Síndrome do ligamento arqueado mediano como diagnóstico diferencial de isquemia mesentérica crônica: relato de caso e revisão da literatura ARRUDA, Gabriel Nóbrega. Discente do Curso de Graduação em Medicina. RIBEIRO, Flávio Antônio de Sá. Docente do Curso de Graduação em Medicina Palavras-chaves: ligamento arqueado mediano, isquemia mesentérica, tronco celíaco. INTRODUÇÃO A Síndrome de Dunbar, reconhecida a partir de 1963, é uma condição rara, que manifesta-se com um quadro arrastado de angina abdominal 1,2 . Entre tantos sinônimos para esta entidade, tem-se a Síndrome do Ligamento Arqueado Mediano (SLAM), sendo este uma estrutura fibrosa com formato de arco que une os pilares diafragmáticos próximo ao hiato aórtico, localizando-se na maioria das pessoas, superiormente ao tronco celíaco, podendo possuir variações anatômicos, situando-se de maneira mais cefálica ou mais caudal 3. A fisiopatologia é obscura, acreditando-se numa mistura de fatores neurológicos e vasculares. Os sintomas são gerados pela compressão do tronco celíaco pelo ligamento arqueado mediano, comprometendo o fluxo sanguíneo, ocasionando o quadro de angina abdominal 2,3. Esta patologia é mais comum em mulheres entre 40-60 anos e magras. A apresentação clínica pode variar desde quadro assintomático até dor vaga importante em andar superior do abdome, após ingestão alimentar, diarreia, vômito, perda de peso e sopro sistólico em epigástrico 1-5 . A apresentação clínica da Síndrome de Dunbar pode mimetizar várias outras condições vasculares, como isquemia mesentéricas crônicas e até malignidades, gerando um atraso em seu diagnóstico, devendo, portanto, suspeitar desta entidade em todo paciente que se apresente com dor abdominal crônica de origem desconhecida 1,3,6. 2 Até o momento, o diagnóstico da SLAM é de exclusão, devendo o médico, realizar uma boa anamnese, além de associar dados clínicos com exames complementares, como angiografia e angiotomografia computadorizada do abdome 3,4,6. Em linhas gerais, o tratamento consiste na ressecção do ligamento arqueado mediano, por via laparoscópica ou aberta, aliviando os sintomas na maioria dos pacientes, entretanto os sintomas podem retornam a longo prazo 1,3. O primeiro caso de isquemia mesentérica (IM) foi relatado em 1815. Mais adiante foram descritos casos de isquemia mesentérica crônica (IMC) devido a trombose venosa, porém, apenas em 1895 tem-se relato de terapêutica cirúrgica para essa patologia (infarto mesentérico) 7. A IM ocorre quando um órgão ou tecido recebe sangue em quantidade inadequada, podendo ter como fator causal: embolia ou trombose arterial, trombose venosa ou compressão extrínseca da veia mesentérica 6,8. O sintoma mais comum da IMC é uma dor abdominal vaga. Em outros casos podem ocorrer angina mesentérica (dor após alimentação), náuseas, vômitos e diarreia. Tais sintomas são comuns a outras patologias, dificultando o raciocínio médico. O diagnóstico da IMC é de exclusão. O tratamento depende da etiologia, variando desde terapia cirúrgica, arteriográfica ou medicamentosa8. O objetivo deste trabalho é relatar um caso e revisão da literatura sobre a Síndrome do Ligamento Arqueado Mediano, enfatizando nesse diagnóstico como diferencial de isquemia mesentérica crônica. Este trabalho é composto por uma revisão da literatura narrativa com relato de caso, obedecendo as normas VANCOUVER e ABNT. O estudo teve aprovação institucional, respeitando o Código de Ética de Pesquisa em Seres Humanos, de acordo com a Resolução 196/96. Além disso, este projeto está isento de conflito de interesses. 3 RELATO DE CASO Identificação: SG, masculino, 76 anos, contador, casado, natural do bairro de Bonsucesso/Rio de Janeiro, morador do Bairro da Barra da Tijuca/Rio de Janeiro, católico. Queixa Principal: “Dor abdominal” História da Doença Atual: Paciente informa que procurou atendimento médico ambulatorial por insistência dos familiares para que o mesmo realizasse um check-up. Refere dor abdominal difusa de baixa intensidade há mais ou menos dois anos sem associação com alimentação que nos últimos meses estendeu-se para região lombar bilateral, mais acentuada a direita, o que o fez pensar em infecção urinária, motivo pelo qual não procurou o médico antes. Informa que essas dores são esporádicas, não interferindo em suas atividades diárias, atribuindo nota 02 numa escala de dor de 0 a 10. Nega febre e alterações geniturinárias e gastrointestinais. Nega também perda ponderal, cansaço e dificuldade para respirar. Informa uma dor em membro inferior direito também esporádica de baixa intensidade do tipo latejante, atribuindo nota 2 (mesma escala de dor). Não associa a dor a esforço físico ou repouso. Paciente não relata outras queixas. História Patológica Pregressa: Paciente hipertenso controlado em uso de terapia dupla. Em 2010 realizou tireoidectomia total devido a nódulo de tireóide; Apendicectomia realizada em 2007. Nega transfusão sanguínea e quadros alérgicos prévios. História Fisiológica: Nascido em casa, através de parteira. Desenvolvimento neuropsicomotor adequado. Nega doenças da infância. Pai de 3 filhos saudáveis. História Familiar: Pai falecido com 80 anos devido a complicações de acidente vascular encefálico isquêmico. Mãe falecida com 96 anos, por coronariopatia. Possui 12 irmãos, sendo uma irmã falecido por complicações de doença reumatológica (não soube informar data de falecimento). Outro irmão faleceu devido a vítima de atropelamento por volta dos 30 anos. Irmã falecida com 40 anos devido a complicações de câncer cerebral. Demais irmãos são saudáveis. 