05-07 Artigo Keila e Thay -DECH (correção banca) FINAL (2)

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Curso de Biomedicina
Artigo de Revisão
DOENÇA DO ENXERTO CONTRA HOSPEDEIRO (DECH): A MAIOR COMPLICAÇÃO
PARA O TRANSPLANTE DE CÉLULAS TRONCO HEMATOPOÉTICAS (TCTH)
GRAFT-VERSUS-HOST DISEASE (GVHD): THE MAJOR COMPLICATIONS FOR HEMATOPOIETIC
STEM CELL TRANSPLANTATION
2
Keila de Sousa Alvez1, Thaiany Martins Rodrigues1, Graziela Silveira Araújo Alves
1 Aluna do Curso de Biomedicina
2 Professora Mestre do Curso de Biomedicina
Resumo
O transplante de células progenitoras hematopoéticas (TCTH) é a modalidade terapêutica utilizada no tratamento e cura de inúmeras
doenças hematológicas e imunodeficiências primárias, contudo, existem várias complicações associadas a esta prática, sendo a mais
importante delas devido à alta taxa de morbimortalidade a doença do enxerto contra hospedeiro (DECH) que é uma doença
imunologicamente mediada pela liberação de citocinas. Este estudo revisa as indicações, tipos, complicações do TCTH, principais
componentes imunológicos envolvidos na patogênese da DECH aguda e crônica, bem como avaliar a correlação entre a presença de
polimorfismos genéticos na incidência da DECH. A fisiopatologia da DECH é complexa e envolve uma série de respostas de diversos
efetores imunológicos a estímulos antigênicos naturais ou que são expressos devido ao dano tecidual provocado pela doença ou pelo
sistema de condicionamento. A produção das citocinas está sob rigoroso controle genético, assim polimorfismos nas regiões
codificadoras podem alterar fatores de transcrição gênica, causando variações na quantidade de citocina produzida na DECH,
interferindo no prognóstico do paciente. Recentemente, vários estudos têm revelado a importância do polimorfismo gênico das
citocinas, o que poderia auxiliar numa intervenção terapêutica mais precoce.
Palavras-Chave: Transplante de Medula Óssea, Fisiopatologia, Citocinas, Polimorfismo.
Abstract
The transplantation of hematopoietic stem cell transplantation (HSCT) is a therapeutic modality used in the treatment and cure of many
hematological diseases and primary immunodeficiency’s, however, there are several complications associated with this practice, the
most important being due to high morbidity and mortality rate of disease graft versus host disease (GVHD) which is a disease immunologically mediated cytokine release. This study reviews the indications, types, HSCT complications, major immune components involved
in the pathogenesis of acute and chronic GVHD, and to evaluate the correlation between the presence of genetic polymorphisms in the
incidence of GVHD. The pathophysiology of GVHD is complex and involves a number of different immunological effector responses to
natural or antigenic stimuli that are expressed due to tissue damage caused by disease or conditioning system. The cytokine production
is under strict genetic control, and polymorphisms in the coding regions can alter gene transcription factors causing variations in the
amount of cytokine produced in GVHD, interfering with the patient's prognosis. Recently, several studies have shown the importance of
cytokine gene polymorphism, which could assist in early therapeutic intervention.
Keywords: Bone Marrow Transplant, Pathophysiology, Cytokines, Polymorphisms.
Contato: [email protected]
Introdução
Atualmente, o Transplante de Células Tronco
Hematopoéticas (TCTH) é uma das alternativas
terapêuticas de maior eficiência para diversas
doenças na qual a atividade medular se encontra
comprometida ou danificada. Essa terapia tem como
finalidade a recuperação da função da medula
óssea de pacientes acometidos com patologias de
origem neoplásica, hematológica, imunológica ou
1,2
metabólica.
Contudo, apesar do TCTH ser a única medida
curativa para muitas doenças, seja de origem
neoplásica ou não neoplásica, existem várias
complicações relacionadas a esse tipo de
transplante, dentre elas, destaca-se pela sua
gravidade e complexidade a Doença do Enxerto
contra o Hospedeiro (DECH). Essa doença se
caracteriza principalmente no fato das células
imunocompetentes
presentes
no
enxerto
transplantado desencadear a ativação do sistema
imunológico do receptor, através de uma cascata
enzimática de citocinas, ativando primeiramente
monócitos e linfócitos e, posteriormente, todo o
sistema imune, deflagrando diversas lesões à
3
órgãos e tecidos do receptor.
