Medicina. Não se pode limitar a autorização de
procedimentos às listagens oficiais. Havendo divergência
entre o seguro saúde contratado e o profissional responsável
pelo procedimento cirúrgico, quanto à técnica a ser
empregada, a escolha cabe ao médico incumbido de sua
realização. Enunciado nº 24 do Aviso nº 94/2010 deste
Tribunal de Justiça. Prevista a cobertura contratual da
doença que aflige o consumidor, é abusiva a recusa à
cobertura do procedimento destinado ao seu tratamento,
especialmente diante da gravidade do quadro clínico.
Obrigação contratual caracterizada. Artigo 51, inciso IV e
§1º, inciso II do CODECON. Autor que logrou êxito em
comprovar o fato constitutivo de seu direito. Artigo 333, inciso
I, do CPC. Correta a sentença que condena a ré ao
ressarcimento do valor desembolsado pelo autor com os
consectários.
Precedentes
SEGUIMENTO
AOS
deste
Tribunal.
RECURSOS.
NEGADO
(0022897-
97.2008.8.19.0014 - APELAÇÃO - DES. PATRICIA SERRA
VIEIRA - Julgamento: 02/04/2012 - DÉCIMA SÉTIMA
CÂMARA CÍVEL)
Apelação cível. Controvérsia entre consumidora e empresa de
seguro saúde. Recusa de cobertura do procedimento médico
denominado como "eletroconvulsoterapia". Tratamento que,
segundo o profissional médico que acompanhava a paciente,
indicava-se como adequado a reverter seu quadro grave de
mania mista psicótica, com ideações suicidas. Aplicabilidade
do Enunciado Sumular n.º 24 desta Corte Estadual. Parte ré
que não logrou êxito em comprovar a invocada exclusão
contratual dos riscos. Existência de cláusula específica
prevendo cobertura de atendimentos clínicos ou cirúrgicos
decorrentes de transtornos psiquiátricos. Interpretação das
condições pactuadas que deve ser realizada à luz da boa-fé
objetiva, garantindo-se ao paciente a plenitude de sua saúde.
Danos emergentes devidamente documentados. Dano moral
ocorrido in re ipsa, devendo ser reconhecido e arbitrado em
R$5.000,00 (cinco mil reais), o que melhor reflete as
peculiaridades do caso, atendendo aos parâmetros desta
Câmara Cível. Primeiro apelo improvido, provendo-se o
segundo recurso. (0318486-06.2010.8.19.0001 - APELAÇÃO
- DES. CELSO PERES - Julgamento: 14/09/2011 - DÉCIMA
CÂMARA CÍVEL)
Responsabilidade Civil. Relação de consumo. Ação de
conhecimento objetivando cobertura para tratamento de
eletroconvulsoterapia, com pedido cumulado de indenização
por danos material e moral. Procedência do pedido, para
autorizar o tratamento mencionado na inicial e condenar a Ré
ao pagamento dos gastos já efetuados pela Autora com esse
tratamento, e de R$ 5.000,00, para reparação do dano moral.
Apelação da Ré. Recusa injustificada de cobertura integral de
procedimento
denominado
Eletroconvulsoterapia
recomendado para tratamento de doença neurológica.
Inteligência dos artigos 47 e 51 da Lei 8078/90. Precedentes
do
TJ/RJ.
Dano
material
comprovado.
Dano
moral
configurado. Indenização que foi fixada com moderação,
observados
os
princípios
da
razoabilidade
e
da
proporcionalidade. Desprovimento da apelação. (002883552.2009.8.19.0042 - APELAÇÃO - DES. ANA MARIA
OLIVEIRA - Julgamento: 28/06/2011 - OITAVA CÂMARA
CÍVEL)
Desse modo, comprovada a prescrição médica, não há dúvida
de que a ré deve arcar com o tratamento.
Por todo o exposto, voto no sentido de negar provimento ao
recurso, mantida a douta sentença recorrida.
Rio de Janeiro, 17 de outubro de 2013.
Des. Elton M. C. Leme
Relator
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