Simone Agadir de Azevedo Santos Prevalência de transtornos mentais nos casos de tentativas de suicídio atendidos em um hospital de emergência na cidade do Rio de Janeiro Dissertação apresentada ao Programa de Pós- graduação em Saúde Coletiva do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Saúde Coletiva. Orientadora Professora Doutora Letícia Fortes Legay Rio de Janeiro – RJ Universidade Federal do Rio de Janeiro 2008 Santos, Simone Agadir de Azevedo Prevalência de transtornos mentais nos casos de tentativas de suicídio atendidos em um hospital de emergência na cidade do Rio de Janeiro / Simone Agadir de Azevedo Santos – Rio de Janeiro: UFRJ / IESC, 2008. ix, 86, f.: il.; 31 cm. Orientador: Letícia Fortes Legay Dissertação (mestrado) – UFRJ/IESC, Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva, 2008. Referências bibliográficas: f. 61-70 1. Transtornos mentais - epidemiologia. 2. Tentativa de suicídio. 3 Prevalência. 4. Estudos transversais. 5. Humanos. I. Legay, Letícia Fortes. II. Universidade Federal do Rio de Janeiro, IESC, Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva. III. Título. II Simone Agadir de Azevedo Santos Prevalência de transtornos mentais nos casos de tentativas de suicídio atendidos em um hospital de emergência na cidade do Rio de Janeiro Dissertação apresentada ao Programa de Pós- graduação em Saúde Coletiva do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Saúde Coletiva. Aprovada em 14 de outubro de 2008. Banca Examinadora: Prof. Dra. Letícia Fortes Legay, IESC/UFRJ Prof. Dra. Edinilsa Ramos de Souza, ENSP/FIOCRUZ Prof. Dr. Giovanni Marcos Lovisi, IESC/UFRJ Rio de Janeiro 2008 III Agradecimentos À minha família, por sempre me apoiar nos meus projetos, incentivando e torcendo muito por mim! Muito obrigada! Ao Lucas, meu afilhado, minha paixão! À Katita e Naná por simplesmente estarem comigo sempre! À professora Drª. Letícia Legay, minha orientadora, e ao professor Dr. Giovanni Lovisi, que com confiança e carinho me estimularam a buscar sempre o melhor de mim. À professora Drª. Lúcia Abelha, por todo apoio e estímulo ao longo do curso, acreditando na realização deste trabalho. À Guará, que através de uma grande amizade e apoio incondicional, permitiume hoje estar concluindo mais esta importante etapa da minha vida profissional. À Vivian e Dayse, que compartilharam comigo todas as dificuldades do campo. À Margarida e aos profissionais do Hospital Souza Aguiar, pelo apoio durante a pesquisa. À Adriana, Cristiane, Daniele, Érika e Tatiana, pela paciência, compreensão e apoio neste momento de tantas ausências. Aos professores Drª. Edinilsa Ramos de Souza e Dr. Guilherme Werneck pela gentileza com que aceitaram o convite para compor minha banca. Aos meus colegas de mestrado, Priscila, Cristina, Diego e Sylvia pelo apoio e carinho! IV Desilusão: Tentativa de suicídio de uma menina de 16 anos... Hoje de manhã quando acordei Mais uma vez com a minha sociedade me revoltei Uma menina de 16 anos o suicídio tentou Quando sua mãe se apercebeu, em pânico entrou Um médico consultou Deste problema lhe falou Com a sua vida tentou acabar Pois o seu grande amor com ela não quis continuar O Médico, rápido, arranjou solução “Teremos que ver a sua evolução” Evolução? Qual evolução? O caminho mais rápido para o caixão? Vamos lá acordar Hoje aquela menina de novo ia tentar Se a sua mãe, a mochila não fosse verificar A menina iria com tudo acabar Uma caixa de comprimidos foi encontrar Mas segundo o Médico, há que esperar Temos que esperar Que a morte se venha consolidar Para que aquele Médico perceba que uma Intervenção em crise Lhe deveria aplicar Aqui Jaz a Sociedade que Idealizo Cathia Chumbo (http://www.luso-poemas.net/modules/news/article.php?storyid=20477) V Resumo O objetivo deste estudo foi o de estimar a prevalência dos transtornos mentais de todos os casos de tentativas de suicídio atendidos em um hospital de emergência na cidade do Rio de Janeiro, durante o período de 2006 a 2007, utilizando um instrumento para avaliação diagnóstica (Composite International Diagnostic Interview). A prevalência de transtornos mentais encontrada foi de 71,9%, sendo os mais freqüentes: episódio depressivo maior (38,9%), uso de substâncias psicoativas (21,9%), transtorno de estresse pós-traumático (20,8%), abuso/dependência de álcool (17,7%) e esquizofrenia (15,6%). A maioria da amostra foi composta por mulheres, baixo nível educacional, faixa etária jovem, utilizando mais ingestão de medicamentos como método e mais relato de história de suicídio na família. Os homens apresentaram significativamente mais transtornos de ansiedade, abuso/dependência de álcool, história de transtorno mental na família e desemprego. Tais achados são similares principalmente a estudos conduzidos em países em desenvolvimento como Israel, Ilhas Fiji e Índia. Os transtornos mentais são importantes na compreensão do comportamento suicida, contudo, estes transtornos e as tentativas de suicídio podem ser conseqüências do contexto socioeconômico, gerando a necessidade de desenvolvimento de políticas e ações públicas que reduzam o desemprego e educação, além do acesso efetivo aos tratamentos dos transtornos mentais. Palavras-Chave: Transtornos mentais; Tentativas de suicídio; Estudo seccional; Prevalência. VI Abstract The main objective of this paper was to estimate the prevalence of mental disorders of all cases of suicide attempts assisted in Rio de Janeiro’s emergency rooms between 2006 and 2007 using a diagnostic evaluation instrument (Composite International Diagnostic Interview). The prevalence of mental disorders found was of 71.9%, being the most frequent: Major Depressive Episode (38,9%), Use of Psychoactive Substances (21,9%), Posttraumatic Stress Disorder (20,8%), Alcohol Abuse/Dependence (17,7%) and Schizophrenia (15,6%). The majority of the sample was of young women, with low education, using more ingestion of drugs as the method of choice and having reported history of suicide in the family. The men had significantly more Anxiety disorder, alcohol abuse/dependence, history of mental disorder in the family and unemployment. These findings are similar mainly to the surveys conducted in developing countries as Israel, Fiji Islands and India. The mental disorders are important to the understanding of suicide behavior, however these disorders and the suicide attempts can be consequences of socioeconomic context generating the need of the development of public policies and actions to reduce unemployment and the improvement of education and above all the access to effective treatment of mental disorders. Key Words: Mental Disorders; Suicide Attempts; Cross-sectional Study; Prevalence. VII Índice Resumo VI Abstract VII Índice de figuras, quadros, gráficos e tabelas IX 1. Introdução 10 1.1. A evolução do conceito de suicídio e sua complexidade 10 1.1.2. Perspectiva sociológica 1.1.3. Perspectiva psicológica 1.1.4. Perspectiva psiquiátrica 11 12 13 1.2. Epidemiologia do suicídio no Brasil e no mundo e sua importância como questão de saúde pública 14 1.3. A questão das tentativas de suicídio 21 1.4. Magnitude dos transtornos mentais e sua relação com suicídio e tentativa 22 2. Justificativa 35 3. Hipótese de trabalho 36 4. Objetivos 36 4.1. Objetivo geral 4.2. Objetivos específicos 5. Material e métodos 5.1. Desenho de estudo 5.2. Local de estudo 5.3. População do estudo 5.4. Instrumentos 5.4.1. Características sociodemográficas e clínico-epidemiológicas 5.4.2. Instrumento utilizado na avaliação dos transtornos mentais 5.5. Coleta de dados 5.6. Aspectos éticos 5.7. Análise de dados 36 36 37 37 37 38 39 39 40 41 43 43 6. Artigo: Prevalência de transtornos mentais nas tentativas de suicídio em um hospital de emergência no Rio de Janeiro 44 7. Referências bibliográficas 61 8. Anexos 71 VIII Índice de Figuras, Quadros, Gráficos e Tabelas Figura 1. Mudanças na distribuição mundial por idade de casos de suicídio entre 1950 a 2000. 18 Quadro 1. Estudos internacionais que relacionam suicídio com presença de transtornos 25 mentais. Quadro 2. Estudos internacionais que relacionam tentativas de suicídio e transtornos mentais. 27 Quadro 3. Estudos brasileiros que relacionam tentativas de suicídio e transtornos mentais. 32 Gráfico 1. Taxas de suicídio (por 100.000) no mundo, segundo sexo e idade, 1998 a 2000. 17 Tabela 1. Taxas de suicídio (por 100.000), segundo sexo, em diferentes países, 2004. 16 Tabela 2. Taxas de suicídio (por 100.000), segundo sexo, no Brasil, 2004. 20 Artigo: Tabela 1. Distribuição das variáveis sociodemográficas nos casos de tentativas de suicídio no 51 HMSA, Rio de Janeiro, período 2006-2007. Tabela 2. Distribuição de variáveis clínico-epidemiológicas nos casos de tentativas de suicídio 52 no HMSA, Rio de Janeiro, período 2006-2007. Tabela 3. Prevalência de transtornos mentais nos casos de tentativas de suicídios no HMSA, Rio de Janeiro, período 2006-2007. IX 53 1. Introdução 1.1. A evolução do conceito de suicídio e sua complexidade A palavra suicídio é formada a partir do latim sui (si próprio) e caedere (matar): matar a si próprio. O seu autor parece ter sido Sir Thomas Browne, que em 1642, utilizou-a pela primeira vez em seu livro Religio Medici com a finalidade de diferenciar a morte auto-infligida da morte provocada contra o outro (homicídio) (WHO, 2002). O suicídio há muito se revelou um fenômeno complexo que envolve inúmeras variáveis e áreas de conhecimento, num campo interdisciplinar e intersetorial (Cassorla & Smeke, 1994; Minayo, 1998). As mortes por suicídio encontram-se situadas no grupo das mortes por causas externas. A Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde, 10ª revisão/CID–10 (OMS, 2000), implantada no Brasil em 1996, inclui o capítulo Causas Externas de Mortalidade e Morbidade, no qual as mortes por suicídio passam a ser classificadas nos códigos X60 a X84. Na versão anterior (CID – 9ª revisão), os óbitos por causas externas (homicídios, suicídios, acidentes de trânsito e outros agravos acidentais) eram parte do capítulo referente à Classificação Suplementar de Causas Externas de Lesões e de Envenenamentos. Esta mudança permite uma maior especificidade para determinadas doenças e agravos (Laurenti, 1997). Estudos recentes enfatizam sobre a importância de se avaliar a intencionalidade no comportamento suicida, visando uma melhor definição do termo tentativa de suicídio como proposta para uma redução dos problemas metodológicos encontrados nas pesquisas sobre o tema e melhor planejamento das ações de prevenção. Para tanto, enfatizam que a intencionalidade encontra-se proporcionalmente relacionada à letalidade da tentativa, ou seja, quanto maior a intenção de morrer, maior a letalidade do método (Nock & Kessler, 2006; Kumar et al., 2006). Contudo, para o presente estudo, utilizou-se a definição adotada pela OMS (2002): comportamento suicida não fatal para os atos que não resultem em morte. Muitos estudos já foram realizados sobre suicídio. Minayo (1998) levanta duas possibilidades: a mobilização social e pessoal que o tema provoca, 10 hipótese preferida pela autora, e certo mimetismo acadêmico, no qual o tema em destaque provoca uma série de estudos. Há muito o tema tem sido discutido seja pela filosofia, psiquiatria, psicologia, ciências sociais, teologia, enfim, uma produção que parece confirmar a primeira hipótese da referida autora. E, mesmo com toda a produção, o suicídio continua sendo um tema complexo que envolve diversas áreas de conhecimento e de grande importância para a saúde pública. 1.1.2. Perspectiva sociológica Entre todas as obras sobre o tema suicídio, Émile Durkheim possui o estudo mais clássico e discutido, mesmo nos dias atuais (Nunes, 1998; Minayo, 1998). Durkheim (1983), em 1897, propõe a seguinte definição de suicídio: “Chama-se suicídio todo caso de morte que resulta direta ou indiretamente de um ato positivo ou negativo praticado pela própria vítima, ato que a vítima sabia dever produzir este resultado. A tentativa de suicídio é o ato assim definido, mas interrompido antes que a morte daí tenha resultado.” (Durkheim, 1983, p. 167) Na sua obra Durkheim propõe-se a colocar em prática a metodologia sociológica que desenvolveu e esclarecer as condições determinantes da taxa social dos suicídios, afirmando que as variações nos números de suicídios são conseqüências de alguma crise que afeta o estado social. Seguindo sua premissa de que a sociedade age de modo coercitivo sobre o indivíduo, ele desenvolve o seu estudo excluindo as pessoas que sofrem de alguma doença mental ou psíquica, isto para descrever as condições sociais que provocam as variações nas taxas de suicídio, ou seja, a taxa social do suicídio. Durkheim classifica o suicídio em quatro categorias. A primeira é o suicídio egoísta, que se caracteriza pela falta da integração do indivíduo com a sua família ou sociedade. O autor analisa as taxas de suicídio pelos aspectos religioso, estado civil e outros, concluindo que a força dos laços sociais determinaria a freqüência do evento. 11 A segunda categoria é o suicídio altruísta. Nesta, Durkheim destaca que integração à sociedade é de total fusão. O suicídio é visto como um dever, uma questão de honra. A terceira, o autor chama de suicídio anômico e a sua ocorrência se deve à falta de regras nas atividades humanas. O quarto tipo é o suicídio fatalista. Este seria o inverso do tipo anômico, pois há um excesso de regulamentação. Durkheim o considerou muito raro e, portanto, não se ateve muito a sua investigação. Numa perspectiva mais ampla, Corrêa & Barrero (2006) citam o trabalho de Andrew Henry e James Short, que em 1954, publicaram o livro Suicide and Homicide, no qual introduziram conceitos de psicologia à análise sociológica. Os autores defendem que as alterações nas taxas de suicídio e de homicídio encontram-se em relação com os ciclos econômicos, podendo ser explicadas como reações agressivas às frustrações provocadas por esses ciclos. De certo modo, percebe-se alguma convergência com o pensamento de Durkheim, no que diz respeito às alterações dos estados sociais, entre as quais se incluíam as crises econômicas. Todavia, Henry e Short divergem do autor ao incluir um aspecto que este tanto havia se esforçado para não abordar em sua metodologia: os aspectos psicológicos. 