1 UNIVERSIDADE VEIGA DE ALMEIDA FACULDADE DE DIREITO INTRODUÇÃO À CIÊNCIA DO DIREITO PROF. JOSEMAR ARAÚJO – [email protected] FOLHA DE APOIO 02 Ordem Jurídica e Ordem Social Cenário de lutas, alegrias e sofrimentos do homem, a sociedade não é simples aglomeração de pessoas. Ela se faz por um amplo relacionamento humano, que gera a amizade, a colaboração, o amor, mas que promove, igualmente, a discórdia, a intolerância, as desavenças. Vivendo em ambiente comum, possuindo idênticos instintos e necessidades, é natural o aparecimento de conflitos sociais, que vão reclamar soluções. Os litígios surgidos criam para o homem as necessidades de segurança e de justiça. Mais um desafio lhe é lançado: a adaptação das condutas humanas ao bem comum. Como as necessidades coletivas tendem a satisfazer-se, ele aceita o desafio e lança-se ao estudo de fórmulas e meios, capazes de prevenirem os problemas, de preservarem os homens, de estabelecerem paz e harmonia no meio social. O Direito se manifesta, assim, como um corolário inafastável da sociedade. A Mútua Dependência entre o Direito e a Sociedade A sociedade sem o Direito não resistiria, seria anárquica, teria o seu fim. O Direito é a grande coluna que sustenta a sociedade. Criado pelo homem, para corrigir a sua imperfeição, o Direito representa um grande esforço, para adaptar o mundo exterior às suas necessidades de vida. Fato Social e Direito Direito e sociedade são entidades congênitas e que se pressupõem. O Direito não tem existência em si próprio. Ele existe na sociedade. A sua causa material está nas relações de vida, nos acontecimentos mais importantes para a vida social. A sociedade, ao mesmo tempo, é fonte criadora e área de ação do Direito, seu foco de convergência. Existindo em função da sociedade, o Direito deve ser estabelecido à sua imagem, conforme as suas peculiaridades, refletindo os fatos sociais, que significam criações históricas do povo, que refletem os seus costumes, tradições, sentimentos e cultura. A sua elaboração é lenta, imperceptível e feita espontaneamente pela vida social. Costumes diferentes implicam fatos sociais diferentes. Cada povo tem a sua história e seus fatos sociais. O Direito, como fenômeno de adaptação social, não pode formar-se alheio a esses fatos. As normas jurídicas devem achar-se conforme as manifestações do povo. Os fatos sociais, porém, não são as matrizes do Direito. Exercem importante influência, mas o condicionamento não é absoluto. Nem tudo é histórico e contingente no Direito. Ele não possui apenas um conteúdo nacional, Nesta hipótese, o Direito vai superar os fatos existentes, impondo-lhes modificações. Acepções da Palavra “direito” Na linguagem comum e nos compêndios especializados, o vocábulo Direito é empregado em várias acepções. Saber distinguir cada um desses sentidos corresponde a uma exigência não apenas de ordem teórica, mas igualmente prática. Como Sinônimo de Ciência substantivo não expressa, naturalmente, normas de conduta social, mas a ciência que as enlaça como objeto. Em lato sensu, a Ciência do Direito corresponde ao setor do conhecimento humano que investiga e sistematiza os conhecimentos jurídicos. Em stricto sensu, é a particularização do saber jurídico, que toma por objeto de estudo o teor normativo de um determinado sistema jurídico. É neste sentido que se fala também em Dogmática Jurídica ou Jurisprudência Técnica. Direito Natural, Direito Positivo e Direito Consuetudinário Quando ouvimos falar em Direito, podemos associar o termo ao Direito Natural ou ao Direito Positivo, que constituem duas ordens distintas, mas que possuem recíproca convergência. O Direito Natural revela ao legislador os princípios fundamentais de proteção ao homem, que forçosamente deverão ser consagrados pela legislação, a fim de que se obtenha um ordenamento jurídico substancialmente justo. O Direito Natural não é escrito, não é criado pela sociedade, nem é formulado pelo Estado. Como o adjetivo natural indica, é um Direito espontâneo, que se origina da própria natureza social do homem e que é revelado pela conjugação da experiência e razão. É constituído por um conjunto de princípios, e não de regras, de caráter universal, eterno e imutável. Como exemplos maiores: o direito á vida e