A DECH pode ser classificada em aguda e
crônica, e a principal característica que as diferem,
são seus sinais e sintomas e pelo fato de ativarem o
4
sistema imune de forma distinta.
Desde a descoberta da DECH por E. Donnal
Thomas, em 1957, vários outros estudos a respeito
das possíveis causas da DECH foram realizados e
comprovados. O sistema Antígeno Leucocitário
Humano (HLA) incompatível entre receptor e doador
é um dos principais fatores que contribuem para que
a doença ocorra, porém estudos mais recentes a
respeito de outros genes não pertencentes ao
antígeno HLA estão sendo realizados. Esses
estudos têm verificado os polimorfismos genéticos
das citocinas que estão associados à resposta de
rejeição da DECH. Assim, já existem associações
entre esses polimorfismos e a ocorrência e
gravidade das manifestações clínicas da DECH
5,6
após o TCTH.
O objetivo dessa pesquisa foi relatar a
fisiopatologia da DECH, definindo a atuação do
sistema imunológico, especialmente das citocinas,
bem como avaliar a correlação entre a presença de
polimorfismos genéticos e o prognóstico dos
pacientes.
Metodologia: Revisão Bibliografia NarrativaRetrospectiva.
Fonte de Pesquisa: artigos e teses encontrados em
banco de dados como Scielo, PubMed e Medline.
Foram pesquisados 60 artigos e, dentre eles foram
selecionados 33, por maior especificidade ao tema.
Discussão
O transplante de órgãos e tecidos é uma
alternativa terapêutica eficiente e segura no
tratamento de diversas doenças, determinando
melhoria na qualidade e na perspectiva de vida.
Facultado pelo aperfeiçoamento de técnicas
cirúrgicas, desenvolvimento de imunossupressores
e compreensão imunológica da compatibilidade e
rejeição, o transplante de órgãos e tecidos deixou
de ser um tratamento experimental e passou a
figurar um procedimento extremamente eficaz no
controle das insuficiências terminais de alguns
7,8
órgãos e falência de alguns tecidos.
O
Transplante
de
Células-Tronco
Hematopoéticas (TCTH) ou Transplante de Medula
Óssea (TMO) consiste na infusão intravenosa de
células
progenitoras
hematopoéticas
para
tratamento de pacientes com déficit medular.
O TCTH é, hoje, reconhecidamente, um
tratamento efetivo para doenças neoplásicas,
hematológicas ou não, doenças metabólicas e
deficiências imunológicas, podendo ser dividido em
três tipos, dependendo do doador e das células
progenitoras:
ü
Transplante Alogênico: envolve a infusão de
células-tronco de um doador compatível, aparentado ou não. Em algumas situações, é
preciso a substituição completa da hematopoese do paciente pela de um doador saudável, habitualmente um familiar com compatibilidade no sistema HLA. Este tipo de transplante apresenta complicações relacionadas a
reações imunológicas entre receptor e doador, desde a rejeição até a DECH ou GVHD
(da sigla em inglês “graft versus host disease”). Esse transplante alogênico pode ser
subdividido em: TCTH com mieloablação, para o qual se utilizam altas doses de agentes
citotóxicos
no
condicionamento
prétransplante, com o objetivo de destruição
completa da medula óssea do receptor, antes
da infusão de células-tronco hematopoéticas;
e em TCTH sem mieloablação que ocorre
quando se minimiza a intensidade ablativa do
tratamento com agentes citotóxicos do receptor pré-infusão das células-tronco do doador.
9,2
ü
Transplante Singênico: o doador é um irmão
gêmeo idêntico. É a modalidade mais rara de
transplante devido a pouca frequência de
gêmeos idênticos na população. A identidade
antigênica entre doador e receptor é absoluta
e não se produz, portanto, nenhuma complicação imunológica e sem efeito antitumoral,
2,10
porém pode haver recidivas.