1.1.3. Perspectiva psicológica De um modo geral, o núcleo da agressão é reconhecido nas diversas teorias sobre o suicídio (Werlang & Botega, 2004). Contudo, a intencionalidade sempre é trazida à tona quando se fala sobre o tema e por sua vez, esta é algo muito difícil de precisar, com exceção dos casos nos quais o suicida relatou diretamente a sua intenção de morte. Uma tentativa de suicídio fracassada não permite a inferência de não ter havido neste ato uma real intenção de morte, assim como nem todos os suicídios são planejados (OMS, 2002). Shneidman, Farberow e Litman (1969 apud Werlang & Botega, 2004)1 propõem uma classificação da morte, com orientação psicológica. A classificação é composta por três categorias: intencional, subintencional e nãointencional. Uma morte intencional é aquela na qual o indivíduo atua direta e 1 WERLANG, MACEDO & KRÜGER (2004). Perspectiva psicológica. In: WERLANG, B. G. & BOTEGA, N. J. (org.). Comportamento Suicida. Porto Alegre: Artmed, 2004. 12 conscientemente para atingi-la. Na morte subintencional, o objetivo é atingi-la através de um ato parcial ou inconsciente. A morte não-intencional seria qualquer morte, desde que independente do estado psicológico de quem a sofra. A partir desta classificação, Shneidman (1992 apud Werlang & Botega, 2004) apresentou um modelo teórico de suicídio com três dimensões: dor, perturbação e pressão. Neste modelo, o indivíduo consegue viver numa intensidade baixa dessas dimensões, mas quando elas tornam-se máximas, o resultado será o suicídio, o homicídio e/ou a psicose. Assim, o suicídio tem a função de aliviar o sofrimento. A terapia cognitiva de Beck é uma abordagem diretiva e estruturada, utilizada no tratamento de diversos transtornos psiquiátricos. Ela preconiza que o humor e o comportamento de um indivíduo são determinados pelos pensamentos, estes podem ser funcionais ou disfuncionais (Beck, 1997). Beck et al (1982) argumentam que a intenção suicida deve ser considerada como um continuum. Assim, num extremo, existe a intenção absoluta de se matar e, no outro, a intenção de viver. Diferentes formas e graus de intenção encontram-se neste continuum. Esta idéia, na publicação original em 1979, encontra-se em acordo com a proposta da OMS (2002) a respeito do termo de comportamento suicida compreender desde o pensamento de se matar, até o planejamento e a aquisição dos meios para cometer o suicídio. 1.1.4. Perspectiva psiquiátrica A existência de um transtorno mental é apontada como o principal fator de risco para o suicídio. Bertolote & Fleischmann (2002) apontam os transtornos de humor, esquizofrenia, transtornos de uso de substância e transtornos de personalidade como os principais dentre os fatores de risco para o suicídio. Estudos têm revelado que mais de 80% das pessoas que cometeram suicídio apresentavam sintomas de depressão grave, tornando a depressão o transtorno mental mais associado ao suicídio (WHO, 2002). A esquizofrenia também se encontra fortemente associada ao suicídio. O risco de suicídio ao longo da vida nas pessoas que sofrem de esquizofrenia 13 é estimado em aproximadamente de 10 a 12 vezes, sendo os pacientes masculinos jovens e aqueles que apresentam o sentimento de “desintegração mental” os que possuem o risco mais forte (WHO, 2002). O abuso de álcool e drogas igualmente possui um papel importante no suicídio. O risco de suicídio é até 60 vezes, em pessoas com dependência de álcool e até 20 vezes, na dependência de drogas (Harris & Barraclough, 1997). A avaliação e o tratamento desses e outros transtornos tornam-se assim os principais componentes para estratégias de prevenção do suicídio. Como este assunto será mais bem discutido no tópico Magnitude dos Transtornos Mentais e sua Relação com Suicídio e Tentativas, aqui foi feita apenas uma breve referência ao assunto. 1.2. Epidemiologia do suicídio no Brasil e no mundo e sua importância como questão de saúde pública No ano 2000, a OMS relatou que aproximadamente um milhão de pessoas morreram por suicídio, com uma taxa global de 16 por 100 mil habitantes. Isto representa uma morte a cada 40 segundos (WHO, 2007). As taxas mundiais de suicídio apresentam variações conforme idade, sexo e país. Estudos desenvolvidos no Brasil têm revelado a tendência progressiva de aumento nas suas taxas, principalmente entre as idades de 15 a 24 anos (Souza, Minayo & Malaquias, 2002; Yunes & Zubarew, 1999). Durante o período de 1980 a 2000, a taxa de mortalidade por suicídio aumentou em 21%. O Brasil se encontra entre os 10 primeiros países com a maior freqüência absoluta (Mello-Santos, Bertolote & Wang, 2005). A coleta de informações sobre o suicídio é um grande problema para o conhecimento da real dimensão deste evento no mundo. A OMS recebe dos países-membros dados recentes disponíveis sobre mortalidade, contudo, há países sem infra-estrutura e recursos para obter os dados de todos os óbitos que ocorrem num determinado período. As informações sobre a mortalidade são retiradas das Declarações de Óbito (DO), pelo fato de serem padronizados internacionalmente em acordo com a CID (OMS, 2000). Há uma grande variação no modo como essas informações sobre a mortalidade são preenchidas. A OMS recomenda cuidado no uso dos dados 14 sobre o suicídio, mesmo nos países com critérios padronizados de registro, pois a aplicação do mesmo pode ainda assim variar. São inúmeros os motivos que levam ao mau registro dessas informações. Questões burocráticas como datas de encerramento para estatísticas oficiais; variações dentro de um mesmo país por causa das fontes de dados; aspectos culturais e religiosos que podem encobrir o suicídio e a má classificação como causa indeterminada (WHO, 2002). Estas questões dificultam a utilização dos dados e com isto a um conhecimento real das informações estatísticas sobre o suicídio. Bertolote & Fleischmann (2002) relatam que, em alguns lugares, é possível que a subnotificação esteja entre 20 a 100%. Para o Brasil, Cassorla & Smeke (1994) alertaram para o fato de algumas variações nas taxas de suicídio serem resultados de alteração da qualidade das informações sobre este tipo de morte, uma vez que, além dos aspectos morais e culturais, inclui a existência de cemitérios clandestinos. Minayo (2005) observa que outro aspecto é o fato de alguns casos de suicídio ou de tentativas serem difíceis de diferenciar de acidentes, por exemplo, o acidente de trânsito que pode mascarar o ato autodestrutivo. Numa revisão epidemiológica das taxas de suicídio em três continentes, Américas, Ásia e Europa, consideraram que taxas abaixo de 5/100.000 habitantes são consideradas baixas, entre 5 e 15 são médias, entre 15 e 30 são altas e acima de 30, altíssimas. Estes serão os parâmetros utilizados neste trabalho. As taxas de suicídio variam internacionalmente, assim, apesar da Europa concentrar as maiores taxas de suicídio para ambos os sexos, também se percebe taxas semelhantes em países de outros continentes (Bertolote & Fleischmann, 2002). O Leste Europeu destaca-se entre os países com as maiores taxas, com predomínio do sexo masculino, como Lituânia, em 2004, com 70,1/100.000 habitantes. Entretanto, também na Europa, encontra-se Malta, com uma das taxas mais baixas para o continente, 7/100.000 habitantes (WHO, 2007) (Tabela 1). Os países do Mediterrâneo possuem taxas mais baixas, assim, como, os países da América Latina. 15 Tabela 1. Taxas de suicídio (por 100.000), segundo sexo, em diferentes países, 2004. País Taxas por Sexo Masculino Feminino Lituânia 70.1 14.0 Federação da Rússia 61.6 10.7 Ucrânia 43.0 7.3 Letônia 42.9 8.5 Eslovênia 37.9 13.9 Japão 35.6 12.8 República da Coréia 32.5 15.0 Finlândia 31.7 9.4 Croácia 30.2 9.8 Moldova 29.3 5.2 Polônia 27.9 4.6 República Tcheca 25.9 5.7 CHINA (Hong Kong SAR) 25.2 12.4 Suíça 23.7 11.3 Luxemburgo 21.9 7.4 Romênia 21.5 4.0 Cuba 20.3 6.6 Bulgária 19.7 6.7 Islândia 17.7 6.2 Noruega 15.8 7.3 Quirguistão 15.0 3.0 Países Baixos 12.7 6.0 Maurício 12.7 3.6 Espanha 12.6 3.9 Costa Rica 12.1 1.6 Reino Unido 10.8 3.3 Equador 8.6 3.7 Malta 7.0 4.9 Fonte: Organização Mundial de Saúde, 2004. Disponível em http://www.who.int/mental_health/prevention/suicide_rates/en/index.html A OMS relatou que apesar das taxas serem altas entre o grupo de idosos, elas vêm apresentando um aumento muito importante na população jovem, tanto em países desenvolvidos quanto em desenvolvimento (WHO, 2007). O suicídio é a terceira causa de óbito entre a população de 15 a 34 anos (Bertolote & Fleischmann, 2002). Como se observa no Gráfico 1 (WHO, 2007), a distribuição das taxas mundiais de suicídio apresentaram em 2000 um acréscimo em comparação ao ano de 1998. A faixa etária de 15 a 24 anos em 1998 apresentou uma taxa de 19,2 e em 2000, de 22,0, um acréscimo, 16 portanto, de 2,8%. A faixa de 45 a 54 anos, de 39,7 passa a 43,6, respectivamente nos mesmos anos, resultando num acréscimo de 3,9%. Gráfico 1. Taxas de suicídio (por 100.000) no mundo, segundo sexo e idade, 1998 a 2000. 60 Masc 1998 40 Masc 2000 Fem 1998 20 Fem 2000 0 5 -14 15 - 24 25 - 34 35 - 44 45 - 54 55- 64 65 - 74 75 + Masc 1998 1,2 19,2 28,3 34,7 39,7 41,0 41,5 55,7 Masc 2000 1,5 22,0 30,1 37,5 43,6 42,1 41,0 50,0 Fem 1998 0,5 5,6 7,7 8,4 10,5 11,8 14,1 18,8 Fem 2000 0,4 4,9 6,3 7,7 9,6 10,6 12,1 15,8 Fonte: Organização Mundial de Saúde, 2002. Disponível em http://www.who.int/mental_health/prevention/suicide_rates/en/index.html No Gráfico 1, observa-se a predominância do sexo masculino na taxa mundial de suicídio. Bertolote & Fleischmann (2002) destacam que a diferença na distribuição das taxas de suicídio entre homens e mulheres é consistente na maioria dos países, o que é importante para se pensar em termos de fatores de risco. Com exceção da China, onde nas áreas rurais observa-se o inverso: as mulheres apresentam uma taxa de suicídio maior que a dos homens. A Figura 1 (WHO, 2007) também apresenta o aumento do número de suicídios na população jovem mundial, no ano de 2000, em comparação ao ano de 1950. Isto se torna particularmente preocupante ao se observar que a faixa etária mais atingida é justamente a população mais ativa economicamente. Entretanto, chama a atenção o fato de que, apesar da taxa de suicídio apresentar-se mais alta no grupo etário de 75 anos e mais (ver Gráfico 1), ao se comparar este grupo com o mais jovem, observa-se, na Figura 1, que em termos de freqüência absoluta mais jovens morrem por suicídio que os idosos. 17 Figura 1. Mudanças na distribuição mundial por idade de casos de suicídio entre 1950 a 2000 40% 45% 5 - 44 anos + 45 anos 60% 55% 1950 (11 países) 2000 (47 países) Fonte: Organização Mundial de Saúde, 2002. Disponível em http://www.who.int/mental_health/prevention/suicide_rates/en/index.html Bertolote & Fleischmann (2002) ressaltaram que este predomínio de mortes por suicídio na população jovem torna-se dramático, uma vez que a população de idosos tem aumentado em relação aos jovens. Projeções da OMS para este agravo é de que ele representará 2,4% da carga global das doenças, em 2020, em contraposição aos 1,8% observado para 1998. Yunes & Zubarew (1999) descreveram o caráter epidêmico da violência na região das Américas e o grave problema de Saúde Pública no qual se transformou. Seu estudo revelou que no período de 1980 a 1995, as taxas de suicídio tiveram um aumento de 45%, na faixa etária de 20 a 24 anos, no Brasil. No ano de 1995, para esta mesma faixa houve uma taxa de 9,6/100.000 habitantes para homens e 2,3 para mulheres. Gawryszewski & Mello Jorge (2000), num estudo realizado em São Paulo, no ano de 1999, ressaltaram que as causas externas já são a primeira causa de morte na faixa etária de 5 a 49 anos. As causas externas provocaram 14,2% do total de mortes. O coeficiente de mortalidade por suicídio foi de 4,4/100.000 habitantes. Souza et al. (1998) realizaram um estudo em nove áreas metropolitanas, no Brasil, com dados de mortalidade obtidos através do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde, no período de 1979 a 1998, na faixa etária de 15 a 24 anos. Verificou-se que, em 1998, há uma grande variação regional na qual se destacam Porto Alegre, Curitiba e 18 Belém com taxas de 10,4; 8,6 e 11,4/100.000 habitantes, respectivamente e no outro extremo, Rio de Janeiro e Salvador com 1,0 e 0,4. Os homens apresentaram um risco de 2,7 em relação às mulheres. Para o total das cidades analisadas, verificou-se um aumento das taxas de 3,5 para 5,0/100.000 habitantes na faixa de 15 a 24 anos. Marín-León & Barros (2003) realizaram um estudo em Campinas, São Paulo, no qual analisaram a tendência das taxas brutas de suicídio no período de 1976 a 2001. Encontraram uma taxa de mortes por suicídio de 4,6/100.000 habitantes e o risco de morte por suicídio foi maior no homem (4,8 vezes). Dados da OMS (2007) para o Brasil, em 2002, mostram uma taxa de mortalidade por suicídio por sexo de 6,8/100.000 e 1,9/100.000, respectivamente para homens e mulheres. No ano de 2004, através dos dados de mortalidade obtidos pelo Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde, distribuídos pelos Estados, observa-se que, para o sexo masculino, as taxas são semelhantes ao dos países europeus tais como Islândia, Noruega e Países Baixos (17,7; 15,8 e 12,7/100.000 habitantes, respectivamente) no mesmo ano (ver Tabela 2) para Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul, Roraima com taxas de 16,42; 13,13 e 12,66/100.000 habitantes, respectivamente. Estas informações demonstram a situação preocupante que é o suicídio no Brasil. 