Interculturalidade latino-americana em Raúl

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Interculturalidade latino-americana... Viana de Lima
Interculturalidade latino-americana em Raúl FornetBetancourt
Rodrigo Viana de Lima - UFES
Resumo: Esta pesquisa tem por objetivo apresentar o tema da
Interculturalidade concebida por Raúl Fornet-Betancourt, na
forma como esta é objeto e traço fundamental deste
pensamento. Concordando que seu pensamento é voltado para
a compreensão das mais diversas culturas, nesse processo serão
buscadas no autor, por suas obras e comentadores, bases da
filosofia intercultural procurando compreender a concepção de
uma nova modalidade de filosofia que busca através da
interculturalidade descentralizar as reflexões filosóficas; esses
são os objetivos desta pesquisa.
Palavras chave: Filosofia ocidental, libertação, inculturação,
interculturalidade.
Abstract: This research has the goal to present the theme
of interculturality designed by Raúl Fornet-Betancourt, the
way it is object and fundamental feature of this thought.
Agreeing that his thought is focused on understanding the
many different cultures, in this process they will be searched
on the author, for his works and by commentators, bases of
intercultural philosophy trying to understand the conception of
a
new
kind
of
philosophy
that searches,
through interculturality, to
decentralize philosophical
reflections : these are the goals of this research.
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Keywords: Western Philosophy, liberation,
inculturation, interculturality
1.Sobre Raúl Fornet-Betancourt
Raúl Fornet-Betancourt nasceu em 1946, em Holguím,
Cuba. Concluiu seu período escolar em Porto Rico e de lá foi
para a Espanha estudar teologia. Logo trocou a teologia pelos
estudos de filosofia. Ainda como estudante teve despertado seu
interesse para os estudos da filosofia latino-americana.
Engajou-se no movimento estudantil em oposição ao
governo espanhol da época, o que ocasionou sua extradição da
Espanha. Exilou-se na França, em Paris, onde continuou seus
estudos. Nesse período mantinha encontros com grandes
pensadores como: Lévinas, Foucault e Jean-Paul Sartre, os
quais influenciariam diretamente seus estudos.
Viveu por dois anos no Peru onde contribuiu com
Gustavo Gutierrez – peruano – teólogo da libertação. Em 1972
foi para Alemanha. Em 1977 foi promovido professor em
Aachen com seu trabalho “A fenomenologia ontológica em
Jean-Paul Sartre”, com uma investigação sobre o Marxismo
chegou ao doutorado na Faculdade de Filosofia y Letras da
Universidade de Salamanca. Em Bremen habilitou-se com o
trabalho: “Outro Marxismo? A recepção filosófica do
marxismo na América latina”.
Ao classificar Cuba, seu país de origem, como sendo
intercultural, o pensador justifica afirmando que a cultura
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cubana é formada pela mescla das culturas européias (dos
colonizadores), africana (dos escravos) e indígenas (originários
da terra). E também porque Cuba faz parte do espaço cultural
latino-americano, que é fortemente cunhado pelas culturas
indígenas, que desde o século dezessete vêm sofrendo forte
abafamento dessa cultura, mas que tem resistido bravamente.
Ao se colocar como habitante do mundo, Raúl FornetBetancourt vivencia culturas de diversos países e seu
pensamento se molda pela “mescla” de teóricos das mais
variadas teses. Assim de um lado recebe influência dos teóricos
europeus e equilibra com influências de pensadores latinoamericanos.
Em 1989 dá inicio a um programa de diálogo entre a
ética do discurso e a filosofia latino-americana da libertação,
que tem por objetivo a abertura entre filosofias do Sul e do
Norte. É também coordenador dos congressos realizados desde
1995 para a filosofia intercultural, onde diversos pensadores se
empenham em mudar a filosofia local. Todos influenciados
pela personalidade de Raúl Fornet-Betancourt, por sua
obsessão pela interculturalidade. Os seminários e congressos
semeiam o principal interesse do autor em sua pesquisa. E sua
disposição com o pensamento filosófico latino-americano
mesclado com alguns princípios filosóficos e teológicos
europeus.
A diversidade cultural dos locais em que Raúl FornetBetancourt passou boa parte da vida foi um fator facilitador
para sua direção rumo à interculturalidade.
2.Roteiro rumo à interculturalidade
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De inicio deixamos claro que a interculturalidade não
pode ser confundida com noções de: multiculturalismo, nova
filosofia da cultura ou uma super filosofia transcultural. O que
cabe a ela é uma realidade ainda em construção. Seu
desdobramento temático gira em torno de uma relação entre as
culturas nativas e histórica – escravos e dominadores – em
comunicação entre si, acreditando no aprendizado mútuo por
meio do dialogo, assim mantendo um principio de dignidade
entre todas elas.
Não podemos também relacionar a interculturalidade
como uma espécie de equilíbrio espiritual, que supera o
problema das ciências naturais, filosofia, religião ou das
culturas diversas. O que é pretendido por ela é criar um ponto
de partida distinto, afastando-se de convenções locais,
nacionais e internacionais que seja imposta por uma cultura
dominante.
A interculturalidade representa um avanço no que diz
respeito ao multiculturalismo no sentido que este se refere à
presença em um mesmo lugar de culturas diversas, que não
estão necessariamente ligadas entre si. O multiculturalismo
pretende defender a liberdade e a igualdade entre as culturas,
buscando conquistar o respeito e a tolerância, com isso
complementa a necessidade do reconhecimento da
interculturalidade por sua parte independente da manifestação
cultural que se apresente, buscando somente o respeito e o
reconhecimento. Daí a evolução de uma sociedade
multicultural para uma intercultural deve ser realizada
mediante dialogo entre eles.
Interculturalidade seria o nome de uma linha filosófica
que apesar de reconhecer seu centro busca ir além das
diferenças entre filosofia, cultura e religião. Por isso não
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absolutiza nem singulariza nenhuma destas. Dessa maneira se
sobressai a qualquer comparação que implicaria um ponto fora
do neutro que não existe se pensando em justiça. A
interculturalidade cria um posicionamento próprio a nível
metodológico e filosófico, não cede privilégios a nenhum
sistema conceitual ou tradicional, mais privilegia a cultura
nativa. Não trata com a filosofia, cultura e religião como sendo
essas criadoras de signos que tornam destaques cada uma delas
em seu contexto.
