BIOCONTROLE DE MURCHA BACTERIANA EM TOMATEIRO POR MEIO DA INCORPORAÇÃO DE RESÍDUOS ORGÂNICOS AO SOLO ALEXSANDRA SOUSA NASCIMENTO SÃO LUÍS Maranhão – Brasil Abril - 2005 Livros Grátis http://www.livrosgratis.com.br Milhares de livros grátis para download. ii BIOCONTROLE DE MURCHA BACTERIANA EM TOMATEIRO POR MEIO DA INCORPORAÇÃO DE RESÍDUOS ORGÂNICOS AO SOLO ALEXSANDRA SOUSA NASCIMENTO Engenheira Agrônoma Orientador: Prof. Dr. JOSÉ MAGNO MARTINS BRINGEL Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Agroecologia da UEMA como requisito para obtenção do Título de Mestre em Agroecologia, área de concentração: Sistemas de Produção Agroecológicos. SÃO LUÍS Maranhão – Brasil Abril - 2005 iii BIOCONTROLE DE MURCHA BACTERIANA EM TOMATEIRO POR MEIO DA INCORPORAÇÃO DE RESÍDUOS ORGÂNICOS AO SOLO ALEXSANDRA SOUSA NASCIMENTO Aprovada em: Comissão Julgadora: ________________________________ Prof. Dr. José Magno Martins Bringel Orientador __________________________________ Prof. Dr. Cândido Athayde Sobrinho ______________________________________ Profª. Drª. Adriana Zanin Kronka iv “Dia a dia sentei com os cidadãos da nova Ciência que me foi apresentada. Línguas, idiomas, teorias diferentes de vários lugares do mundo, estavam ali comigo. Essa era uma ciência diferente: muitas teorias, mas um só propósito, só um latejar, só uma energia, a de completar a tarefa que me foi designada e envolver-me no imenso campo energético da paz e do conhecimento ” (Dr. Egidio Vechio – Ph.D) v Dedico este trabalho a meus queridos pais, a minhas irmãs e ao André Silva, pessoas muito especiais em minha vida. vi AGRADECIMENTOS - A Deus, pela perseverança e ânimo na retomada; - Ao Prof. DS.c. José Magno Martins Bringel, pela orientação, amizade, incentivo e solidariedade nos momentos difíceis, meus mais sinceros agradecimentos; - Ao Núcleo de Biotecnologia Agronômica – CCA / UEMA pelo material de apoio utilizado na execução dos experimentos; - À CAPES e à UEMA pela concessão de bolsa de estudos e oportunidade de progredir na carreira acadêmica; - Ao Dr. Júlio Rodrigues Neto – Instituto Biológico / Laboratório de Bacteriologia Vegetal, Campinas – SP, pelo envio dos isolados do patógeno utilizados neste experimento; - Aos Professores: Alessandro Costa da Silva, Gilson Soares da Silva, Flávio Henrique R. Moraes e Antonia Alice Rodrigues, pelo incentivo à pesquisa e valiosa transmissão de conhecimentos; - Aos professores Adriana Zanin Kronka e Sérgio do Nascimento Kronka, pela revisão do trabalho e importante colaboração nas análises estatísticas; vii - A todos os professores deste Mestrado, a quem devo todo o enriquecimento intelectual; - Aos meus pais e irmãs, que, com amor e amizade, me ajudaram sempre a manter os estudos com muita garra, lutando ao meu lado, inclusive nos momentos de dificuldades; - A André Santos da Silva, por todos os momentos de confidências, alegrias, sonhos e lutas, e, especialmente, pela valiosa colaboração durante todo o experimento; - Ao Secretário do Mestrado em Agroecologia, Valter Junior Campos Serra, pela atenção e apoio dedicado; - Aos funcionários do Laboratório de Solos – UEMA, José Raimundo Everton Araújo e João Reis, pela realização das análises químicas dos resíduos; - À Profª. Edysâmia da Silva Lopes, pela amizade e revisão de língua estrangeira; - Aos amigos: Gabriel Fernandes Silva, Eládio Cirqueira Loiola, Valdenia Cristina Mendonça, Nádson de Carvalho Pontes e Myrna Hylal Moraes, que estiveram sempre ao meu lado, nos bons e nos maus momentos, me incentivando e consolando; - Aos colegas de turma do Mestrado, pela convivência, amizade e troca de experiências. viii SUMÁRIO LISTA DE FIGURAS............................................................ xi LISTA DE TABELAS............................................................ xiii RESUMO............................................................................ xv ABSTRACT......................................................................... xviii 1 INTRODUÇÃO................................................................. 21 1.1 Objetivos...................................................................... 24 1.1.1 Objetivo geral............................................................ 