ü Transplante Autólogo: as células-tronco
hematopoéticas provêm da medula óssea
ou do sangue periférico do próprio indivíduo
a ser transplantado (receptor). Nesse caso,
as células progenitoras são coletadas
previamente de forma programada, quando
o paciente se encontra em remissão
completa da doença, exceto no caso do
Mieloma Múltiplo que, apesar de a medula
óssea estar infiltrada de plasmócitos, eles
não são oncogênicos, e haverá redução da
massa tumoral e aumento da sobrevida.
Este tipo de transplante tem menos risco
que o alogênico por não existir nenhum tipo
de reação imunológica entre receptor e
doador; por isso, pode ser usado em
pacientes mais idosos. Entretanto, como o
efeito antitumoral é menor, o índice de
11
recidivas é maior.
Para a obtenção de células progenitoras
hematopoéticas são necessárias quantidades
adequadas de células da medula, as quais podem
ser coletadas na crista ilíaca posterior, através de
múltiplas punções e aspirações da medula, ou do
sangue periférico, através de máquinas de aférese
2,12,13
ou ainda do sangue do cordão umbilical.
As indicações para os transplantes alogênicos
e singênicos são divididos em doenças não
neoplásicas e doenças neoplásicas (Tabela 1).
Tabela 01 – Indicações de Transplante de TCTH
Doenças não neoplásicas
Doenças neoplásicas
Anemia aplástica grave
(AAG)
Leucemia Mielóide Crônica
(LMC)
Anemia de Fanconi
Leucemia Mielóide Aguda
(LMA)
Chediaki-Higashi
Leucemia Linfocítica Aguda
(LLA)
Wistok-Waldrich
Síndrome Mielodisplásica
Imunodeficiência
combinada severa;
Leucemia mielomonocítica
crônica
Osteoporose
Mielofibrose maligna aguda
Adenoleucodistrofia
Linfomas não Hodgkin
Leucodistrofia
metacromática infantil
Talassemia maior
Anemia falciforme
Fonte: FERNANDI,2010.
A DOENÇA
HOSPEDEIRO
DO
ENXERTO
CONTRA
O
A DECH é uma síndrome cuja patologia se
caracteriza pelo fato de células imunocompetentes
do doador, após o TCTH, serem responsáveis por
desencadear uma grande cascata de mediadores
inflamatórios (citocinas), que irão ativar o sistema
imunológico do receptor, fazendo com que o
mesmo, ataque e lesione órgãos e tecidos como
3
pele, fígado e todo o trato gastrointestinal (TGI).
E. Donnall Thomas e sua equipe médica, em
meados de 1957, foram os responsáveis pela
realização dos primeiros TCTH e também pela
descoberta da DECH.
Em 1962, esse grupo de pesquisa observou
uma síndrome secundária recorrente do processo
de TCTH que ocorria após a “pega” do enxerto e se
caracterizava pela presença de perda de peso,
quadro diarreico, lesões em pele e fígado, presença
de infiltrado linfocitário e aumento do tecido linfóide
4,14
no enxerto.
Diante dessa descoberta, em
1966,
Billingham, médico que também fazia parte da
equipe de Thomas, estabeleceu alguns critérios,
utilizados até hoje, que caracterizam o aparecimento
da DECH, são eles:
ü O enxerto deve possuir células imunocompetentes;
ü O receptor deve apresentar antígenos reconhecidos como não próprio pelas células
imunocompetentes da medula óssea enxertada;
ü O organismo do receptor deve ser incapaz de
destruir as células imunocompetentes presen5
tes no enxerto.
Atualmente, já estão bem estabelecidos os
fatores que podem favorecer a DECH:
ü Doadores não aparentados;
ü Incompatibilidade do sistema HLA;
ü Altas doses de quimioterapia no “regime de
condicionamento”, que podem vir a ocasionar
lesões no trato gastrointestinal (TGI) aumentando assim os níveis de secreção de citocinas.
A DECH possui algumas classificações e subclassificações, podendo se apresentar como, limitada, quando as lesões estão localizadas apenas na
pele ou em apenas um órgão; extensa, quando
ocorrem múltiplas lesões na pele e acometimento
de vários órgãos; e ainda como aguda (DECH-a) e
15
crônica (DECH-c).