Dentro de uma comunicação, a interculturalidade aparece
como caminho de pensamento e de vida por um duplo
movimento: querer entender e ser entendido. Caracterizando,
assim, uma abertura em busca da fusão entre as filosofias,
culturas e religiões, que seria uma retomada do diálogo em
uma única visão e percepção do mundo. Em um nível de
relação que implica o âmbito sócio-cultural, seja individual ou
grupal, também podemos tratar dentro de um comportamento
intercultural de cada sociedade e cultura de acordo com as
seguintes condições: tratar como condição inicial a diversidade
de pessoas e culturas, facilitar a comunicação através das
diferenças filosóficas, culturais e religiosas com respeito mutuo
entre pessoas.
Alguns autores apresentam uma linha de que existe uma
parcela de interculturalidade distinta para cada sociedade. Essa
linha abre a reflexão da aceitação e compreensão que é a chave
para esse tipo de relação em tudo o que desperta, com isso
favorece um caminho que ultrapassa e aumenta as
comunicações e trabalhos em comum, o aumento dessas
capacidades serve de instrumento para criar a própria imagem e
adequar-se a situação intercultural especifica. Isso cria a
necessidade de uma adequação de comportamento diante dessa
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realidade e cria um modelo capaz de reconhecer as próprias
necessidades respeitando os outros. È importante dizer que
para esse modelo trazer resultados, é necessário a existência de
um plano político local e internacional que o permita.
Assim podemos dizer que a interculturalidade revela sua
aposta no diálogo mútuo, o crescimento mediante a fusão entre
filosofia, religião e as culturas diversas, a compreensão da
cultura, a coragem de aprender a pensar novamente a luz das
diversas tradições evitando cair na mesmice: conquistar e forjar
o outro a minha visão e auto-compreensão, o que está
relacionado com compreensão superior a realidade e razão em
se contexto. Analisando assim não se entende por qual tipo de
autoridade se acha licito impor-se ao outro.
Segundo o principio da “originalidade da cultura” e com
ele a pluralidade cultural, isto mostra que não temos que
dominar, converter ou impor nosso modo de ser e de pensar a
ninguém. Na verdade não existe um ponto homogêneo para a
submissão de todos, mesmo que esse fato tenha sido
predominante por muito tempo. A interculturalidade busca
tratar bem, conhecer e aumentar a auto-compreensão do outro
dentro de um dialogo que não o obriga a negar ou admitir tudo
o que lhe é proposto.
A interculturalidade aposta em um diálogo fundado no
principio da existência dialógica racional do ser humano que
apresenta outros aspectos. Por isso, sempre nosso pensar, sentir
e atuar se realizam em respeito a algo ou alguém. Isso significa
assumir a centralidade do dialogo para se ter acesso a uma
determinada relação, instaurando a inter-subjetividade como
partida para animar, renovar e reconfigurar o aspecto
epistemológico conceitual em seu amplo sentido, nessa
compreensão de cultura e da vida partindo da filosofia. Na
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realidade nosso “conhecimento” tende ao “desconhecimento”
de outros mundos, de modo que o nosso olhar da realidade se
dá distorcido, dificultando então entender e relacionar-se com
ela (através de seus diferentes símbolos e códigos), assim
impedindo o estabelecimento de uma comunicação autentica.
Temos de estar conscientes de que cada cultura tem
definido historicamente a construção do normal e do natural (a
priori). Isso se perde com as relações de poder, marcado pela
desigualdade racial e cultural.
Para que um projeto possa ser qualificado de intercultural
esse teria que assumir uma deliberada inter-relação entre as
distintas culturas e se apresentar expressando em toda sua
dinâmica e finalidade ultima. É possível afirmar que só
modelos orientados pelos termos acima podem ser
considerados “intercultural”. Temos que compreender que a
condição fundamental para poder qualificar como
“interculturalidade” é sua concepção como um processo
permanente e sempre inacabado.
3. Aproximação teórica
O próprio Raúl Fornet-Betancout se baseou em diversas
teses e princípios filosóficos europeus, estimulando-se com
essas, o que marcou as diversas mudanças em sua caminhada.
Ele se encontra em uma tradição originalmente judaico-cristão,
de um humanismo ético-crítico, a mesma tradição que serviu
de linha condutora para diversos pensadores como Herder,
Marx, Sartre, Lévinas e também para pensadores da filosofia
da libertação.
Ele analisa a interconexão desses princípios no fato de
expressarem uma humanidade, observada como parte da
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formação da existência humana, qualificada como si mesma.
Essa subjetividade se interessa no outro no sentido literal,
eticamente direcionada. Essa construção se desenvolve,
segundo seu entendimento, em uma tradição humanística
libertadora, apresentando conceitos de uma subjetividade real
que se alimenta da recordação de todos aqueles que lutaram por
sua humanidade negada.
Neste ponto, a filosofia desenvolvida por Sartre causa
grande influência pelo engajamento político, pela reflexão e
por se conectar com a situação real. Esse contexto
desenvolvido por Sartre o trás à reflexão, contudo, ele vê a
chance de superar a diferença entre universalidade e
particularidade. Construindo sua própria tese, ele amplia a
filosofia Sartreana, por uma de relevância ético-prático, o que
motiva o princípio filosófico de Raúl Fornet-Betancourt; “O
esboço ético de Sartre quer ser entendido como perspectiva de
um processo aberto para dar sentido à história da frágil
emancipação do homem através da práxis libertadora”. Por
essa práxis, as pessoas organizam sua liberdade dentro de uma
práxis comum. Ela se transforma em uma soma de forças que
busca a construção de um “reino humano”, que propõe um
acerto mais justo com a materialidade, que não se trata somente
de uma simples distribuição de bases de vida. Raúl FornetBetancourt analisa Sartre como um esboço de uma práxis
solidária que interrompem com o poder dominador e com os
dominantes. Essa foi uma das contribuições em direção à sua
construção do ético-prático.
Ele também apresenta conexão com o interesse de Sartre
em fazer jus à existência do outro. Sartre não encara o ‘outro’
como objeto de conhecimento, nem como idéia reguladora e
sim como ‘corpo’. Sua relação com o ‘outro’ não é de
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conhecimento e sim de ‘ser’, por isso torna o mundo
intersubjetivo. Buscando em Hegel, Sartre diz: “O caminho à
minha mesmice passa necessariamente pelo ‘outro’”. FornetBetancourt valoriza o esforço de Sartre em apresentar o ‘outro’,
e o critica por não apresentar o ‘outro’ como real, o qual eu
encontro e não como o que eu nomeio e o perco na
generalidade.
