98 Arquivos Catarinenses de Medicina Vol. 38, no. 2, de 2009 1806-4280/09/38 - 02/98 Arquivos Catarinenses de Medicina ARTIGO ORIGINAL Hepatimetria: correlação entre o método clínico e ultra-sonográfico Rosemeri Maurici da Silva1, Marcelo Vasconcelos Siqueira2 Resumo Introdução: O método clínico é amplamente utilizado para avaliação da hepatimetria, utilizando-se a associação das técnicas de percussão e palpação. Alterações encontradas no exame físico determinam investigações posteriores com exames complementares. Objetivo: Avaliar a correlação da hepatimetria obtida pela semiotécnica de percussão e palpação, com a hepatimetria obtida através da ultra-sonografia. Métodos: Foi realizado um estudo transversal, onde a amostra foi formada por quarenta acadêmicos do Curso de Medicina da Unisul – Tubarão - SC. Os participantes foram submetidos ao exame clínico e ultra-sonográfico abdominal. Resultados: Dos 40 participantes, 20 de cada gênero, a idade média foi de 22,98 (± 2,75) anos. A média final da hepatimetria clínica foi de 9,14 (± 1,99) cm. A diferença das medidas entre os examinadores não foi estatisticamente significativa (p=0,28). A média da hepatimetria obtida através do ultra-som foi de 10,33 (± 2,89) cm. Não foram estatisticamente significativas as diferenças da hepatimetria entre os gêneros (p=0,11) e entre os biótipos (p=0,082). Para os indivíduos com peso abaixo de 70Kg o coeficiente de correlação de Pearson foi de 0,75 (IC 95%: 0,23 a 0,78). Para os indivíduos com peso superior a 70 Kg o coeficiente de correlação de Pearson foi de 0,45 (IC 95%: -0,27 a 0,66). Conclusão: A hepatimetria obtida pelo método clínico apresenta boa correlação com o método ultra1 Doutora em Medicina/Pneumologia, Professora do Curso de Medicina da Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul) e da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). 2 Acadêmico do Curso de Medicina da Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul). 98 sonográfico, embora subestime o tamanho real do fígado em adultos jovens. A influência das habilidades do examinador mostram-se nítidas, assim como as características dos pacientes. Descritores: 1. Fígado; 2. Exame Físico; 3. Ultra-sonografia. Abstract Introduction: The clinical method widely is used for evaluation of the liver size. Objectives: To evaluate the correlation of the liver size gotten for the technique semiologic of percussion and palpation, with the liver size obtained by ultrasonography. Methods: A transversal study was carried through between-observator, sample was formed by forty academics of the Course of Medicine of the Unisul – Tubarão - SC. The participants had been submitted to the clinical examination and the abdominal ultrasonography. Results: 20 participants had been of each gender, average age were of 22,98 (± 2,75) years. The final average of the clinical liver size was of 9,14 (± 1,99) cm. The difference of the measures between the examiners was not statistically significant (p=0,28). The average of the liver size obtained by ultrasonography was of 10,33 (± 2,89) cm had not been statistically significant the differences of the liver size between genders (p=0,11) Hepatimetria: correlação entre o método clínico e ultra-sonográfico and the biotypes (p=0,082). For people which weight below of 70Kg we find the following correlation: r = 0,75 (IC 95%: 0,23 0,78). For people which weight above 70 kg we find the following correlation r = 0,45 (IC 95%: -0,27 0,66). Conclusion: The liver size obtained by the clinical method presents good correlation with the ultrasonography method, even so underestimate the real size of the liver in young adults. The influence of the abilities of the examiner reveals clear, as well as the characteristics of the patients. Keywords: 1. Liver; 2. Physical Examination; 3. Ultrasonography. Introdução Considerado a maior glândula do corpo humano1-4, o fígado é uma víscera intra-abdominal que pesa entre 1000g e 3000g, com uma média de 1500g1,3, sendo de maior densidade entre os indivíduos do gênero masculino.3 Localizado em sua maior parte