Sistemas Eleitorais e Governabilidade

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Sistemas Partidários e Sistemas Eleitorais
Notas de Aula
1) Definições
Sistema Partidário = conjunto formado pelos partidos políticos, cuja
abordagem pode focalizar o número de partidos e a interação
competitiva entre estes e com os eleitores. Sua importância reside na
estruturação das escolhas dos representados e na estabilização política.
Sistema Eleitoral = fórmula para transformar votos em cadeiras no
Legislativo
2) Sistemas Partidários
O que explicaria o número de partidos de uma democracia, isto é, o
formato do sistema partidário?
Existem
três
explicações:
a
sociológica,
a
ideológica
e
a
institucionalista.
Na interpretação sociológica, o número de partidos tem ligação direta
com o número de clivagens (dimensões de conflito) sociais existentes. O
importante é saber que tipo de clivagem se manifesta de forma mais saliente
do que outras, que tipo de alianças elas produziram num determinado país, e
que conseqüências o conjunto de forças teve na construção de consenso
dentro de um estado nacional.
1
O livro de Lipset e Rokkan, Party Systems and Voters Alignements,
publicado em 1967 foi um marco para as explicações sociológica e
ideológica
dos sistemas partidários.
Nele
os autores
atribuem à
heterogeneidade dos interesses e grupos sociais a emergência de
diferentes sistemas partidários na Europa ocidental nos séculos 19 e 20.
Para eles, o número e a força relativa dos partidos europeus seria
determinado por dois eventos históricos cruciais:
-
uma revolução nacional (a construção de estados-nação modernos e
seculares)
-
a revolução industrial.
À medida que as elites estatais se engajavam na construção de um aparato
administrativo único e de uma burocracia centralizada, elas entraram em
conflito com dois grupos sociais: os membros de territórios periféricos e a
Igreja Católica.
Por sua vez, a revolução industrial gerou duas dimensões adicionais de
conflito: entre o campo e a cidade (sobretudo em torno de questões
comerciais) e, mais tarde, entre proprietários e trabalhadores.
O conflito capital-trabalho emergiu em todos os países, mas só adquiriu
significância plena com a extensão do sufrágio.
Limites da explicação sociológica
Os críticos mais radicais da abordagem sociológica questionam a suposição
de que os eleitores tenham preferências pessoais pré-existentes que os
políticos vão representar. Eles argumentam, ao contrário, que as
preferências políticas não existem na forma de um dado objetivo à espera
de partidos que os canalizem e mobilizem.
Para alguns críticos, preferências políticas simplesmente não existem. Os
eleitores são ignorantes, apenas interessados nos seus assuntos privados e
paixões, que um político ambicioso pode articular em torno de um princípio
ideológico que sirva aos seus próprios interesses.
Para outros, os eleitores têm preferências sobre políticas públicas e
grandes questões, mas estas são diversificadas demais para servir a
qualquer propósito prático, de modo que é difícil articulá-las com os grupos
e idéias mobilizados na arena eleitoral.
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Na versão ideológica, o número de partidos de um sistema partidário
decorreria do número de opiniões relevantes existentes na sociedade. De
acordo com essa interpretação, uma das razões para a criação de um novo
partido é a percepção dos organizadores de que há espaço para
representar
um
segmento
social
cujos
interesses
não
estavam
representados até então.
Limites da explicação ideológica
Os críticos da explicação ideológica argumentam que os políticos não são
motivados
ideologicamente
para
representar
certos
interesses
e
implementar as preferências de políticas públicas correspondentes. Ao
contrário, eles são apenas empresários do voto que avaliam as questões
que podem aumentar seu capital eleitoral, escolhem que grupos politizar e
mobilizar e de que maneira.
Muito empregada no contexto de estudos recentes sobre conflitos étnicos e
identidade nacional, esta abordagem já tinha sido avançada por Sartori no
final da década de 1960 e ganhou bastante fôlego nos últimos anos para
explicar a formação de novas clivagens em democracias recentes no
terceiro mundo e no antigo bloco soviético.
Já na perspectiva institucionalista, é a estrutura institucional que
explicaria o número de partidos de um sistema político. Segundo essa
abordagem, são atributos derivados de instituições democráticas, como por
exemplo, o sistema eleitoral, o sistema de governo e a estrutura do Estado
(federalista ou unitário), que poderiam explicar o formato dos sistemas
partidários. Isso porque, são essas regras que estabeleceriam o cenário
para a atuação dos partidos políticos.
