FATORES DA EVOLUÇÃO DO DIREITO - Inúmeros são os fatores sociais que concorrem para a evolução do Direito, não sendo possível, neste modesto trabalho, examiná-los todos. Vamos apenas destacar aqueles que, em nossa opinião, são os principais, a saber: os fatores econômicos, políticos, culturais e religiosos. 1) Fatores econômicos - A organização social tem o seu ponto básico de articulação no modo pelo qual os homens produzem, possuem e comerciam. Assim sendo, podemos afirmar, sem possibilidade de erro, que o Direito vai se modificando à medida que vai se alterando a estrutura econômica da sociedade. - Tão marcante é a influência da economia sobre o Direito que alguns autores chegam a se posicionar no sentido de conceber o Direito como reflexo, exclusivamente, da constituição econômica. - Sem dúvida constitui exagero considerar o Direito reflexo exclusivo da constituição econômica, embora não se possa negar que, entre as forças modeladoras do Direito, o fator econômico é o que exerce uma influência mais decisiva, ainda que seguido de muito perto pelo político. 1.1) Influência do fator econômico sobre o Direito Romano - Em Roma, a sociedade inicialmente compunha-se de camponeses que viviam da lavoura; tinham que tirar da terra o seu sustento. Uniam-se todos em torno do pater familias, único dotado de capacidade jurídica, para a produção dos bens necessários à sobrevivência do grupo. Tal direito estava perfeitamente adequado a uma sociedade de pequenos agricultores. - Aí pelo III século antes de Cristo, os agricultores romanos tornaram-se comerciantes. Lançaram-se ao mar, entraram em contato com outros povos, dedicaram-se com grande intensidade à compra e venda de mercadorias. - Essa modificação na estrutura econômica imediatamente repercutiu no direito. A organização da família tornou-se menos rígida, passando a ser submetida ao controle da sociedade global e não mais exclusivamente ao pater familias. Dentre outras mudanças, os estrangeiros deixaram de ser tratados como inimigos e passaram a ser amigos. 1.2) Influência do fator econômico sobre o Direito Moderno - Algo idêntico ao ocorrido em Roma desenvolveu-se quando da criação da grande indústria e do maquinismo, no fim do século XVII. Surgiu uma nova classe, enriquecida pela posse de capitais mobiliários, em decorrência do enfraquecimento correlativo dos proprietários de terras. A burguesia ascendeu ao poder político. - A própria instituição da escravidão, sua substituição pelo servilismo durante o regime feudal e sua posterior superação pelo assalariado na moderna sociedade burguesa, são transformações econômicas de repercussão imensa sobre o status pessoal em geral, e sobre a condição jurídica do homem trabalhador em particular. 2) Fatores políticos - A palavra política, embora ligada etimologicamente a polis (cidade), modernamente é utilizada para designar a ciência e a arte de governar, abrangendo as relações entre o indivíduo e o estado, as relações dos estados entre si, bem como as funções e atribuições do Estado. - Já houve quem identificasse Estado e Direito e ainda hoje é a perspectiva da maioria dos juristas em face do Estado. Sem entrar em polêmica, voltamos a enfatizar que do ângulo sociológico em que nos situamos há uma nítida distinção entre o Direito e o Estado, embora não se possa negar a proximidade em que se situam, este se realizando socialmente através daquele. - A aparição do poder político, longe de ser o responsável pela gênese do direito, é apenas um evento que exerce uma reação grave e imediata, tanto na função e estrutura jurídicas, como sobre o conteúdo do direito. - A influência dos fatores políticos sobre o Direito torna-se mais patente no caso da revolução. Mal concluída a tomada do poder pelo grupo revolucionário, surge um Direito novo, substituindo aquele que servia de sustentáculo normativo ao sistema social, político e econômico contra o qual a revolução se lançou. 