à liberdade. Em contato com as realidades concretas, esses princípios são desdobrados pelo legislador, mediante normas jurídicas, que devem adaptar-se ao momento histórico. Positivo é o Direito institucionalizado pelo Estado. É a ordem jurídica obrigatória em determinado lugar e tempo. Malgrado imprópria, a expressão Direito Positivo foi cunhada para efeito de distinção com o Direito Natural. Logo, não houvesse este não haveria razão para aquele adjetivo. Não é necessário, à sua caracterização, que seja escrito. O direito consuetudinário refere-se a normas que vigoram por força de hábitos culturais de uma sociedade, sem que necessariamente sejam naturais ou escritos. O Direito costumeiro pode ser definido como conjunto de normas de conduta social, criadas espontaneamente pelo povo, através do uso reiterado, uniforme e que gera a certeza de obrigatoriedade, reconhecidas e impostas pelo Estado. Direito Objetivo e Direito Subjetivo. Não são duas realidades distintas, mas dois lados de um mesmo objeto. Entre ambos, não há uma antítese ou oposição. O Direito vigente pode ser analisado sob dois ângulos diferentes: objetivo ou subjetivo. Do ponto de vista objetivo, o Direito é norma de organização social. É o chamado Jus norma agendi. Quando se afirma que o Direito do Trabalho não é formalista, emprega-se o vocábulo Direito em sentido objetivo, como referência às normas que organizam as relações de emprego. O direito subjetivo corresponde às possibilidades ou poderes de agir, que a ordem jurídica garante a alguém. é um direito personalizado, em que a norma, perdendo o seu caráter teórico, projeta-se na relação jurídica concreta, para permitir uma conduta ou estabelecer consequências jurídicas. Quando dizemos que "fulano tem direito à indenização", afirmamos que ele possui direito subjetivo. O Emprego do Vocábulo no Sentido de Justiça: É comum ainda observar-se o emprego da palavra Direito como referência ao que é justo. Ao se falar que "Antonio é homem direito", pretende-se dizer que ele é justo em suas atitudes. Relação Jurídica É comum empregar-se o vocábulo Direito como referência à Ciência do Direito. Quando se diz que "fulano é aluno de Direito", este A relação jurídica faz parte do elenco dos conceitos jurídicos 2 fundamentais e constitui um ponto de convergência de vários componentes do Direito. Nela se entrelaçam fatos sociais e normas jurídicas. É no quadro amplo das relações jurídicas que se apresentam os sujeitos do direito e se projetam direitos subjetivos e deveres jurídicos. sujeito passivo é o responsável pela obrigação principal. Sujeito ativo e passivo apresentam-se sempre em conjunto nas relações jurídicas. Um não pode existir sem o outro, do mesmo modo que não existe direito onde não há dever. Classificação Na concepção de Hans Kelsen, significativa por partir do chefe da corrente normativista, a relação jurídica não consiste em um vínculo entre pessoas, mas entre dois fatos enlaçados por normas jurídicas. Como exemplo, figurou a hipótese de uma relação entre um credor e um devedor, afirmando que a relação jurídica “significa que uma determinada conduta do credor e uma determinada conduta do devedor estão enlaçadas de um modo específico em uma norma de direito...” São as relações jurídicas que dão movimento ao Direito. Em cada uma ocorre a incidência de normas jurídicas, que definem os direitos e os deveres dos sujeitos. Há relação jurídica que se extingue tão logo é produzido o seu efeito: a relação que se estabelece entre o passageiro e o motorista de praça desaparece quando, no local de destino, o preço da corrida é pago. Outras há cujos efeitos são duradouros, como se passa nas relações matrimoniais. Na maior parte dos vínculos, os dois sujeitos possuem direitos e deveres, como nas relações de emprego. Há relações em que os poderes e as obrigações são recíprocos e de igual conteúdo para as duas partes: dever de coabitação entre os cônjuges. As relações jurídicas se formam pela incidência de normas jurídicas em fatos sociais. Em sentido amplo, os acontecimentos que instauram, modificam ou extinguem relações jurídicas denominamse fatos jurídicos. Quando ocorre um determinado acontecimento regulado por regras de Direito, instaura-se uma relação jurídica. Se