DECHa e DECHc
A principal diferença entre DECHa e DECHc
se encontra no mecanismo distinto de ativarem o
sistema imune. Na DECHa o resultado final é a
ativação completa de linfócitos T alorreativos,
enquanto na DECHc estão envolvidos a ativação de
linfócitos T auto e alorreativos com formação de
4, 16,17
anticorpos, ou seja, ativação de linfócitos B.
A DECHa e DECHc eram classificadas e
diagnosticadas de acordo com o período em que
seus sinais de sintomas apareciam: DECHa se
manifestava em até 100 dias após o TCTH e a
DECH-c se manifestava no período após esses 100
dias. Em 2006, o National Institutes of Health (NIH),
padronizou os critérios de diagnóstico e
diferenciação para DECHa e DECHc, não mais
baseados no período em que ocorre e sim em seus
sinais e sintomas, sendo estabelecidos novos
15,18
critérios de classificação.
Assim, a DECHa pode ser subclassifica em:
ü Clássica: quando ocorre antes de 100 dias
após o TCTH e apresenta sinais e sintomas
como exantema maculopapular na superfície corporal e intenso quadro de diarreia,
náuseas, vômito, anorexia, íleo paralitico ou
hepatite colestática;
ü Tardia: quando seus sinais e sintomas aparecem após 100 dias da realização do
TCTH, acontece frequentemente após a retirada dos imunossupressores.
ü Grau I, II, III e VI, de acordo com a gravidade das manifestações clinicas (Tabela 2).
Tabela 2 - Manifestações Clínicas e Diagnóstico para
DECHa
Pele (rash
maculopapular)
Fígado
(Dosagem
de
Bilirrubina
Total)
Trato
Gastrointestinal
(Diarreia)
Grau
I
Presente em
menos de 50%
da superfície
corporal
Sem
alteração
dos valores
de
referencia
Sem quadro de
diarreia
Grau
II
Presente em
mais de 50% da
superfície
corporal
2,0 – 3,0
mg/dL
Entre 500 e 1.000
ml/dia, com
náuseas e
vômitos
Grau
III
Presente em
mais de 50% da
superfície
corporal
3,1 – 15,0
mg/dL
Acima de 1.000
ml/dia
Acima de
15,0 mg/dL
Dor abdominal
grave com ou sem
presença de íleo
paralitico.
Grau
IV
Eritroderma
generalizada com
presença de
bolhas e
descamação
Fonte: BOUZAS, 2010. (Adaptado)
E a DECHc é subclassificada como:
ü Clássica: na qual apresenta sinais e
sintomas como despigmentação da pele,
eritema, alopecia, artralgia, edema em
membros
superiores
e
inferiores,
insuficiência do pâncreas (Tabela 3);
ü Síndrome de Sobreposição: se caracteriza
pelo aparecimento dos sintomas clássicos
16,19
da DECHa e DECHc.
Tabela 3 – Manifestações Clínicas e Diagnóstico para DECH-c
Órgão ou Sistema
Pele
Unhas
Cabelos
Boca
Olhos
Trato
gastrointestinal
Fígado
Pulmão
Músculos e
Articulações
Alterações
Imunohematológicas
Outras
Sinais e Sintomas
- Despigmentação
- Alterações de Esclerose
- Hiper/hipopigmentação
- Edema
- Prurido
- Distrofia
- Unhas opacas
- Perda das unhas
- Alopecia cicatrizante ou não
- Descamação com pápulas no couro
cabeludo
- Restrição na abertura da boca pela
esclerose
- Xerostomia
- Úlceras
- Gengivite e mucosite
- Eritema
- Dor
- Ressecamento e dor
- Conjuntivite
- Fotofobia
- Hiperpigmentação periorbitária
- Blefarite
- Estenose do terço médio superior do
esôfago
- Insuficiência do pâncreas exócrino
- Dosagem de Bilirrubina total e
Fosfatase Alcalina > 2x acima do valor
de referência.
- ALT e AST > 2x maior que os valores
de referência.
-Bronquiolite obliterante (diagnóstico
através de biopsia pulmonar.