no quadrante superior direito e parte do quadrante superior esquerdo, está encoberto pelo diafragma em quase toda a sua totalidade, e sobreposto pela caixa torácica.1 O tamanho de um fígado normal é proporcional ao tamanho do corpo. Em indivíduos do gênero masculino, mede de 10 a 12 cm, e no gênero feminino, de 8 a 10 cm.4 A percussão deverá iniciar suavemente, sobre a linha hemiclavicular direita, na altura da segunda costela, começando do som claro pulmonar até a busca da macicez hepática, que ocorrerá aproximadamente na altura do 5º espaço intercostal.5 Os últimos pontos de macicez encontrados na percussão sobre esta mesma linha imaginária, determinarão o limite inferior do fígado.5 O trajeto que une dois pontos, onde o primeiro é o início da macicez hepática e o último, sendo o ponto limite da macicez ao nível do rebordo inferior, é o tamanho supostamente real do fígado.5,6 Após a percussão hepática, realiza-se a palpação.5 Durante essa técnica, o objetivo principal do examinador é definir o contorno da borda inferior do fígado, mais precisamente do lobo direito. A borda do lobo esquerdo se ajusta à caixa costal inferior esquerda e Arquivos Catarinenses de Medicina Vol. 38, no. 2, de 2009 99 freqüentemente é impalpável, até mesmo em condições de hepatomegalia volumosa.4 O fígado pode ter seu volume medido através de várias técnicas, como a radiografia, cintilografia, tomografia computadorizada, ressonância magnética e a ultrasonografia.7-9 A ultra-sonografia é o primeiro método de imagem para avaliar qualquer afecção que atinja o fígado, sendo considerado o exame de eleição para imagem abdominal na maioria dos centros de saúde.8 Além disso, a ultra-sonografia possui uma série de vantagens importantes: é um exame de baixo custo, de rápida execução, isento de risco, não invasivo, que não utiliza radiações ionizantes e tampouco sedação, o que facilita ainda mais a realização técnica, principalmente quando se trata de crianças.9 O método clínico é amplamente utilizado para avaliação da hepatimetria, utilizando-se a associação das técnicas de percussão e palpação. A determinação da acurácia desta semiotécnica, bem como a sua variação entre os observadores e intra-observador é altamente desejável, uma vez que as alterações encontradas no exame físico determinam investigações posteriores com exames complementares. Com o objetivo de avaliar a correlação da hepatimetria obtida pela semiotécnica de percussão e palpação, com a hepatimetria obtida através da ultra-sonografia, além de estimar a variação encontrada nas medidas obtidas pelo método clínico entre os observadores, propusemonos a realizar este estudo. Métodos Foi realizado um estudo transversal, entre os meses de agosto e outubro de 2007, na Unidade Hospitalar de Ensino do Curso de Medicina da Unisul – Campus Tubarão – SC. A amostra de estudo foi constituída de quarenta alunos maiores de 18 anos do curso de graduação de Medicina da Unisul (Tubarão – SC), selecionados aleatoriamente, sendo 20 indivíduos do gênero feminino e 20 indivíduos do gênero masculino. Todos os participantes concordaram em participar através da assinatura de termo de consentimento livre e esclarecido. Os critérios de exclusão foram deformidades torácicas, ascite, pneumectomia direita, síndrome de Chilaiditi, além de qualquer outra condição que afetasse a realização do exame físico ou da ultra-sonografia, além daqueles que não concordassem em participar do estudo. 99 Hepatimetria: correlação entre o método clínico e ultra-sonográfico 100 Arquivos Catarinenses de Medicina Vol. 38, no. 2, de 2009 Todos os participantes foram submetidos ao exame clínico e ao exame ultra-sonográfico abdominal. A semiotécnica utilizada para delimitar o tamanho do fígado foi por meio indireto, onde foi percutida a borda superior hepática, em seguida feito a palpação da borda inferior, ambos na linha hemiclavicular direita no sentido crânio-caudal, criando uma linha imaginária entre esses dois pontos limites. A estimativa em centímetros dessa linha traçada entre os pontos, determinou a hepatimetria clínica do fígado. Nos