19 Tabela 2. Taxas de suicídio (por 100.000), segundo sexo, no Brasil, 2004. Estados Masculino Estados Feminino Rio Grande do Sul 16,42 Mato Grosso do Sul 4,11 Mato Grosso do Sul 13,13 Rio Grande do Sul 3,45 Roraima 12,66 Goiás 3,18 Santa Catarina 11,84 Paraná 3,04 Amapá 11,81 Mato Grosso 2,91 Paraná 10,42 Santa Catarina 2,82 Ceará 9,48 Tocantins 2,72 Goiás 8,99 Piauí 2,65 Mato Grosso 8,52 Acre 2,50 Piauí 8,10 Distrito Federal 2,35 Minas Gerais 7,57 Sergipe 2,23 Rio Grande do Norte 7,30 Ceará 2,19 Espírito Santo 7,00 Espírito Santo 2,06 Distrito Federal 6,51 Minas Gerais 2,03 Rondônia 6,49 Rondônia 1,77 Tocantins 6,43 Pernambuco 1,63 São Paulo 6,36 Roraima 1,58 Sergipe 6,11 São Paulo 1,44 Acre 5,57 Amapá 1,40 Pernambuco 5,54 Alagoas 1,38 Amazonas 5,23 Rio de Janeiro 1,25 Alagoas 5,01 Paraíba 1,09 Paraíba 4,20 Pará 1,04 Rio de Janeiro 4,10 Maranhão 0,99 Bahia 2,96 Amazonas 0,95 Pará 2,92 Bahia 0,85 Maranhão 2,30 Rio Grande do Norte 0,60 Total 7,07 Total 1,85 Fonte: Ministério da Saúde/SVS – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM, 2007. No Brasil, Botega (2007) assinala que apenas quando se precisou discutir a temática das violências, por conta das altas taxas de mortalidade por homicídio e acidentes com veículos, veio à tona o suicídio como um problema de saúde pública brasileira. O Ministério da Saúde instituiu o Grupo de Trabalho (Portaria Nº 2.542/GM, 2005) e Diretrizes Nacionais para Prevenção do Suicídio (Portaria Nº 1.876, 2006) com objetivo de elaborar e implantar a Estratégia Nacional de Prevenção ao Suicídio. Em 2006, também lançou um manual de prevenção de suicídio orientado para as equipes de saúde mental e uma bibliografia comentada sobre comportamento suicida. A perspectiva diante dessas medidas é que elas sirvam para auxiliar a desmistificação do suicídio e 20 assim, contribuir para um planejamento eficaz de prevenção do comportamento suicida. 1.3. A questão das tentativas de suicídio A tentativa de suicídio é um dos componentes do comportamento suicida. Este entendido como um continuum compreende desde o pensamento sobre se matar, gestos, ameaças, tentativas de suicídio, chegando ao planejamento e o suicídio em si. Seguindo a proposta da OMS (2002), definirse-á tentativa de suicídio como comportamento suicida não fatal, ou seja, todo ato suicida que não resulte em morte. Informações confiáveis sobre as tentativas de suicídio são difíceis pelos mesmos motivos vistos nos casos de suicídio, sendo que há um agravante, não há um documento padronizado internacionalmente e de registro obrigatório como a Declaração de Óbito. Minayo (2005) ressalta que os registros elaborados nos hospitais relatam apenas a causa secundária, ou seja, a lesão ou trauma conseqüentes das tentativas. A OMS (2007) calcula que o número das tentativas é, pelo menos, 20 vezes maior que número dos suicídios. Há estudos cujos valores chegam a 40 vezes (Schmidtke et al., 1996). Com isto, o cenário que melhor exibe o problema é de um iceberg. A ponta, a parte visível, os suicídios e a parte submersa, seria a grande maioria dos comportamentos suicidas sobre os quais não se tem conhecimento. Calcula-se que apenas 25% das pessoas que tentam suicídio procuram hospitais públicos, não sendo estes casos necessariamente os mais graves. Os registros são importantes para a pesquisa e prevenção, pois, aqueles que tentam suicídio estão mais sujeitos a novos comportamentos suicidas, podendo inclusive vir a cometer suicídio (WHO, 2002). Num estudo realizado no México, Borges et al. (2000) encontraram uma prevalência de 7,7% de tentativas de suicídio atendidas em uma emergência de um hospital geral. No Brasil, em 2002, as unidades do Sistema Único de Saúde (SUS) registraram 9.312 casos notificados de tentativas de suicídio que necessitaram de 36.699 dias de internação, totalizando um gasto de R$ 2.994.944,42 para a recuperação emergencial de sua saúde. Em 2003, 10.436 tentativas foram 21 internadas (Minayo, 2005; D’Oliveira, 2003). Quanto aos hospitais ou clínicas particulares, não há qualquer informação a respeito. Outros dados importantes vêm dos estudos que descrevem diferenças no perfil de quem comete o suicídio e daqueles que tentam. As pessoas que cometem suicídio são, na sua maioria, do sexo masculino, mais propensos a utilizar meios mais violentos, faixas etárias entre 15 e 35 anos e acima de 75 anos, desempregados, aposentados, solteiros ou separados (Brasil, 2006; Mello-Santos et al., 2005; Marín-León & Barros, 2003; Cassorla, 1991). Nas tentativas de suicídio, o perfil muda em alguns aspectos: predomina o sexo feminino, com faixa etária entre 15 e 35 anos, solteiras ou separadas, mais propensas a utilizar meios menos violentos (Werneck, 2006; Kachava & Escobar, 2005; Rapeli & Botega, 2005; Cassorla, 1991; Nunes, 1988). Na população jovem de 15 a 44 anos, as lesões ou traumas decorrentes das tentativas de suicídio são a sexta maior causa de problemas de saúde e incapacitação física (WHO, 2002). Estes dados colocam as tentativas de suicídio como um grave problema de Saúde Pública, que vem atingindo cada vez mais a população jovem e gerando graves problemas de saúde, psicológicos e socioeconômico. 1.4. Magnitude dos transtornos mentais e sua relação com o suicídio e tentativa Estudos epidemiológicos mostram que milhões de pessoas sofrem algum tipo de doença mental no mundo e que este número vem sofrendo um aumento progressivo. Segundo a Organização Mundial da Saúde/OMS (2001), cerca de 450 milhões de pessoas sofrem de transtorno mental ou comportamental e somente uma minoria recebe tratamento, sofrendo estigma e discriminação. O reconhecimento desta situação é importante uma vez que a definição da própria OMS para saúde envolve “um estado de completo bemestar físico, mental e social e não meramente a ausência de doença ou enfermidade” (WHO, 2006, p.1). A Classificação de Transtornos Mentais e de Comportamento da Classificação Internacional de Doenças, 10ª revisão (CID – 10) (1993), no 22 Brasil, traduzido pelo Centro Colaborador da OMS/UNICAMP para Pesquisa e Treinamento em Saúde Mental, define transtornos mentais e de comportamento como um conjunto de sintomas ou comportamentos que são reconhecidos clinicamente e que provocam em algum grau de sofrimento e interferência nas funções pessoais. No Brasil, estudos têm contribuído para um melhor entendimento entre os aspectos ambientais e sociais e a origem dos transtornos mentais. Muitos casos com sintomas ansiosos ou depressivos, mesmo não satisfazendo todos os critérios diagnósticos de doença mental, apresentam uma elevada prevalência na população adulta (Coutinho, Almeida-Filho & Mari, 1999). Pesquisas revelam também diferenças de gênero na prevalência de transtornos mentais. As mulheres exibem as maiores taxas de transtornos de ansiedade e do humor, enquanto nos homens as maiores taxas são transtornos associados ao uso de substância psicoativas (Andrade et al., 1999). Os transtornos mentais aumentam o sofrimento individual e geram implicações socioeconômicas significativas, pois tais sintomas constituem causa importante de dias perdidos de trabalho, além de elevarem a demanda por serviços de saúde (WHO, 2007; Andrade et al., 1999). Esses aspectos colocam a identificação e o tratamento dos transtornos mentais como um problema de saúde pública no mundo. Os transtornos mentais são fatores de risco que devem ser seriamente considerados na compreensão do suicídio. O diagnóstico psiquiátrico encontrase presente em mais de 90% dos suicídios, destacando-se os transtornos de humor com 20,8%, a esquizofrenia com 19,9% e os transtornos de personalidade com 15,2% em 7424 pacientes psiquiátricos (Bertolote & Fleischmann, 2002). Harris & Barraclough (1997) realizaram uma meta-análise composta por 249 artigos, encontrando, através dos critérios do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais/DSM – III – R e CID – 9, 44 tipos de transtornos mentais. Estes estudos exibiram aumentos significativos nas taxas de mortalidade padronizada que demonstrou variações quanto ao risco de suicídio, por exemplo, na depressão maior de 200 vezes mais, no transtorno bipolar até 133 vezes e na esquizofrenia até 155 vezes. Os autores concluíram que se os resultados pudessem ser generalizados, todos os transtornos 23 mentais aumentam, de modo importante, o risco para o suicídio. Enfatizando, ainda, que muitos desses estudos apontam que o risco de suicídio demonstra ser alto no início do tratamento para o transtorno mental e, depois disso, ele diminui. Este ponto é particularmente importante para o planejamento de ações de prevenção do suicídio e para o controle do tratamento dos transtornos mentais. Arsenault-Lapierre, Kim & Turecki (2004) também realizaram uma metaanálise de artigos sobre transtornos mentais e suicídio que utilizaram a metodologia de autópsia psicológica2 ou registros oficiais, contendo entrevistas com informantes. Utilizando critérios do DSM, CID ou Critério Diagnóstico em Pesquisa/RDC, os autores analisaram um total de 177 artigos nos quais encontraram nos pacientes suicidas: transtornos afetivos (43,2%); problemas com uso de substâncias (25,7%); transtorno de personalidade (16,2%); e transtornos psicóticos (9,2%), distribuídos em quatro grandes regiões Europa, América do Norte, Austrália e Ásia. Em estudo recente, Ernst et al. (2004), também utilizando o método de autópsia psicológica em 168 casos de suicídios, encontraram 9,5% sem preencherem critérios para transtornos do Eixo I3. Entretanto, alguns transtornos do Eixo I não são identificáveis pelo método da autópsia psicológica o que explicaria esta baixa ocorrência. Isto porque o que permanece é que a maioria dos estudos aponta que em mais de 90% dos suicídios ocorre à presença de transtornos mentais. Assim, os autores consideraram que seus resultados não são incoerentes com a maioria dos estudos. O Quadro 1 apresenta diferentes estudos que investigaram a relação entre suicídio e transtornos mentais, alguns com resultados diferentes daqueles mencionados anteriormente. Segundo Werlang & Sperb (2004), autópsia psicológica é uma estratégia de avaliação retrospectiva que visa auxiliar a determinar o modo de morte de um indivíduo. Esta técnica foi desenvolvida por Shneidman, Farberow e Litman, no final da década de 50, nos Estados Unidos. 3 O Eixo I serve para o relato de todos os vários transtornos ou condições da Classificação/DSM, exceto Transtornos de Personalidade e Retardo Mental (relatados no Eixo II). Seriam estes, Esquizofrenia, Transtornos do Humor, Transtornos de Ansiedade etc. 2 24 Quadro 1. Estudos internacionais que relacionam suicídio com presença de transtornos mentais. Autor (ano de País publicação) Lawrence et al. Austrália Período Delineamento/ Critério Diagnóstico do Estudo Amostra /Instrumentos 1980-1998 Estudo de Coorte CID – 9 3731 suicídios. População: (Dados secundários: Transtornos mentais encontrados: 165693 WA Linked Transtorno por uso de álcool ou drogas (2001) Database) Resultados Psicoses afetivas Esquizofrenia Transtornos neuróticos Brown et al. Inglaterra 1981-1982 (2000) Estudo de Coorte CID – 9 14 suicídios. Amostra: 370 (Dados secundários: Transtorno mental encontrado: Royal South Hants Esquizofrenia Hospital) Hoyer et al. Dinamarca 1973-1993 (2000) Estudo de Coorte CID – 8 3127 suicídios. Amostra: 54103 (Dados secundários: Transtornos mentais encontrados: Danish Psychiatric Depressão maior Case Register) Transtorno bipolar Depressão neurótica Baxter & Reino Appleby Unido 1969-1975 Estudo de Coorte CID – 8 118 suicídios. Amostra: 7921 CID – 9 Transtornos mentais encontrados: Esquizofrenia (Dados secundários: Transtornos afetivos Psychiatric Case Transtornos de personalidade (1999) Register) Ruschena et al. Austrália 1995 (1998) Foster et al. (1997) Irlanda Julho de Estudo Seccional CID – 9 569 suicídios, 188 foram identificados como casos Amostra: 3632 (Dados secundários: psiquiátricos. State Coroner of Transtornos mentais encontrados: Esquizofrenia Victoria) e Transtornos afetivos. DSM – III – R Transtornos do Eixo I: 86% Estudo de Caso 1992 a (Autópsia SCID – I julho de psicológica) SAP5 1993 Amostra: 118 4 Transtornos do Eixo II6: 44% Co-morbidade psiquiátrica ou co-morbidade somatopsiquiátrica (Eixo I/Eixo III7) Transtornos mentais encontrados: Dependência de álcool Depressão maior Transtornos de personalidade A maioria dos estudos encontrados na pesquisa apresentou desenho de coorte. Por se tratar de suicídio, a maioria realizou pesquisa com dados secundários e apenas um estudo usou instrumentos diagnósticos ao utilizar o Structured Clinical Interview for DSM – III – R: entrevista semi-estruturada. Standardised Assessment of Personality. 6 O Eixo II diz respeito aos Transtornos da Personalidade e Retardo Mental (DSM-IV-TR, 2002). 7 O Eixo III é usado para indicar condições médicas gerais potencialmente importantes para a compreensão e manejo do transtorno mental do indivíduo (DSM-IV-TR, 2002). 4 5 25 método de autópsia psicológica. Os países foram variados assim como o tamanho das amostras. Muitos estudos utilizaram amostras grandes, acima de 3000 pacientes, sendo que nenhum apresentou amostras abaixo de 100. Os transtornos mentais encontrados variaram bastante, destacando-se os transtornos afetivos8, transtornos por uso de substâncias e esquizofrenia. O critério diagnóstico na sua maioria foi o CID, tendo um único estudo utilizado o DSM. Alguns estudos apresentaram um risco de suicídio variando de 13,7 a 16,37 para os homens e 13,6 a 22,10 para as mulheres na esquizofrenia. Nos transtornos afetivos o risco foi 10,9 e 22,8 para homens e mulheres respectivamente, já nas psicoses afetivas foi 15,35 para homens e 19,39 para mulheres. Os transtornos de personalidade apresentaram um risco de 11,9 e 17,5 para homens e mulheres (Lawrence et al., 2001; Baxter & Appleby, 1999; Ruschena et al., 1998). Um estudo apresentou a taxa de mortalidade padronizada para suicídio de 19,33 para depressão maior, 18,67 para depressão psicótica e para o transtorno bipolar uma taxa de 18,09 para homens e 20,31 para mulheres (Hoyer et al., 2000). Quanto à prevalência dos transtornos mentais, apenas um estudo a apresentou com 37% para uso de álcool e 32% para depressão maior, já nos transtornos de personalidade os valores encontrados foram 19% para a personalidade esquiva, 14% para a paranóide e 9% para a borderline. As comorbidades psiquiátricas e somatopsiquiátricas apresentaram uma freqüência de 74% (Foster et al., 1997). Diversos estudos mostraram que o risco de suicídio é particularmente alto após o contato com o serviço de saúde mental ou alta hospitalar, enfatizando a importância do acompanhamento desses pacientes como estratégia de prevenção do suicídio (Lawrecen et al., 2001; Brown et al., 2000; Hoyer et al., 2000; Baxter & Appleby, 1999; Ruschena et al., 1998). Foster et al. (1997) destacaram ainda a presença de co-morbidade psiquiátrica ou somatopsiquiátrica como um incremento no risco de suicídio. Em última análise, os estudos citados mostraram também que apesar das variações nas freqüências, os transtornos mentais sempre aumentam o risco de suicídio. Todos os autores ressaltaram a importância dos serviços de 8 São os transtornos de humor: bipolar, depressivos e episódio maníaco (CID – 10, 1993). 