Of. Circular nº 26/2015

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ
Procuradoria-Geral de Justiça
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Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Proteção à Saúde Pública
Rua Mal. Deodoro, 1028, 5º andar, Curitiba - PR.
Ofício Circular nº 26/15-CAO-Saúde
Curitiba, 28 de outubro de 2015.
Superveniente ao presente ofício, houve a edição da Lei nº 13.269, de 13 de
abril de 2016, que autorizou o uso da fosfoetanolamina sintética por
pacientes diagnosticados com neoplasia maligna.
A lei, no entanto, teve sua vigência suspensa liminarmente por força da
decisão proferida na Ação Direta de Inconstitucionalidade 5501, até o
definitivo julgamento da demanda que questiona a distribuição da
substância ante a ausência de testes em seres humanos e o
desconhecimento sobre a sua eficácia e efeitos colaterais
Colega,
Com nossos cumprimentos, cabe-nos expressar reflexão sobre a
possibilidade de provocar o Sistema Único de Saúde para dispensação a pacientes em
tratamento oncológico da substância química fosfoetanolamina, anunciada em meios de
comunicação como supostamente eficaz para o tratamento de diversos tipos de câncer.
Até hoje a substância não é registrada na ANVISA como
medicamento e está em fase experimental de pesquisa, somente como produto químico, na
Universidade de São Paulo, ainda sem estudos sobre a ação em seres vivos, muito menos
estudos clínicos controlados em humanos. Assim, para além de o produto não estar cadastrado
como remédio, não foi analisado cientificamente ainda para esse fim e, portanto, não são
conhecidas as consequências do seu uso. Ou seja, além de não haver evidências terapêuticas,
não está quantificada sua segurança farmacológica e seus eventuais efeitos adversos.
Portanto, para além de ser vedado, em todas as esferas de gestão
do SUS, dispensação, pagamento, ressarcimento ou reembolso de medicamento ou produto
experimental ou de uso não autorizado pela ANVISA (art. 19-T, da Lei n. 8080/90) – o que já
implicaria em empecilho jurídico para se buscar o emprego dessa substância no âmbito do
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sistema público de saúde – não há nenhuma segurança técnica, como dito, sobre os possíveis
efeitos colaterais no seu uso por seres humanos.
O Tribunal de Justiça de São Paulo, em sede de pedido de
suspensão de decisão para entrega dessa substância a portadores de câncer, asseverou que “a
substância pedida não é medicamento – já que assim não está registrada. Não se trata
tampouco de droga regularmente comercializada, mas de um experimento da Universidade de
São Paulo. (...) Por todos esses fatos, não seria recomendável a equiparação da situação de
entrega da fosfoetanolamina à dispensação de medicamentos: não há, como sói acontecer nas
demandas por remédios, uma possível falha do Estado ao não pôr à disposição dos pacientes
determinado fármaco existente no mercado (…) Em contrapartida, não se podem ignorar os
relatos de pacientes que apontam melhora no quadro clínico. Pondo-se de parte a questão
médica, que se refere à avaliação da melhora, do ponto de vista jurídico há uma real
contraposição de princípios fundamentais. De um lado, está a necessidade de resguardo da
legalidade e da segurança dos procedimentos que tornam possível a comercialização no Brasil
de medicamentos seguros. Por outro, há necessidade de proteção do direito à saúde. Por uma
lógica de ponderação de princípios em que se sabe que nenhum valor prepondera de forma
absoluta sobre os demais, tem-se que é a verificação do caso concreto a pedra de toque para
que um princípio se imponha. Conquanto legalidade e saúde sejam ambos princípios igualmente
fundamentais, na atual circunstância, o maior risco de perecimento é mesmo o da garantia à
saúde. Por essa linha de raciocínio, que deve ter sido também a que conduziu a decisão do STF,
é possível a liberação da entrega da substância”. (Autos sob n. 2194962-67.2015.8.26.0000, de
suspensão de liminar, Relator José Renato Nalini, Órgão Especial do TJSP, publicado em
28.10.2015).
Nesse sentido, a liminar concedida pelo Ministro Edson Fachin, no
STF, exclusivamente a uma paciente em estado terminal de câncer, foi baseada em laudo
médico fundamentado, no sentido de mitigar os sintomas apresentados. E, nessa hipótese, a
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responsabilidade integral pelas consequências do uso da substância na paciente recaem ao
médico subscritor. A especificidade desse caso concreto não espraia influência para todos os
demais.
No Paraná, desconhece-se até o presente momento prescrições
médicas, de uso da fosfoetanolamina, em tratamento oncológicos, mas, ainda assim, há alguns
pacientes e/ou familiares aportando às Promotorias de Justiça (inclusive de Curitiba),
demandando providências ministeriais, inclusive para a obtenção das prescrições médicas
dessa substância.
Diante deste cenário, este Centro de Apoio Operacional solicitou
formalmente manifestação técnica do Conselho Regional de Medicina, para externar
manifestação acerca da propriedade das indicações médicas do uso dessa substância.
A posição oficial de tal órgão, externada no ofício n. 267/2015,
subscrito pelo Presidente do CRM-PR, é a de que “… a fosfoetanolamina é uma substância que
não foi testada clinicamente em pacientes, portanto, seus efeitos terapêuticos, riscos de uso e
eventuais efeitos colaterais são desconhecidos. Assim sendo, não há no momento nenhuma
evidência científica para seu uso em oncologia, até que indispensáveis protocolos de pesquisa
venham a demonstrar sua indicação de efetividade”.
Por todos esses fundamentos, a manifestação do Centro de Apoio
Operacional das Promotorias de Proteção à Saúde Pública é no sentido de não ser desejável,
por ora, qualquer intervenção ministerial para se tutelar os interesses de pacientes e/ou seus
familiares para o uso dessa substância em tratamento oncológico. Não obstante, é de se
compreender a pretensão subjetiva de pessoas interessadas em alcançar suposto benefício
para sua saúde, principalmente quando abalada por grave moléstia, o que recomenda especial
trato no acolhimento de tais indivíduos nas Promotorias de Justiça e nas respectivas
orientações e esclarecimentos.
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Na oportunidade, ratificamos-lhe nossa manifestação da mais
elevada consideração.
MARCO ANTONIO TEIXEIRA
Procurador de Justiça
FERNANDA NAGL GARCEZ
Promotora de Justiça
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