Dinheiro doado vem com carimbo de corrupção? Celso Vicenzi A ex

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Dinheiro doado vem com carimbo de corrupção?
Celso Vicenzi
A ex-senadora, ex-ministra e ex-candidata à presidência da República Marina Silva, que
manteve-se calada durante toda a tragédia ambiental da Samarco/Vale, ressurgiu no noticiário
para defender o golpe contra Dilma Roussef, torcendo por uma análise condenatória do
Tribunal Superior Eleitoral. Diz a líder ambientalista que nada falou da maior tragédia
ambiental recente no país, que se ficar comprovado que a chapa Dilma/Temer recebeu
dinheiro da corrupção da Petrobras para financiar a campanha, o impeachment seria legítimo,
porque previsto na Constituição.
Pois vamos raciocinar um pouco mais sobre essa tese que há de desafiar os eminentes sábios
do TSE. Nota de dois, dez, vinte, cinquenta, cem reais vem com carimbo de CORRUPÇÃO? O
que uma empresa movimenta de dinheiro ou o que lucra, não vai tudo para uma mesma
conta? Quem separa o dinheiro que pode ter sido, eventualmente, proveniente de corrupção
daquele que foi ganho sem qualquer expediente desonesto?
Difícil crer, mesmo diante do mais ferrenho opositor do governo Dilma, que alguém sustente
que TODO o dinheiro arrecadado pela Petrobras, por exemplo, é resultante de corrupção. Se
uma pequena parte – ou de que tamanho for – é resultado de corrupção, como saber se foi
justamente esta a parte doada a uma campanha eleitoral? Qual eminente e sábio ministro do
Tribunal Superior Eleitoral saberá distinguir as notas carimbadas como legais daquelas fruto de
corrupção? Afinal, a tese, numa eventual condenação, é de que se trata de dinheiro da
corrupção. Como saber? Uma empresa que teve eventuais negócios ilícitos é totalmente
corrupta?
Talvez alguns doutos senhores da lei se esforçarão para transformar em sofismas baratos (ou
seriam caros?) o que é ato de uns em condenação de todos. Até onde é possível pensar as
responsabilidades, caberia aos tesoureiros das campanhas políticas tão somente declarar o
recebimento de doações – de empresas ou pessoas físicas –, conforme prevê a lei. Nenhum
tesoureiro e muito menos um candidato teriam que saber, a priori, se o dinheiro foi benzido
pelo mercado ou se é procedente de vias tortas da corrupção. Repare bem: é dinheiro com
empresa que tem endereço, CNPJ, produz ou comercializa bens de uso autorizado. Não é
dinheiro de tráfico de pessoas, venda ilegal de armas ou de qualquer outra atividade ilícita.
Como criminalizar, portanto, o que é recebido de boa fé e que nenhuma legislação eleitoral
solicita prévia investigação de sua sanidade? Se é dinheiro limpo ou desonesto?
Mesmo que investigações apontem que determinadas empresas se envolveram com
esquemas de corrupção, com agentes públicos, quem deve ser punido são os dirigentes,
servidores ou detentores de cargos públicos ou privados envolvidos no esquema. Diretamente
envolvidos. Não é porque dirigentes de uma empresa deram dinheiro a agentes públicos que
todo e qualquer dinheiro que venha a ser doado, futuramente, pela empresa (neste caso quem
doa é a empresa, não o dirigente), esteja imediatamente contaminado por corrupção.
Além disso, a Petrobras, os bancos e as principais empreiteiras do país doaram dinheiro para
todos os principais candidatos, Marina Silva incluída. Se Dilma vier a ser condenada, qual a
punição para os demais candidatos, que receberam do mesmo dinheiro? Ou será que o maior
crime é ter sido eleita com o voto da maioria dos brasileiros?
Segundo levantamento feito pelo UOL, com base em prestação de contas enviadas ao TSE,
75% do total arrecadado por Dilma, Aécio e Marina, na última campanha, era dinheiro
proveniente de empresas de construção, indústria e agronegócio. Marina Silva arrecadou R$
31 milhões de empresas – um terço era dinheiro proveniente de construtoras que também
doaram a outros candidatos. Como Marina pode saber se entre todo esse volume de dinheiro
não havia também dinheiro de corrupção?
Nem ela, nem Dilma, nem Aécio, nem o TSE têm esse condão capaz de, ao tocar em uma nota
de 100 reais, distingui-la como cédula limpa ou cédula podre. Não há arrazoado jurídico ou
econômico capaz de separar, do lucro das empresas, o que é dinheiro bom do que é dinheiro
ruim. O caixa é sempre o mesmo, ninguém separa cédulas com o carimbo “proveniente de
corrupção” e “proveniente de negócios legais”. Na hora de fazer a doação, o dinheiro é o
mesmo, não há como distingui-lo.
Portanto, é legítimo que a Lava Jato e outras investigações rastreiem negócios que foram
resultado de corrupção e tomem as medidas previstas em lei para punir os responsáveis e
sanar o problema. Mas isso não pode servir de pretexto para anular uma eleição que seguiu
todos os trâmites normais e legais. Dilma não cometeu crime por receber dinheiro de uma
empresa que tem envolvimento com corrupção, porque não infringiu nenhuma lei ao receber
a doação.
Não é possível nem mesmo alegar que a Petrobras (ou outra pessoa jurídica) cometeu um
crime de corrupção. Pessoas em cargos de comando cometeram crimes. E somente elas
devem responder pelo que fizeram. A Petrobras, que emprega milhares de brasileiros e tem
importância fundamental para a economia do país, não pode ser vítima, posto que, em última
instância, vítimas seriam todos os brasileiros honestos que nela trabalham e que podem vir a
ser demitidos se a empresa não puder operar normalmente, porque alguns de seus dirigentes
cometerem ilícitos. Sem falar no impacto que isso representa na vida de milhões de brasileiros
e brasileiras.
A justiça precisa separar o joio do trigo. E o TSE não pode cassar o voto dos brasileiros com a
aplicação de casuísmos.
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