- Fasciíte
- Endurecimento das articulações
- Edema nas articulações
- Câimbras musculares
- Artralgia ou Artrite
- Trombocitopenia
- Eosinofilia
- Linfopenia
-Presença de Autoanticorpos (AHAI e
PTI)
- Derrame Pericárdico ou Pleural
- Neuropatia periférica
- Ascite
Fonte: BOUZAS, 2010. (Adaptado)
A COMPATIBILIDADE ENTRE O SISTEMA HLA
O Complexo Principal de Histocompatibilidade
(MHC), localizado na região do braço curto do
cromossomo 6 (6p 21.3), trata-se de uma região
do genoma humano responsável por uma grande
variabilidade de genes funcionais (loci). Em
humanos esse complexo é conhecido como
Antígenos Leucocitários Humanos (HLA), pois foi
detectado por J. Dausset, em 1958, na superfície
20
de leucócitos.
O sistema HLA pertence a um conjunto de genes
que possuem como principal função a de codificar
as principais moléculas encarregadas pela
apresentação do antígeno na superfície,
participando, portanto, da imunidade adquirida,
mas podendo participar da imunidade inata, por
meio de sua interação com as células Natural
5,21,22
Killer (NK).
Os genes HLA são os mais polimórficos do
genoma humano, com milhares de alelos
descritos.
Essas
moléculas
apresentam
numerosas funções do sistema imune, como:
responsabilidade pela seleção clonal, indução de
tolerância imunológica, imunidade mediada por
células T, resposta inflamatória e produtos
celulares como as citocinas e anticorpos. O
sistema HLA também esta está diretamente
relacionado ao processo de rejeição de órgãos e
tecidos e à suscetibilidade para algumas doenças
23
infecciosas e autoimunes.
O sistema HLA contém aproximadamente quatro
milhões de pares de bases e seus genes
encontram-se fisicamente agrupados dentro de
três regiões distintas, denominadas classe I, II e
III. A região classe I (porção mais telomérica)
apresenta os genes que codificam as moléculas
clássicas HLA-A, HLA-B e HLA-C e as moléculas
não-clássicas HLA-E, HLA-F, HLA-G. A região
classe II apresenta cinco loci, denominados DP,
DN, DO, DQ e DR, localizados próximo ao
6
centrômero.
As moléculas classe I estão presentes em todas
as células nucleadas e plaquetas, e são
responsáveis por apresentar antígenos (peptídeos)
aos linfócitos T citotóxicos (TCD8+). As moléculas
classe II são encontradas apenas em linfócitos B,
macrófagos, monócitos, células de Langerhans,
células dendríticas, células endoteliais e linfócitos
T quando ativados, são responsáveis pela
apresentação de antígenos aos linfócitos TCD4+.
Já as moléculas de classe III não possuem a
função
de
apresentar
antígenos,
sendo
responsáveis pelo sistema complemento (C2, C4 e
7,24
fator B) e pelo fator de necrose tumoral (FNT).
O reconhecimento dos antígenos pelos linfócitos
T através das moléculas do sistema HLA, podem
ocorrer por duas vias; a via citosólica, na qual a
molécula HLA classe I irá se associar ao antígeno
endógeno, essa associação ocorre com a ajuda
de três proteínas: a chaperonina que mantém o
complexo HLA estável até a ligação com a β2
microglobulina; a TAP (Transporter of Associated
Peptide), que aproxima o antígeno da molécula
HLA; e a LMP (Large Multipurpose Protease),
cuja função é degradar as proteínas sintetizadas
na célula em fragmentos constituídos por nove
aminoácidos. A molécula HLA classe I passa,
então, a expressar, na superfície de sua célula,
amostras de seu metabolismo protéico. Se
ocorrerem alterações nesses produtos do
metabolismo, elas serão reconhecidas pelo
sistema imune via linfócito T citotóxico (CD8). Na
via endolítica, o antígeno exógeno, fagocitado
pela célula e digerido por enzimas proteolíticas,
origina diversos peptídeos que se associam às
moléculas HLA classe II. O complexo formado
migra para a superfície da célula onde é
21
reconhecido pelo linfócito T auxiliar (CD4).
De acordo com Buhler et al. (2012), o elevado
polimorfismo nos genes HLA torna pouco provável
que dois indivíduos escolhidos aleatoriamente na
população expressem moléculas HLA idênticas.
Essa diferença genética pode ser vista como a base
da rejeição para os transplantes, que tem sido
considerada a barreira que impede seu sucesso,
pois ao reconhecer um antígeno incompatível com o
organismo do receptor, irá conduzir a resposta
imune celular e humoral, que por sua vez acarretará
na destruição do órgão ou enxerto transplantado.