26 saúde diagnosticarem a existência de transtornos mentais, avaliando, tratando e acompanhando estes transtornos como a principal estratégia de prevenção do suicídio. Em se tratando das tentativas de suicídio, a literatura contém diversos estudos que apresentam a presença de transtornos mentais nestes agravos, concluindo que os transtornos incrementam tanto o risco quanto a gravidade da tentativa (Quadro 2). Quadro 2. Estudos internacionais que relacionam tentativas de suicídio e transtornos mentais. Autor País (ano de Período Delineamento/ Critério Diagnóstico do Estudo Amostra Resultados /Instrumentos Janeiro de Estudo DSM – IV Transtornos mentais encontrados: Seccional Composite International Diagnostic Depressão Maior publicaçã o) Bernal et Bélgica, al. (2007) França 2001 a Alemanha, agosto de Amostra: Itália, Holanda 2003 21.425 Interview 10 Transtorno Distímico Transtorno de ansiedade generalizada e Espanha9 Transtorno por uso de álcool Kumar et Índia al. (2006) Setembro Estudo CID – 10 81% dos pacientes apresentaram alta de 1995 a Seccional Suicide Intent Scale intenção suicida em presença dos julho de Amostra: 203 Risk Rescue Rating Scale11 1997 Montgomery-Asberg Depression Rating Scale12 Presumptive Stressful Life Events Scale13 transtornos mentais, especialmente a depressão. Transtornos mentais encontrados: Transtornos Depressivos Dependência de Álcool Continua Continuação European Study on the Epidemiology of Mental Disorders (ESEMED): trata-se de estudo multicêntrico. Na versão CAPI (Computer-assisted personal interview): entrevista diagnóstica computadorizada. 11 Escala que avalia a letalidade da tentativa de suicídio. 12 Escala que avalia a depressão, principalmente em hospital geral. 13 Avalia os eventos estressantes e o nível de estresse até 1 mês antes da tentativa. 9 10 27 Zalsman et Estados al. (2006) Unidos -- Estudo DSM – IV Ambos grupos apresentaram como co- Seccional Structured Clinical Interview for morbidade o transtorno de personalidade. Amostra: 307 DSM-IV 14 No grupo bipolar, a letalidade máxima foi Hamilton Rating Scale for modestamente mais alta que no outro de Depression 15 depressão (45,2% vs 39,7%). Beck Depression Inventory 16 Transtornos mentais encontrados: Beck Hopelessness Scale 17 Depressão Maior Brown Goodwin Aggression Transtorno Bipolar Inventory 18 Barratt Impulsivity Scale 19 Suicide Intent Scale 20 Scale for Suicide Ideation 21 Beck’s Medical Lethality Scale 22 Forman et Estados al. (2004) Unidos -- Estudo DSM – IV O estudo comparou múltiplas tentativas Seccional e Structured Clinical Interview for com uma única tentativa. Follow-up DSM-IV As múltiplas tentativas apresentaram mais Structured Clinical Interview for características depressivas, uso de DSM-IV Personality Disorders23 substâncias e desesperanças. Hamilton Rating Scale for Nas múltiplas tentativas houve mais relato Depression de abuso emocional na infância e história (seguimento) Amostra: 153 Global Assessment of Functioning familiar de transtorno mental e suicídio. Scale24 Scale for Suicide Ideation Suicide Intent Scale Janeiro de Estudo Brief Psychiatric Rating Scale25 O grupo bipolar apresentou maior risco de Azzoni 1997 a outubro Seccional Scale for the Assessment of letalidade. (2004) de 2002 Amostra: 2395 Positive Symptoms e Scale for the Transtornos mentais encontrados: Assessment of Negative Transtorno Bipolar Raja & Itália Symptoms26 Transtorno Unipolar Mini Mental State Examination27 Global Assessment of Functioning Scale Clinical Global Impression Conclusão Clover et al. Austrália Abril de 1998 a Estudo caso- DSM – IV Transtorno mental avaliado: Entrevista clínica estruturada. Escala que avalia o curso objetivo da gravidade da depressão. 16 Escala utilizada para avaliar o curso subjetivo da gravidade da depressão. 17 Escala que avalia a desesperança. 18 Escala que avalia a agressividade. 19 Escala que avalia a impulsividade. 20 Escala que avalia a intenção suicida. 21 Escala que avalia a ideação suicida. 22 Escala usada para avaliar o grau da severidade da tentativa de suicídio. 23 Usada neste estudo para avaliar o Transtorno de Personalidade Borderline. 24 Usada neste estudo para avaliar o nível do funcionamento psiquiátrico, ocupacional e social. 25 Usada neste estudo para avaliar: sintomas psicóticos, hostilidade-agitação, ansiedade-depressão. 26 Escalas para avaliar os sintomas positivos e negativos. 27 Teste usado para rastrear Demência, Amnésia e outros Transtornos Cognitivos. 14 15 28 (2004) Murase et dezembro de controle Composite International Diagnostic 2001 Amostra: 330 Interview Janeiro de Estudo clínico DSM – IV Transtornos mentais encontrados: 1998 a Amostra: 108 Entrevistas realizadas por Transtornos depressivos psiquiatras Transtornos psicóticos Japão al. (2003) dezembro de 2000 Transtorno do estresse pós-traumático Transtorno de personalidade borderline Wunderlich Alemanha Janeiro a julho Estudo DSM – IV Transtornos mentais encontrados: de 1995 Seccional Composite International Diagnostic Transtornos de ansiedade Amostra: 3021 Interview Transtornos depressivos et al. (2001) Transtornos por uso de substância Wunderlich Alemanha Janeiro a julho Estudo DSM – IV Transtornos mentais encontrados: de 1995 Seccional Composite International Diagnostic Transtorno do Estresse Pós-Traumático Amostra: 3021 Interview Transtorno Distímico et al. (1998) Fobia específica Transtorno Bipolar Transtornos de Ansiedade Beautrais et Nova Setembro de Estudo de DSM – III – R Pessoas com alto nível de co-morbidade al. (1996) Zelândia 1991 a maio de caso-controle Structured Clinical Interview for psiquiátrica apresentam maior risco de 1994 Amostra: 302 DSM – III – R – Patient Version tentativas severas. Transtornos mentais encontrados: Transtornos de humor Transtornos por uso de substâncias Transtorno de personalidade anti-social Psicose não-afetiva Uma grande parte dos estudos apresentou desenho seccional. As pesquisas foram desenvolvidas em vários países, contudo, a maioria foi em países desenvolvidos tais como Austrália, Estados Unidos, Alemanha, Japão e outros. O tamanho das amostras utilizadas variou bastante. As amostras em quatro estudos foram acima de 1000 pacientes, contudo, a maioria apresentou uma amostra que variou de 108 a 330 pacientes. Sobre o período dos estudos, a maioria desenvolveu a pesquisa em 2 anos, sendo que dois estudos utilizaram 3 anos e apenas dois realizaram as pesquisas em 6 meses. Os locais de pesquisa foram variados, destacando-se hospitais de emergência, psiquiátricos e ambulatórios; apenas três estudos foram realizados em residências. A maioria dos estudos utilizou os critérios do DSM, apenas uma pesquisa utilizou a CID e um não revelou o critério. Instrumentos padronizados foram amplamente utilizados nos estudos, porém, são instrumentos para 29 rastreamento dos sintomas psiquiátricos. Apenas quatro estudos utilizaram o Composite Internacional Diagnostic Interview/CIDI, uma entrevista padronizada e validada internacionalmente que avalia transtornos mentais e formula diagnósticos em acordo com as definições e critérios da Classificação Internacional de Doenças/CID e do Manual Diagnóstico e Estatístico de Desordens Mentais/DSM. Cinco outros estudos para avaliar a depressão usaram as escalas Montgomery-Asberg Depression Rating Scale, Hamilton Rating Scale for Depression, Beck Depression Inventory, Brief Psychiatric Rating Scale e Structured Clinical Interview for DSM-III-R. Alguns instrumentos foram utilizados para avaliar a intenção, ideação e grau da severidade das tentativas de suicídio, são eles Suicide Intent Scale, Scale for Suicide Ideation e Beck´s Medical Lethality Scale, respectivamente. Um estudo apresentou um risco de tentativa de suicídio ao longo da vida para depressão maior de 3,9, distimia de 1,9, transtorno de ansiedade generalizada de 2,0, transtorno de estresse pós-traumático de 1,9 e dependência de álcool de 1,8 (Bernal et al., 2007). Duas pesquisas avaliaram a razão de chances encontrando para os transtornos do humor valores variando de 7,8 a 33,4, transtornos de ansiedade de 4,9 a 3,7, destacando-se o ataque de pânico com 11,3 nas mulheres. Para as psicoses não afetivas a razão de chances foi de 16,8 (Wunderlich et al., 2001 e 1998; Beautrais et al., 1996). Quanto à prevalência dos transtornos mentais, a dos transtornos de humor variou de 64 a 72,4%, a do transtorno por uso de substância variou de 53 a 71,1% e já a dos transtornos de ansiedade apresentou um valor de 53% (Kumar et al., 2006; Zalsman et al., 2006; Clover et al., 2004; Forman et al., 2004). Murase et al. (2003) encontraram um maior número de transtornos depressivos entre o grupo que utilizou a overdose por drogas como método (53%) que o grupo que utilizou métodos violentos (15), o mesmo ocorreu para esquizofrenia (14 vs 3) e para o transtorno de personalidade borderline (28 vs 1). Raja et al. (2004) avaliando as diferenças entre as tentativas de suicídio no transtorno bipolar e unipolar, verificaram que a principal diferença encontrada foi que o grupo bipolar apresentou uma maior letalidade nas tentativas de suicídio. 30 Os estudos, no geral, destacam o incremento que os transtornos mentais e co-morbidades provocam no risco de tentativas de suicídio. Os transtornos mais destacados foram: do humor, ansiedade e por uso de substâncias, sobressaindo aqui o uso de álcool. Bernal et al. (2007) verificaram que o episódio depressivo maior e a dependência de álcool apresentaram risco de 4,8 e 2,5, respectivamente para tentativa de suicídio ao longo da vida. O risco atribuível proporcional foi de 28% para depressão maior, ou seja, 28% dos casos de tentativas de suicídio se devem à depressão maior. Avaliando alguns destes artigos, tais como o de Wunderlich et al. (2001; 1998) sobre transtornos mentais e os padrões de co-morbidade nas tentativas de suicídio, os autores concluíram que a tentativa de suicídio está fortemente associada à psicopatologia uma vez que 91% de todas as tentativas de suicídios apresentaram ao menos um transtorno mental, sendo a maioria comorbidades (79%). Identificando também um risco de tentativa 3,5 vezes maior para as pessoas com dois diagnósticos, 6,4 vezes para aquelas com três diagnósticos e 18 vezes para com aquelas mais de três diagnósticos. Beautrais et al. (1996) destacaram os transtornos de humor, uso de substância, ansiedade e comportamentos anti-sociais com maior correlação nas tentativas de suicídio graves. Contudo, a contribuição destes transtornos para o risco de tentativa tendeu a variar com idade e sexo. O transtorno de humor apresentou-se mais forte nas pessoas com 30 anos ou mais, enquanto que o transtorno de ansiedade foi mais forte no sexo masculino. Quanto à comorbidade, 56,6% das pessoas que cometeram tentativas de suicídio graves apresentaram critérios diagnósticos para dois ou mais transtornos. No Brasil, poucos estudos se dedicaram a avaliar a relação entre transtornos mentais e tentativas de suicídio. Prieto & Tavares (2005) realizaram uma revisão bibliográfica na qual levantaram estudos nacionais e internacionais sobre a incidência, eventos estressores e transtornos mentais como fatores de risco para suicídio e tentativa de suicídio. Os autores encontraram na sua revisão uma maior incidência dos transtornos do humor, relacionados a substâncias, da personalidade e esquizofrênicos. Destacaram a existência de graves conflitos relacionais e perdas interpessoais significativas como os eventos precipitadores do comportamento suicida. 31 O Quadro 3 apresenta estudos que investigaram a relação entre as tentativas de suicídio e os transtornos mentais na realidade brasileira. Quadro 3. Estudos brasileiros que relacionam tentativas de suicídio e transtornos mentais. Autor (ano de Estado publicação) Rapeli & São Paulo Período Delineamento/ Critério Diagnóstico do Estudo Amostra /Instrumentos 35 meses Estudo Seccional CID – 10 Amostra: 121 European Parasuicide Botega (2005) Resultados Transtornos mentais encontrados: Standardized Interview Schedule Depressão 28 Beck’s Suicide Intent Scale Transtornos neuróticos, estresse e somatoforme Hospital Anxiety and Depression Scale29 Soares (2003) São Paulo Outubro de Estudo Seccional CID – 10 58,3% teve o diagnóstico de Amostra:192 Questionário sociodemográfico esquizofrenia. Ficha padronizada para colher 87,5% tinham intenção de morrer na história psiquiátrica 30 tentativa de suicídio. Check list da CID – 10 Transtornos mentais encontrados: Positive and Negative Sympton Esquizofrenia Scale 31 Schedules of Clinical Assessment Abuso/dependência de álcool Abuso/dependência de drogas in Neuropsychiatry32 Disability Assessment Schedule 33 Client Service Reciept Interview34 Moreira et al. (2000) São Paulo Novembro Estudo de caso - Transtornos mentais encontrados: de 1998 Amostra: 10 Questionário Depressão Transtorno bipolar Esquizofrenia Continua Continuação Entrevista para obter informações sócio-demográficas e clínicas sobre níveis de intenção suicida e letalidade. 29 A escala avalia ansiedade e depressão para ser aplicada em hospital geral em pacientes não psiquiátricos. 30 Adaptada da Life Chart Rating Form, da OMS: questionário sobre curso e evolução da esquizofrenia. 31 Escala para avaliar a presença e intensidade de sintomas psiquiátricos. 32 Entrevista psiquiátrica para avaliar o uso de álcool e substâncias psicoativas. 33 Escala para avaliar o funcionamento social de pacientes com transtorno psiquiátrico. 34 Questionário para obter informação sobre renda familiar e do paciente. 