indivíduos em que a palpação da borda hepática inferior não foi possível, foi considerado como o limite inferior o último ponto de percussão maciço.10,11 Neste mesmo momento foi avaliado o ângulo de Charpy com o objetivo de classificar os participantes em brevilíneos, longilíneos ou normolíneos, e os dados antropométricos (altura e peso). Todos os participantes foram avaliados por dois observadores com conhecimento e treinamento no método clínico descrito. Cada observador realizou três medidas em cada participante, sendo a média entre os valores o valor final do tamanho hepático. A média entre os dois valores finais foi usada para a correlação com a hepatimetria obtida pelo método ultra-sonográfico. As medições foram realizadas de forma independente entre os observadores. No segundo momento do estudo, os participantes obtiveram a hepatimetria pelo método ultra-sonográfico, realizada por médico radiologista, sem conhecimento dos resultados da hepatimetria realizada pelo método clínico. Também foi avaliada a presença de ascite e da Síndrome de Chilaiditi. O aparelho de ultra-som utilizado foi o Logic 5, da marca GE, de sonda convexa, com freqüência variada, de 3,5 a 5,5 mHz. A hepatimetria foi feita na linha hemiclavicular direita, iniciando na superfície inferior do diafragma (representado por uma linha ecogênica recobrindo a convexidade hepática), até limite inferior do fígado, durante a inspiração máxima. Foi elaborado um banco de dados no programa EpiData®, e a análise estatística foi realizada com o auxílio do software EpiInfo®. A correlação das medidas hepáticas realizadas pelo método clínico com as medidas realizadas pelo método ultra-sonográfico foram calculadas através do coeficiente de correlação de Pearson. Para a análise das diferenças de variáveis entre os gêneros foram aplicados testes de significância estatística e considerados significativos valores de p menores ou 100 iguais a 0,05. O projeto de pesquisa foi submetido e aprovado pelo Comitê de ética e pesquisa em Seres Humanos da Unisul sob o registro 07.060.4.01.III. Resultados As características dos participantes estão demonstradas na Tabela 1. Não houve exclusões na amostra avaliada. Tabela 1 - Características dos participantes. Para o examinador 1, quatro participantes tiveram hepatimetria determinada pela percussão e palpação, enquanto em 36, só foi possível realizar a hepatimetria pela percussão. Para o examinador 2, sete participantes tiveram hepatimetria determinada pela percussão e palpação, e em 33 só foi possível realizar a hepatimetria pela percussão. A média da hepatimetria verificada na linha hemiclavicular de todos os participantes, obtida pelo examinador 1 foi de 8,86±2,34 cm, enquanto que a obtida pelo examinador 2 foi de 9,41± 2,03 cm. A média final da hepatimetria foi de 9,14±1,99 cm. A diferença das medidas entre os examinadores não foi estatisticamente significativa (p=0,28). A média da hepatimetria obtida através do ultra-som foi de 10,33±2,89 cm, sendo que no gênero masculino e feminino a média foi de (9,60±2,59 cm) e (11,0±3,04 cm) respectivamente. A diferença da hepatimetria entre o gênero feminino e masculino, determinada pelo ultra-som não foi estatisticamente significativa (p=0,11). Pelo ultra-som, a média da hepatimetria nos longilíneos, normolíneos e brevilíneos foi de 11,7±1,7 cm, 10±3,1 cm e 8,3±0,7 cm, respectivamente. A diferença na hepatimetria de acordo com o biotipo não foi Hepatimetria: correlação entre o método clínico e ultra-sonográfico estatisticamente significativa (p=0,082). Para os indivíduos com peso abaixo de 70Kg, o coeficiente de correlação de Pearson foi de 0,75 (IC 95%: 0,23 a 0,78). Para os indivíduos com peso superior a 70 Kg, o coeficiente de correlação de Pearson foi de 0,45 (IC 95%: -0,27 a 0,66). Houve diferença estatisticamente significativa entre a média da hepatimetria clínica final e a média da hepatimetria ultra-sonográfica final (p=0,034), assim como também houve diferença estatisticamente significativa (p=0,016) entre a média final da hepatimetria do observador 1 e a média final da