Contudo, ele funda seu próprio inicio tendo como base
Sartre, porém busca desbravar outros caminhos, mudando o
enfoque. Diferente de Sartre, ele constrói seu pensamento em
uma dimensão dialógica e, na intersubjetividade, trabalha com
a idéia do ‘ser-um-para-o-outro’ de Sartre e com a concepção
heideggeriana do ‘ser-com’ (abstrato, que se perde na
mesmice) e altera para o ‘ser-com’ real (concreto, que “é”).
Assim o ‘ser-para-o-outro’ apresentado por Sartre é criticado
por Fornet-Betancourt, por apresentar a prioridade do ‘outrosujeito’ o que ameaça o ‘outro’ real a se tornar novamente um
princípio apriorístico. Assim o ‘ser-para-o-outro’ não é
entendido por ele como é por Sartre, na forma de carga
(insuportável) e sim como alicerce do ser humano que abre
diversas possibilidades.
Neste inicio da jornada rumo a interculturalidade, seu
pensamento e suas idéias ainda não foram concebidos, porém,
essa critica a Sartre não é uma simples crítica contra a filosofia
européia que se contrapunha à própria tese desenvolvida.
Através do pensamento da dialogicidade e da
intersubjetividade são criadas bases que, mais tarde, são
somados com outras bases, o que contribui para o inicio do
desenvolvimento teórico da própria tese da interculturalidade.
Também de grande contribuição em sua construção
teórica foi o confronto com a filosofia latino-americana. Em
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seus primeiros escritos, Fornet-Betancourt explicita sua
admiração por diversos filósofos latino-americanos e cria certa
aproximação com eles.
No período de sua formação filosófica, no trato da
filosofia latino-americana – o próprio conceito que sugere
unicidade já é desorientador – já que tudo estava em
movimento. Neste contexto perturbador ele também busca
encontrar sua própria posição, ao ter avaliado todas as posições
individuais dos diversos pensamentos analisados. Neste
momento ele dialoga com diversos pensadores latinoamericano. Tratarei dos diálogos em um parágrafo próprio.
É importante apresentar até que ponto ele reconheceu a
importância de se pensar filosoficamente e o quanto o exemplo
europeu acrescentou para essa avaliação. Isso porque está em
questão à filosofia latino-americana, que já havia sido
levantada pelo pensador argentino Juan Bautista Alberdi
(1810-1884) e comentada nos anos setenta do século vinte pelo
próprio Fornet-Betancourt por um artigo intitulado “Existe uma
filosofia latino-americana?”.
O artigo é uma crítica por perceber que as universidades
latinas apresentam um currículo quase que exclusivo da
filosofia européia ou norte-americana, filosofia latinoamericano é quase inexistente. O que encontramos em nossas
universidades são disciplinas de filosofia latino-americanas
isoladas e não em disciplinas como lógica ou ética, por
exemplo, o que acaba por contribuir para discriminação.
Pensadoras latinas não são reconhecidas como filósofas, isso é
causa da descriminação dos europeus, mas também pela falta
de auto-apreciação dos latinos-americanos e latinasamericanas.
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Nos tempos de Alberdi a descriminação do “latinoamericano” era ainda mais transparente. A desvalorização do
todo cultural, chegava ao ponto de dizerem (europeus) só terá
futuro a America Latina se dada sua europeização.
Neste ponto de busca por uma auto-afirmação, Alberdi
apresenta a necessidade de uma nova filosofia nacional e
latino-americana, o que ainda não existia. Ele propõe como
ponto de partida os problemas latino-americanos e pontos
históricos, para assim se criar uma filosofia pura latinoamericana, sem rejeitar os fundamentos da filosofia européia,
que deve ser usada como base e não como fim.
Em seqüência apresenta-se com muita intensidade a
questão sobre como deveria ser o formato de uma filosofia
latino-americana ainda a ser concebida. Trataria de uma nova
filosofia que só teria validade para a América Latina? Ou
deveria ser uma filosofia partindo da América Latina com
relevância universal? O ponto alto foi o IX Congresso de
filosofia latino-americano em 1977, onde pensadores latinos
apresentam suas opiniões.
Este conflito em torno da filosofia é frutífero, por que
trás à reflexão a questão sobre se existe uma ou mais filosofias
e como se posiciona Raúl Fornet-Betancourt neste embate. Ele
deixa claro que sua posição é muito crítica perante as teses e
pensamentos até então apresentadas.
Fornet-Betancourt apresenta seu conceito de filosofia:
“Para nós, a filosofia é uma ação
essencialmente humana. [...] Em outras
palavras, filosofar não é apenas uma reflexão
sobre o humano e tudo o que determina o
humano, porém, filosofar também significa viver
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a partir de acordo com o essencialmente
humano” (Problemas actuales de La filosofia em
hispanoamerica, Buenos Aires, 1985, p.29)
Essa afirmação apresenta duas coisas: de um lado ele
considera que filosofar é tipicamente humano e, de outro, a
filosofia “termina” no agir humano ou pelo menos deveria sêlo. Esta sua convicção aponta sua posição ante a filosofia
latino-americana.
Sua posição para a ação o liga com diversas posições da
filosofia latino-americana. Esta convicção de que a filosofia
não é um fim em si mesma se torna uma marca do seu
pensamento.
Sua primeira declaração merece uma explicação: se a
filosofia é tipicamente humana, então ela é universal, no
sentido de conteúdo, quando uma filosofia surge num
determinado lugar e se universaliza a partir dali, porém
universal no sentido de pensamento ou reflexão que podem
surgir e são praticadas. Assim Fornet-Betancourt fica
indiretamente distante da filosofia ocidental, a qual com
freqüência impõem uma pretensão de representação exclusiva e
não reconhece outro pensamento com prestigio de filosofia.
Com isso ele também concorda que o âmbito histórico e a
situação real determinam a filosofia, já que ela como todo
movimento humano, só acontece no espaço e no tempo.