28 32 Rapeli & São Paulo Botega (1998) Outubro de Estudo Seccional CID – 10 Transtornos mentais encontrados: 1995 a Amostra: 53 Questionário de Tentativa de Transtornos depressivos setembro Suicídio 35 Transtornos psicóticos de 1996 Alcoolismo Teixeira & São Paulo 1988 a Villar Luis Estudo descritivo Amostra: 3100 (1997) CID – 9 População atendida: adolescentes. Dados obtidos por listagens e Transtornos mentais encontrados: disquetes do Serviço de estatística Transtornos neuróticos do hospital. Esquizofrenia Quadros relacionados a álcool e drogas Feijó et al. Rio Maio a Estudo de Caso DSM – III – R População adolescente. (1996) Grande do agosto de Amostra: 32 Escala de Ideação Suicida36 Transtorno mental encontrado: Sul 1995 Escala de Comportamento Depressão maior Suicida37 Self-Reporting Questionnaire38 Check list para depressão maior do DSM – III – R Mini-Mental State Escala de Nível Socioeconômico A maioria dos estudos foi desenvolvida em São Paulo, apenas um foi do Rio Grande do Sul e nenhum do Rio de Janeiro. Também na sua maioria apresentaram desenho seccional, tendo somente dois estudos de caso. Quanto ao tamanho das amostras, apenas um estudo utilizou uma amostra acima de 1000 pacientes, tratando-se de um estudo com dados secundários. Dois estudos usaram amostras pouco acima de 100 e três abaixo desde valor. O período de desenvolvimento das pesquisas em dois estudos foi: 2 anos, 1 ano e menos de 6 meses. Todos os estudos foram realizados em hospital. As pesquisas brasileiras utilizaram na sua maioria os critérios da CID, tendo apenas um trabalho usado o DSM e outro estudo não revelou qual o critério. Foram usados instrumentos para rastreamento de sintomas psiquiátricos na grande parte dos estudos, contudo, deve-se ressaltar que nenhum desses estudos utilizou uma entrevista diagnóstica padronizada internacionalmente como o CIDI, da OMS, para avaliar e diagnosticar os transtornos mentais nas tentativas de suicídio, dependendo assim ou do diagnóstico registrado em prontuário ou do consenso de um grupo formado por Baseado no European Parasuicide Standardized Interview Schedule. Escala adaptada da Diagnostic Interview Schedule. 37 Escala adaptada da Diagnostic Interview Schedule. 38 Auto-escala para detecção de casos suspeitos de transtorno mental. 35 36 33 psiquiatras sobre um determinado diagnóstico, o que se torna um custo muito alto na contratação de especialistas sobre o tema. Os transtornos mais encontrados foram: esquizofrenia, transtornos depressivos e transtornos por uso de substâncias, sobressaindo também o uso de álcool. Os instrumentos usados para avaliar o comportamento suicida foram European Parasuicide Standardized Interview Schedule e Escala de Comportamento Suicida. Para avaliar a intenção e a ideação suicida foram utilizadas as escalas Beck´s Suicide Intent Scale e Escala de Ideação Suicida. Ao comparar os trabalhos, verificou-se que os estudos internacionais quando utilizaram instrumentos diagnósticos, este foi o CIDI, quando não, usou-se mais instrumentos de rastreamento de sintomas psiquiátricos como os estudos nacionais. Assim, fica clara a necessidade de se desenvolver pesquisas brasileiras a fim de se conhecer melhor o fenômeno da tentativa de suicídio e qual a sua real associação com os transtornos mentais na população do país, assim como, a utilização de um instrumento diagnóstico e validado internacionalmente que avalie os transtornos mentais e permita uma comparação dos resultados. Estas pesquisas são de grande relevância para o planejamento de ações que visem à prevenção do suicídio. 34 2. Justificativa As tentativas de suicídio são um grave problema de Saúde Pública, atingindo cada vez mais a população jovem. A OMS (2007) calcula que o número das tentativas é, pelo menos, 20 vezes maior que número dos suicídios, porém, outros estudos apontam valores que chegam a 40 vezes (Schmidtke et al., 1996). Segundo a OMS (2002), as lesões ou traumas decorrentes das tentativas de suicídio são a sexta maior causa de problemas de saúde e incapacitação física, na população jovem de 15 a 44 anos. Os transtornos mentais incrementam o risco e a gravidade das tentativas de suicídio. As prevalências dos transtornos mentais associados às tentativas de suicídio variam de 87,3 a 90% (Arsenault-Lapierre, Kim & Turecki, 2004; Bertolote & Fleischmann, 2002). Dentre estes transtornos, destaca-se a depressão, cujos valores encontrados nos estudos variaram de 13 a 53,8%, dependência de álcool de 17,5% a 35,9%, transtorno de estresse póstraumático de 10,73% a 27,1%, esquizofrenia de 4,8% a 9,3%, personalidade anti-social de 5,4% a 20,6% e co-morbidades variando de 12,2 a 60,6%. As comorbidades principais são a depressão e o uso de substâncias (Bernal et al., 2007; Kumar et al., 2006; Nock & Kessler, 2006; Haw et al., 2001, Beautrais et al., 1996). Inúmeros transtornos mentais são de difícil diagnóstico. Atualmente, escalas validadas internacionalmente, tais como o Composite International Diagnostic Interview, da OMS, vêm sendo utilizadas para tal fim. Esta é considerada o padrão-ouro por se tratar de um questionário diagnóstico estruturado e padronizado internacionalmente através dos critérios do DSM-IV e CID-10. Diante dos poucos estudos realizados no Brasil que investigaram a freqüência dos transtornos mentais nos casos de tentativas de suicídio e a não utilização de instrumento diagnóstico padronizado internacionalmente nos estudos brasileiros, o presente trabalho torna-se importante para estimar a prevalência dos transtornos mentais nas tentativas de suicídio que foram atendidas num hospital de grande porte de emergência da cidade do Rio de Janeiro. 35 3. Hipótese de trabalho Existe uma forte associação entre transtornos mentais e tentativas de suicídio. 4. Objetivos 4.1. Objetivo geral Estimar a prevalência dos transtornos mentais nos casos de tentativas de suicídio. 4.2. Objetivos específicos Descrever o perfil sociodemográfico nas tentativas de suicídio. Descrever os meios utilizados nas tentativas de suicídio. Estabelecer a prevalência dos transtornos mentais nas tentativas de suicídio. 36 5. Material e métodos 5.1. Desenho de estudo Este estudo é parte do projeto de pesquisa intitulado “Estudo casocontrole sobre fatores de risco para tentativas de suicídio em uma população atendida em um hospital de emergência no Rio de Janeiro”. O estudo original foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do IESC/UFRJ, sendo apresentado à Direção do Hospital Municipal Souza Aguiar/HMSA que oficializou a realização do estudo dentro do hospital. Trata-se de um estudo descritivo seccional com os pacientes atendidos devido à tentativa de suicídio, no Setor de Emergência do HMSA. Segundo Medronho et al. (2006), o estudo seccional se caracteriza pela observação direta de determinada quantidade de indivíduos numa única oportunidade, sendo muito utilizado para estimar a freqüência de uma doença. Sua principal limitação é não permitir o estabelecimento da relação causal entre doença e exposição, uma vez que a exposição é observada no momento do desfecho. Contudo, a sua principal vantagem para o presente estudo, será obter uma descrição das características da população estudada no período já citado e, também, sugerir hipóteses sobre a existência de associações de freqüência entre transtornos mentais e tentativas de suicídio. 5.2. Local do estudo O HMSA, o maior hospital público de emergência da América Latina, atende, em média, mil pessoas por dia e tem capacidade para atender a população em mais de 25 especialidades médicas (PCRJ, 2007), possuindo mais de 500 leitos, incluindo-se os da grande emergência. Além disso, possui uma equipe que atua em turnos de 24 horas, especializada em cirurgia de trauma, tornando-se referência no atendimento às vítimas de violência. Somando a este fato, a sua localização, em área importante do centro comercial da cidade do Rio de Janeiro, próximo a principal estação ferroviária intermunicipal e duas rodoviárias, favorece a um grande fluxo de pessoas a procura de atendimento médico. 37 Neste contexto, a clientela do HMSA é bastante heterogêneo. A maior parte de seus pacientes possui nível social muito baixo, contudo, é possível encontrar pacientes de classe média, com plano de saúde privado, seja porque sofreram um acidente em via pública, por exemplo, ou porque o seu convênio médico não cobriu uma determinada intervenção. A diversidade das localidades da procedência dos pacientes é outro fator importante no atendimento. Encontram-se pacientes dos mais diversos municípios do estado do Rio de Janeiro e, inclusive, de outros estados e turistas estrangeiros. Na denominada grande emergência, localizada no segundo andar do hospital estão a Sala das mulheres, Sala dos homens, Unidade de Pacientes Graves/UPG, Unidade de emergência em ortopedia, Sala de sutura, Unidade de politrauma e Emergência pediátrica. O acesso é feito por elevadores ou escada. Os setores da grande emergência que fizeram parte deste trabalho, e onde os pacientes menos graves foram entrevistados, constituiram-se pela Sala das mulheres, Sala dos homens e Unidade de politrauma. Quando o paciente chegava ao hospital em estado clínico muito crítico, por exemplo, nos casos de tentativas de suicídio por queimadura, as pesquisadoras eram avisadas e as entrevistas aconteciam nas enfermarias clínicas pertinentes a cada caso. Por este motivo, realizou-se entrevistas nas enfermarias do Centro de Tratamento de Queimados – Adultos, na Cirurgia Geral, na Clínica Médica, na Cirurgia Vascular e na Ortopedia. Em todas essas clínicas, os pacientes chegaram graves ao hospital, sendo necessário procedimentos cirúrgicos e/ou especializados antes de serem abordados. Só realizou-se um único atendimento a um caso de tentativa de suicídio na Emergência pediátrica. Nos demais casos, as entrevistas foram realizadas nas salas já citadas. 5.3. População do estudo Durante o período do estudo foram admitidos 118 casos de tentativas de suicídio no Setor de Emergência do HMSA, entre abril de 2006 e março de 2007. As tentativas de suicídio foram confirmadas pelos pacientes através das entrevistas. Foram excluídos os dois casos reincidentes durante o período da pesquisa, considerando apenas a primeira admissão desse modo evita-se a 38 duplicação de casos. E 10 casos que evoluíram a óbito, caracterizando-se em suicídio. Consideramos a possibilidades de algumas perdas de casos pelo fato de serem em geral casos não graves, que eram rapidamente liberados pelos médicos plantonistas ou que saíram à revelia. De qualquer maneira, usando os boletins de emergência, pudemos quantificar estas perdas que foram 10 casos, no horário da madrugada. Todos os 96 pacientes elegíveis ao estudo foram entrevistados, porém, nem todos, devido à gravidade do caso, puderam completar todas as etapas da pesquisa. 5.4. Instrumentos No estudo optou-se pela utilização dos dados da ficha de notificação, obrigatória a todos os casos pelas Secretarias de Saúde e Ministério da Saúde (Resolução “N” SMS Nº 784, 2001), através do questionário sociodemográfico e clínico-epidemiológico e a aplicação do instrumento Composite International Development Interview (CIDI), versão 2.1, pelos dados da literatura que indicam que aproximadamente 98% dos casos de suicídio estão relacionados aos transtornos mentais (Bertolote & Fleischmann, 2002), tornando-se imprescindível no estudo das tentativas de suicídio. Este estudo pretende avaliar a presença destes transtornos nos casos observados. A seqüência de aplicação dos instrumentos é a citada abaixo. Entretanto, na observação inicial do paciente optamos por algumas inversões nesta seqüência devido aos estado do mesmo, o que permitiu uma abordagem mais adequada a cada caso. 5.4.1. Características sociodemográficas e clínicoepidemiológicas Questionário sociodemográfico e clínico-epidemiológicas Elaborado por pesquisadores do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva – IESC/UFRJ, com base na Ficha de Notificação de Suicídio e Tentativas, da Secretaria Municipal de Saúde/RJ, e considerando-se as variáveis importantes relacionadas às tentativas de suicídio, encontradas na literatura (Botega et al., 1995). (Anexo I) 39 Variáveis estudadas: intenção de morte, idade, sexo, naturalidade, hora do agravo, data do agravo, data da internação, destino do paciente, meios utilizados na tentativa de suicídio, natureza e extensão da lesão, última consulta a um profissional de saúde, motivo da consulta, uso de álcool/drogas ilícitas/medicamentos no momento do agravo, motivos relatados, história de tentativas de suicídio anteriores, tentativas de suicídio na família, história de suicídio na família, história de doença mental na família, dependência de álcool/droga, uso de medicamentos psicoativo, uso regular de algum outro medicamento, local do agravo, história de doença física, internação psiquiátrica, tratamentos psiquiátricos e psicológicos atuais e anteriores. 5.4.2. Instrumento utilizado na avaliação dos transtornos mentais Composite International Development Interview (CIDI), versão 2.1 O CIDI foi escolhido para avaliar os transtornos mentais, no presente estudo, por apresentar inúmeras vantagens em relação a outros instrumentos. A mais importante delas é o de ser um instrumento totalmente estruturado e padronizado, permitindo o estabelecimento da confiabilidade e validade. Essas características asseguram que os resultados de diferentes estudos possam ser comparados, e que as entrevistas possam ser administradas de uma maneira uniforme, permitindo que não-clínicos o administrem. A versão 2.1 abrange dezessete principais áreas diagnósticas de acordo com as definições e critérios da Classificação Internacional de Doenças, décima revisão, (CID-10), da Organização Mundial de Saúde e do Manual Diagnóstico e Estatístico de Desordens Mentais, quarta edição, (DSM-IV), da Associação Psiquiátrica Americana. Ele possui um programa próprio que gera diagnósticos de transtornos mentais. Em razão do seu formato flexível, o CIDI permite que os pesquisadores utilizem apenas seções que são de seu interesse. Desse modo, para este estudo foram utilizadas apenas quinze áreas, que foram: Fobia Social (D33 a D42), Agorafobia (D43 a D53), Transtorno de Pânico (D54 a D62), Transtorno de Ansiedade Generalizada (D63 a D69), Transtorno Depressivo e Distimia (E1 a E54), Transtorno Afetivo e Maníaco (F1 a F22), Esquizofrenia e outros Transtornos Psicóticos (G1 a G35), Transtornos 40 Alimentares (H1 a H17), Transtorno devido ao uso do Álcool (J1 a J23), Transtorno de Estresse Pós-Traumático (K22 a K45), Transtorno devido ao uso de Substâncias Psicoativas (L1 a L24), Demência, Amnésia e outros Transtornos Cognitivos (M1 a M22). Muitos desses distúrbios são avaliados na maioria dos estudos da área. As áreas Transtorno devido ao Uso de Nicotina e Transtorno Somatoforme e Dissociativo foram excluídas tanto por não ser muito referidas nas pesquisas da área, quanto para não tornar a coleta de dados ainda mais extensa. A entrevista para preencher o CIDI consistiu em 278 perguntas acerca dos sintomas de distúrbios mentais, mas nem todas as perguntas são necessariamente feitas, graças ao fato de que