hepatimetria ultrasonográfica, porém entre a média final obtida pelo observador 2 e o ultra-som não houve diferença estatisticamente significativa (p=1,01). O valor do coeficiente de correlação de Pearson entre a média da hepatimetria obtida pelo examinador 1 e o ultra-som foi de 0,53, entre o examinador 2 e o ultrasom foi de 0,64, e entre a média final obtida pela clínica e pela ultra-sonografia foi de 0,65. Discussão Nesse estudo, houve boa correlação entre a hepatimetria obtida pelo método clínico e pelo método ultra-sonográfico (r = 0,65). Na literatura, Hessel 7 também encontrou boa correlação (r = 0,93) entre as medidas hepáticas obtidas pelo método clínico e pelo método ultra-sonográfico, quando estudou 126 crianças saudáveis. Castell e colaboradores11, também obtiveram boa correlação (r = 0,77) em seu estudo com 116 adultos saudáveis, entre a percussão e a hepatimetria obtida por imagem, porém esse estudo não cita qual o exame de imagem padrão que foi utilizado para comparação. Sapira e colaboradores12 encontraram coeficiente de correlação de Pearson de 0,64 em seu estudo com 96 indivíduos saudáveis, quando compararam a medida obtida pela percussão com a medida ultra-sonográfica. Por outro lado, Rajnish e colaboradores13 em uma amostra com 180 pacientes, estudaram a acurácia da palpação e percussão comparadas com a ultra-sonografia e concluíram que o método clínico por si só não é suficientemente capaz de confirmar ou excluir a presença de hepatomegalia. No presente estudo observou-se que a média da hepatimetria obtida pelo método clínico sobre a linha hemiclavicular, subestimou a média obtida pela ultrasonografia, o que também é descrito na literatura por Arquivos Catarinenses de Medicina Vol. 38, no. 2, de 2009 101 Hessel7 e por Sullivan e colaboradores14 em estudo com pacientes adultos. Em outro estudo com 21 crianças não foi encontrado o mesmo resultado, ou seja, a média da hepatimetria clínica através da percussão e ausculta, superestimou a média ultra-sonográfica.15 Quando se comparou a média da hepatimetria anotada pelo examinador 1 com a média ultra-sonográfica, também observou-se que a média da hepatimetria clínica subestimou a ultra-sonográfica como está descrito na literatura.7,11,12 O mesmo não ocorreu com o examinador 2, não havendo diferença significativa entre sua média e a média ultra-sonográfica. Talvez por alguns fatores como habilidade do examinador, intensidade da percussão, fase da respiração, sensibilidade da palpação, delimitação precisa da linha hemiclavicular direita, podem ter influenciado a precisão dos examinadores. Na literatura há poucas evidências que comparem a acurácia na detecção de fígados palpáveis ou não com o grau de concordância intra e entre observadores. Sabese que vários fatores podem interferir na determinação da hepatimetria, como peso, altura, idade, gênero, técnica de percussão, local da percussão, fase da respiração, anormalidades anatômicas, obesidade, ascite volumosa, cirrose, tumores, hepatomegalia, hábitos pessoais e posição do paciente durante o exame.7,9,11,12,16-21 Numa revisão, Meidel e Ene 17 citam que a porcentagem de fígados palpáveis em indivíduos saudáveis é de 28%. Rajnish e colaboradores 13 encontraram boa correlação entre os 3 examinadores (82% a 84%) para determinar fígados palpáveis em 36 pacientes com fígados aumentados pela ultra-sonografia, e concluíram que 20% dos doentes possuem fígados palpáveis. Sullivan e colaboradores14, concluíram que a avaliação clínica do fígado pode ser dificultada devido à forma, posição e eixo hepático. Até o ângulo de percussão dos dedos do examinador pode interferir na hepatimetria22, assim como a força realizada durante a percussão.23 Rosenfield e colaboradores24 estudaram em 100 pacientes adultos a correlação da palpação com a cintilografia, e concluíram que a palpação pode ser alterada com a posição ortostática e supina do indivíduo. Jackson e colaboradores19, também concluíram que a posição do paciente interfere nas medidas do fígado. Naylor e colaboradores concluíram em um estudo entre observadores, que existem