Emergências Endocrinológicas em Cuidados Intensivos Pediátricos Versão original: Versão Portuguesa: Michael Karadsheh, MD Mona Zawaideh, MD Helena Almeida, MD Unidade de Cuidados Intensivos e Especiais Pediátricos Hospital Fernando Fonseca – Portugal Emergências Endocrinológicas Índice: Insuficiência Adrenocortical Feocromocitoma Hipoglicémia Emergências Endocrinológicas A glândula supra-renal é composta por duas partes: O Córtex: constituído por 3 camadas: Zona Glomerulosa Zona Fasciculata Zona Reticularis A Medula Emergências Endocrinológicas Glândula Supra-renal: O córtex superficial é principalmente estimulado pelo sistema renina-angiotensina e níveis elevados de K+, que regulam a libertação de aldosterona O córtex mais profundo é principalmente controlado pelo sistema CRH-ACTH que regula a libertação de cortisol em resposta ao stress. Também produz androgéneos. Emergências Endocrinológicas Glândula supra-renal: O córtex produz várias hormonas: aldosterona, cortisol e hormonas sexuais. A medula faz parte do sistema nervoso simpático e produz catecolaminas. Emergências Endocrinológicas Acção da aldosterona: aumenta a reabsorção de Na+ e Cl aumenta a secreção de K+ e H+ Acção do cortisol: Mobilizar energia Hiperglicémia Retenção de água por aumento da HAD Ajudar na adaptação ao stress Emergências Endocrinológicas Manifestações do défice de aldosterona: Hiponatrémia Hiperkaliémia Acidose Desidratação Azotémia Manifestações do défice de cortisol: Falta de força Hipotensão Choque Hipoglicémia Eosinofilia Insuficiência da Supra-renal Primária: ex, hiperplasia congénita da SR Secundária: ex, pan-hipopituitarismo Terciária: ex, terapêutica crónica com altas doses de glicocorticóides Iatrogénica: administração insuficiente de de glicocorticóides em situações de stress Hiperplasia Congénita da Supra-renal A deficiência de 21 beta-hidroxilase é a deficiência enzimática mais comum. O diagnóstico é mais fácil nas meninas: têm ambiguidade sexual. Suspeitar em rapazes com ambiguidade sexual por exemplo, hipospádias com criptorquidia uni ou bilateral. Hiperplasia Congénita da Supra-renal Crise supra-renal: É necessário um elevado grau de suspeição. Pensar quando o choque e colapso vascular são desproporcionados em relação à gravidade da doença e não respondem à expansão de volume e suporte inotrópico. Suspeitar quando perante uma hipoglicémia grave sem causa aparente. Emergências Endocrinológicas A hiperplasia congénita da supra-renal (HCSR) é uma emergência médica. Crise Supra Renal Diagnóstico: Electrólitos: (hiponatrémia, hiperkalémia, hipoglicémia) Cortisol e ACTH plasmáticos; considerar doseamentos de renina, aldosterona e 17hidroxiprogesterona. Crise Supra Renal Terapêutica: Hidratar com SF Corrigir hiperkaliémia: Monitorização ECG Expansão de volume NaHCO3 IV, 2 – 3 mEq/Kg Insulina Actrapid® 0,1 U/kg IV com Dextrose 25%, 2 mL/Kg em 30 minutos, pode repetir-se. Kayexalato ® Crise Supra Renal Adrenal Crisis Terapêutica: Glucocorticóides: 4mg/m2 Dexametasona (não interfere com o doseamento do cortisol no teste de estimulação do ACTH) e 100 mg/m2 de Hidrocortisona, com ajustamentos dependendo da situação de stress. Crise Supra Renal Doses Hidrocortisona: Stress Major, 50-100 mg/m2/d de 6/6h Febre ou intercorrência aguda (stress minor), 30 mg/m2/d de 8/8 ou 6/6hs Reposição fisiológica em doentes semHCSR, 10 mg/m2/d 3-4 doses; Reposição fisiológica em doentes comHCSR, 15-25 mg/m2/d em 3-4 doses; Crise Supra Renal Após Estabilização Manter hidratação iv por