Ele busca se distanciar do rigor dos particularistas. Se
uma filosofia surge de uma determinada situação, sem que aja
impedimentos, ela é mais que uma simples reflexão sobre essa
situação: “Porque aquilo pelo que realmente se pergunta não é
a simples situação, porém, precisamente aquilo que qualifica
esta situação enquanto tal, ao aparecer como o que nela está em
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jogo, a saber, o próprio ser humano em tudo o que lhe é
próprio.” Trata-se, para Fornet-Betancourt, do natural humano,
do que é indispensável que ele separa claramente das
circunstâncias. Uma filosofia que mistura todas essas coisas,
para ele, não é filosofia.
Neste ponto o autor tende a uma posição universalista, na
qual se dialoga com uma philosophia perennis.
Contextualizada nesta fase do seu pensamento, em que ele
dialoga com uma filosofia pura, nem de longe segue sua tese
final da Interculturalidade. Seu contato com a filosofia latinoamericana, pelo menos às teses de cunho particularista, neste
ponto, pode ser assinalado como criticamente distante.
Em paralelo, chama à atenção a profundidade do seu
envolvimento na filosofia latino-americana, apresentada em
autobiografias e em muitas obras posteriores. Ele deixa
explícita sua aproximação com o pensamento de José Martí,
que pregava a interconexão com formas de pensamento véteroamericanas e criticava uma filosofia apenas ocidental, ele
entende ai um verdadeiro pensamento latino-americano. A
filosofia latino-americana de Juan Bautista Alberdi a Leopoldo
Zea, que ele, em 1985, em “Problemas actuales de la filosofia
em hispanoamérica”, não olhava com bons olhos por
considerar uma construção muito particularista, ele passa a
considerar como pilar de uma construção filosófica
intercultural. A filosofia latino-americana é para ele um
“modelo de uma filosofia prática, que representa um contexto
histórico no qual aquela se encontra.
4.Diálogos
De entrada devemos apresentar que este subtema deve
contribuir na construção da tese da Interculturalidade de Raul
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Fornet-Betancourt. Trataremos aqui com dois grandes
pensadores da filosofia latino-americana Leopoldo Zea e
Enrique Dussel. Deixamos claro que outros pensadores latinoamericanos como: Arturo Ardao, Arturo Roig, Luis Villoro,
José Marti, etc, foram de suma importância no dialogo
construtivo da tese da interculturalidade.
Traremos aqui um dialogo mais profundo com a filosofia
latino-americana e seu próprio passado, com suas expressões
históricas, com figuras e instituições que determinam as linhas
de seu desenvolvimento, em uma única palavra, diálogo com a
história; pelo que está não só da direção e inspira suas
articulações presentes, como perpetua muitas de suas práticas
atuais, em nível do ensino escolar ou universitário ou mesmo
no âmbito da investigação.
Não existe prática intercultural sem vontade e exercício
de tradução, isso quer dizer que a perspectiva intercultural que
apresentamos aqui como horizonte de autocrítica da filosofia
latino-americana deve somar para deixar nítido que a filosofia
latino-americana não pode responder o desafio da
interculturalidade sem passar por uma dura mudança que
busque descentralizar sua história e com isso abrir seu presente
a uma diversidade de formas de expressão e de práticas do
filosofar.
Seguindo um lugar comum da historiografia filosófica da
América Latina, na forma de filosofia que desde Juan Bautista
Alberdi (1820-1884) se fixa com o nome de “filosofia
americana”. Iniciaremos o dialogo com dois dos grandes
nomes da filosofia latino-americana.
Começamos com Leopoldo Zea, não só pelo que seu
nome representa na filosofia latino-americana, mais acima de
tudo porque nenhum outro filósofo na América Latina assumiu
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tamanho compromisso e empenho em tornar o “1992” (data
comemorativa dos 500 anos da chegada dos europeus na
América do Sul) um tema de reflexão filosófica
contextualizada.
Mesmo que a principio Leopoldo Zea aponte o
eurocentrismo que é nítido na categoria “descobrimento”, suas
obras posteriores sobre o assunto não deixam duvidas de que
para ele a comemoração dos quinhentos anos de “história
comum” não é a oportunidade favorável para aceitar o desafio
de um dialogo (intercultural) no interior da America Latina, se
não uma grande chance de trabalhar a reconciliação da
comunidade ibero-americana.
Para que se compreenda a tese central da filosofia da
história latino-americana de Leopoldo Zea, é importante
entender que sua base de interpretação é a idéia de “latinidade”,
e essa também é sua base para tratar com o “1992”, motivo que
o impede de ter o justo alcance do desafio intercultural
proposto por povos indígenas e afro-americanos, em suas
mobilizações pelos direitos à autodeterminação política,
cultural e religiosa. Leopoldo Zea trata com esse assunto como
sendo um problema de incorporação nos âmbitos nacionais
vigentes, pois ele não entende que o “indígena”, ao menos no
México, passe por problemas de diferenças culturais e sim por
uma falta de integração social e econômica. “O problema não é
o indígena como sujeito de uma cultura diferente, o indígena
tem direitos como mexicano, não como pertencente a esta ou
àquela outra etnia”.
Dentro de um projeto de entendimento da América
Latina com a “Ibéria”, da integração do mundo iberoamericano como sendo um bloco cultural mestiço e porta voz
do mundo anglo-saxão, dentro das formas da globalização
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atual, Leopoldo Zea nivela as condições culturais que o evento
do “1992” acrescenta, na América Latina, para ler essa data
exclusivamente sob o signo do lema do “Encontro de dois
mundos” o qual anula o significado histórico dessa data como
acontecimento que chama ao encontro intercultural os muitos
mundos americanos, ou seja, ao “descobrimento” que
reconhece a diversidade cultural da América Latina nos povos
e culturas vivas que reclamam, justamente, o fim dos discursos
e políticas que os incluem muito rápido em um mundo mestiço
onde o setor-chave (política, economia, educação, religião)
nunca tem podido cogovernar.
Leopoldo Zea não percebe que para a América Latina o
“1992” é o Kairós (Deus da mitologia grega. Na filosofia grega
e romana é a experiência do momento oportuno) do “encontro
de dois mundos” no interior da América Latina; o Kairós da
reconstrução intercultural que não rejeita nem a latinidade nem
a mestiçagem como ponto de identidade, mais as repõe como
parte de uma construção de diálogos e práticas culturais, e não
como espinha dorsal do desenvolvimento cultural na América
Latina.