24 1.1.2 Objetivos específicos.................................................. 24 2 REVISÃO DE LITERATURA.............................................. 25 2.1 A murcha bacteriana.................................................... 25 2.1.1 Descrição da doença.................................................. 25 2.1.2 Características do patógeno....................................... 29 2.2 Controle da murcha bacteriana.................................... 32 2.2.1 Incorporação de resíduos orgânicos ao solo............... 35 2.2.2 Efeito de antagonistas sobre fitopatógenos................. 45 2.2.3 Manipulação dos fatores físicos do solo...................... 47 3 MATERIAL E MÉTODOS.................................................. 49 ix 3.1 Análise das características químicas dos resíduos orgânicos............................................................................ 50 3.1.1 Coleta e amostragem dos resíduos............................. 50 3.1.2 Análise química do resíduo orgânico.......................... 50 3.2 Avaliação do material orgânico sobre Ralstonia solanacearum..................................................................... 52 3.2.1 Análise microbiológica do resíduo orgânico................ 52 3.2.2 Obtenção de isolados de Ralstonia solanacearum biovar 1 e 3........................................................................ 3.2.3 Avaliação da agressividade de isolados de 53 R. solanacearum biovar 1 e 3 em tomateiro............................. 55 3.2.4 Avaliação das dosagens dos resíduos orgânicos usados no biocontrole de R. solanacearum.......................... 59 3.2.4.1 Inoculação da bactéria............................................ 59 3.2.4.2 Avaliações do experimento...................................... 60 3.2.5 Avaliação do período de incorporação dos resíduos orgânicos ao solo................................................................ 63 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO.......................................... 64 4.1 Análise das características químicas dos resíduos orgânicos............................................................................ 64 4.2 Avaliação do material orgânico sobre R. solanacearum. 68 4.2.1 Análise microbiológica dos resíduos orgânicos........... 68 x 4.3 Avaliação da agressividade dos isolados de R. solanacearum biovar 1 e 3 em tomateiros........................... 74 4.4 Avaliação das dosagens e períodos de incorporação...... 77 4.4.1 Avaliação das dosagens dos resíduos orgânicos usados no biocontrole de Ralstonia solanacearum, com ferimento de raízes............................................................. 77 4.4.2 Avaliação das dosagens dos resíduos orgânicos usados no biocontrole de Ralstonia solanacearum, com infestação do solo............................................................... 85 4.4.3 Avaliação do período de incorporação dos resíduos.... 90 4.4.3.1 Método da inoculação pelo ferimento de raiz........... 90 4.4.3.2 Inoculação pela infestação do solo.......................... 98 5 CONCLUSÕES................................................................ 107 REFERÊNCIAS................................................................... 109 xi LISTA DE FIGURAS 1. Esquema do método de inoculação de Ralstonia solanacearum através do ferimento da haste (Morgado et al., 1994)...................................................................................... 2. Esquema do método de inoculação de 58 Ralstonia solanacearum pelo ferimento de raiz (LOPES, 1981)................ 62 3. Colônias de bactérias formadas nos extratos aquosos de resíduos orgânicos vegetais: raspa de mandioca, nim e citronela................................................................................. 70 4. Freqüências (%) de espécies de fungos identificados nos resíduos de mandioca, nim e citronela.................................... 73 5. Tomateiros inoculados com diferentes isolados de Ralstonia solanacearum, biovares 1 e 3 para avaliação de agressividade.......................................................................... 76 6. Média das notas atribuídas as plantas com sintomas de murcha bacteriana utilizando três resíduos vegetais................................................................................... 