limitações clínicas para determinar com precisão a linha hemiclavicular direita.25 Todos esses motivos podem levar os examinadores a não medir exatamente os limites hepáticos dos participantes, o que interfere sobremaneira com os 101 Hepatimetria: correlação entre o método clínico e ultra-sonográfico 102 Arquivos Catarinenses de Medicina Vol. 38, no. 2, de 2009 resultados obtidos. Nesse estudo, a média final da hepatimetria clínica foi de 9,14±1,99 cm sobre a linha hemiclavicular direita. Castell e colaboradores11 encontraram em adultos um valor bastante próximo, uma média de 9,75±2 cm quando apenas utilizou a percussão leve. Hessel encontrou uma média de 9,10±1,81 cm em crianças com idades entre 2 e 13 anos.7 A média da hepatimetria do examinador 1 foi de 8,86±2,34 cm enquanto que a obtida pelo examinador 2 foi de 9,41± 2,03 cm e não houve diferença significativa entre suas médias (p=0,28). Hessel7 encontrou em crianças, excelentes coeficientes de correlação entre as médias de 2 observadores distintos durante a hepatimetria. A média final da hepatimetria ultra-sonográfica foi de 10,33±3,04 cm. Niederau e colaboradores26 em um estudo com 915 participantes saudáveis, também encontraram valores próximos, a média foi de 10,5±1,5 sobre a linha hemiclavicular direita. Kratzer e colaboradores 16 numa amostra aleatória de 2080 participantes adultos incluindo saudáveis e doentes, encontraram uma média ultra-sonográfica de 14,0±1,7 cm sobre a linha hemiclavicular direita. Hessel7 encontrou nas crianças, uma média ultra-sonográfica de 10,31±1,82 cm sobre a linha hemiclavicular direita. Pela ultra-sonografia, a média da hepatimetria para o gênero masculino e feminino, foi de 9,60±2,59 cm e 11,0±3,04 cm respectivamente, porém este estudo não encontrou diferenças significativas entre os gêneros pela medida ultra-sonográfica (p=0,11). O mesmo não relata a literatura. Niederau26 e colaboradores, em um estudo com 915 adultos saudáveis encontraram diferença significativa entre gêneros, porém não especificam os valores dessas medidas. Castell11, no estudo com 116 adultos, conclui que o gênero é fator determinante para o tamanho do fígado, que homens possuem medidas hepáticas maiores do que as mulheres e propuseram inclusive, uma fórmula de correção da hepatimetria clínica pela percussão para cada gênero. Kratzer e colaboradores16 numa amostra de 2080 adultos encontraram diferença significativa para hepatimetria ultra-sonográfica entre os diferentes gêneros, sendo a média em homens de 14,5±1,6 cm, e em mulheres foi de 13,5±1,7 cm. Por outro lado, Konus e colaboradores27 em um estudo com 307 crianças com idades entre 5 dias e 16 anos, não encontraram diferença significativa nas dimensões nos lobos do fígado. 102 Pela ultra-sonografia, a média da hepatimetria nos longilíneos, normolíneos e brevilíneos foi de 11,7±1,7 cm, 10±3,1 cm e 8,3±0,7 cm, respectivamente. A diferença na hepatimetria de acordo com o biotipo não foi estatisticamente significativa (p=0,082), talvez devido ao pequeno número de brevilíneos participantes. Outros estudos com amostras maiores deverão ser realizados para confirmar ou refutar estes resultados. Quando foram selecionados os indivíduos com peso acima e abaixo de 70 Kg, foi obtida uma boa correlação entre peso e tamanho do fígado. Para os indivíduos com peso abaixo de 70 Kg o coeficiente de correlação de Pearson foi de 0,75 (IC 95%: 0,23 a 0,78). Para os indivíduos com peso superior a 70 Kg o coeficiente de correlação de Pearson foi de 0,45 (IC 95%: -0,27 a 0,66). Com isso, observa-se que o peso é uma variável que influencia diretamente na acurácia da hepatimetria, de tal forma que a hepatimetria clínica em indivíduos com peso inferior a 70 Kg, pode ser mais confiável. Na literatura, não há estudos que comparem hepatimetria com o biotipo do participante determinado pelo ângulo de Charpy, porém, há relatos de que o peso influencia no tamanho hepático. Kratzer e colaboradores16 também encontraram correlação entre o índice de massa corporal e a hepatimetria, e verificaram que quanto maior é o índice de massa corporal