Limites da explicação institucionalista
As regras e a estrutura institucional podem explicar o número de partidos,
mas não a sua localização espacial e ideológica, nem o tipo de suporte
ideológico que os sustentam.
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Modelos institucionais não prevêem facilmente a
possibilidade de
mudanças. Os institucionalistas puros encaram as regras institucionais
como um equilíbrio que se auto sustenta.
3) Sistemas Eleitorais
Distrito Eleitoral = divisão administrativa na qual se realiza a eleição
Magnitude Eleitoral (M) = número de cadeiras em disputa em um
determinado distrito eleitoral
3.1) Sistemas Majoritários ou Distritais
M=1
Há tantos distritos quanto for o número de cadeiras em disputa
3.1.1 Maioria simples ou relativa (First past the post FPTP)
→ Inglaterra
Lógica do sistema = concentrar votos em alguns distritos
Quando há um só turno, acarreta uma diminuição do número de
partidos, mas introduz distorções na representação.
Inglaterra, outubro de 1974: os Trabalhistas fizeram 319 das 635
cadeiras com apenas 39,3% da votação total, enquanto os Liberais
ganharam apenas 13 cadeiras com 18,6% da votação
3.1.2 Sistema de dois turnos
→ França
1º turno escolhe, 2º turno elimina
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3.1.3 Voto alternativo
→ Austrália
o eleitor numera os candidatos em ordem de preferência
3.2) Sistemas Proporcionais
M>1
Inspirados na sugestão de Mirabeau que afirmava em 1789 que a
função do parlamento era refletir o mais fielmente possível as feições do
eleitorado, tal como um mapa reproduz em miniatura os diferentes
traços geográficos de um território.
3.2.1 Sistema de voto único transferível (single transferable vote STV)
→ Irlanda (1921)
Os eleitores assinalam suas preferências na cédula
É o eleitor que controla a transferência de votos
3.2.2 Representação proporcional de lista
→ Bélgica (1899)
3.2.3 Quantas cadeiras cada partido recebe
Fórmulas das maiores médias
Os métodos das maiores médias dividem os votos recebidos
pelos partidos por números em série. Feita a divisão, os
partidos que obtêm resultados com maiores valores ocupam
as cadeiras disputadas.
a) Fórmula D’Hondt (divisores = 1, 2, 3, 4, etc)
utilizada na maioria dos países, favorece os maiores
partidos
b) Fórmula Sainte-Laguë (divisores = 1, 3, 5, 7, etc)
utilizada apenas na Nova Zelândia, mais equânime
5
c) Fórmula Sainte-Laguë modificada (divisores = 1,4; 3; 5;
7; etc)
Noruega e Suécia, dificulta o acesso dos pequenos
partidos
Fórmulas de maiores sobras
Primeiro calcula-se o quociente eleitoral, que servirá para o
preenchimento inicial das cadeiras.
Depois distribuem-se as cadeiras não ocupadas no primeiro
estágio, de acordo com as maiores sobras de cada partido.
a) Quota Hare = nº votos / nº cadeiras
mais proporcional (Colômbia, Costa Rica, Dinamarca,
Madagascar)
b) Quota Droop = nº votos / (nº cadeiras + 1)
favorece os maiores partidos (África do Sul, Grécia,
República Tcheca)
No Brasil
No Brasil calcula-se o quociente eleitoral de acordo com a
Quota Hare para a distribuição das primeiras cadeiras. Em
1945, as cadeiras não ocupadas eram destinadas ao partido
mais votado em cada estado. Desde 1950, as sobras são
alocadas de acordo com a fórmula D’Hondt. (nas eleições de
1998, os votos em branco deixaram de ser contabilizados
para o cálculo do quociente eleitoral)
Cláusula de exclusão
É o mínimo de votos (em termos absolutos ou percentuais)
que
um
partido
necessita
receber
para
garantir
representação parlamentar.
Tem por conseqüência dificultar o acesso dos pequenos
partidos ao Legislativo.
→ na Alemanha, um partido precisa alcançar 5% dos votos
nacionais para garantir representação na Câmara Baixa.