Trataremos agora com Enrique Dussel, outro nome
importante e representativo da filosofia latino-americana ainda
dentro do tema do “1992”. Para esse dialogo servirá de
referencia sua obra “1492. o encobrimento do outro: a origem
do mito da modernidade”.
Enrique Dussel levanta sua voz para apresentar a questão
do “1992” do ponto de vista do “outro” (da vitima) e fala de
um combate violento em desigualdade que pede uma
“celebração” senão uma “explicação ao índio americano”. Ele
marca sua posição olhando para o “outro” e assim constrói seus
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argumentos percebendo o Kairós com que o “1992” encara a
filosofia e a teologia na América Latina.
Desde sua escolha pelo “Outro” e desde sua crítica à
ideologia dominadora que dela se desprende, ele apresenta em
outro momento importante de sua argumentação a visão
européia do “1492”, que para ele é o resultado de uma falsa
miragem eurocêntrica e que não pode, por conseguinte, se não
desconhecer ou encobrir ao “outro”. As criticas direcionadas ao
eurocentrismo nos discursos sobre o “1492” é um passo
realmente importante em sua argumentação já que sua intenção
é firmar a tese de que o “1492” é a data que nos deixa frente a
frente com o fato histórico à “origem do mito da
Modernidade”. Mas sabendo que isso é um mito e para ele um
mito que deve ser desmitificado em sua origem, que atua
fortemente para fazer da Europa o centro da história universal
onde; historicamente, só a Europa aparece, o resto do mundo, o
“Outro”, fica fora de tudo e é reduzida a coadjuvante nas
glórias européias.
Dentro de uma perspectiva da visão européia do “1492”,
Enrique Dussel aponta como a ideologia eurocêntrica se fixa
em figuras históricas (invenção, descobrimento, conquista,
colonização, conquista espiritual) que devem ser revisadas
como alteração de uma dialética de dominação imperial que
não deixa lugar próprio, nem físico nem cultural para a
alteridade do “Outro”.
Enrique Dussel busca construir sob uma linha que
pretende abrir horizontes para uma nova interpretação (não
eurocêntrica) da história universal, onde a América Latina não
fica como mera coadjuvante e sim como foco principal no
momento que é constituido a chamada Modernidade na história
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mundial. Dussel busca mostrar o lugar da América Latina na
história universal da qual tem sido excluída, ele diz:
“Com razão se tem afirmado que a
América Latina ficava excluída, como fora da
história. A questão é propor uma ‘reconstrução’
que seja histórica e arqueologicamente
aceitável e que ao mesmo tempo, corrija o
desafio eurocentrista”. (1492. O encobrimento
do outro, 1993 p. 12)
A contribuição de Enrique Dussel vem da forma como
ele “vê” desde “os olhos do Outro” ou seja, como toma para si
o “espírito” que anima a “visão do Outro” e como faz uso disso
na apresentação de sua argumentação, deixando claro uma fina
sintonia com “a voz do Outro”.
Como já dissemos anteriormente é possível observar
rapidamente o quanto a filosofia latino-americana influenciou
diretamente o pensamento de Fornet-Betancourt. Em vários
momentos ele se confrontou de maneira crítica com diferentes
linhas da filosofia latino-americana. Ao mesmo tempo os
diversos pensadores serviram de base solida para sua
construção.
As observações críticas formuladas na apresentação
desses “grandes nomes” da filosofia latino-america ao
fenômeno intercultural e o seu desafio para o fazer filosófico
em Nossa América são limitações assinaladas devido às suas
colocações que podem também ser comprovadas por suas
respostas à pergunta sobre a situação da filosofia no fim do
século XX.
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Esse fato tem importância por remeter às respostas de
Leopoldo Zea, Arturo Andrés Roig, Enrique Dussel e Luis
Villoro, refere-se a um documento de biografia intelectual e de
autopercepção, que permite balancear, com base numa primeira
versão direta, como e de que maneira esses pensadores tem
assumido o desafio do dialogo intercultural em seu
desenvolvimento e qual nível de prioridade ele tem dado ao
desenvolvimento de suas próprias posições. Digo que estas
respostas deixam claras as limitações marcadas em suas
colocações, porque, se são testemunho de um grande esforço
em contextualizar a filosofia em nosso meio, e como diz
Leopoldo Zea articular “um filosofar a altura do homem”, não
se vê nas respostas que se tenha tomado consciência de que
esse processo contextualização seguira sendo incompleto e
deficiente enquanto não se considere como um processo que
exige também a abertura da filosofia à diversidade cultural que
informa a realidade dos contextos de vida da América Latina, e
que tem, por isso mesmo, como parte integral de sua dinâmica
o encarar esse dialogo entre as culturas presentes no continente
como um desafio de transformação radical da filosofia latinoamericana.
Assim, por exemplo, Enrique Dussel insiste em projetar
mundialmente seu projeto filosófico da filosofia da libertação,
na figura de uma ética universal da vida; Arturo Andrés Roig
propõe priorizar a reflexão sobre a constituição da
subjetividade latino-americana à luz da categoria da dignidade
humana; Luis Villoro sublinha a importância de fundamentar
uma nova ética e Leopoldo Zea ressalta, como linha de futuro
prioritária, a perspectiva orteguiana de pensar em dialogo com
circunstâncias e experiências próprias. Projetos todos eles, sem
duvida, fundamentais para o desenvolvimento contextual da
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filosofia na América Latina, mas que não fazem cargo, todavia,
de que a diversidade cultural com que os confronta a mesma
contextualidade do continente, os desafia com a tarefa
prioritária de refazer a filosofia latino-americana desde o
dialogo entre todas as culturas que compõem a riqueza plural
da América Latina.
Por outro lado, é pertinente advertir, nesse contexto, que
o impacto do kairós da conjuntura histórica do “1992” não se
deixou sentir somente entre os representantes consagrados da
filosofia latino-americana. Por isso, há necessidade de ampliar
nosso campo de análise (Interculturalidade: crítica, diálogo e
perspectiva. São Leopoldo: Nova Harmonia, 2004.).
Fornet-Betancourt é especialmente influenciado por José
Martí, a quem ele admira como pensador e crítico, que busca
assumir a realidade e liga seus esforços de compreensão com
responsabilidade ética.