toda relação jurídica pressupõe uma relação de vida, nem toda relação social ingressa no mundo do Direito, apenas as relativas aos interesses fundamentais de proteção à pessoa e à coletividade. Assim, os vínculos de amizade, laços sentimentais, permanecem apenas no plano fático. Elementos da Relação Jurídica Integram a relação jurídica os elementos: sujeito ativo, sujeito passivo, vínculo de atributividade e objeto. O fato e a norma jurídica, que alguns autores arrolam como elementos, são antes pressupostos da existência da relação jurídica. Sujeitos da Relação Jurídica Entre os caracteres das relações jurídicas, há a chamada alteridade, que significa a relação de homem para homem. Nesse vínculo intersubjetivo, cada qual possui uma situação jurídica própria. Esta consiste na posição que a parte ocupa na relação, como titular de direito ou de dever. Denomina-se situação jurídica ativa a que corresponde à posição do agente portador de direito subjetivo e situação jurídica passiva, a do possuidor de dever jurídico. Parte é a pessoa ou conjunto de pessoas com uma situação jurídica ativa ou passiva. A referência que se faz com o vocábulo parte é para distinguir os participantes da relação dos chamados terceiros, que são pessoas alheias ao vínculo jurídico. Denomina-se sujeito ativo a pessoa que, na relação, ocupa a situação jurídica ativa; é o portador do direito subjetivo que tem o poder de exigir do sujeito passivo o cumprimento do dever jurídico. Como na maioria das relações jurídicas as duas partes possuem direitos e deveres entre si, sujeito ativo é o credor da prestação principal. Sujeito ativo ou titular do direito é a pessoa natural ou jurídica. Sujeito passivo é o elemento que integra a relação jurídica com a obrigação de uma conduta ou prestação em favor do sujeito ativo. O A relação jurídica que envolve apenas duas pessoas é denominada simples. Plurilateral é a relação em que mais de uma pessoa apresenta-se na situação jurídica ativa ou passiva. Quanto aos sujeitos ainda, as relações podem ser relativas ou absolutas. Relativa é aquela em que uma pessoa ou um grupo de pessoas figura como sujeito passivo. Absoluta se dá quando a coletividade se apresenta como sujeito passivo, o que ocorre, por exemplo, quanto ao direito de propriedade e nos direitos personalíssimos, em que todas as pessoas têm o dever de respeitá-los, investindo-se, pois, na situação jurídica passiva. A relação jurídica pode ser de Direito Público ou de Direito Privado. A primeira hipótese, também denominada relação de subordinação, ocorre quando o Estado participa na relação como sujeito ativo, impondo o seu imperium. É de Direito Privado, ou de coordenação, quando integrada por particulares em um plano de igualdade, podendo o Estado nela participar não investido de sua autoridade. Vínculo de Atributividade No dizer de Miguel Reale, “é o vínculo que confere a cada um dos participantes da relação o poder de pretender ou exigir algo determinado ou determinável”. O vínculo de atributividade pode ter por origem o contrato ou a lei. Objeto O vínculo existente na relação jurídica está sempre em função de um objeto. As relações jurídicas são estabelecidas visando a um fim específico. A relação jurídica criada pelo contrato de compra e venda, por exemplo, tem por objeto a entrega da coisa, enquanto no contrato de trabalho o objeto é a realização do trabalho. É sobre o objeto que recai a exigência do sujeito ativo e o dever do sujeito passivo. O objeto, também denominado objeto imediato, é a coisa em que recai o poder do sujeito ativo, enquanto conteúdo, ou objeto mediato, é o fim que o direito garante. O objeto é o meio para se atingir o fim, enquanto o fim garantido ao sujeito ativo denomina-se conteúdo. Exemplificando, Paulo Nader afirma que Na propriedade, o conteúdo é a utilização plena da coisa, o objeto é a coisa em si; na empreitada, o conteúdo é a realização da obra, o objeto é prestação do trabalho; numa sociedade comercial, o conteúdo são os lucros procurados, o objeto é o ramo de negócio explorado. Fontes: NADER, Paulo. Introdução ao Estudo do Direito. 26. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012. REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. São Paulo: Saraiva, 2002.