3) Fatores culturais - Se compararmos o direito de uma sociedade culturalmente desenvolvida com o de outra inculta, constataremos imediatamente a necessária harmonia existente entre a ordem jurídica e os fatores de cultura. O direito evolui acompanhado a evolução cultural, a ponto de podermos afirmar ser ele o aspecto cultural de um povo. 3.1) O que é cultura? - Numa definição simplista, cultura é tudo aquilo que o homem acrescenta à natureza. São conhecimentos que vão se formando, transmitindo-se a outras gerações como autêntica herança social. É o conjunto de conhecimentos, crenças, artes, de regras morais, jurídicas e de costumes, e de quaisquer outras aptidões do homem, por ele adquiridas em sua condição de membro da sociedade. - A maior evidência de ser o Direito uma manifestação de cultura social, um fenômeno cultural, está no fato de surgirem novos ramos do Direito à medida que se expande o mundo cultural de um povo. Falamos hoje em Direito Espacial, Nuclear, das Telecomunicações etc., realidade somente possível graças ao progresso científico dos tempos modernos. 4) Fatores religiosos - Nos povos antigos, o direito não se diferenciava da religião. Praticamente se confundiam porque o poder, a autoridade, o direito e a religião emanavam da mesma divindade, e quase sempre estavam centralizados nas mãos da mesma pessoa. Quando o chefe político não era também o líder religioso, este partilhava do poder, exercendo imensa influência sobre o povo. - Somente após um lento e prolongado processo de secularização, sob o impacto de civilizações mais adiantadas, o direito foi se separando da religião – o mundo profano do sagrado. - Hoje, pode-se dizer, de um modo geral, que a religião se ocupa com o foro íntimo, com a consciência pessoal, ao passo que o direito trata do foro externo; a religião se preocupa com as relações entre o homem e a divindade, o direito disciplina as relações sociais que se travam entre o homem e o homem, ou entre o homem e o grupo. 4.1) Influência da Religião sobre o Direito - Alguns sistemas jurídicos, tal como entre os povos antigos, ainda hoje estão profundamente impregnados de religião, a exemplo do que ocorre no Mundo Islâmico, onde regras jurídicas e religiosas praticamente se confundem. Entretanto, mesmo os sistemas jurídicos leigos, onde religião e direito não se confundem e a Igreja está separada do Estado, não deixam de receber a influência constante dos fatores religiosos. - Nos dias atuais, os países onde predomina o protestantismo são bem mais liberais para com certos assuntos jurídicos do que aqueles onde predomina o catolicismo. O divórcio, por exemplo, foi aprovado no Brasil depois de longa e sistemática campanha contrária que a Igreja Católica lhe moveu. E até hoje não temos leis regulamentando o controle da natalidade em razão da acirrada oposição que setores conservadores religiosos lhe fazem. 4.2) Outros fatores sociais - Esses são os principais fatores sociais da evolução do Direito, mas como estes, muitos outros existem a exercer influência, pois, sendo o direito um fenômeno social, atuam sobre ele todos os fatores que atuam sobre a sociedade. O clima, o território, o número de habitantes, os recursos naturais, os grupos organizados e a própria opinião pública despertada pela mídia a respeito de algum caso rumoroso são outros tantos fatores da evolução do Direito. - Serve-nos de bom exemplo o recente Estatuto do Desarmamento. Entre os países que não enfrentam guerra civil, o Brasil detém o recorde de mortes por arma de fogo. Entretanto, na aprovação da Lei do Desarmamento, o Lobby contra o projeto, organizado principalmente por fabricantes de armas e munição, foi mais forte. - A vida das normas jurídicas não é eterna; elaboradas para as relações dos homens em sociedade, têm o seu destino condicionado ao substractum social que disciplinam e ordenam. As mudanças na sociedade mais cedo ou mais tarde refletem em mudanças na legislação em vigor ou em uma nova interpretação dada a normas anteriores. Bibliografia: - Cavalieri Filho, Sérgio. Programa de Sociologia Jurídica – Rio de Janeiro: Forense, 2005.