5.Cultura
Se nos questionarmos sobre o que significa para FornetBetancourt uma filosofia intercultural, de uma maneira
definidora e conteudística, com o que foi apresentado até
agora, certamente observaremos uma controvérsia com sua
construção final. Assim trabalharemos com a fase de seu
pensamento que se entende como filosofia intercultural, essa
que se dá por meados dos anos noventa do século vinte.
Antes de entrarmos em interculturalidade temos que
apresentar o que Fornet-Betancourt entende por cultura, a
pensar que o discurso de cultura está na boca do mundo e serve
de base do intercultural.
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Cultura para ele tem um significado muito grande, já que
cada filosofia e cada pensamento são pré- determinados por seu
contexto cultural.
Fornet-Betancourt compreende cultura como um conceito
amplo e dinâmico, e não como unidade imutável, protegida,
que determina o ser humano. Ele rejeita uma essência da
cultura da mesma forma de um determinismo cultural, e vem
cobrar respeito e reconhecimento em face da cultura, que ele
aponta como nossas reservas, conceito que mostra que são
responsáveis pelo nosso pensar e agir, a fonte da qual
“bebemos”. O respeito e o reconhecimento não podem ser
comparados com conservação de culturas ou como afirmação
de um estado persistente de cultura, e sim a chance para que
cada indivíduo tenha no âmbito da cultura a possibilidade de
tomar posse de suas tradições, lidar com elas e modelá-las.
Reservas culturais não podem ser confundidas com relíquias,
pois se trata de uma riqueza atual e presente.
Culturas são “horizontes de compreensão e ação que
devem ser concretizados no dia a dia, por seres humanos
concretos os quais não interpretam unitariamente nem
traduzem uniformemente aquilo que em cada caso nomeiam
em sua própria cultura. Com isso também se diz que para a
dinâmica interna de uma cultura pertence não só a confirmação
de sua tradição, mas também a sua modificação, portanto, a
dialética de tradição e inovação”.
Fornet-Betancourt chama a atenção que essa tradição que
acentua a dinâmica de uma cultura de cultura só se sustenta
quando “ela não se aposenta para viver de seus rendimentos”.
Quando algumas culturas seguem unilaterais as suas tradições,
elas interrompem seu próprio curso natural e passam a servir
exclusivamente à conservação de uma herança de tradições.
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Fornet-Betancourt acrescenta que essa forma fundamentalista
de cultura é uma não-cultura. Para ele cultura se destaca por
sua força fundadora em ajudar seus membros de maneira
orientada na realização de suas necessidades, na construção de
um plano de vida, bem como no ajuste de suas preocupações.
Isso também alcança uma dimensão material, que FornetBetancourt formula em conexão com Herbert Marcuse –
sociólogo e filosofo alemão:
“Há culturas onde metas e valores pelos
quais se define uma comunidade humana têm
incidência efetiva na organização social do
universo contextual-material que afirma como
próprio
porque
nele
se
encontram”.
(Transformación intercultural de La filosofia,
2001, p.181.)
Se as chances de uma cultura transparecer por seus
membros forem limitadas, a existência desta está em risco.
Assim, pelas linhas da globalização econômica e a distribuição
internacional de trabalho, privam nações e culturas de
produzirem elas mesmas seus pilares que sustentem essas
culturas, sem isso as mesmas correm risco.
Fornet-Betancourt apresenta seu entendimento sobre
relação entre indivíduo e cultura. Nenhum humano existe sem
cultura ou pode existir sem ela, mas, ao mesmo tempo ele não é
refém e não é determinado por ela, mas pode relacionar-se com
ela. A cultura faz o homem, como ele faz a cultura. Somos
sujeitos de culturas e tomamos posse da cultura. Nesta reflexão
ele se baseia na dialética sobre determinação e liberdade de
Sartre, o que influenciou seu entendimento de filosofia já que
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para a filosofia a cultura não pode ser sem importância porque
cada pensamento tem suas bases partindo de um contexto
cultural.
Já que as culturas não são monolíticas, sempre existirá
mais de uma tradição que – com suas tradições e conflitos –
formam uma cultura. Assim dentro de cada cultura existem
tendências libertadoras e opressoras, sua observação é sobre
uma dialética de libertação e opressão nas varias tradições que
formam uma cultura. Existe uma variedade intracultural, no
campo do qual uma linha tradicional é particularmente
fortalecida para fins de estabilização. O que chamamos de
cultura pessoal já está ligado a uma determinada linha. E
porque não existe uma sociedade ideal, assim sempre vão
existir conflitos no campo comunitário. Por isso, as culturas
não são processos limítrofes no sentido de simplesmente
separar o próprio do estranho, mas as fronteiras são criadas
dentro da própria cultura. Por isso a interculturalidade já está
no ventre das culturas.
Pensando na riqueza de facetas de cada cultura, mesmo
que ocultas, Fornet-Betancourt criou o conceito da
desobediência cultural que é a mesma idéia da desobediência
civil contra a opressão em âmbito cultural, e apela para isso a
correntes libertadoras. A desobediência cultural descreve a
práxis libertadora que se dirige contra a opressão, a filosofia
intercultural pode apelar para essa desobediência cultural.
Desobediência cultural surge do interior de uma cultura como
critica de seu modelo, ela oferece a cada membro de uma
cultura o direito de considerá-la mutável. A filosofia
intercultural tende a assumir esta desobediência cultural e, pela
experiência da oposição entre as diversas culturas, apresentar
que cada uma tem o direito sobre sua concepção de mundo,
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mas que o mundo não pode se reduzir a ela. Por isso, cada
pessoa pode se por em ligação com sua cultura e modificá-la,
para isso ela pode rever tradições ocultas e reprimidas e até
recorrer à comunicação com outras culturas ou desenvolver
novas perspectivas a partir das velhas tradições.
A tese de Fornet-Betancourt apresenta que não só
existem muitas culturas na história humana, mas também
muitas tradições no âmbito de uma mesma cultura, as quais
abrem mais uma vez, espaço para as diversas biografias de seus
membros. Com isso uma cultura sempre apresenta diferenças
entre determinação e liberdade e aponta para contradições
sociais e religiosas. Por isso, seu olhar crítico de cultura, que a
princípio sugere cuidado quando se fala de cultura, faz conexão
com seu inicio no contexto latino-americano. Por que com
muita frequência e sob a desculpa de uma cultura comum, é
apresentado como monobloco o que não é unitário: as formas
culturais crioulas, dominam frente as várias culturas e tradições
indígenas e também as afro-americanas, que foram ignoradas,
reprimidas ou oprimidas. Apontando as diferenças
intraculturais, todas as linhas sejam de tradições particulares
como também os indivíduos ganham força para tornar possível
uma reinterpretação cultural.