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3.2.4 Que candidatos, de cada partido, ocuparão as cadeiras
Definidas quantas cadeiras cada partido conquistou, resta
saber quem de cada partido ocupará essas cadeiras. O
sistema proporcional de lista necessita de critérios para
distribuir as cadeiras conquistadas pelos partidos entre os
candidatos de cada lista.
a) lista fechada = os partidos definem previamente o
ordenamento dos candidatos, cabendo
aos eleitores exclusivamente votar na
legenda. (novas democracias: África do
Sul, Argentina, Uruguai, Espanha,
Portugal, Israel; e Itália a partir de 2006)
b) lista aberta = o eleitor define a ordem da lista (Brasil,
Chile, Finlândia, Peru, Polônia)
c) lista livre = o eleitor pode votar em apenas um partido
ou
escolher
vários
candidatos
(Suíça,
Luxemburgo)
d) lista
flexível
=
os
eleitores
podem
intervir
no
ordenamento da lista feito pelo partido
(Bélgica, Holanda, Dinamarca, Áustria,
Suécia, Noruega)
e) coligações eleitorais = permitem que pequenos partidos
eleitorais tenham mais chances de obter representação
3.3) Sistemas Mistos
Sistemas Mistos são aqueles que utilizam, simultaneamente, aspectos
dos dois modelos de representação (proporcional e majoritário) em
eleições para o mesmo cargo.
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Sistemas de combinação = combinar as virtudes das duas famílias de
sistemas eleitorais
→ novas democracias (Coréia do Sul, Rússia, Taiwan e Ucrânia)
Sistemas de correção = compensar com representantes eleitos pelo
sistema proporcional as distorções na relação votos/cadeiras produzidas
pelas eleições majoritárias
→ Alemanha (1949), México (1963)
(década de 90: Bolívia, Hungria, Itália, Nova Zelândia e Venezuela)
4) Conexão entre os sistemas eleitorais e os sistemas
partidários
Descrição dos sistemas partidários
Número efetivo de partidos
Tamanho relativo dos partidos
Fórmulas matemáticas para descrever os sistemas partidários
Posição relativa dos partidos no espectro ideológico
Sartori = após descartar os partidos que não obtiveram cadeiras no
Parlamento, os partidos relevantes são os que têm potencial de
coalizão ou chantagem.
Blondel = leva em consideração tanto o número quanto os tamanhos
relativos dos partidos (partidos dominantes, meio partido)
Índices Matemáticos
Índice de Laakso e Taagepera:
N = 1 .,, onde si é a proporção de cadeiras do partido i.
• Σ si2
Este índice (N) traz a mesma informação que o índice de fragmentação
(F) de Rae e Taylor:
N=
1 .
1-F
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Posição relativa dos partidos
Sartori sugere descrever os sistemas partidários em categorias que
dependem da posição relativa dos partidos entre eles
- Pluralismo polarizado
- Pluralismo moderado
- Bipartidarismo
- Partido predominante
Leis de Duverger
● A eleição majoritária de um só turno tende ao dualismo de partidos
● A eleição majoritária em dois turnos ou a representação proporcional
tendem ao multipartidarismo
Explicações das leis de Duverger: efeito mecânico e efeito psicológico
Efeito mecânico = todos os sistemas eleitorais tendem a favorecer os
maiores partidos
Efeito psicológico = nenhum eleitor gosta de desperdiçar o voto
Reavaliação das Leis de Duverger
Sartori = Duverger confunde dualismo partidário, bipartidarismo real e
bipolarização; ausência de critérios e definições claras para a contagem
inequívoca do número de partidos
Sistemas bipartidários: ambos os partidos tendem para o centro
O que incentiva a governabilidade é o fato de os partidos serem
próximos ideologicamente (perto do centro). O que não acontece nos
sistemas polarizados descritos por Sartori
Riker = sistemas majoritários de um só turno não impedem o surgimento
de um terceiro partido, que podem tanto criar quanto extinguir, fato que
depende muito mais das preferências dos eleitores
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Douglas Rae = sugere a necessidade de introduzir a variável Magnitude
do Distrito na explicação;
→ os atributos do sistema partidário no plano eleitoral não
necessariamente os mesmos do sistema no plano parlamentar
→ Conclusão de Rae = os efeitos da fórmula eleitoral e da magnitude
do distrito são marginais quanto ao seu impacto no sistema partidário,
cujo formato é, em última instância, determinado pela distribuição real
das preferências manifestadas através do voto pelo eleitorado.