o entrevistado pode não manifestar certos sintomas chave (filtros), que são específicos para um determinado distúrbio. Não os tendo, passa-se a perguntar acerca de outros sintomas. Isto é, os filtros permitem pular várias perguntas que são implicadas ao sintoma-chave. Isso faz abreviar a entrevista, porque essa técnica obriga a restringir ao que é provável. O código de respostas é categórico, ou seja, a presença ou não do sintoma. Perguntas adicionais são feitas para avaliar a duração e, também, a primeira e última ocorrência dos sintomas. Os códigos para avaliação do tempo de ocorrência dos sintomas são os seguintes: • se os sintomas estavam presentes nas duas últimas semanas; • se os sintomas estavam presentes entre 15 dias e 1 mês; • um mês a seis meses; • seis meses a um ano; • mais que um ano. A validade do CIDI foi realizada num estudo multicêntrico mundial (Wittchen et al., 1991). A sua tradução para o português foi feita pelo departamento de psiquiatria da Escola Paulista de Medicina (EPM), que participou do estudo multicêntrico relatado anteriormente. Os entrevistadores foram treinados por este departamento, seguindo as normas estabelecidas pela OMS para uso do instrumento. Além das seções citadas, ainda foi utilizado o questionário sociodemográfico do CIDI. As variáveis demográficas estudadas foram: idade, 41 sexo (através da observação), estado matrimonial, número de filhos, educação e ocupação. As três últimas seções do CIDI aplicadas dizem respeito às: anotações do entrevistador sobre comentários do entrevistado – foi questionado ao entrevistado se havia algo que ele quisesse falar e que não havia sido perguntado ao longo da entrevista, com anotação de data e horário final da entrevista; observações do entrevistador – o entrevistador era orientado a marcar as suas opções de uma lista de comportamentos. O objetivo aqui é a realização do diagnóstico de esquizofrenia. Esta secção era preenchida imediatamente após a entrevista. E codificações do entrevistador – o entrevistador preenchia esta seção logo após o término da entrevista. Trata-se de questões relacionadas à entrevista em si: se ocorreu alguma interrupção e por parte de quem, por exemplo. 5.5. Coleta de dados A coleta de dados foi realizada por quatro entrevistadoras, psicólogas, treinadas previamente nos instrumentos. As pesquisadoras foram selecionadas por possuírem experiência prévia em estágio no local de estudo. O projeto de pesquisa foi divulgado no hospital através de cartazes informativos e comunicado oficial às chefias dos setores. Para favorecer a receptividade e a colaboração dos profissionais de saúde e administrativos, cada entrevistadora foi apresentada no seu primeiro dia de plantão aos mesmos pela chefia do Serviço de Saúde Mental, do HMSA. E, a cada plantão, realizava-se primeiro o contato com as equipes, perguntando se havia algum paciente admitido por tentativa de suicídio. Este procedimento foi essencial para efetivar a colaboração de todas as equipes do setor de emergência. Após este primeiro momento, em caso negativo, as entrevistadoras faziam busca através de cada Boletim de Emergência/BE que se encontravam junto aos pacientes nos setores já informados. O trabalho incluiu todos os dias da semana, inclusive feriados, no período de 9:00 h às 17:00 h. Este período foi considerado suficiente, já que os casos atendidos à noite permanecem obrigatoriamente no hospital até a manhã seguinte, podendo ser então abordados. As pesquisadoras avaliaram e 42 realizaram busca ativa dos casos de tentativa de suicídio atendidos no setor de emergência no HMSA, no período de abril de 2006 a março de 2007. Cada entrevista teve uma duração média de 1 hora. Desse modo, nenhuma notificação foi preenchida em caso suspeito, mas, somente em casos confirmados de tentativas de suicídio. Durante o período da pesquisa, as notificações foram preenchidas pelas pesquisadoras uma vez que estas entrevistaram todos os casos de tentativas atendidos no HMSA. 5.6. Aspectos éticos Todos os participantes da pesquisa foram esclarecidos quanto ao propósito da mesma e assinaram o termo de consentimento informado antes de serem entrevistados (Anexo II). Quando impossibilitados de assinar o consentimento, por algum comprometimento clínico, obtivemos a sua autorização verbal na presença dos familiares/amigos ou profissionais da equipe, essa observação era anotada no termo. Todos os pacientes atendidos foram encaminhados a serviços de psiquiatria ou psicologia, conforme a necessidade de cada caso e em comum acordo. Também se realizaram contatos telefônicos em períodos determinados após a alta hospitalar: 1º contato - após 15 dias da data da alta; 2º contato após 1 mês da alta; e 3º contato - após 2 meses da alta. O objetivo foi reforçar a busca por tratamento e quando necessário, refazer o encaminhamento para outros serviços quando os originais não os atendessem por algum motivo, geralmente, por não comportar a demanda destas unidades. 5.7. Análise dos dados Foram calculadas as prevalências dos transtornos mentais, das características sociodemográficas e clínico-epidemiológicas e dos meios utilizados. O teste Qui-quadrado e o teste de Fisher foram utilizados para medir associações entre variáveis categóricas, e o teste T para variáveis contínuas. Os resultados da análise bivariada foram considerados estatisticamente significativos quando o p-valor foi igual ou menor que 0,05. As associações cujos valores de significância são limítrofes (0,05 - 0,1) e foram consideradas 43 de importância clínica (Browner, 2006), não foram excluídas. No caso do CIDI, este O programa SPSS 10.1 foi utilizado para as análises estatísticas. 6. Artigo: Prevalência de transtornos mentais nas tentativas de suicídio em um hospital de emergência no Rio de Janeiro Introdução Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) mostram que, no ano 2000, aproximadamente um milhão de pessoas morreram por suicídio, sendo a taxa global de 16 por 100 mil habitantes. Isto representa 1 morte a cada 40 segundos (WHO, 2007). As altas taxas de suicídio afetam países desenvolvidos e em desenvolvimento, colocando este agravo entre as três principais causas de óbitos na população jovem entre 15 e 44 anos (WHO, 2002). Isto é particularmente preocupante ao se observar que este grupo economicamente ativo, que já é o mais vulnerável a outros tipos de violências em nosso meio, está cada vez mais sob risco para o suicídio. No caso das tentativas de suicídio, esse panorama é ainda mais grave. Estudo europeu estimou que o número de tentativas de suicídio pode ser até 40 vezes maior que o de suicídios (Schmidtke et al., 1996). Contudo, a OMS, numa perspectiva mundial, apontou um valor superior em até 20 vezes (WHO, 2007). Na população jovem de 15 a 44 anos, as lesões ou traumas decorrentes das tentativas de suicídio são a sexta maior causa de problemas de saúde e incapacitação física (WHO, 2002). Estes dados colocam as tentativas de suicídio como um grave problema de Saúde Pública mundial, que vem atingindo cada vez mais jovens e gerando sérios danos à saúde, incluindo danos psicológicos e socioeconômicos. Entre os fatores de risco para as tentativas de suicídio sobressaem-se variáveis sociodemográficas e clínico-epidemiológicas, a história de tentativa de suicídio anterior e os transtornos mentais (Brasil, 2006; WHO, 2002). As variáveis sociodemográficas e clínicas mais freqüentemente observadas nas tentativas são: sexo feminino, jovem, desempregado (a), solteiro (a), com baixo 44 nível educacional, uso de álcool ou drogas durante a tentativa, tratamento psiquiátrico anterior. A ingestão de medicamentos é o método mais utilizado (Werneck et al., 2006; Fleischmann et al., 2005; Suominen et al., 2004; Borges et al., 2000; Feijó et al., 1996; Platt 1984). Estudos apontam a importância da história de tentativa de suicídio anterior como um preditor de novas tentativas e do suicídio (Skogman et al., 2004; Suokas et al., 2001; Hawton et al., 1998; Schmidtke et al., 1996). Dentre os transtornos mentais relacionados às tentativas de suicídio, destaca-se a depressão, cujas freqüências encontradas nos estudos variaram de 13 a 53,8%, dependência de álcool de 17,5% a 35,9%, transtorno de estresse pós-traumático de 10,73% a 27,1%, esquizofrenia de 4,8% a 9,3%, personalidade anti-social de 5,4% a 20,6% e co-morbidades variando de 12,2 a 60,6%. As co-morbidades principais são a depressão e o uso de substâncias (Bernal et al., 2007; Kumar et al., 2006; Nock & Kessler, 2006; Haw et al., 2001, Beautrais et al., 1996). Poucos estudos nacionais se dedicaram a avaliar a prevalência dos transtornos mentais nas tentativas de suicídio (Teixeira & Villar Luis, 1997; Rapeli & Botega, 2005; Marcondes Filho et al., 2002; Rapeli & Botega, 1998; Feijó et al., 1996; Botega et al., 1995). Nestes, os transtornos mais freqüentes foram: depressivos, variando de 18 a 28%, uso de álcool com 40,7% e uso de substâncias, variando de 11,1% a 29,5%. Quanto ao método, as amostras desses estudos variaram bastante, de 32 a 121 participantes, sendo a maioria coletada em hospitais. Os instrumentos mais utilizados para a avaliação dos transtornos mentais foram o inventário de intenção suicida de Beck e Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão. Como se sabe, estes instrumentos não fornecem o diagnóstico de transtornos mentais e sim o rastreamento de sintomas psiquiátricos. O único estudo encontrado, cujo objetivo principal foi a avaliação dos transtornos mentais, é o desenvolvido por Teixeira & Villar Luis (1997) através de dados secundários (n= 3100) coletados de um serviço de urgência psiquiátrica. Os transtornos mentais encontrados foram: esquizofrenia, em 15% dos casos, transtornos neuróticos, 28% e quadros relacionados a álcool e drogas, 12%. No Brasil, fica evidente a necessidade de se desenvolver pesquisas que avaliem os transtornos mentais relacionados às tentativas de suicídio, com a 45 utilização de dados primários coletados através instrumentos padronizados e validados internacionalmente, capazes de diagnosticar um grande número de transtornos mentais, permitindo assim uma comparação com a literatura internacional. Estas pesquisas são de grande relevância para o planejamento de ações que visem a prevenção do suicídio. Diante da importância do tema ainda muito pouco explorado por nossa comunidade científica, e a rara utilização de dados primários coletados através de instrumentos diagnósticos padronizados e validados, este estudo tem o objetivo principal de estimar a prevalência dos transtornos mentais nos casos de tentativas de suicídio atendidos em um hospital de emergência público no Rio de Janeiro, Brasil, no período de abril de 2006 a março de 2007. Métodos Local do estudo O Hospital Municipal Souza Aguiar/HMSA está localizado em área urbana no centro da cidade do Rio de Janeiro. O HMSA é considerado o maior hospital de emergência da América Latina, realizando cerca de 30.000 atendimentos por mês na sua unidade de emergência e com uma equipe especializada em cirurgia de traumas, atendendo às vítimas de violência (Brasil, 2007). O hospital atende em mais de 25 especialidades médicas, porém, não possui psiquiatra no seu corpo médico. A sua área de captação compreende 15 bairros urbanos com um total de 268.280 habitantes, dados para o ano 2000. Contudo, o hospital atende pacientes dos mais diversos municípios do estado do Rio de Janeiro, de outros estados, além de turistas estrangeiros. O atendimento no HMSA ocorre através do Sistema Único de Saúde (SUS), sendo a maior parte de seus pacientes de nível social muito baixo. Contudo, é possível encontrar pacientes de classe média, com plano de saúde privado, seja porque sofreram um acidente em via pública, por exemplo, ou porque o seu convênio médico não cobriu uma determinada intervenção. Neste contexto, o público do HMSA é bastante heterogêneo. Os casos de tentativas de suicídio que chegam ao serviço de emergência do HMSA são notificados através da Ficha de Notificação de Suicídio e Tentativas, da Secretaria Municipal de Saúde/RJ, pelas psicólogas do serviço de Saúde 46 Mental do hospital. Esta ficha é preenchida tanto em casos suspeitos, quanto confirmados. Durante o período deste estudo, as pesquisadoras registraram e notificaram os casos. População estudada Foram admitidos 118 casos de tentativas de suicídio no setor de emergência do HMSA, entre abril de 2006 a março de 2007. Destes, 10 casos evoluíram a óbito e 2 casos foram reincidentes, considerando-se apenas a primeira admissão. Portanto, a amostra elegível para o estudo consistiu de 106 casos. Estudos recentes trazem uma discussão sobre a importância de se avaliar a intencionalidade no comportamento suicida, visando uma melhor definição do termo tentativa de suicídio como proposta para uma redução dos problemas metodológicos encontrados nas pesquisas sobre o tema e melhor planejamento das ações de prevenção. Para tanto, enfatizam que a intencionalidade encontra-se proporcionalmente relacionada à letalidade da tentativa, ou seja, quanto maior a intenção de morrer, maior a letalidade do método (Nock & Kessler, 2006; Kumar et al., 2006). Para o presente estudo, utilizou-se a definição adotada pela OMS (WHO, 2002): comportamento suicida não fatal para os atos que não resultem em morte. Instrumentos Características sociodemográficas e clínico-epidemiológicas Um questionário foi construído com base na Ficha de Notificação de Suicídio e Tentativas, da Secretaria Municipal de Saúde/RJ, e complementado com variáveis importantes encontradas na literatura sobre tentativas de suicídio. As informações sociodemográficas foram: sexo, idade, estado civil, local de nascimento, escolaridade e ocupação. As informações clínicoepidemiológicas: história de tentativa anterior, história de suicídio na família, historio de transtorno mental na família, uso de álcool/ drogas no momento do agravo, hospitalização psiquiátrica, tratamento psiquiátrico ou psicológico anterior e atual, uso regular de medicamentos psicoativos, doenças físicas, meios utilizados e última consulta a um profissional de saúde. 