84 xii 7. Médias das notas atribuídas em diferentes dias após incorporação de raspa de mandioca ao solo............................ 93 8. Médias das notas atribuídas em diferentes dias após incorporação de nim ao solo................................................... 95 9. Médias das notas atribuídas em diferentes dias após incorporação de citronela ao solo............................................ 97 10. Curva de controle das notas atribuídas às plantas tratadas com raspa de mandioca em diferentes períodos de incorporação.......................................................................... 99 11. Curva de controle das notas atribuídas às plantas tratadas com folhas de nim em diferentes períodos de incorporação........................................................................... 100 12. Tomateiros tratados com resíduos das folhas de nim em diferentes dosagens................................................................ 102 13. Curva de controle das notas atribuídas às plantas tratadas com citronela em diferentes períodos de incorporação........................................................................... 103 14. Tomateiros inoculados plantados em substrato contendo resíduo de citronela, com 0 dia de incorporação...................... 106 15. Tomateiros inoculados plantados em substrato contendo resíduo de citronela, com 60 dias de incorporação.................. 106 xiii LISTA DE TABELAS 1. Descrição dos isolados de Ralstonia solanacearum (Smith) Yabuuchi biovar 1 e 3, utilizados no trabalho........... 2. Características químicas dos resíduos 54 orgânicos vegetais (Manihot esculenta, Azadirachta indica, Cymbopogon nardus)............................................................ 3. População microbiana presente 64 nos resíduos orgânicos de mandioca, nim e citronela................................ 4. Número total e freqüências relativas de colônias fúngicas obtidas nos resíduos de mandioca, nim e citronela,............................................................................... 5. 72 Agressividade dos isolados de R. solanacearum biovar 1 e 3 de tomateiros................................................................ 6. 68 Médias das notas atribuídas às plantas 75 na incorporação de raspa de mandioca ao solo, com ferimento de raiz.................................................................................. 78 xiv 7. Média das notas atribuídas às plantas tratadas com incorporação de nim ao solo, inoculadas com ferimento de raiz....................................................................................... 8. 81 Média das notas atribuídas às plantas tratadas com incorporação de citronela ao solo, inoculadas com ferimento de raiz................................................................................... 9. Média das notas atribuídas às plantas 83 na incorporação de raspa de mandioca ao solo, com infestação do solo.................................................................................. 10. 86 Média das notas atribuídas às plantas tratadas com incorporação de nim ao solo, inoculadas com infestação do solo....................................................................................... 11. 88 Média das notas atribuídas às plantas tratadas com incorporação de nim ao solo, inoculadas com infestação do solo....................................................................................... 89 12. Correlação entre inoculação de bactéria pelo ferimento de raiz e pela infestação do solo............................................ 104 xv BIOCONTROLE DE MURCHA BACTERIANA EM TOMATEIRO POR MEIO DA INCORPORAÇÃO DE RESÍDUOS ORGÂNICOS AO SOLO Autora: ALEXSANDRA SOUSA NASCIMENTO Orientador: Prof. Dr. JOSÉ MAGNO MARTINS BRINGEL RESUMO A murcha bacteriana, causada por Ralstonia solanacearum (Smith) Yabuuchi, é uma doença de grande importância para o cultivo do tomate no Maranhão, uma vez que os métodos atuais empregados para o seu controle não têm demonstrado efeito xvi significativo na redução dos danos e das perdas econômicas. O presente trabalho teve como objetivo avaliar a ação dos resíduos orgânicos vegetais: mandioca (Manihot esculenta