Taagepera e Shugart = os sistemas eleitorais não surgem no vácuo,
eles resultam do conflito e do debate políticos, e tendem a ser alterados
quando suas cláusulas são vistas como restritivas da atividade política.
O efeito redutor do número de partidos é, em parte, contido pelo
número de questões relevantes que perpassam a sociedade, pois o
número de partidos existentes depende desse número → dimensão
externa ao sistema eleitoral
Reafirmam, concordando com Rae, a importância da magnitude
dos distritos = quanto maior a magnitude, maior a proporcionalidade
Lijphart = consolida os achados pioneiros de Duverger e Rae
Lijphart estabelece que o efeito da fórmula é maior do que Rae
supõe e ordena as fórmulas básicas em função do seu efeito
proporcionalizante, do efeito mais acentuado para o menor:
Sainte-Lägue, Hare, Sainte-Lägue modificada, Quota, Imperiali,
STV, d’Hondt, pluralidade e maioria.
nº efetivo de partidos eleitorais → Efeito psicológico
nº efetivo de partidos parlamentares → Efeito psicológico e efeito
mecânico
Gary Cox = sugere classificar os sistemas eleitorais em duas novas
categorias:
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-
sistemas que produzem incentivos centrípetos
(aumento no número de votos por eleitor, combate à
abstenção, diminuição na magnitude do distrito) : a
estratégia dos candidatos é convergir para o centro
-
sistemas que produzem incentivos centrífugos :
a estratégia dos candidatos é se dispersar ao longo do
espectro ideológico
Richard Katz = devemos ir além do número de partidos para verificar a
conexão entre sistemas eleitorais e governabilidade.
Governabilidade está relacionada com a estabilidade do governo:
-
governo de coalizão ou não
-
governo de maioria ou de minoria
-
durabilidade do governo
-
correspondência entre os resultados eleitorais e
a escolha do governo (o governo formado é o único
possível? Corresponde ao desejo dos eleitores?)
5) Considerações finais
Sistemas eleitorais podem obstruir ou tolher a criação ou o
funcionamento de partidos, novos ou antigos, fazendo-os desaparecer,
mas nenhum sistema eleitoral gera por si só novos partidos ou mesmo
todas as condições necessárias e suficientes à sua instituição e ao seu
funcionamento. Para lograr esse resultado, condições rigorosamente
sociais, que não podem ser substituídas por provisões institucionais, são
necessárias.
Representação proporcional leva ao voto sincero
Eleições majoritárias levam ao voto estratégico
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Avaliação dos sistemas eleitorais
Para avaliar um sistema eleitoral, ou desenhar um novo, é necessário
em primeiro lugar saber o que se espera de um sistema eleitoral.
Nenhum sistema eleitoral simplesmente reflete as preferências dos
eleitores, ou as clivagens existentes na sociedade, ou ainda a
configuração do sistema partidário. Todo sistema eleitoral influencia
esses aspectos e cada um o faz à sua maneira.
Pode-se então falar em objetivos dos sistemas eleitorais, mesmo que,
dado que não constituem a única influência no sistema político, a
reforma
do
sistema
eleitoral
possa
trazer
mudanças
apenas
incrementais.
Há vários objetivos possíveis para os sistemas eleitorais que podem ser
compatíveis, ou não, com outros objetivos, por isso devem ser bem
esclarecidos.
Objetivos possíveis dos sistemas eleitorais:
1-
Proporcionalidade entre votos e cadeiras = cada vez
mais os sistemas eleitorais são julgados pela sua capacidade de
reproduzir no parlamento as preferências dos eleitores
2-
Accountability
dos
representantes
=
os
sistemas
eleitorais que limitam o poder dos líderes partidários de escolher os
candidatos produzem deputados mais responsivos
3-
Governos estáveis = a redução do número de partidos
facilita a formação de coalizões e torna os governos mais estáveis
4-
Vitória do vencedor de Condorcet = o vencedor de
Condorcet é o candidato que seria o mais votado quando
confrontado com cada um dos outros candidatos, se tomados dois a
dois
5-
Conciliação inter-étnica e inter-religiosa = os sistemas
eleitorais que favorecem essa conciliação são aqueles que induzem
os candidatos a um comportamento moderado de maneira que
chegam a um acordo com adversários de outras etnias ou religiões
6-
Representação das minorias
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6) Bibliografia para aprofundar a questão
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