47 Transtornos mentais O Composite International Development Interview (CIDI), versão 2.1, foi desenvolvido pela OMS (Robins et al., 1988) e escolhido para avaliar os transtornos mentais. Trata-se de um instrumento totalmente estruturado e padronizado, permitindo que não-clínicos o administrem após treinamento. As pesquisadoras do presente estudo foram treinadas pelo Centro de Treinamento do CIDI/Escola Paulista de Medicina (40 horas/treinamento), seguindo as normas estabelecidas pela OMS. Este instrumento foi traduzido e validado em vários países, inclusive no Brasil (k = 0,97) (Wittchen et al., 1991), permitindo que resultados de diferentes estudos possam ser comparados. O CIDI abrange dezessete principais áreas diagnósticas de acordo com as definições e critérios da décima revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID -10), da OMS e da quarta edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Desordens Mentais (DSM - IV), da Associação Psiquiátrica Americana. Ele possui um programa próprio que gera diagnósticos de transtornos mentais. Os autores optaram por usar a classificação da CID -10, por esta ser mais utilizada universalmente. Os transtornos mentais abaixo foram selecionados por serem os diagnósticos mais freqüentemente associados às tentativas na grande maioria dos estudos da área. 1. Transtornos neuróticos, transtornos relacionados com estresse e somatoformes: fobia social, agorafobia, transtorno de pânico, transtorno de ansiedade generalizada, transtorno de estresse pós-traumático, transtorno obsessivo compulsivo. 2. Transtornos do humor (afetivos): transtorno depressivo, distimia, transtorno afetivo bipolar. 3. Transtornos alimentares: anorexia nervosa e bulimia nervosa. 4. Esquizofrenia, transtornos esquizotípico e delirantes: esquizofrenia e transtornos psicóticos agudos e transitórios. 5. Transtornos mentais e comportamentais decorrentes do uso de substâncias psicoativas: incluindo abuso e dependência de álcool. 48 Coleta de dados Quatro psicólogas treinadas previamente em todos os instrumentos conduziram as entrevistas. As pesquisadoras realizaram busca ativa para identificar e recrutar os casos e inseri-los no estudo. As entrevistas foram conduzidas individualmente, depois de estabilizado o quadro clínico, durante as quais os casos foram confirmados pelos próprios pacientes ou pelos familiares/ acompanhantes. Estas entrevistas tiveram uma duração média de 1 hora. Todos os participantes ou os responsáveis legais, no caso de menores de idade, assinaram o termo de consentimento informado. Aspectos éticos Este estudo é parte do projeto de pesquisa intitulado “Estudo casocontrole sobre fatores de risco para tentativas de suicídio em uma população atendida em um hospital de emergência no Rio de Janeiro”. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, sendo apresentado à Direção do HMSA que oficializou a realização do estudo dentro do hospital. Análise dos dados Foram calculadas as prevalências de transtornos mentais, das características sociodemográficas e clínico-epidemiológicas. O teste Quiquadrado e o teste de Fisher foram utilizados para medir associações entre variáveis categóricas, e o teste T para variáveis contínuas. Os resultados da análise bivariada foram considerados estatisticamente significativos quando o p-valor foi igual ou menor que 0,05. As associações cujos valores de significância são limítrofes (0,05 - 0,1) e foram consideradas de importância clínica (Browner, 2006), não foram excluídas. O programa SPSS 10.1 foi utilizado para as análises estatísticas. Resultados Características sociodemográficas e clínico-epidemiológicas Foram entrevistados 96 dos 106 casos elegíveis para o estudo (90,6%, taxa de participação). Não conseguimos realizar a entrevista em 10 casos os 49 quais se evadiram antes da abordagem (6 homens e 4 mulheres). A maioria dos casos era do sexo feminino (62,5%) e predominaram: faixa etária de 25 a 49 anos (55,2%), solteiros (44,8%), nascidos no Rio de Janeiro (62,5%), baixo nível educacional (66,7%) e emprego formal (35,4%). Os homens apresentaram uma taxa significativamente maior de desemprego em relação às mulheres (47,1% vs 17,5%, χ2 = 8,79; p= 0,01). (tabela 1) As características clínico-epidemiológicas que apresentaram maior freqüência foram: tentativas de suicídio anteriores (51%), tratamento psiquiátrico/psicológico anterior (44,8%), uso regular de medicamentos psicoativos (40,6%) e uso de álcool/drogas no momento do agravo (35,4%). O método mais utilizado foi o medicamento (39,6%), seguido pelo uso de pesticida (33,3%). Ao comparar as características clínico-epidemiológicas entre os sexos, os homens apresentaram uma prevalência estatisticamente significante na história de transtorno mental na família e no uso do álcool no momento do agravo, respectivamente (χ2 = 10,60; p= 0,007; χ2 = 6,83; p= 0,01). (tabela 2) Aproximadamente 31% (n= 30) dos indivíduos que tentaram suicídio tiveram contato com um profissional de saúde e 23% (n= 7) desses tiveram contato com um profissional de saúde mental na semana da tentativa de suicídio. 50 Tabela 1. Distribuição das variáveis sociodemográficas nos casos de tentativas de suicídio no HMSA, Rio de Janeiro, período 2006-2007. Variáveis* Total Masculino n=96 Feminino n=36 p-valor n=60 n % n % n % Idade (anos) < 18 18-24 25-34 35-49 ≥50 8 24 22 31 11 8,3 25,0 22,9 32,3 11,5 2 4 10 15 5 5,6 11,1 27,8 41,7 13,9 6 20 12 16 6 10,0 33,3 20,0 26,7 10,0 Estado Civil Casado/ União Estável Solteiro Separado Viúvo 39 43 10 4 40,6 44,8 10,4 4,2 13 16 6 1 36,1 44,4 16,7 2,8 26 27 4 3 43,3 45,0 6,7 5,0 Local de Nascimento Rio de Janeiro Sudeste (exceto RJ) Nordeste Outros 60 13 15 8 62,5 13,5 15,6 8,3 22 2 7 5 61,1 5,6 19,4 13,9 38 11 8 3 63,3 18,3 13,3 5,0 Escolaridade Ensino Fundamental Ensino Médio Ensino Superior 64 28 4 66,7 29,2 4,2 25 10 1 69,4 27,8 2,8 39 18 3 65,0 30,0 5,0 Ocupação Estudante Desempregado Do lar/ Aposentado Trabalho Informal Trabalho Formal Pensionista 7 26 11 11 34 2 7,3 27,1 11,5 11,5 35,4 2,0 1 16 0 4 12 1 2,9 47,1 0,0 11,8 35,3 2,9 6 10 11 7 22 1 10,5 17,5 19,3 12,3 38,6 1,8 0,11 0,44 0,14 0,83 0,01 *O total de observações pode variar devido à ocorrência de ausência de informações. 51 Tabela 2. Distribuição de variáveis clínico-epidemiológicas nos casos de tentativas de suicídio no HMSA, do Rio de Janeiro, período 2006-2007. *O total de observações pode variar devido à ocorrência de ausência de informações. Variáveis* Total Masculino Feminino n=96 n=36 n=60 p-valor n % n % n % Tentativas de Suicídio Anteriores 49 51,0 18 50,0 31 51,7 0,79 História de Suicídio na Família 13 13,5 3 8,3 10 16,7 0,25 História de Transtorno Mental na Família 24 25,0 13 36,1 11 18,3 0,007 Uso de Álcool no Momento do Agravo 21 21,9 13 36,1 8 13,3 0,01 Uso de Drogas no Momento do Agravo 13 13,5 6 17,1 7 11,7 0,45 Internação em Hospital Psiquiátrico 17 17,7 8 22,2 9 15,0 0,37 Tratamento Psiquiátrico/Psicológico Anterior 43 44,8 18 50,0 25 41,7 0,43 Uso Regular de Medicamentos Psicoativos 39 40,6 16 44,4 23 38,3 0,55 Doença Física 23 23,9 11 30,6 12 20,0 0,24 Meios Utilizados Medicamentos Pesticidas Meios Violentos Outros 38 32 20 6 39,6 33,3 20,8 6,2 10 14 09 3 27,8 38,9 25,0 8,3 28 18 11 3 46,7 30,0 18,3 5,0 0,33 Prevalência de transtornos mentais dos últimos 12 meses O total de transtornos mentais encontrados foi de 71,9%. Os transtornos mentais mais prevalentes foram: o episódio depressivo maior (38,9%), abuso/dependência de substâncias psicoativas (21,9%), transtorno de estresse pós-traumático/TEPT (20,8%), abuso/dependência de álcool (17,7%) e esquizofrenia (15,6%). (tabela 3) Os homens apresentaram maior prevalência de todos os transtornos avaliados, com exceção do abuso/depedência de substâncias psicoativas que foi maior nas mulheres. Os seguintes transtornos mentais foram significativamente maiores nos homens em relação às mulheres: agorafobia com 19,4% vs 3,3% (χ2= 6,874; p=0,009), abuso/dependência de álcool com 30,6% vs 10,0% ( χ2 = 6,524; p=0,01), transtorno de ansiedade generalizada/TAG com 13,9% vs 3,3% (χ2 = 3,709; p=0,05). 52 A taxa de prevalência de co-morbidades (≥ 2 transtornos mentais) encontrada foi de 25,0%, sendo 33,3% em homens e 20,0% em mulheres. As co-morbidades mais freqüentes foram os transtornos da ansiedade e depressão (6,3%) e o abuso/dependência de substâncias psicoativas, ansiedade e depressão (6,3%). Tabela 3. Prevalência de transtornos mentais nos casos de tentativas de suicídios no HMSA, Rio de Janeiro, período 2006-2007. Transtornos mentais Total n=96 Masculino n=36 Feminino n=60 p-valor n % n % n % Episódio depressivo maior 34 35,4 14 38,9 20 33,3 0,58 Bipolar 5 5,2 3 8,3 2 3,3 0,29 Distimia 6 6,2 3 8,3 3 5,0 0,51 Transtorno de estresse pós-traumático 20 20,8 8 22,2 12 20,0 0,79 Transtorno de ansiedade generalizada 7 7,3 5 13,9 2 3,3 0,05 Agorafobia 9 9,4 7 19,4 2 3,3 0,009 Abuso/dependência de álcool 17 17,7 11 30,6 6 10,0 0,01 Abuso/dependência de substâncias psicoativas* 21 21,9 5 13,9 16 26,7 0,14 Esquizofrenia e transtornos psicóticos agudos e transitórios 15 15,6 6 16,7 9 15,0 0,83 Todos os transtornos mentais 69 71,9 28 77,8 41 68,3 0,36 *Sedativos, solventes, estimulantes, cocaína, canabinóides e múltiplas drogas. Associação de transtornos mentais e tentativas de suicídio anterior A história de tentativa de suicídio anterior foi a variável clínica encontrada com maior freqüência no nosso estudo. Ela foi utilizada para verificar se haveria ou não associação com os diferentes transtornos mentais apresentados na nossa amostra. O episódio depressivo maior foi encontrado com maior prevalência entre aqueles indivíduos com relato de tentativas de suicídio anterior. O abuso/dependência de álcool e o TEPT associaram-se significativamente: 28,9%; χ2 = 4,952, p= 0,03 e 31,1%; χ2 = 3,263, p= 0,07, respectivamente. 53 Discussão A prevalência dos transtornos mentais O objetivo principal deste estudo foi o de estimar a prevalência dos transtornos mentais nos casos de tentativas de suicídio atendidas no HMSA, durante o período de um ano. A taxa total de transtornos mentais foi de 71,9%. Devido a diversidade metodológica empregada nos diversos estudos realizados sobre o tema, tais como a seleção e tamanho das amostras e os instrumentos de diagnósticos, encontrou-se uma grande dificuldade na comparação da prevalência de transtornos mentais. Esta dificuldade, entretanto não impediu a observação de que a taxa total encontrada em nosso estudo está mais próxima a de pesquisas realizadas em países em desenvolvimento como Israel, Ilhas Fiji e Índia, os quais apresentaram uma taxa total dos transtornos mentais que variaram de 53% a 64% (Novack et al., 2006; Aghanwa, 2004; Kumar et al., 2006). Os estudos conduzidos em países desenvolvidos encontraram taxas próximas a 90% (Bernal et al., 2007; Beautrais et al., 1996). O episódio depressivo maior foi o transtorno mental mais freqüente neste estudo (35,4%), o que está em consonância com a grande maioria da pesquisas sobre o tema (Blackmore et al., 2008; Bernal et al., 2007; Kumar et al., 2006; Rapeli & Botega, 2005; Skogman, Alsén & Öjehagen, 2004; Marcondes Filho et al., 2002). Observou-se que a nossa taxa não diferenciou expressivamente dos estudos em países em desenvolvimento que variaram de 27,3 a 29,5% (Aghanwa, 2004; Kumar et al., 2006). Estudos em países desenvolvidos apresentaram taxas bem maiores do que a nossa, entre 53,8 a 61,4% (Nock & Kessler, 2006; Wunderlich et al., 2001). Contudo, uma pesquisa conduzida no Japão mostrou taxa de depressão bem menor 24% (Murase et al., 2003). Estas diferenças podem ser explicadas por fatores culturais, os quais já foram evidenciados nos países orientais (Lee et al., 2007). A prevalência de agorafobia (9,4%) e do transtorno de ansiedade generalizada/TAG (7,3%) foram similares à maioria dos estudos conduzidos em países desenvolvidos que apresentaram taxas entre 10,10% a 14,7% (Bernal et al., 2007; Nock & Kessler, 2006), com exceção de um estudo na Holanda em que a taxa de TAG encontrada foi 20,5% (Sareen et al., 2008) e de agorafobia na Alemanha com taxa de 24,3% (Wunderlich et al., 2001). O TEPT em nosso 54 estudo foi de 20,8%, encontrando-se entre as taxas dos estudos internacionais, que variaram 10,7% a 27,1% (Bernal et al., 2007; Nock & Kessler, 2006; Wunderlich et al., 2001). A freqüência de transtornos de ansiedade foi de 37,5%, sendo bem menos presente que nos estudos em países desenvolvidos cujos valores estão em torno de 64% (Sareen et al., 2005; Wunderlich et al., 2001). Chama a atenção o resultado de pesquisa realizada na Índia, que encontrou uma freqüência de 1% para transtornos de ansiedade (Kumar et al., 2006). Segundo os autores esta taxa poderia ser explicada pelo uso de entrevistas clínicas, ao invés de instrumentos padronizados, as quais poderiam subestimar os valores encontrados. Os homens apresentaram uma maior prevalência de transtornos de ansiedade e de depressão em relação às mulheres, sendo a diferença estatisticamente significativa na agorafobia e no TAG. Este resultado a princípio contraria a literatura internacional, que mostra uma prevalência acentuada destes transtornos no sexo feminino nas tentativas de suicídio (Wunderlich et al., 2001; Zalsman et al., 2006). Por outro lado, estudos em países em desenvolvimento têm também demonstrado uma maior taxa destes transtornos no sexo masculino (Kumar et al., 2006; Aghanwa, 2004). A razão para esta diferença é desconhecida e, portanto, sujeita à especulação (Aghanwa, 2004). Segundo Kumar et al. (2006), os fatores culturais e sociais presentes nos países em desenvolvimento poderiam explicar esta diferença. No Brasil, esta diferença pode estar relacionada aos aspectos como baixo nível educacional e um alto índice de desemprego que poderiam aumentar a probabilidade de depressão e dos transtornos de ansiedade (Ludermir, 2005) e conseqüentemente do comportamento suicida nos homens. A prevalência do abuso/dependência de álcool (17,7%) foi similar aos resultados de estudos em países desenvolvidos e em desenvolvimento. Em acordo com a literatura internacional, neste estudo este transtorno foi maior significativamente para o sexo masculino (Bernal et al., 2007; Kumar et al., 2006; Marcondes Filho et al., 2002; Wunderlich et al., 2001; Hufford, 2001; Dieserud et al., 2000; Suominen et al., 2004; Hjelmeland, 1996; Ostamo et al., 1991; Borges et al., 2000; Ferreira de Castro et al., 1998; Teixeira & Villar Luis, 1997). 