A compreensão de cultura de Fornet-Betancourt permite
perceber essas construções e abre para um dialogo mais crítico
com elas.
6.Intercultural
A compreensão de cultura até aqui apresentada é uma
introdução central para a filosofia intercultural, pois faz
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conexão com a pluralidade intercultural, assumindo essa e
concedendo permissão para que ela se expresse.
O conceito da diferença intra-cultural, que faz oposição
internamente, mas que também se preenche alternadamente, se
encontra em uma forma de diálogo e serve de hipótese básica
para a interculturalidade, partindo do fato de que as culturas se
encontram entre si em uma relação de troca, sem que isso
ameace suas identidades. Fornet-Betancourt concorda com as
bases teóricas da cultura, já que identidade cultural se
estabelece num processo inacabado, pois para ela a orientação
recíproca do si-mesmo e do ‘Outro’ é constitutiva. As
identidades culturais se fecundam partindo de um limite préestabelecido e da influencia de outras culturas.
Fornet-Betancourt entende que o intercultural se coloca
coma uma possibilidade de complemento, segundo o qual todas
as culturas se completam alternadamente e, respectivamente,
entram em diálogos recíprocos. Para que se defina
interculturalidade é preciso partir do pressuposto de que ela
apresenta um ponto de partida para o entendimento dialógico
com outras culturas, e só assim irá se aproximar do que
podemos entender por interculturalidade. Ele apresenta este
tipo de definição como “definição contrastante”, contra uma
definição que se entende como parâmetro, onde todas as outras
devem tomar como referencia. Mesmo que o ato de definir não
exclua inteiramente a violência, se mantem outra definição, que
pode ser espalhada por outras, porém de maneira provisória e
corrigível. Raul Fornet-Betancourt propõe uma definição de
interculturalidade, nesse sentido provisório.
“Poderíamos [...] encarar a compreensão
do intercultural como metodologia que nos
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permite estudar, descrever e analisar as
dinâmicas de interação entre diferentes culturas
e que vê a interculturalidade como uma nova
interdiciplina, com a compreensão do
intercultural como um processo real de vida,
como uma forma de vida consciente, na qual se
vai forjando uma tomada de posição ética a
favor da convivência com as diferenças”.
(Filosofar para nuestro tiempo en clave
intercultural, 2004, p.13.)
Essa proposta da interculturalidade poderia ser
considerada como projeto político para a reorganização das
relações internacionais, ou mesmo como projeto cultural que
gostaria de guiar a relação de cultura na base do
reconhecimento e da reciprocidade. Poderíamos encontrar
inúmeros conceitos para o assunto, mas, para que melhor
possamos compreender não devemos tomar o conceito como
definição, mais sim, buscarmos uma aproximação no âmbito
conceitual num dialogo com a construção de FornetBetancourt.
Para
compreensão
apresentamos
que
interculturalidade é uma postura do encontro e do dialogo com
outras culturas e suas formas de pensar, que busca correção e
enriquecimento mutuo.
Paralelo com a definição do conceito, a construção da
interculturalidade pode ser entendida como determinação de
lugar genuíno, interculturalidade não é comparação, FornetBetancourt não se interessa por comparação, por sobrepor
posições, mas, dentro de um processo de interação, as bases
individuais que aparecem nos diálogos se modificam. Ou pelo
menos deveriam ter consigo essa pré-disposição. Essa é uma
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característica do pensamento de Fornet-Betancourt: entender
que nenhuma cultura é perfeita, assim como não é perfeita uma
tese filosófica, este entendimento marca o dialogo. Uma cultura
que entende sua limitação e se abre a aceitar e aprender com
outras, ela está disposta a partilhar sua riqueza e seu saber, sem
impor-se diante ao ‘outro’. Com isso ela corre o risco de ser
questionada e provavelmente modificada. “Arriscamos
realmente a determinação cultural de nossa maneira de pensar
ao encontrar-nos com vozes culturais que se oferecem como
perspectivas para situar-nos e apresentar-nos a nós mesmos”
O diálogo intercultural pede, acima de tudo, paciência no
encontro intercultural, requer tempo suficiente para que se
possa perceber, entender e valorizar o diverso. O espaço para
isso designa o inter, aquele espaço aberto do encontro no qual
o diverso permanece primeiramente indeterminado e no qual a
gente se abstém do juízo e da definição.
“Um quarto e definitivo passo consistiria
no cultivo deste inter, onde toda definição
apressada é um erro, bem como toda
precipitada declaração de harmonia pode ser
expressão
solapada
de
dominação”.
(Transformaçión intercultural de La filosofia,
2001.)
Cultivar esse prefixo “inter” pode significar que primeiro
crie esses espaços, já que eles não se fazem presentes na
filosofia acadêmica e nem na convivência social ou na política.
Pelo uso do conceito Fornet-Betancourt ultrapassa a brilhante e
frutífera dinâmica do inter, o qual lança em conjunto a
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possibilidade de modificação, que talvez não esteja ligado ao
conceito do transcultural.
7.Filosofia
Mesmo que essa contribuição não esteja diretamente
ligada à filosofia intercultural, ela vem a somar no sentido de
podermos constatar que o conceito de filosofia para FornetBetancourt se ampliou cada vez mais. Como vimos acima ele
apontou que a filosofia deve dedicar-se ao essencial, ao
puramente humano. Esta dimensão humana essencial liga todos
os homens e é universal.
Para Fornet-Betancourt uma boa filosofia se comprova
precisamente na maneira pela qual ela relaciona reflexão e
contexto. Ele não abre mão da universalidade, porém, a
apresenta de outra maneira. Nessa perspectiva a universalidade
não surge pelo domínio e expansão do que lhe é próprio, ela
surge das diversas experiências e apresenta um solidário
coexistir. Ele não aceita um entendimento conceitual que
trabalha universalidade de maneira eurocêntrica ou ocidental e
constrói uma oposição entre universalidade e particularidade,
ele entende universalidade no sentido intercultural, “porque a
interculturalidade, para cuja práxis – observando de passagem
– a contextualidade é condição de possibilidade e realmente
está em decidida contradição com a globalidade, que produz a
dominância das hoje dominantes culturas, mas não tem
objeções contra a comunicação e a universalidade.”