A aloimunização é a formação de anticorpos
quando ocorre a exposição do indivíduo a antígenos
não próprios. Nos transplantes, as células
alogênicas do doador, que expressam as diferenças
polimórficas dos alelos HLA, são responsáveis pela
sensibilização do receptor. Dessa forma, os
linfócitos TCD4 recebem, através de seus
receptores de membrana, o primeiro sinal de
ativação que leva à sua proliferação e produção de
25
citocinas.
As citocinas, por sua vez, induzem a
expansão de clones de linfócitos TCD8 e a
diferenciação de linfócitos B em plasmócitos, que
irão secretar anticorpos específicos para os
determinantes antigênicos das moléculas HLA do
doador. A aloimunizacão pode ocorrer tanto pelos
antígenos HLA classe I, quanto pelos antígenos HLA
20
classe II.
O
PAPEL
DAS
CITOCINAS
IMUNOPATOGÊNIA DA DECH
NA
As citocinas são classificadas como proteínas
que possuem uma ampla distribuição em diversos
tipos celulares, conhecidas como mediadores
pleiotrópicos, possuindo papel muito importante na
comunicação celular.
Essa comunicação ocorre devido sua
interação com os receptores de membrana
presentes nas células, portanto, as citocinas
também podem ser conhecidas como glicoproteínas
23
transmembrânicas.
Esses estímulos bioquímicos gerados pelas
citocinas são responsáveis por desempenhar várias
funções, como influenciar o crescimento e
diferenciação de linfócitos e regular a intensidade da
26
resposta imune.
De acordo com estudos realizados por Jaksch
e Mattsson (2008), as citocinas são liberadas
durante o “regime de condicionamento”, período que
antecede o TCTH, no qual ocorre o processo de
destruição por irradiação e quimioterapia total da
medula óssea do receptor (ablação medular),
atuando como uma cascata enzimática que ativa
sequencialmente monócitos e linfócitos.
A imunopatogenia da DECH é complexa e
pode ser dividida em fase aguda e crônica, sendo a
26
fase aguda subdividida em três etapas.
Na etapa I, devido ao regime de
condicionamento, o processo de destruição da
medula óssea leva a uma lesão de vários tecidos do
receptor, incluindo mucosa intestinal e fígado, que
ocasiona a secreção das primeiras citocinas
inflamatórias: o Fator de Necrose Tumoral-α (TNF-α)
e as Interleucinas-6 e 1 (IL-6 e IL-1), que no póstransplante irá ocasionar:
ü Aumento da expressão do antígeno HLA, que
estimula os fatores de reconhecimento do
MHC e o Complexo de Histocompatibilidade
Secundário, conhecido como mHag (originais
das regiões polimórficas de proteínas presentes nas células-alvo do receptor);
ü Maturação de células dendríticas por ação da
IL-6;
ü Início do processo de ativação e maturação
de células TCD4 do doador (presentes no
transplante);
ü Liberação de lipopolissacarídeos, que irá aumentar ainda mais a produção de citocinas
TNF-α e IL-6, ocasionando dano celular ao
trato gastrointestinal;
ü Início do processo de apoptose endotelial.
Na fase II, irá ocorrer:
ü Proliferação das células TCD4, ativadas na
fase I;
ü Produção de citocinas inflamatórias IL-2 e
Interferon-γ (INF-γ) pelo Th1 que irão induzir
a expansão de linfócitos TCD4, TCD8 e NK;
ü Estimulação do antígeno HLA de classe I e
II, que potencializará a ativação dos linfócitos TCD8+ e TCD4+, respectivamente;
ü Ativação completa das células T devido ativação do antígeno B7 nas Células Apresentadoras de Antígenos (APCs) e consequente
ativação dos receptores CD28 e CTLA-4
nas células TCD4.
ü Produção de citocinas supressoras Th2 (IL4, IL-10, células T supressoras CD4- e CD8)
que irão tentar controlar a cascata do processo inflamatório e intensidade da DECH.
Na fase III irá ocorrer:
ü Ativação de fagócitos e células
mononucleares por ação do INF-γ;
ü Ativação
dos
queratinócitos
e
fibroblastos
por
ação
dos
lipossacarídeos,
ocasionando
manifestações tegumentares da DECH;
ü Produção de outros tipos de citocinas
pró-inflamatórias.