um ou dois dias. Iniciar mineralocorticóide (Fludrocortisona, dose habitual diária 0.1-0.2 mg, oral) após suspender o SF iv. Considerar o teste de estimulação com ACTH. Desmame dos corticóides para dose de manutenção em 1 – 3 dias após resolução da situação. Crise Supra Renal Na Hiperplasia Congénita da Supra Renal a dose de cortisol deve ser aumentado para 3 vezes a dose de manutenção em intercorrências febris, trauma ou outros episódios de stress. Feocromocitoma O feocromocitoma é um tumor secretor de catecolaminas originário das células cromafins As células cromafins produzem catecolaminas. A norepinefrina (NE) é transformada em epinefrina (EPI) pela fentolamina metiltransferase A NE e a EPI são transformadas em ácido vanilil mandélico (AVM) pelas COMT (catecol-Ometiltransferase) e MAO ( monoamina oxidase) A dopamina é metabolizada em ácido homovanélico. Emergências Endocrinológicas Feocromocitoma: Raro em crianças aparecendo habitualmente após os 14 anos; Frequentemente bilateral e com tumores extra adrenais. A NE é o produto predominante Pode associar-se a outros síndromes: endocrinopatia múltipla (MEN) Feocromocitoma Os efeitos fisiológicos são mediados pelos receptores adrenérgicos sob o efeito das catecolaminas. A NE actua nos receptores alfa e a EPI actua nos alfa e beta. Feocromocitoma Apresentação: Apresentação clássica: Hipertensão mantida Taquicárdia Hipersudação Cefaleias Outras: Náuseas e vómitos Alterações da visão Hipotensão ortostática Dor abdominal Poliúria e polidipsia. Feocromocitoma Diagnóstico: Colheita de urina de 24hs para pesquisa de catecolaminas livres, metanefrinas fraccionadas e creatinina Metanefrinas plasmáticas livres fraccionadas Localização: TAC, RMN MIBG pode ser útil na doença metastática extra supra-renal Feocromocitoma Terapêutica: Quando se diagnostica um feocromocitoma o doente deve ser operado após preparação médica adequada. Feocromocitoma Terapêutica Médica: Expansão de volume Controlo da Hipertensão Drogas alfa-adrenérgicas: fentolamina e fenoxibenzamina Deve sempre obter-se um bloqueio alfa adequado antes do bloqueio beta, para evitar um quadro de insuficiência cardíaca congestiva Feocromocitoma Terapêutica Médica: Beta-bloqueantes para prevenir e tratar arritmias (propranolol, esmolol). Uso cuidadoso se evidência de miocardiopatia. Outros: nifedipina e labetalol. Feocromocitoma Terapêutica: O tratamento de primeira escolha é cirúrgico. bloqueio adrenérgico durante 2 semanas, no pré operatório Para travar os efeitos do excesso de EPI e NE Permitir a restauração do volume extracelular Fenoxibenzamina e prazosina orais Terapêutica adjuvante: metirosina Feocromocitoma Intra-operatória: Monitorização hemodinâmica Evitar halotano e atropina Controlar a hipertensão com drogas iv: fentolamina e nitroprussiado sódico Arritmias: propranolol e lidocaína Tratar a hipotensão quando é removido um tumor produtor de NE Feocromocitoma Pós-operatório: Instabilidade hemodinâmica é comum devido às repercussões no volume extra celular. Usar volume para tratar a hipotensão e evitar o uso de vasopressores. Hipertensão persistente sugere a existência de tumor residual. Emergências Endocrinológicas Hipoglicémia: A definição exacta de hipoglicémia em lactentes e crianças permanece controversa. Hipoglicémia é definida como um nível de glicémia inferior a 40mg/dl mesmo na ausência de sintomas e independentemente da idade. Hipoglicémia Fisiopatologia: A insulina suprime a produção de glicose e estimula a sua utilização. As hormonas contra-reguladoras são: Catecolaminas, glucagon, hormona de crescimento e cortisol. Hipoglicémia Etiologia Stress Doenças de armazenamento do glicogénio Hipoglicémia cetótica Pan-hipopituitarismo Sépsis Doença hepática Nesidioblastose Adenoma de células Beta Venenos Baixo peso ao nascer RN filho de mãe diabética Hipoglicémia Os sintomas precoces estão relacionados com a actividade adrenérgica e a resposta autonómica à hipoglicémia: sudação, palpitações, ansiedade. Episódios repetidos ou prolongados de hipoglicémia podem resultar no aparecimento de sintomas neurológicos com escassos ou nenhum sinais de aviso: “ignorância hipoglicémica”. Os sintomas neurológicos da hipoglicémia aparecem a partir de glicémias inferiores a 36mg/dl Hipoglicémia A ausência de glicose no cérebro produz consequências adversas no cérebro, metabolismo e crescimento. Pode levar a sequelas permanentes do crescimento e função cerebrais. Sequelas a longo termo: atraso mental ou epilepsia. Hipoglicémia Manifestações Ansiedade Ataxia Parestesias Transpiração Disartria Hipotermia Apneia Cianose Palpitações Recusa alimentar Fome Confusão Convulsões Coma Hipoglicémia Terapêutica: A abordagem imediata do lactente ou criança com hipoglicémia consiste em obter colheitas de sangue e urina e administrar glicose. Hipoglicémia Análises de angue: Glicose plasmática Ácidos gordos livres Acil carnitina total e livre Lactato hidroxibutirato Toxicologia e rastreio metabólico Hormonas glicorreguladoras (insulina, hormona crescimento, cortisol, péptido C) Electrólitos e função hepática Amónia Hipoglicémia Diagnóstico: Colher a primeira urina após o episódio. Pedir corpos cetónicos e substâncias redutoras. Congelar a restante urina para estudos toxicológicos, ácidos orgânicos, ácidos dicarboxílicos e/ou acilglicinas. Hipoglicémia Diagnóstico: A maior parte dos estudos podem ser realizados em sangue em heparina ou EDTA As amostras devem ser transportadas em gelo. O plasma não utilizado deve ser conservado a -70ºC. Hipoglicémia Diagnóstico: É fundamental obter amostras durante o episódio. Deve colher-se um volume de sangue seguramente suficiente (5 a 10ml) antes de iniciar as medidas terapêuticas para confirmar o diagnóstico e permitir a realização de testes bioquímicos adicionais. Hipoglicémia Tratamento Infusão de glicose: RN: Administrar 2ml/kg de dextrose 10% seguido de infusão contínua de 6-8mg/kg/min até atingir glicémias de 70 – 120mg/dl. Crianças: 0,5-1 g/kg, que equivale a 2-4 ml/kg de dextrose 25% ou 5-10 ml/kg de dextrose 10% ou 10-20 ml/kg de dextrose a 5%. Se a hipoglicémia persistir pode aumentar-se a infusão de glicose para 8-15mg/kg/min. Suspeitar de hiperinsulinismo quando há necessidade de ritmos de glicose superiores a 10m/kg/min. Hipoglicémia Terapêutica: Na impossibilidade de administrar glicose iv, prescrever glucagon 0,003mg/kg im ou sc ou epinefrina 0,01mg/kg im ou sc. Corrigir a doença de base. Hipoglicémia Terapêutica: Se não há resposta à glicose iv, administrar hormona de crescimento 1 mg/24h Hidrocortisona 5-10 mg/kg/d de 8/8 hs. Prednisolona oral 1-2 mg/kg/24 de 6/6 ou 12/12hs. Hipoglicémia Terapêutica (crónica): Diazóxido 10-25 mg/kg/dia em 4 doses Efeitos colaterais: hirsutismo, edema, aumento do ácido úrico, aumento da idade óssea. Octreótido (análogo da somatostatina): Utilizado na hipoglicémia hiperinsulinémica. 20-50 micrograms SC com 6-12 horas de intervalo. Efeitos colaterais: atraso crescimento, dor no local injecção, hepatite, queixas gastrointestinais.