Fornet-Betancourt fixa a tarefa da filosofia neste sentido
com a definição hegeliana, segundo o qual a filosofia deve
captar sua época em pensamentos. Ela deve estar em condições
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de trazer para o conceito quais os problemas e desafios de sua
época e o que as ocupa.
“Neste sentido, pode ser afirmado que a filosofia
encerra uma tensão interna que, entre outros aspectos,
se expressa pela constante recontextualização de sua
reflexão em cada situação histórica”.
A filosofia deve posicionar-se sempre de novas maneiras
por sua época e encontrar respostas para as questões de seu
tempo. Isso não significa romper com a tradição, isso faz parte
do processo. Mais, se a filosofia quiser reconhecimento à sua
tarefa de entender seu tempo e conceitos, ela sempre deverá
retomar sua tradição, adaptando para uma reflexão do seu
tempo. Dessa reflexão, primeiro é importante que se tenha
consciência da própria contextualidade.
“Assim a filosofia da qual se parte é
exposição de uma posição que se expõe à
discussão e que não exclui, portanto, a
possibilidade de sua transformação teórica
mediante
o
contraste
argumentativo”.
(Interculturalidad y globalización. Ejercicios de
crítica filosófica intercultural en el contexto de
la globalización neoliberal, 2000.)
A objeção de Fornet-Betancourt à filosofia acadêmica
européia, é por entender que ela não está consciente de sua
contextualidade, ela pretende ser universal, vê a si mesma
como a única e verdadeira forma de filosofar, fora desse padrão
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filosofia não é possível. Dessa forma ela não enxerga seus
próprios condicionamentos contextuais.
Para compreender sua época, a filosofia deve se guiar
pelos estudos e resultados de pesquisas de outras ciências, tais
como, ciências econômicas, ciências sociais, ciências políticas,
literatura, psicologia, etc. Por exemplo: das ciências
econômicas, para analisar as ligações econômicas da
globalização, da sociologia e ciência política, para entender
processos de modificação social; das etnias para ter um melhor
entendimento de culturas estranhas. A interculturalidade tem
papel importante na filosofia intercultural, mesmo que na
prática ela tenha a aparência de ainda não ter traduzido essa
exigência programática. Fornet-Betancourt entende que
filosofia não se limita a uma reflexão textual, ela não cria uma
hermenêutica textual e sim uma hermenêutica do contexto.
Supõe-se que uma filosofia que conheça seu contexto não lhe
seja indiferente. Onde a filosofia nota situações inadequadas,
ela quer mediar modificações. Ele entende que é relevante na
práxis, mais contribui na linha da filosofia da libertação.
Ele identifica a vontade de mudar uma práxis social não
só em tradições da filosofia latino-americana, mais também em
correntes européias. Uma filosofia que brota da insatisfação
com fatores de injustiça busca superá-la, alcançando assim
importância prática e dimensão crítica. Assim a filosofia não se
torna fim em si mesmo.
Percebendo que a filosofia contemporânea raramente se
da conta dessa função, se torna necessário uma mudança da
filosofia. Critica a essa filosofia ocidental estabelecida, que é
por sua história dominada pela busca de certezas absolutas,
verdades imutáveis e do homem em si. É ponto de partida da
interculturalidade. Já que a interculturalidade pressupõe
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diversidade e diálogo, essa linha não é possível, quando, a
impossibilidade de mudança e a certeza absoluta são os
maiores valores. Por isso torna a crítica a essa tradição cultural
indispensável. Fornet-Betancourt não se contém nas críticas,
ele busca ultrapassar o horizonte da crítica com novas
propostas que sirvam como alternativas de um “processo de
aconselhamento e de troca”, para assim chegar a um conceito
aberto e mutável de razão.
Trata-se de uma mudança em busca de uma filosofia da
contextualidade e da interculturalidade, que não se completa e
procura complemento, para isso são apontadas linhas
encobertas de tradições no âmbito de uma filosofia e alterada a
diversidade intracultural.
Tal filosofia alcança não só o âmbito restrito de filosofia
acadêmica, mas também as formas de um saber cultural e
popular. Ela não se posiciona somente no texto mais também
no contexto. Fazendo uso não somente de textos escritos como
também das tradições orais, como, mitos e canções se tornam
ferramentas do filosofar.
Um diálogo intercultural que assume aqui seu ponto de
partida é então um dialogo “sobre e entre situações do humano,
e não como um intercâmbio de idéias abstratas orientadas para
embelezar a liturgia ou o culto do pensamento alheio à
realidade”. Na orientação de Fornet-Betancourt pela vida e
pelas situações cotidianas dos humanos, que é expresso com
particular clareza no artigo “Interculturalidade e barbárie”
aparecem mais uma vez a influência da filosofia de José Martí
e de Jean-Paul Sartre.
Desta forma, o cotidiano das pessoas e as tradições
especificas das múltiplas culturas alcançam a máxima
importância. É verdade que entre a verificação programática e
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metodológica de que o dia a dia das pessoas é filosoficamente
importante e a real tradução de conteúdos dessa exigência
permanece um vazio: a condição ainda não parece muito clara,
de forma pratica. Não é possível dizer que a filosofia surgira
quando a situação de vida de uma mãe educadora única no
Peru, à vida de crianças migrantes em Honduras ou o dia a dia
do trabalhador jornaleiro na Argentina se tornam um local
filosófico. Aqui faltam valores vivenciais da ainda jovem
filosofia intercultural.
Essa filosofia como é exigida, ultrapassa a racionalidade
monológica da filosofia tradicional dominante. Ela se vê como
um pensar que se desprende da monocultura em direção
pluralidade
cultural,
ela
funda
suas
bases
na
interdiciplinaridade e se direciona a práxis.
Filosofia, para Fornet-Betancourt, não significa filosofia
no sentido estrito e acadêmico. Ele deixa claro por ele próprio
não separa rigidamente no emprego dos conceitos de filosofia
intercultural e interculturalidade.
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