A fase crônica da DECH pode se manifestar
entre 3 a 6 meses após o TCTH, podendo ser
resultante da DECH aguda (forma progressiva) ou
não, e se caracteriza pelo reconhecimento tardio de
linfócitos T autorreativos do doador, que
reconhecem as diferenças alogênicas do receptor e
através de citocinas como IL-4 e INF-γ estimulam a
ativação de linfócitos B autorreativos, produzindo
assim auto-anticorpos que ocasionarão dano ao
enxerto pela ativação de células mononucleares e
fibrose tecidual, além da presença de atrofia e
14,15
disfunção tímica.
Assim, a seleção tímica para eliminação de
clones de células T alo ou auto-reativas se encontra
27
ineficaz.
Células do tipo Th1 e Th2 irão estimular a
produção das citocinas IL-4, INF γ e TNF-α, que por
sua vez, irão estimular a produção de colágeno e
produzir as lesões fibróticas características da
DECH crônica. Células do tipo Th3 também estão
presentes na síndrome da DECH crônica e irão
estimular a produção de Fator de Necrose TumoralBeta (TNF-β), que é responsável por ocasionar
mudanças esclerodérmicas na pele, pelo fato de ser
capaz de estimular a matriz extracelular e
imunossupressão prolongada, por também ser uma
citocina que atua desempenhando papel regulatório
28
no sistema imunológico.
POLIMORFISMOS GÉNETICOS NA DOENÇA DO
ENXERTO CONTRA O HOSPEDEIRO
Os polimorfismos genéticos correspondem a
variações naturais de um gene ou cromossomo.
Podem atuar como marcadores genéticos, já que
são transmitidos associados a outros genes
localizados na região cromossômica próxima a eles.
Essas variações na sequência de DNA
podem criar ou destruir sítios de reconhecimento de
enzimas de restrição e podem estar associados a
27
apenas uma base.
A frequência de alelos heterozigotos para o
polimorfismo genético ocorre geralmente numa
29,30
frequência superior a 1% na população geral.
A produção das citocinas está sob rigoroso
controle genético, assim polimorfismos nas regiões
codificadoras, íntrons ou regiões promotoras dos
genes associados à produção de citocinas, podem
alterar a ligação dos fatores de transcrição gênica,
causando variações na quantidade de citocina
31,32
produzida conforme a região gênica afetada.
Um indivíduo pode ser capaz de produzir
níveis altos, intermediários e baixos de citocinas de
acordo com a herança e expressão de alelos, sendo
este um fator atualmente ligado ao desenvolvimento
7,13
da DECH.
Nesse contexto, a variação individual da
resposta imune a transplantes esta relacionada à
variação genética na regulação da expressão dos
genes de citocinas. Vários genes já foram
associados ao desenvolvimento e gravidade da
DECH, bem como à sobrevida dos pacientes, por
modularem a intensidade da inflamação e os danos
19,33
teciduais após o TCTH.
Trabalhos
envolvendo
polimorfismos
genéticos de citocinas e suas correlações com a
DECH vêm apresentando resultados relevantes.
Contudo, ainda existem muitas discrepâncias entre
os estudos que tem avaliado essa relação entre o
sucesso do TCTH e a presença de polimorfismos
Nessa revisão, elencam-se os principais achados
sobre esta temática (Tabela 4).
Tabela 4 - Estudos sobre polimorfismos de genes de citocinas associados com a doença do enxerto contra o hospedeiro.
Polimorfismo
Características
Autor
SNP/ Genótipo
Dominici et al., 2002
IL1A-889 TT
↑ da resposta imunológica DECHa
IL1RN, IL1A889,
Incidência DECHa e DECHc e
IL1AVNTR
sobrevida após o transplante
Dinarello, 1996
Rocha et al., 2002; Cullup et al., 2001
Incidência DECHa de grau II-IV.