do sujeito, maior será a hepatimetria. Niederau e colaboradores26 também observaram que o peso influencia no tamanho do fígado, além do índice de massa corpórea. Konus e colaboradores27 encontraram coeficiente de correlação de 0,80 entre peso da criança e a dimensão do fígado. Encontraram que a altura é o melhor parâmetro de correlação com tamanho longitudinal do fígado na linha hemiclavicular em crianças (r = 0,85), e concluíram que quanto maior a altura da criança, maior é a dimensão longitudinal do fígado. Wolf28 também cita que a altura do sujeito interfere nas dimensões do fígado, além da idade e do gênero. Altunkaynak e colaboradores 20 concluíram recentemente, que o excesso de peso é um fator determinante para hepatomegalia, principalmente no gênero feminino. No presente estudo foi observada diferença estatisticamente significativa entre a média da hepatimetria clínica final e a média da hepatimetria ultra-sonográfica final (p=0,034), e também entre a média do examinador 1 e a média ultra-sonográfica. Hessel7 também encontrou diferença significativa em crianças, assim como Sapira e colaboradores 12 e Hepatimetria: correlação entre o método clínico e ultra-sonográfico Skrainka e colaboradores29 também encontraram em adultos. Quando comparamos a média do examinador 2 com a média ultra-sonográfica, não houve diferença significativa entre os resultados. Na literatura há controvérsias nos estudos com mais de um examinador realizando hepatimetria. No estudo de Hessel7, o mesmo não aconteceu. Para os dois examinadores participantes do estudo houve diferença significativa entre suas médias e a média ultra-sonográfica. Por outro lado, Skrainka e colaboradores29 compararam a hepatimetria clínica com a ultra-sonografia, num estudo com 3 grupos distintos de examinadores, sendo eles, médicos, professores e estudantes. Nos grupos dos médicos e estudantes, não houve diferença significativa entre os resultados das médias da hepatimetria, porém entre o resultado dos professores com a ultra-sonografia houve diferença significativa. Barloon e colaboradores30 , realizaram um estudo sobre hepatimetria com dois grupos distintos de estudantes de medicina. No grupo 1, os alunos possuíam o auxílio da ultra-sonografia em tempo real para delimitar os limites do fígado, guiando a palpação e a percussão, já no grupo 2, os alunos não possuíam auxílio da ultra-sonografia. Para os dois grupos houve diferença significativas na média de suas medidas, porém, no grupo que utilizou o ultra-som em tempo real houve melhor acurácia nas medidas. Os resultados deste estudo mostram que a hepatimetria obtida pelo método clínico apresenta boa correlação com o método ultra-sonográfico, embora subestime o tamanho real do fígado em adultos jovens, o que pode ser demonstrado pela diferença estatisticamente significativa entre a média final da observação clinica e a média final obtida pelo ultrasom. A influência das habilidades do examinador mostram-se nítidas, assim como as características dos pacientes, como ficou demonstrado pelas diferenças anotadas em indivíduos acima e abaixo de 70 Kg. Estudos com amostras maiores se fazem necessários para determinar o grau de precisão desta semiotécnica em diferentes grupos populacionais. Conclusão A hepatimetria obtida pelo método clínico apresenta boa correlação com o método ultra-sonográfico, embora subestime o tamanho real do fígado em adultos jovens. A influência das habilidades do examinador mostram-se nítidas, assim como as características dos pacientes. Arquivos Catarinenses de Medicina Vol. 38, no. 2, de 2009 103 Referências Bibliográficas: 1. Moore KL, Dalley AF. Anatomia orientada para a clínica. 4. ed. Rio de Janeiro (RJ): Guanabara Koogan; 2001. 2. Dângelo JG, Fattini CA. Anatomia humana sistêmica e segmentar para o estudante de medicina. 2 ed. São Paulo (SP): Atheneu; 1998. 3. Guyton AC, Hall JE. Tratado de Fisiologia Médica. 10 ed. Rio de Janeiro (RJ): Guanabara Koggan; 2002. 4. Epstein O, Perkini GD, Bono DP de, Cookson J. Exame clínico. 2 ed. Porto Alegre (RS): Artmed; 1998. 