4 História Social: Nega tabagismo. Etilista Social (duas latas de cerveja aos finais de semana). Alimentação adequada em qualidade e quantidade (verduras, carnes, pão, frutas, leite, ovos). Sedentário. Calendário vacinal em dia. Nega viagens recentes. Não possui animais de estimação. Após dois anos com essa dor abdominal vaga, no qual o paciente não deu importância procurou o cirurgião geral em dezembro de 2012. Foram realizados exames como: hemograma completo, glicemia, uréia, creatinina, sódio, potássio, bilirrubina total e frações, TAP, PTT, INR, lipase, amilase, PCR, VHS, todos, dentro dos valores de referência. Exame físico normal. Foi realizado USG e tomografia computadorizada de abdome, sem alterações. Entretanto na mesma época foi realizada uma arteriografia (figura1), possibilitando o diagnóstico de SLAM. Figura 1: evidencia a compressão do tronco celíaco na sua inserção. Em junho de 2013 o paciente foi submetido a cirurgia no qual consiste na divisão do tecido fibroso, bandas musculares, associado ao procedimento de revascularização. SÍNDROME DO LIGAMENTO ARQUEADO MEDIANO COMO DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL DE ISQUEMIA MESENTÉRICA CRÔNICA A isquemia mesentérica ocorre quando tecidos tem suporte inadequado de sangue, devido a embolia/trombose arterial, trombose venosa com limitação de fluxo arterial ou compressão extrínseca de vasos mesentéricos 7,8 . A clínica de isquemia mesentérica crônica consiste em angina mesentérica/dor abdominal relacionada as 5 refeições geralmente após a alimentação quando se necessita de mais oxigênio para suprir as necessidades metabólicas 8, outros sintomas como perda ponderal e medo de se alimentar podem estar presentes 3,8. A Síndrome do ligamento arqueado mediano, conforme descrito anteriormente, ocorre pela compressão do tronco celíaco pelo ligamento arqueado mediano, reduzindo o suprimento sanguíneo em leito mesentérico, podendo cursar clinicamente com dor e desconforto abdominal, podendo estar associado sopro sistólico em região epigástrica, náuseas e vômitos. CONCLUSÃO Pelo exposto acima percebe-se uma semelhança importante entre os dois diagnósticos, muitas vezes, levando ao médico, a pensar em outras patologias como trombose vasos mesentéricos, processos ateroscleróticos ou neoplasias, deixando passar o diagnóstico de SLAM. Além disso, tanto a isquemia mesentérica crônica quanto a SLAM são diagnósticos de exclusão, portanto, o médico deve insistir na elucidação diagnostica em pacientes com dor abdominal crônica indeterminada com o auxílio de exames complementares, principalmente na dupla angio TC com arteriografia. No caso do nosso paciente, após um longo tempo de sintomatologia, foi feito o diagnostico SLAM, com posterior tratamento cirúrgico. Até o momento, o paciente encontra-se bem, assintomático e satisfeito com os resultados. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1 - Godoy JMP, Hussain KMK, Nagato LC, Raymundo SRO, Reis LF. Angina abdominal secundária à Síndrome da Compressão do Tronco Celíaco: relato de caso e revisão da literatura. Cir Vasc Angiol: 17:202-207, 2002. 2 – Almeida N, Amargo P, Freitas D, Gonçalves C, Gregório C, Gomes D, Gouveia H, Otero M. Um caso de Síndrome de Compreensão do Tronco Celíaco com eventual componente iatrogênico. J Port Gastrenterol 13: 196-201, 2006. 3 – Marques LU, Silva A, Tiengo RR. Síndrome do Ligamento Arqueado Mediano – Relato de Caso. Revista Ciências em Saúde v3, n1, 2013. 4- Antonella B, Bernardo R,Conte D, Iazzetta I, Libero L, Tartaglia A, Tartaglia E, Triscino G, Varricchio A. Laparoscopic treatment of celiac axis compression syndrome(CACS) and hiatal hernia: Case report with bleeding complicationsand review. International Journal of Surgery Case Reports 4 (2013) 882– 885. 5 – França LHG, Mottin C. Surgical treatment of Dunbar syndrome. J Vasc Bras. 2013 Mar; 12(1):57-61. 6 6 – Petrella S, Prates JC. Celiac Trunk Compression Syndrome. A Review. Int. J. Morphol., 24(3):429-436, 2006. 7- Boley SJ, Brandt LJ, Sammaritano RJ. History of Mesenteric Ischemia. Surgical Clinical of North America, vol 77, 1997. 8. Herbet GS, Steele SR. Acute and Chronic Mesenteric Ischemia. Surg Clin N Am 87 (2007).