A Doença de Alzheimer

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Prof. Murillo Ranulpho Tavares Júnior
Doença de Alzheimer e Genética
Como se sabe muito pouco sobre o funcionamento do cérebro, as doenças
mentais são particularmente desafiadoras para a medicina. No entanto, quanto
mais aprendermos sobre o desenvolvimento cerebral, os mecanismos de
transmissão sináptica e os papéis dos vários neurotransmissores na função
cerebral, mais nos aproximaremos de tratamentos racionais para as doenças
mentais.
Uma das principais doenças do cérebro sob inspeção molecular é a doença
de Alzheimer (AD - Alzheimer's disease), que é caracterizada por uma
perda progressiva de memória, orientação e julgamento. O exame post-mortem
do cérebro de pessoas com AD revelou placas de neurônios mortos, ou quase
mortos, envoltos em um emaranhado de fibras compostas na sua maioria de um
polipeptídeo simples e pequeno, chamado proteína amilóide. Essa proteína foi
purificada de cérebros afetados e sua seqüência de aminoácidos foi determinada,
o que tornou possível a vários grupos projetarem sondas de oligonucleotídeos
para isolar os cDNAS da proteína amilóide. A seqüência dos cDNAS isolados
demonstrou que a proteína amilóide se origina de uma proteína precursora de
amilóide muito maior, a APP (amyloid precursor protein), que possui a
característica de uma proteína que se espalha sobre a membrana celular.
O fragmento protéico encontrado nas placas de amilóides é aparentemente
originado de um precursor maior por ação de enzimas proteolíticas. Várias
formas diferentes da APP são produzidas pelo processamento alternativo do
mRNA da proteína APP. Algumas dessas formas contêm uma seqüência
estritamente relacionada a uma família de inibidores proteolíticos conhecidos, o
que torna possível que problemas com a degradação de proteína contribuam
para o desenvolvimento da doença. Uma questão fundamental que ainda não foi
resolvida é se a proteína amilóide realmente causa degeneração neural, ou se ela
é simplesmente um fragmento deixado por células cerebrais que estão
morrendo.
A evidência de que a produção de amilóide contribui para a morte do
neurônio veio de um experimento de transferência gênica, em que uma linhagem
de célula precursora neuronial foi modificada por engenharia genética para
expressar um fragmento do gene APP. Quando essas células foram induzidas
para diferenciarem neurônios adultos por tratamento com NGF, elas pararam
a diferenciação após alguns dias, degeneraram e morreram. Uma outra indicação
de que a proteína amilóide contribui diretamente para a degeneração neuronial
foi a observação de que a adição de fragmentos de proteína amilóide sintética
em culturas neuroniais causou a degeneração das células. O exame da seqüência
do fragmento ativo revelou que ele estava relacionado a uma família de
neuropeptídeos conhecidos. A adição desses neuropeptídeos relacionados nas
culturas bloqueou o efeito da proteína amilóide. Esses experimentos sugerem
que a proteína amilóide pode atuar interferindo na ação de neuropeptídeos
naturais.
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Prof. Murillo Ranulpho Tavares Júnior
A genética da doença de Alzheimer é complexa, e os resultados de estudos
genéticos de formas herdadas de AD têm sido conflitantes. Entretanto,
descobertas recentes começam a indicar uma função para a proteína amilóide.
Após a clonagem do gene da APP ele foi mapeado no cromossomo humano 21.
Uma cópia extra desse cromossomo é a causa da síndrome de Down, uma forma
de retardamento mental em que os doentes desenvolvem sintomas similares aos
da AD (incluindo placas amilóides) ainda quando crianças. Talvez a doença de
Alzheimer e a síndrome de Down ocorram simplesmente devido à excessiva
produção da proteína amilóide. Essa hipótese ganhou uma força considerável
quando o gene responsável pela forma herdada de AD foi também mapeado no
cromossomo 21, perto do gene da APP.
Entretanto, esse quadro interessante deteriorou-se quando análises
genéticas mais detalhadas mostraram, evidência de recombinação entre o "gene
de Alzheimer" e o gene de APP o que sugeria que os dois genes eram diferentes.
Recentemente, porém, o gene responsável pela forma herdada de AD em duas
famílias britânicas não relacionadas foi mais uma vez mapeado próximo ao gene
da APP Utilizando a reação da polimerase em cadeia para amplificar e seqüenciar
o gene da APP dos indivíduos afetados dessas famílias, os pesquisadores
descobriram que o gene carregava uma mutação de um simples nucleotídeo, a
qual transformava valina em isoleucina no domínio transmembrana da proteína
amilóide. Uma mutação alterando um aminoácido próximo também foi
descoberta em indivíduos com um tipo raro de enfermidade hemorrágica cerebral
hereditária.
Embora a prova definitiva de que as mutações de APP contribuam para o
desenvolvimento da doença de Alzheimer ainda não tenha sido obtida, essa é a
evidência mais forte até o momento para uma função da proteína amilóide.
Novamente vislumbramos o quanto as ferramentas do DNA recombinante
nos ajudaram em nossos esforços para entender e tratar uma doença trágica e
mitificada.
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