55 No Brasil, a dependência do álcool já é um importante problema na área da Saúde Pública, principalmente entre os homens. Cerca de 50% das hospitalizações psiquiátricas masculinas são devidas ao abuso/dependência do álcool, além de inúmeros problemas sociais associados a ele, como a violência interpessoal e acidente de trânsito (Laranjeira, 2004; Brasil, 2007b). Um recente estudo paulista mostrou que 33,1% dos casos de suicídio analisados através dos registros do Instituto Médico Legal apresentaram alcoolemia média (37,1% vs 20,1%) e alta (23,5% vs 20%), homens e mulheres respectivamente. Os autores concluíram que cerca de um terço dos suicídios desta amostra ocorrem subseqüentemente ao consumo de álcool (Ponce et al., 2008). No nosso estudo 21,9% das pessoas, principalmente os homens, estavam sob efeito do álcool no momento da tentativa de suicídio. Uma possível explicação para a maior prevalência de transtornos mentais no sexo masculino entre os casos de tentativas de suicídio aponta para a hipótese já descrita de que uma síndrome depressiva nos homens seria diferente em relação daquela presente nas mulheres. Esta síndrome se caracterizaria por sintomas psiquiátricos como: baixa tolerância ao estresse, baixo controle do impulso, baixa auto-estima, alcoolismo e suicídios (Kirmayer et al., 1998; Rutz et al., 1999). Outra possibilidade seria o fato dos homens demorarem a buscar ajuda médica, encontrando-se assim com quadros mais graves de transtornos mentais. Desse modo, a gravidade do transtorno mental seria um fator distintivo entre homens e mulheres, implicando que os casos de tentativas de suicídio masculinas devem ser acompanhados de modo mais rigoroso e por um longo tempo, por outro lado, as mulheres devem receber atenção quanto à possibilidade de tentativa de suicídio no início do curso do transtorno mental (Jamison, 2002). As co-morbidades incrementam o risco de tentativas de suicídio. A freqüência de co-morbidades foi de 25%, sendo os principais grupos de transtornos mentais: ansiedade e depressão (6,3%), e uso de substâncias, ansiedade e depressão (6,3%). Estudos internacionais apontam associação entre co-morbidades e tentativas de suicídio, destacando o episódio depressivo maior, uso/dependência de álcool e drogas (Borges et al., 2008; Nock & Kessler, 2006; Kessler et al., 2005; Sokero et al, 2005; Dhossche et al., 2000; Lecrubier, 2001; Beautrais et al., 1996). Wunderlich et al. (1998) encontraram 56 um risco para tentativa de suicídio 3,5 vezes maior entre os participantes de seus estudos com dois diagnósticos de transtornos mentais, do que os sem diagnóstico, de 6,4 vezes para aqueles com três diagnósticos e, ainda, um risco 18 vezes maior entre aqueles com mais de três diagnósticos. Encontramos 21,9% de abuso/dependência de substâncias psicoativas. Este transtorno só foi avaliado em um único estudo, que encontrou uma taxa de 56% de abuso/dependência de substancias psicoativas ao longo da vida (Nock & Kessler, 2007). Esta diferença pode ser explicada pelo fato de nossa pesquisa apresentar taxas dos últimos 12 meses. As principais substâncias psicoativas encontradas foram: maconha, cocaína e solventes, as mesmas observadas por Marcondes Filho et al. (2002), em estudo realizado em Londrina, Paraná. A esquizofrenia apresentou uma prevalência importante no nosso estudo (15,6%), o que está em acordo com pesquisas nacionais e internacionais (Teixeira & Villar Luis, 1997; Dhossche et al., 2000; Murase et al., 2003). É importante destacar que a depressão e a esquizofrenia são os dois principais transtornos mentais que mais contribuem para o aumento de risco de suicídio nos indivíduos adultos (Gunnel & Lewis, 2005). O episódio depressivo foi encontrado com maior freqüência entre aqueles com relatos de tentativas de suicídio anterior. Outros estudos demonstram que a associação entre a história de tentativa de suicídio anterior e transtornos mentais aumentam em 5 a 6 vezes o risco para novas tentativas e suicídio, principalmente nos casos com maior letalidade (Forman et al., 2004; Raja & Azzoni, 2004; Zahl & Hawton, 2004; Sokero et al., 2005; Carter et al., 2005). Características sociodemográficas e clínico-epidemiológicas da amostra As características sociodemográficas e clínico-epidemiológicas que apresentaram uma maior freqüência foram: baixo nível educacional, jovem, história de tentativas de suicídio anteriores, historia de tratamento psiquiátrico/psicológico anterior, uso de álcool/drogas no momento do agravo. 57 Estes fatores estão referidos em estudos nacionais e internacionais, confirmando a importância deles como um preditor positivo para as tentativas de suicídio (Werneck et al., 2006; Fleischmann et al., 2005; Kachava & Escobar, 2005; Suominen et al., 2004; Murase et al., 2003; Qin et al., 2000; Schmidtke et al., 1996; Feijó et al., 1996; Botega et al., 1995; Petronis et al., 1990). No nosso estudo sobressaiu a população jovem, principalmente mulheres entre 14 e 24 anos. Este resultado é consistente com os relatados previamente na literatura (Schmidtke et al., 1996; 2004; Welch, 2001; WHO, 2002). Na nossa amostra existiu um grande número de adultos jovens desempregados com baixo nível educacional. A literatura aponta que o desemprego e baixo nível socioeconômico incrementam o risco de suicídio e tentativa naqueles indivíduos vulneráveis, como aqueles com história de suicídio anterior (Blackmore et al., 2008; Qin, Agerbo & Mortensen, 2003; Qin et al., 2000; Platt 1984). Nosso achado foi de que quase a metade das mulheres (46,7%) utilizou a ingestão de medicamentos psicoativos como o principal método da tentativa de suicídio. Este resultado foi corroborado por estudos nacionais e internacionais (Botega et al., 1995; Kachava & Escobar, 2005; Marcondes Filho et al., 2002; Nunes, 1988; Werneck et al., 2006; Aghanwa, 2004; Novack et al., 2006). O uso abusivo de medicamentos psicoativos trata-se de um problema de Saúde Pública no Brasil. Segundo a OMS, em 1990, consumiu-se 500 milhões em doses diárias de tranqüilizantes no Brasil. Esta quantia foi três vezes mais alta do que a esperada (OMS, 1990). Recentemente, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) está tentando resolver este problema através de um maior controle na regulamentação da produção e dispensação destes medicamentos. A ingestão de pesticida foi também um importante método nas tentativas de suicídio, especialmente entre os homens. Este resultado é consistente com os de outros estudos nacionais (Botega et al., 1995; Kachava & Escobar, 2005; Nunes, 1988; Werneck et al., 2006). Em nossa investigação, todos os 32 indivíduos que tentaram com o uso de pesticida, utilizaram a fórmula denominada “chumbinho”. O uso deste pesticida também foi identificado como principal método utilizado nas tentativas em outros estudos realizados no Rio 58 de Janeiro (Werneck et al., 2006; Moraes, 1999). A ingestão de pesticidas constitui a terceira maior causa de intoxicação aguda no Brasil. Um recente estudo sobre intoxicação realizado no Ceará indicou que 84,2% de todos os casos de intoxicação por pesticida eram relacionados à tentativa de suicídio (Marques, 2005). Todos estes estudos, incluindo a nossa investigação, sugerem a necessidade de se desenvolver estratégias que restrinjam o acesso a este método, como parte de uma política de redução de casos por intoxicação e tentativas de suicídio. É necessário e urgente ampliar o controle da aquisição do “chumbinho”, uma vez que apesar da venda ser proibida, o acesso é fácil e barato (a dose custa cerca de R$ 2, 00 nas ruas do Rio de Janeiro). Quanto à medicação psicoativa, além da fiscalização para o cumprimento da exigência da apresentação da prescrição médica para o seu acesso, faz-se também necessário uma maior conscientização da comunidade médica quanto à dispensação destes medicamentos. Destacou-se nos nossos resultados a prevalência de história de transtorno mental na família entre os homens. Este achado foi confirmado por um estudo que mostrou um risco maior nos casos cuja família tinha história de doença mental (Agerbo et al., 2002). Neste aspecto, é preciso conhecer mais sobre o impacto do transtorno mental nos membros da família e a sua inclusão nas intervenções preventivas do suicídio. Nossos dados também mostraram que 31% dos indivíduos que tentaram suicídio tiveram contato com um profissional de saúde e 23% destes com um profissional de saúde mental na semana da tentativa. Nossos resultados, apoiados em outros estudos, indicam a importância de se desenvolver treinamento junto aos profissionais de saúde, não só os de saúde mental, para a avaliação dos riscos de suicídio e prevenção do mesmo (Kachava & Escobar, 2005; Nunes, 1988). A tentativa de suicídio é um importante problema de saúde pública que precisa ser melhor investigado através de metodologias adequadas a nossa realidade. Em razão da grande variedade regional, as taxas de suicídio variam de 2 a 16 mortes por 100.000 habitantes no Brasil. Existe a necessidade de se pesquisar sobre os transtornos mentais, incluindo as distinções de gênero e os aspectos culturais, sociais e regionais que influenciam o comportamento suicida nestas diferentes populações. Nossos achados sugerem que a 59 prevenção do suicídio precisa ser multisetorial, incluindo ações e políticas para educação e empregos, além das medidas de intervenção e tratamento dos transtornos mentais. Limitações O desenho do estudo foi seccional e, portanto, não se pode estabelecer uma relação causal entre os fatores estudados. Esta amostra não é representativa de todos os casos de tentativas de suicídio no Rio de Janeiro e sim dos casos de tentativas que buscam atendimento médico emergencial no HMSA. 60 7. Referências bibliográficas AGHANWA, H. 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Endereço ___________________________________________________________ _____________________________________________________________________ 3. Naturalidade ___________ 4. Há quanto tempo reside na cidade? _________ 5. Telefone de contato __________ 6. Data do agravo 7. Hora do agravo ______________ 8. Data da internação / / / / 9. Destino do paciente 1- tratado e liberado 2- internado 3- removido Para onde? ___________________________________ 4- óbito 10. Método: 1-arma de fogo 2-afogamento 3-enforcamento 4-fogo/fumaça 5-impacto de veículo (motor/trem) 6-objeto cortante. Qual? ___________________________________ 7-precipitação de lugar elevado 8-medicamento 9-pesticida (chumbinho, DDT, agrotóxico, etc.). Qual? ______________________ 10-gás banh/cozinha 11-outro método. Qual? ________________________________ 99-ignorado 11. Natureza, localização e extensão da lesão 1-queimadura 2-fratura 3-laceração 4-outra. Qual? _____________________________ 12. Quando foi a última consulta/atendimento do paciente com um profissional de saúde (qualquer que tenha sido o motivo da consulta), antes desse agravo? ______________________ (dias, semanas, meses atrás) 13. Natureza da consulta (médico, psicólogo, etc.) ______________________ 14. Motivo da consulta _____________________________________________ 15. No momento do agravo o paciente estava sob efeito de álcool 1-não 2-sim 16. No momento do agravo o paciente estava sob efeito de droga ilícita 1-não 2-sim Qual? __________________________________ 17. No momento do agravo o paciente estava sob efeito de medicamento (até 24 horas antes do evento) 1-não 2-sim Qual? _____________________________________ 18. Intencionalidade atribuída pelo paciente 1-sem intenção de suicídio 2-com intenção de suicídio 19. Queixa/problema (s) relatado (s) ______________________________________________________________ 1-conflito familiar 2-sexual 3-problemas no trabalho 4-problemas na escola 5-problemas financeiros 6-violência/abuso físico/sexual 7-doença 8-desemprego 9-viuvez 10-mudança de residência 11-solidão 12-outros. Qual? __________________________________________ 20. Há quanto tempo? ____________________________________ 21. História de tentativas de suicídio anteriores 1-não 2-sim. Quem? _________________________________ 22. História de suicídio na família 1-não 2-sim. Quem? __________________________________ 23. História de tentativa de suicídio na família 1-não 2-sim. Quem e qual? __________________________________ 24. História de transtorno mental na família 1-não 2-sim. Qual? _____________________________________ 25. Dependente de droga ilícita 1-não 2-sim. Qual? ____________________________________ 26. Uso regular de medicamento psicoativo 1-não 2-sim. Qual? _____________________________________ 27. Faz uso constante de algum outro medicamento 1-não 2-sim. Qual? ___________________________________ 28. Dependente de bebida alcoólica 1-não 2-sim 29. Local do agravo 1-residência 2-trabalho 3-via pública 4-outro Qual? ___________________________________________________________ 30. Você tem alguma doença ou problema de saúde que precisa ser tratado? 1-não 2-sim 31. Se sim, que doença(s) ou problema (s) de saúde é (são) esses (s) ____________________________________________________________________ 32. Esteve internado em hospital psiquiátrico 1-não 2-sim 33. Faz ou fez tratamento em ambulatório de psiquiatria e ou psicologia? 1-não 2-sim. Qual? ________________________________________________ Anexo II TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO Um grupo de Pesquisadores do Núcleo de Estudos de Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro, psicólogos, está realizando uma pesquisa intitulada Avaliação de fatores de risco para tentativas de suicídio em uma população atendida em hospital de emergência no RJ. Esta pesquisa tem como objetivo analisar os fatores de risco associados às tentativas de suicídio em uma população atendida no setor de emergência de um hospital público da cidade do Rio de Janeiro. Independente de sua participação na pesquisa, o paciente permanecerá sendo respeitado e assistido pela instituição, permanecendo em sigilo sua identidade. Ao longo da aplicação do questionário, caso haja desconforto de qualquer natureza, o paciente poderá interrompera entrevista. Os dados coletados serão utilizados apenas para a presente pesquisa e poderão ser apresentados ou publicados em eventos científicos. Assinatura da Pesquisadora: ______________________________________________________ PARECER DO PARTICIPANTE: Aceito participar da presente pesquisa: Assinatura: _______________________________________________________________ Nome: __________________________________________ Data: