INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA FLUMINENSE PÓS–GRADUAÇÃO LATO SENSU EM EDUCAÇÃO PROFISSIONAL INTEGRADA À EDUCAÇÃO BÁSICA NA MODALIDADE DE EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS EMILSE GOMES CHAGAS A QUESTÃO ENSINO-APRENDIZAGEM NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS Campos dos Goytacazes/RJ 2010. EMILSE GOMES CHAGAS A QUESTÃO ENSINO-APRENDIZAGEM NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS Artigo apresentado ao Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense como requisito parcial para Conclusão do Curso de Pós–Graduação Lato Sensu em Educação Profissional Integrada à Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos. Or.: Luiz Cláudio Gomes de Abreu Campos dos Goytacazes/RJ 2010 5 AGRADECIMENTOS A Deus pela oportunidade de crescimento pessoal e profissional, pelo sustento em todos os momentos desta jornada. Aos familiares pela compreensão e incentivos. Aos amigos e professores pelos encontros e aprendizagens. Ao Instituto Federal Fluminense (IFF) pela oportunidade oferecida por este curso de PósGraduação. 6 A principal meta da educação é criar homens que sejam capazes de fazer coisas novas, não simplesmente repetir o que outras gerações já fizeram. Homens que sejam criadores, inventores, descobridores. A segunda meta da educação é formar mentes que estejam em condições de criticar, verificar e não aceitar tudo que a elas se propõe. Jean Piaget 7 A QUESTÃO ENSINO - APRENDIZAGEM NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS Emilse Gomes Chagas 1 RESUMO: O objetivo deste artigo é apresentar uma breve revisão bibliográfica dos principais estudos sobre a questão ensino-aprendizagem que podem ser aplicados à Educação de Jovens e Adultos. Foram abordadas teorias de aprendizagem de Piaget, Vigotsky, Wallon e Ausubel. A metodologia usada foram pesquisas realizadas em livros, artigos, periódicos e fontes da internet. O material lido foi resumido e apresentado através de texto argumentativo. Palavras-chave: educação de jovens e adultos, ensino-aprendizagem, teorias cognitivas. THE ISSUE IN TEACHING LEARNING EDUCATION OF YOUNG AND ADULTS SUMMARY: The objective of this paper is to present a brief review of major studies on the teaching-learning issue that can be applied to education of young and adults. Were addressed learning theories of Piaget, Vygotsky, Wallon and Ausubel. The methodology used was research in books, articles, journals and internet sources. The material read was summarized and presented through an argumentative text. Keywords: young and adults education, teaching-learning, cognitive theories. INTRODUÇÃO É comum encontrar entre os educadores a constatação de que a educação oferecida pela escola pública brasileira é bem distinta daquela que deve atender às necessidades da população. A educação pública, especialmente na modalidade de Ensino de Jovens e Adultos, deve estar voltada para os tempos atuais. O que motiva este estudo é o fato de que a Educação de Jovens e Adultos tem sido pouco debatida, em especial as bases teóricas da relação ensino-aprendizagem nesta modalidade de ensino. Teorias tradicionalmente discutidas no contexto da educação básica, tais como as de Piaget, Vygotsky, Wallon e Ausubel podem contribuir para uma nova ação pedagógica na EJA? 1 Pós-Graduanda em Educação Profissional Integrada à Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos 8 A hipótese que orienta este estudo é o fato de que as teorias que fundamentam a questão ensino-aprendizagem abordadas neste estudo podem ser aplicadas à Educação de Jovens e Adultos permitindo uma nova ação pedagógica que valorize e contemple a diversidade. O conhecimento das teorias de Vigostski, Piaget, Wallon e Ausubel pode fornecer subsídios importantes para uma nova prática pedagógica que permita a coexistência de sonhos, ideais e anseios de toda uma comunidade. Para tanto, o educador precisa ser um profissional competente, ético e aberto a inovações. Um mediador que faça de suas aulas um laboratório de pesquisa, um espaço de discussão e um ambiente de sensibilização. Que saiba o valor da razão, mas que não menospreze o potencial da emoção. Nesta perspectiva a EJA se apresenta como um contexto de ampliação das oportunidades educacionais, de aprendizagem e de crescimento pessoal e profissional, pois possui especificidades em seu processo ensino-aprendizagem que devem ser conhecidas pelo educador. O objetivo deste estudo é sintetizar as principais contribuições das teorias de aprendizagem de Piaget, Vigotski, Ausubel e Wallon que possam ajudar a imprimir uma nova dinâmica nas atividades pedagógicas da EJA. A relevância desta pesquisa está na reflexão sobre a prática pedagógica da EJA. Professores, diretores, pedagogos e especialistas da área educacional podem, a partir das novas perspectivas sugeridas por este estudo, implementar posturas e programas de ensino mais eficazes para a EJA. A metodologia usada foi a pesquisa bibliográfica em livros, artigos, periódicos e fontes da internet. O material lido foi resumido e apresentado através de texto argumentativo. O artigo não pretende esgotar as contribuições que as teorias de Piaget, Vigotski, Ausubel e Wallon podem trazer para o Ensino de Jovens e Adultos. No entanto, os aspectos abordados em cada uma delas podem ser considerados de suma importância para a revisão de práticas descontextualizadas em relação às necessidades dos alunos. 9 1. ABORDAGENS TEÓRICO-CONCEITUAIS DO PROCESSO DE APRENDIZAGEM 1.1 Conceitos de Aprendizagem Aprender é uma atividade complexa. O fluxo de experiências variadas que o indivíduo vivencia origina o seu aprendizado. Mas muitas dessas vivências não deixam resultados na vida consciente. Infere-se a partir dessa afirmativa alguns acontecimentos da vida suscitam efeitos cognitivos e outros não. Compreender e explicar a aprendizagem é imprescindível para quem lida com o aprendizado e para quem quer torná-lo mais eficiente e permanente para todos os alunos, especialmente para aqueles que não aprenderam na época e na idade oportuna. De acordo com Lima e Carvalho (2009) a aprendizagem pode ser natural ou induzida, onde a espontânea baseia-se em preferências e motivações pessoais, ocorre por tentativa e erro, imitação, observação, por meio de fontes acessadas no dia-a-dia. Já a induzida ocorre em contextos estruturados para ensinar, tendo como ações planejadas a fim de facilitar a aprendizagem. Há consenso entre os pesquisadores de que a aprendizagem consiste de mudança no comportamento. Abbad (2007 apud LIMA e CARVALHO, 2009 p. 25) afirma que: O conceito de aprendizagem sofre variações dentro da Psicologia, de acordo com as diversas abordagens existentes, mas, de forma geral, aprendizagem faz referência às mudanças que ocorrem no comportamento do indivíduo, não resultantes unicamente de maturação, mas de sua interação com o contexto. 1.2 Correntes de Abordagem da Aprendizagem Do ponto de vista psicológico há duas correntes de abordagem da aprendizagem: a cognitivista e a comportamental. Para os comportamentalistas a aprendizagem ocorre por condicionamento, onde o comportamento muda por mecanismos de estímulo-resposta. Algo externo ao organismo o estimula a reagir ou a responder ao estímulo, logo se a resposta ao estímulo for satisfatória deve ser recompensada e reforçada, se não deve ser eliminada. Nesta perspectiva o erro é visto como algo negativo e deve ser evitado ou punido. 10 Skinner é o maior representante dessa corrente e afirma que o comportamento é influenciado pelos resultados. O condicionamento operante é um mecanismo que permeia uma determinada reação até que o indivíduo fique condicionado e associe uma necessidade a àquela ação, ou seja, um estímulo do ambiente faz com que o indivíduo responda – seu reforço positivo ocasiona a aprendizagem, sendo o homem um produto do ambiente (LIMA e CARVALHO, 2009). Já a abordagem cognitivista surge a partir do século XX. Esta abordagem compreende o indivíduo como sujeito do processo de aprendizagem. Para os cognitivistas a compreensão se dá por um processo de reorganização mental e psicológica em resposta à experiência. (LIMA e CARVALHO, 2009). As teorias associacionistas entendem a aprendizagem como reprodução da realidade, cópia e associação entre elementos. As teorias construtivistas compreendem a cognição como uma mudança qualitativa das estruturas de conhecimento do indivíduo. As teorias sobre a natureza e origem do conhecimento da antiga Grécia formaram as bases atuais da psicologia da aprendizagem. Sob a perspectiva do pensamento grego, Aristóteles se opõe à Platão ao admitir que o conhecimento advém da experiência sensorial que permite ao homem associar imagens formadas a partir da percepção sensível. O indivíduo não possui conhecimentos inatos ((LIMA e CARVALHO, 2009). O associacionismo comportamental demonstra o caráter universal da aprendizagem. Suas leis são objetivas e aplicáveis a qualquer ser humano e animal e em qualquer situação ou atividade. O cognitivismo compreende a aprendizagem não como um processo de reprodução da realidade, mas de sua representação. As estruturas mentais existentes no cérebro humano são responsáveis por interpretar a realidade. Assim, o cérebro, ou melhor, a mente é responsável por criar a representação do mundo. No entanto, essa abordagem parece ineficaz para explicar os comportamentos adaptativos e as mudanças qualitativas na aprendizagem (LIMA e CARVALHO, 2009). As diversas teorias sobre a forma como ocorre o desenvolvimento e a aprendizagem constituem um ambiente de discussão permanente. Por isso, a seguir serão abordadas alguns desses estudos acerca do desenvolvimento cognitivo humano e suas contribuições para a compreensão do processo ensino-aprendizagem. 11 1.2.1 A psicogênese do desenvolvimento cognitivo de Piaget A Psicogênese é a parte da Psicologia que estuda a origem (genesis) dos processos mentais e funções psíquicas (psyche) (HOUAISS, 2001). Jean Piaget ao investigar a natureza da aprendizagem definiu alguns estágios do desenvolvimento da inteligência. Para o pesquisador o conhecimento é construído pouco a pouco de acordo com a maturação do organismo. À medida que as estruturas mentais e cognitivas se organizam e amadurecem ocorre o desenvolvimento humano. Assim, Piaget estabeleceu os estágios do desenvolvimento da inteligência de acordo com a faixa etária do indivíduo. A estrutura mental vai se organizando a partir das experiências que o sujeito estabelece com o meio e com outros através de processos de equilibração. Um dos aspectos da Teoria da Psicogênese muito importante para a formação de professores é a constatação de que todos os seres vivos podem ser considerados inteligentes. Isto se a inteligência for concebida como uma forma de organização e adaptação a contextos em constantes transformações. Organização no sentido de que é necessário mobilizar todo o organismo para manter-se equilibrado enquanto as circunstâncias se apresentam como problematizadoras ou em oposição à vida. Se o professor entende a educação como um elemento desafiador para o aluno, ele faz dos conteúdos que trabalha situações problema que o levam a se organizar e mobilizar seu repertório cognitivo para solucioná-las (MACEDO, 1997). Além disso, a constatação de que grande parte daquilo que conserva a vida está fora de do homem, ou seja, não é, nem poderá ser produzido por ele, leva à compreensão de que o ser humano está fadado à interação. Por exemplo, depende da natureza, de outras pessoas, da comunidade. É necessário adaptar, regular as necessidades e possibilidades de sobrevivência ao que está fora. É a inteligência que permite ao homem efetuar essas trocas vitais. Na linguagem de Piaget, ela possibilitará, por mecanismos de assimilação e acomodação, que essas interações possam ser efetuadas e que a vida, em sua expressão biológica, cultural, psicológica, etc., continue. Se a formação do professor contempla esse estudo, fica fácil entender que o processo de aprendizagem é eficaz quando as questões trabalhadas em sala de aula mantêm íntima relação com a vida, ou seja, se o aluno consegue ampliar suas habilidades de enfrentamento e soluções de problemas reais. A escola deve preparar o aluno, estimulando sua 12 inteligência para a interação e o enfrentamento dos desafios que a vida lhe apresenta (MACEDO, 1997). Aceitar a noção de inteligência como o que possibilita e dá sentido à vida para qualquer ser vivo implica pensar em uma questão muito importante para os seres humanos. Se é assim, por que a violência, a fome, a injustiça, a desigualdade social, a falta de vontade de aprender ou ensinar, a inveja, o ciúme, o medo, a destruição da natureza e tantas outras coisas contrárias à vida continuam a acontecer? Talvez porque ainda não se tenha como compreender e praticar, no nível hoje exigido pela complexidade da vida, os dois elementos fundamentais de inteligência ou de vida: sua condição interdependente e reversível. A Interdependência refere-se, na teoria de Piaget, a uma qualidade da relação entre as partes e o todo que lhe corresponde. Para resolver um problema deve-se considerar todo o conjunto da situação, as compatibilidades, a multiplicidade de fatores a considerar. É isso o que nos obriga, do ponto de vista do conjunto, a considerar cada parte (regras, objetos, restrições) de modo autônomo em relação às outras, isto é, consideradas em si mesmas. Ao mesmo tempo, cada parte deve ser coordenada com as outras e, simultaneamente, com o todo que as integra (MACEDO, 1997). Esta compreensão permite ao professor planejar seus conteúdos de modo a estimular o pensamento indutivo e dedutivo. A interdependência faz ver a necessidade de interação entre pessoas e grupos: nas relações políticas, comerciais, científicas e tecnológicas (nas trocas pela informática, por exemplo). Mas lembra-nos também do quanto essa qualidade tem sido, em nome da independência, pervertida. A independência evita que se tente resolver o problema por ensaio e erro, ou seja, primeiro agindo e depois sofrendo as conseqüências de nossa ação. Macedo (1997) esclarece que a reversibilidade pode ser entendida como um coordenador de uma independência, com qualidade construtiva. Neste sentido se caracteriza por ser uma possibilidade mental, corporal ou social de se considerar as relações entre as partes e o todo de modo simultâneo. Aprende-se, nesses últimos séculos, a valorizar a tarefa realizada de modo sucessivo e exclusivo. A inteligência, na perspectiva de Piaget, ao contrário, pede coordenação de pontos de vista. A reversibilidade, como qualidade de um pensamento operatório, é a que cria a necessidade de considerar simultaneamente todos os fatores em jogo num problema e permite fazer 'viagens mentais' antes de decidir concretamente pela indicação efetiva dos transportes a serem feitos. Trata-se de uma conclusão, de poder interpretar e decidir qual é o melhor 13 procedimento para um resultado desejado em função do objetivo. Descobrir as impossibilidades, considerar as contingências, não sendo determinado por elas, e valorizar aquilo que é possível e necessário em cada situação são condições para uma ação operatória flexível, rigorosa e aberta (LIMA e CARVALHO, 2009). É a reversibilidade como qualidade construtiva (relacional, dialética) que caracteriza uma inteligência operatória que pode ligar passado, presente e futuro, dirigindo as ações pelo projeto que as determina. O passado, em uma inteligência de qualidade operatória, corresponde a um pensar e a um agir histórico. O futuro, em uma inteligência operatória, expressa-se por criticar as hipóteses sugeridas por essa reflexão, por poder inferir resultados bons e ruins para o objetivo proposto pelo problema, por planejar e decidir as melhores ações antes de realizá-las concretamente. Estas constatações são imprescindíveis para toda a ação pedagógica, para orientação dos procedimentos didáticos e efetivação da aprendizagem eficaz. Se a formação de professores contempla uma metodologia de trabalho onde a problematização, a interação e adaptação estão presentes, é fácil para o professor aplicá-la em sua ação educativa. No contexto da EJA os estudos de Piaget podem contribuir para a percepção de que o adulto ou adolescente que não teve oportunidades educacionais na idade apropriada pode apresentar defasagens que precisam ser trabalhadas pela escola. No entanto, o adulto aprende de forma diferente da criança, pois o seu saber já está amadurecido para viver situações de aprendizagem mais complexas, no entanto suas experiências cognitivas podem ser limitadas por suas experiências. Portanto, é fundamental para o educador promover educação de qualidade para todos, independente da faixa etária. 1.2.2 A natureza mediada da cognição em Vigotsky Vigotsky considerou a Psicologia de sua época incapaz de fornecer uma explicação suficiente para os processos psicológicos do homem e se propôs a reformulá-la. Sua aspiração era compreender o desenvolvimento humano na vida em sociedade e como ser sóciohistórico. Vigotsky rejeitou a redefinição do objeto da Psicologia proposta pelo behaviorismo americano e por seus companheiros soviéticos de que mente e comportamento são fenômenos distintos e separados. Para Vigotsky o comportamento humano era inerentemente social e culturalmente organizado. Consciência e comportamento eram compreendidos como aspectos integrados de uma mesma unidade (Vigotsky 1979 apud Freitas 2000). 14 Nos estudos acerca do desenvolvimento humano, Vigotsky propõe uma nova concepção de origem e natureza das funções psíquicas. Compreendia que o sujeito não se constituía a partir de fenômenos internos e nem se reduzia a um mero reflexo passivo do meio, para ele, o sujeito se construía na relação com o ambiente. O principal tema da Psicologia em Vigotsky, como suporte para este artigo, refere-se dos processos mentais no indivíduo têm a sua origem nos processos sociais e só podem ser compreendidos através da mediação dos instrumentos e signos2 cujos conceitos emergiram da crença de Vigotsky na possibilidade de transformar o mundo material, mediante o emprego de ferramentas. Essa perspectiva estabeleceu as condições para a modificação da própria atividade reflexa e sua mudança qualitativa em consciência. “Este processo, porém, se completava mediado pela construção de uma classe especial de ferramentas: aquelas que permitissem realizar transformações nos outros” (FREITAS, 2000 p. 90). Vigotsky denominou essas ferramentas de signos que eram proporcionados essencialmente pela cultura, pelas pessoas do meio, pelos outros. Esses signos, ao interiorizarem-se, transformando-se em meios de regulação interna ou auto-regulação, iriam modificar dialeticamente a estrutura da conduta externa. Todas as funções no desenvolvimento da criança aparecem duas vezes: primeiro, no nível social, e depois, no nível individual; primeiro, entre pessoas (interpsicológica), e, depois, no interior da criança (intrapsicológica) (VIGOTSKY, 1984: 64). O pensamento e a consciência não são uma emanação de características estruturais e funcionais internas, mas são, ao contrário, fortemente influenciadas por atividades externas e objetivas, realizadas num ambiente social. A atividade é definida como uma unidade de análise, integrando as características sócio-interativas e individuais-cognitivas das condutas. A cooperação social na atividade se realiza por meio de instrumentos ou signos dentre os quais os signos verbais desempenham um papel primordial. A internalização progressiva dos instrumentos de cooperação permite a construção do pensamento consciente que transforma e regula as outras funções psíquicas (FREITAS, 2000: 89). Essa é a idéia da gênese social do pensamento em Vigotsky. “A criança começa a perceber o mundo não somente através dos olhos, mas também através da fala” (VIGOTSKY, 1984 p. 43). A rotulação do objeto permite que a criança 2 Os signos são os meios de contato com o mundo exterior e também consigo mesmo e com a própria consciência (...) os signos são a única maneira adequada para o estudo da consciência. (FREITAS, 2000: 89) 15 recorte-o de uma situação global ampliando seu vocabulário, além disso, o uso de gestos compensa sua dificuldade de comunicação pela linguagem. A linguagem permite uma percepção visual integral, pois a fala adquire uma função sintetizadora e instrumental de formas mais complexas de percepção cognitiva. “Os elementos, separadamente, são rotulados e, então, conectados numa estrutura de sentença, tornando a fala essencialmente analítica” (VIGOTSKY, 1984 p. 46). Assim, Vigotsky entende que o mundo não é percebido somente em cores e formas, mas com sentido e significado. A percepção é parte da dinâmica do comportamento, portanto para mostrar a mudança na relação entre percepção e ação motora Vigotsky fará estudos sobre a escolha em crianças. Em crianças pequenas o pensamento evolui sem a linguagem, os primeiros balbucios se formam sem o pensamento e têm por objetivo atrair a atenção do adulto. Percebe-se, desta maneira, a função social da fala desde os primeiros meses. Segundo Vigotsky (1974 apud FREITAS, 2000: 93): pode-se estabelecer no desenvolvimento da fala da criança uma linguagem pré-intelectual e no desenvolvimento de seu pensamento, um pensamento pré-lingüístico. Aos dois anos de idade, o pensamento pré-lingüístico e a linguagem pré-intelectual se encontram e se juntam, surgindo um novo tipo de organização lingüístico-cognitivo. A essa altura, quando essas duas linhas se encontram, o pensamento se torna verbal e a linguagem racional. Neste período a criança começa a perceber o propósito da fala e que cada objeto tem um nome. Ela passa a sentir a necessidade das palavras, tenta apreender os signos (descoberta da função simbólica da palavra). Com o intuito de entender o pensamento verbal Vigotsky não separa analiticamente pensamento e palavra, mas o compreende em uma unidade que é o significado das palavras. O significado em Vigotsky é um fenômeno da fala e do pensamento, uma generalização, um conceito construído por atos do pensamento. Para entender a unidade do significado é preciso compreender que é um fenômeno do pensamento, apenas quando ganha corpo por meio da fala, e só é fenômeno da fala na medida em que é iluminado pelo pensamento. A evolução dos significados das palavras ocorre na evolução histórica da linguagem. Não é o conteúdo de uma palavra que se altera, mas o modo pelo qual a realidade é generalizada e refletida em uma palavra. Nesta relação, porém, há que se distinguir a estrutura da fala e do pensamento. 16 A estrutura da fala foi apresentada por Vigotsky em dois processos divergentes e inversos: fala interior e exterior. A fala interior não é propriamente uma fala, mas uma atividade intelectual e afetivo-volitiva, tem uma formação específica, leis próprias e mantém relações com outras formas de atividade de fala. É uma fala para si mesmo, não é antecedente da fala exterior, nem reprodução desta, interioriza-se em pensamento. A fala exterior está voltada para os outros e consiste na tradução do pensamento em palavras: é a sua materialização e objetivação. Além da fala interior e da fala exterior, Vigotsky também estudou a fala egocêntrica partindo do princípio de que esta tem um papel fundamental na atividade da criança: a função diretiva estratégica de transformar sua atividade em um pensamento intencional. A fala egocêntrica é o estágio transitório na evolução da fala oral para a fala interior. Essa evolução se processa de uma fala exterior para uma fala egocêntrica e desta para uma interior, isto é, do social para o individual. Ela é um fenômeno de transição das funções interpsíquicas (atividade social) para as intrapsíquicas (atividade individual) (FREITAS, 2000 p. 96). Além de acompanhar as atividades da criança, a fala egocêntrica está a serviço de sua orientação mental, da compreensão consciente que ajuda a superar suas dificuldades. Portanto, segue o desenvolvimento do pensamento e transforma-se em fala interior. À medida que a vocalização egocêntrica decresce, aumenta a capacidade de pensar as palavras ao invés de pronunciá-las. O pensamento ligado por palavras é o verbal, plano específico da fala interior. Enquanto na fala exterior é expresso em palavras, a fala interior é em grande parte um pensamento que expressa significados puros. Em Vigotsky, a palavra além de ser um fator do desenvolvimento mental da criança, exerce uma função organizadora e planejadora dos pensamentos, uma função social e de comunicação. É através da linguagem que a criança entra em contato com o conhecimento humano e adquire conceitos sobre o mundo que a rodeia, apropriando-se da experiência acumulada histórica e socialmente pelo gênero humano. É a partir da interação social, da qual a linguagem é expressão que a criança constrói sua própria individualidade. É no fluxo da interação verbal que a palavra ganha diferentes significados e se transforma conforme o contexto em que se move. O caráter dinâmico da realidade ideológica das interações sociais possibilita a realização da palavra como signo ideológico. O diálogo se revela como uma forma de ligação entre linguagem e vida. Em Vigotsky a evolução semântica da língua se faz pelas transformações do significado da palavra ao longo do desenvolvimento do sujeito. 17 Segundo Vigotsky a construção das funções psíquicas da criança está vinculada à apropriação da cultura humana, através de relações interpessoais dentro da sociedade à qual pertence. Essa apropriação se dá através da educação e do ensino por intermédio de adultos ou companheiros mais experientes. No caso da EJA as contribuições de Vigotsky se dão no campo das interações. A compreensão de que o processo de aprendizagem se dá pelo contato com o outro, permite ao educador formular situações de aprendizagem que envolvam o trabalho em grupo e a ajuda pedagógica de um aluno para outro, além da intervenção do professor. 1.2.3 A psicogênese da pessoa total de Wallon A grande contribuição de Wallon para a educação foi a abordagem da importância dos aspectos afetivos na aprendizagem. O professor mediador no contexto da EJA deve estudar os processos relativos à cognição e às relações interpessoais e pessoais presentes nos ambientes de aprendizagem. Afetividade, inteligência e movimento são categorias de atividades cognitivas do desenvolvimento humano que devem ser conhecidas pelo docente (ALMEIDA, 2000). A compreensão de que o desenvolvimento não começa cognitivamente traz novas perspectivas para a prática pedagógica que deve considerar tanto a sensibilidade interna (elementos da vida psíquica) quanto a externa (elementos do mundo exterior) (GUEDES, 2010). Ao ministrar aulas e planejar suas atividades pedagógicas o professor deve considerar os aspectos afetivos que estão envolvidos nos conteúdos escolares. Não se deve perder de vista a importância da emoção na aprendizagem e da visão da pessoa como um todo. Os conteúdos escolares devem integrar a dimensão individual e social, atendendo à formação do indivíduo e da sociedade. Na modalidade de Ensino de Jovens e Adultos o professor mediador tem o grande desafio de conciliar aspectos cognitivos e afetivos em seus ambientes de aprendizagem 18 1.2.4 A aprendizagem significativa de Ausubel Aprendizagem significativa capacita o sujeito a viver em sociedade de modo participativo e reflexivo, é uma aprendizagem que se caracteriza por ser crítica e norteadora de habilidades como autonomia, auto-regulação, autodisciplina e interação. Para haver aprendizagem significativa são necessárias duas condições. Em primeiro lugar, o aluno precisa ter uma disposição para aprender: se o indivíduo quiser memorizar o conteúdo arbitrária e literalmente, então a aprendizagem será mecânica. Em segundo, o conteúdo escolar a ser aprendido tem que ser potencialmente significativo, ou seja, ele tem que ser lógica e psicologicamente significativo: o significado lógico depende somente da natureza do conteúdo, e o significado psicológico é uma experiência que cada indivíduo tem. Cada aprendiz faz uma filtragem dos conteúdos que têm significado ou não para si próprio (PELIZZARI, KRIEGL e BARON, 2010 p. 38) A noção de aprendizagem significativa remete à necessidade de promover a disposição para aprender e para superar a cognição mecânica, também faz refletir acerca das habilidades retidas e aquelas que caem no esquecimento. Certamente cada professor traz consigo as lembranças de aprendizagens que nunca foram esquecidas, pois estão intimamente relacionadas a eventos carregados de emoções (positivas ou negativas). Todos lembram daquela professora do “primário” e do modo como ensinou a somar e a subtrair. Festinhas dos dias das mães, a peça de teatro que trazem à memória as aprendizagens significativas filtradas dos conteúdos que tiveram significado. Esta reflexão faz pensar sobre o modo como os conteúdos escolares estão sendo organizados e quais são os seus significados para cada aluno, com isto aumenta a responsabilidade dos educadores que querem promover a independência intelectual de seus alunos. A mediação do professor é fundamental na construção do conhecimento, pois o docente assume o papel de mediador, a aprendizagem deixa ser mecânica e passa a ser significativa, pois o professor não é aquele que detém o conhecimento, nem é apenas a informação que deve ser reproduzida. A ideia de mediação pressupõe a disposição para ensinar aprendendo. Mediar a aprendizagem requer habilidades para criar condições para que o conhecimento seja construído por todos. É mostrar para os alunos que eles têm infinitas possibilidades e habilidades que encontram-se latentes (PELIZZARI, KRIEGL e BARON, 2010) 19 A educação necessária ao mundo de hoje é prioritariamente crítica e promotora da inclusão social. Neste sentido, é libertadora e deve promover as relações humanas, assentando-se em convicções voltadas para os valores humanos, a fraternidade e a consciência da interdependência entre o homem e o planeta. Para ser significativa a educação precisa considerar as habilidades, vivências e conhecimentos que os alunos trazem como base para a construção de novas aprendizagens relacionadas à vida e ao mundo contemporâneo. CONSIDERAÇÕES FINAIS Pensar sobre as possibilidades educacionais que surgem da aplicação das teorias de ensino/aprendizagem e sobre a imensidão dos desafios que se apresentam na EJA, motiva a mudança, a revisão de crenças, posturas, conceitos e preconceitos. Neste sentido, o artigo tematizou questões importantes em cada uma das teorias abordadas. A síntese da Teoria da Psicogênese trouxe a constatação de que os seres humanos podem ser considerados inteligentes, pois a inteligência é concebida como uma forma de organização e adaptação aos contextos que estão em constantes transformações. Neste sentido o professor deve criar circunstâncias problematizadoras que instiguem o aluno a reequilibrarse. Se o docente entende a educação como um elemento desafiador, faz dos conteúdos que trabalha em sala de aula, situações problema que levam o aluno a se organizar e mobilizar seu repertório cognitivo para solucioná-las. Assim, as aulas deixam de ser monótonas e repetitivas, pois os desafios do dia a dia dos jovens e adultos são muitos e variados e estão intimamente relacionados com a necessidade de sobreviver num mundo muito exigente cognitiva e afetivamente. A contribuição da Psicologia em Vigotsky para a compreensão da formação social da mente é muito importante para todo o educador. Ao afirmar que os processos mentais no indivíduo têm a sua origem nos processos sociais e que só podem ser compreendidos através da mediação dos instrumentos e signos, Vigotsky faz co-participantes do processo de aprendizagem dos alunos. O conceito de mediação de instrumentos e signos emerge da crença de Vigotsky na possibilidade de transformar o mundo material, mediante o emprego de ferramentas, estabelece as condições para a modificação da própria atividade reflexa e sua transformação qualitativa em consciência. Essas ferramentas são proporcionados essencialmente pela cultura, pelas pessoas do meio, pelos outros. Portanto, a sala de aula deve ser um espaço de 20 aprendizagem cooperativa, de trabalho em grupo e troca de experiências. Sem essa compreensão o educador dificulta e limita a aprendizagem do seu aluno. No contexto da psicogênese de Wallon constatou-se que o professor mediador da EJA deve prestigiar ações educativas que promovam as relações interpessoais e pessoais. Afetividade, inteligência e movimento são categorias de atividades cognitivas do desenvolvimento humano que devem ser contempladas no trabalho com qualquer área do conhecimento. A compreensão de que o desenvolvimento não começa cognitivamente traz novas perspectivas para a prática pedagógica que deve considerar tanto a sensibilidade interna, ou seja, os elementos da vida psíquica, quanto a externa, os elementos do mundo exterior. Ao ministrar aulas e planejar suas atividades de sala de aula o professor deve considerar os aspectos afetivos que estão envolvidos nos conteúdos escolares. Não se deve perder de vista a importância da emoção na aprendizagem e da visão da pessoa como um todo. Aprendizagem significativa de Ausubel permitiu compreender que ela capacita o sujeito a viver em sociedade de modo participativo e se caracteriza por ser crítica e norteadora de habilidades como autonomia, auto-regulação, autodisciplina e interação. Para haver aprendizagem significativa são necessárias duas condições: o aluno precisa ter uma disposição para aprender e o conteúdo escolar a ser aprendido tem que ser potencialmente significativo, isso significa que ele tem que ser lógica e psicologicamente significativo. O aluno filtra os conteúdos que têm ou não significado para ele. O professor precisa superar o ensino mecânico que cai no esquecimento. Todas estas reflexões remetem à constatação de que a educação que os alunos da escola pública brasileira, em especial, os alunos da EJA necessitam é prioritariamente crítica, afetiva, cooperativa e promotora da inclusão social. Neste sentido, é uma educação libertadora, pois promove as relações inter e intrapessoais e assenta-se em convicções voltadas para os valores humanos, a fraternidade e a consciência planetária. Portanto, a hipótese de que essas fundamentações sobre a questão ensinoaprendizagem podem mudar a prática pedagógica dos educadores da modalidade de Ensino de Jovens e Adultos é teoricamente possível. Cabe a cada professor, independente de sua área de atuação, a disposição para fazer delas uma prática transformadora. 21 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: ALMEIDA, Laurinda Ramalho de. Wallon e a educação. In: Henri Wallon – Psicologia e Educação. São Paulo: Loyola, 2000. CARVALHO, Eliane Maria C. Carvalho; LIMA, Maria Célia Cardoso. Abordagens Teóricoconceituais do Processo de Aprendizagem. POSEAD. Educação a Distância. Módulo Básico. CETEB: Brasília, 2009. DANIEL, S. Harry. Uma introdução a Vigotsky. São Paulo: Loyola, 2001. FREITAS. Maria Teresa de Assunção. Vigotsky & Bakhtin. Psicologia e Educação: Um intertexto. São Paulo: Ática, 2000. GUEDES, Adrianne Ogêda. A Psicogênese da pessoa compelta de Wallon. Desenvolvimento da comunicação humana.Disponível em http://www.museudainfancia .unesc.net. Acesso de 12 de agosto de 2010. HOUAISS. Dicionário da Língua Portuguesa. São Paulo: Objetiva, 2001. MACEDO, Lino de. Piaget e a nossa inteligência. Revista Pátio nº 1, maio/junho de 1997. PELIZZARI, Adriana; KRIEGL, Maria de Lurdes; BARON Márcia P. Teoria da Aprendizagem significativa de Ausubel. Disponível em http://www.bomjesus.com.br/artigos. Acesso em 05 de agosto de 2010.