-330 G/G
(Macmillan et al., 2003)
John et al. (1998)
- 3X na produção de IL-2 em indivíduos homozigotos MacMillan et al. (2003b)
G\G quando comparados aos homozigotos T\T
Hoffmann et al., 2001
+166
Mutação silenciosa
John et al. (1998)
-174 G/G
↑ probabilidade de DECHa
Cavet et al. (2001)
-174 G/C e C/G
↑ probabilidade de DECHc
Cavet et al. (2001)
-1237 A/G
↑ da mortalidade
Shamim et al., 2006
IL-18
haplótipo GCG 137,607, ↓ do risco de mortalidade
Cardoso et al., 2004
656
Middleton
↑ da DECHa mais grave e DECHc, com baixa Cavet
IL-10
-1064
sobrevida.
et
et
Takahashi
Cavet
al.,
al.,
et
et
al.,
al.,
1998;
1999;
2000;
2001;
Nordlander et al., 2002;
Bettens et al., 2006
1082 G/G,
IL-10
IL-10
↑ incidência de DECHa ou DECHc.
Rocha et al. 2002
↑ incidência de DECHa com risco de mortalidade.
Dickinson et al. 2001
-1082,-592,
Socié et al., 2001
-819GCC/GCC
Keen et al., 2004
-592 A/A
↓ Incidência de DECH grau III e IV e morte em Lin et al., 2003
remissão
IL-10
haplótipo IL10 , -1082, - Risco aumentado de DECH crônica
Kimet al., 2005
819, -592ATA
Bogunia-Kubik et al., 2003;
Complicações tóxicas em transplantes HLA-idênticos Bettens et al., 2006
TNF-α
TNF-α íntron 2 (alelo A)
aparentados ou não e alta mortalidade
TNF-α
-308 GG/GA
Em HLA-idênticos não-aparentados à pega tardia de Takahashi et al. 2001
neutrófilos.
TNF-α
+488A
Forma grave de DECHa e mortalidade precoce na Mullighan, Bardy, 2004
DECHc
TNF
-863(C/A) e -857 (C/T)
Associado a DECHa grau III e IV. Menor recaída.
Ishikawa et al., 2002
TNF
-238G/A
Maior gravidade e incidência de DECH crônica
Viel et al., 2007
TNF
TNFd3/d3
↑ incidência de DECHa, grau III e IV e IL10 -1064, Klöger et al., 2000
DECHa severa.
Keen et al., 2004
Alta mortalidade em HLA-idêntico não-aparentado.
TNF
TNFd4
DECH moderada à grave em HLA-idêntico não- Nordlanderet al., 2002
aparentado
Awad et al., 1998
↑ incidência na DECHa, enquanto outros relatam que Leffell et al.,2001 e Hattori
TNFβ1
+869 e +915 TG/GG
92% dos indivíduos não desenvolveram a doença.
et al., 2002
Fibrose medular
Tambur et al., 2001
Pravica
INF-γ
+874AA
Risco de DECH aguda
et
al.,
1999;
Mlynarczewska et al., 2004
Considerações Finais
A Doença do Enxerto Contra o Hospedeiro
é uma síndrome clínica caracterizada por
inúmeros sintomas, sendo uma das principais
causas de morbimortalidade após o TCTH. Esta
reação ocorre devida uma resposta alorreativa
dos linfócitos do enxerto contra os antígenos de
histocompatibilidade do hospedeiro, sobretudo
após o transplante alogênico, embora tenha
ocorrido em casos raros de transplante autólogo.
Tendo em vista que o sistema HLA é
responsável pelo reconhecimento do próprio e
não próprio, a genotipagem HLA detalhada e nãoHLA pode ser útil para melhorar o curso do TCTH,
auxiliando na seleção do doador e identificando
receptores com alto risco para desenvolver a
DECH.
A DECH é um processo complexo e seu
controle não depende de um único agente, dessa
forma, o conhecimento da imunopatogênese é um
fator crucial para a prevenção ou controle da
doença.
Como perspectivas futuras, estudos de
polimorfismos gênico das citocinas poderão ser
usados como marcadores de prognóstico e
evolução dos pacientes pós TCTH. Além disso,
estudos de cinética da coexistência de células do
doador e do receptor que visa à detecção de
quimera mista pós-transplante estão sendo
desenvolvidos para diminuir os casos de rejeição
e DECH.
Enquanto isso, sugere-se que pesquisas
sejam realizadas para o desenvolvimento de uma
terapia imunossupressora adequada para os
pacientes que apresentarem a DECH.
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Anexo
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