5. Porto CC. Exame clínico: bases para a prática médica. 6 ed. Rio de Janeiro (RJ): Guanabara Koogan; 2005. 6. Bickley LS. Bates: propedêutica médica. 8 ed. Rio de Janeiro (RJ): Guanabara Koogan; 2005. 7. Hessel G. Hepatometria na infância: comparação entre o método clínico e ultrasonográfico. [Dissertação] Campinas (SP): Unicamp; 1991. 8. Vezozzo DCP, Rocha DC, Cerri GG. Ultra-sonografia abdominal. 1 ed. São Paulo (SP): Sarvier; 1993. 9. Rocha SMS, Oliveira IRS, Widman A, Chisman BSK, Fukushima JT, Oliveira LAN, et al. Hepatometria ultra-sonográfica em crianças: proposta de novo método. Radiol Bras 2003;36:63-70. 10. Swartz MH. Tratado de semiologia médica: história e exame clínico. 5 ed. Rio de Janeiro (RJ): Elsevier; 2006. 11. Castell DO, O’Brien KD, Muench H, Chalmers TC. Eastimation of liver size by percussion in normal individuals. Ann Intern Med 1969;70:1183-9. 12. Sapira JD, Williamson DL. How big is the normal liver? Arch Intern Med 1979;139:971-3. 13. Rajnish J, Amandeep S, Namita J, Madhular P, Kalantri SP. Accuracy and reliability of palpation and percussion for detecting hepatomegaly: a rural hospital-based study. Indian J Gastroenterol 2004;23:171-4. 14. Sullivan S, Krasner N, Williams R. The clinical estimation of liver size: a comparison of techniques and an analysis of the source of error. Br Med J 1976;30:1042-3. 15. Callahan CW Jr, Alpert B. Simultaneous percussion auscultation technique for the determination of liver span. Arch Pediatr Adolesc Med 1994;148:873-5. 16. Kratzer W, Fritz V, Mason RA, Haenle MM, Kaechele V. Factors affecting liver size: a sonographic survey of 2080 subjects. J Ultrasound Med 2003; 22:115561. 103 104 Arquivos Catarinenses de Medicina Vol. 38, no. 2, de 2009 Hepatimetria: correlação entre o método clínico e ultra-sonográfico 17. Meidl EJ, Ende J. Evaluation of liver size by physical examination. J Gen Intern Med 1993;11:635-7. 18. Gilbert VE. Detection of the liver below the costal margin: comparative value of palpation, light percussion, and auscultatory percussion. South Med J. 1994;87:182-6. 19. Jackson ML, Zuckier L, Goldfarb CR, Ongseng F. Effect of patient positioning on liver size estimation. J Nucl Med 1986; 27:1632-4. 20. Altunkaynak BZ, Altunkaynak ME. Relationship of body weight and volume of liver: a morphometrical and stereological study. Saudi Med J. 2007; 6: 8915. 21. Chan SC, Liu CL, Lo CM, Lam BK, Lee EW, Wong Y, Fan ST. Estimating liver weight of adults by body weight and gender. World J Gastroenterol 2006; 12:2217-22. 22. Kingra GS. Percussion of the liver. NEJM 1970; 283(2):101. 23. Al-Awqati Q. Percussion of the liver. Ann Intern Med 1969;71(4):868. 24. Rosenfield AT, Laufer I, Schneider PB. The significance of a palpable liver. A correlation of clinical and radioisotope studies. Am J Roentgenol Radium Ther Nucl Med 1974;122:313-7. 25. Naylor CD, McCormack DG, Sullivan SN. The midclavicular line: a wandering landmark. CMAJ 1987;136:48-50. 26. Niederau C, Sonnenberg A, Müller JE, Erckenbrecht JF, Scholten T, Fritsch WP. Sonographic measurements of the normal liver, spleen, pancreas, and portal vein. Radiology 1983;149:537-40. 27. Konus Ö, Özdemir A, Akkaya A, Erbas G, Celik H, Isik S. Normal liver, spleen, and kidney dimensions in neonates, infants, and children: evaluation with sonography. A J R 1998;171:1693-98. 28. Wolf DC. Evaluation of the size,shape,and consistency of the liver. In Walker HK, Hall HD, Hurst JW. Clinical methods: the history, physical, and laboratory examinations. Disponível em: URL: http:// www.ncbi.nlm.nih.gov/books/ bv.fcgi?rid=cm.chapter.3049 29. Skrainka B, Stahlhut J, Fulbeck CL, Knight F, Holmes RA, Butt JH. Measuring liver span. Bedside examination versus ultrasound and scintiscan. J Clin Gastroenterol 1986;8:267-70. 30. Barloon TM, Brown BP,Abu-Yousef MM, Ferguson KJ, Schweiger GD, Erkonen WE et al. Teaching physical examination of the adult liver with use of real-time sonography. Acad Radiol 1998;5:101-3. 104 Endereço para correspondência: Universidade do Sul de Santa Catarina Avenida José Acácio Moreira, s/n Tubarão - Santa Catarina CEP: 88704900