Crantz), nim indiano (Azadirachta indica Juss.) e citronela (Cymbopogon nardus L) no biocontrole da murcha bacteriana em tomateiros. Os resíduos foram incorporados ao solo nas dosagens: 20, 40, 60, 80 e 100 g.L-1, em cinco épocas diferentes: 0, 15, 30, 45 e 60 dias antes da inoculação. Os ensaios foram realizados em casa de vegetação do Núcleo de Biotecnologia Agronômica da Universidade Estadual do Maranhão – UEMA. O preparo do substrato usado envolveu a mistura de solo autoclavado com os resíduos secos, triturados e moídos, em suas respectivas dosagens pré-selecionadas. Este foi colocado em vasos com capacidade para 1 L e mantido em casa de vegetação pelos períodos de incorporação pré-definidos. Plântulas de tomate suscetíveis (cv. Santa Cruz) foram preparadas em bandejas e, na data prevista para inoculação, foram transplantadas para os vasos contendo o substrato. Para a inoculação nos tomateiros utilizou-se o isolado 206, biovar 1, coletado em Goiânia (GO). A inoculação consistiu no ferimento das raízes, através de corte do sistema radicular com tesoura e imersão deste em suspensão bacteriana (108 ufc/mL). As avaliações foram feitas do quinto ao décimo dia após a inoculação, considerando-se o número de plântulas sadias, murchas ou mortas. O delineamento experimental xvii utilizado foi o de blocos casualizados com seis repetições, sendo a parcela experimental constituída de seis vasos, com uma planta por vaso. Os resultados demonstraram a eficiência da incorporação dos resíduos ao solo sobre o desenvolvimento da doença. A raspa de mandioca foi mais eficiente aos 30 dias, na dosagem de 20 g/L-1. O nim indiano apresentou melhores resultados aos 30, 45 e 60 dias de incorporação nas dosagens de 80 e 100 g/L-1, enquanto que a citronela foi eficiente em todas as dosagens e em todas as épocas de incorporação. xviii BIOCONTROL OF BACTERIAL WILT IN TOMATOES PLANT WITH INCORPORATION OF ORGANICS RESIDUES IN THE SOIL Author: ALEXSANDRA SOUSA NASCIMENTO Adviser: Prof. Dr. JOSÉ MAGNO MARTINS BRINGEL ABSTRACT The bacterial wilt, caused by Ralstonia solanacearum (Smith) Yabuuchi, is an important disease of tomatoes plant in Maranhão, its control has not been efficient to reduce of the damages and the economic losses caused by attack of its causal agent. The objective of the present research was to evaluate the action of the organics residues: cassava (Manihot esculenta Crantz), Indian neen (Azadirachta indica Juss.) and citronela (Cymbopogon nardus L) on the biocontrol of the bacterial wilt of tomatoes plants. The organics residues were incorporated in the soil using following dosages: 0, xix 20, 40, 60, 80 and 100 g/L-1, at five differents periods: 0, 15, 30, 45 and 60 days. The experiments were conducted in greenhouses of Agronomical Center Biotechnology of the Universidade Estadual do Maranhão - UEMA. Eight isolates of R. solanacearum, biovars 1 and 3, from different geographics regions of the country were tested. The evaluation of the aggressiveness of the isolates allowed the election of the isolate 206, biovar 1, collected in Goiânia (GO). The prepare of the substratum that was used involved the mixture of soil steril with dry, triturated and milled out residues, in its respective preselected dosages. This one was placed in plots with capacity for 1 L and kept grennhouse in the periods of incorporation preselected. Seedlings were prepared in trays and transplanted for the plots contend the substratum. The inoculations methods consisted of the cut of the roots system with scissor followed by immersion of the roots in bacterial suspension (108 ufc/mL). The evaluations were made from the fifth to the tenth day after the inoculation, considering the number of healthy, wilt or died seedlings. The experimental design was a blocks randomized, with six replications, being the experimental parcel consisted by six plots, with one plant for each plot. Results showed the efficiency of the incorporation of the residues in the soil, on the disease development. The cassava scrap was more efficient on 30 days at the 20 g/L-1 dosage of. Indian neem presented better results on 30, 45 and 60 days of incorporation the xx dosages 100 and 80 g/L-1, while citronela was efficient in all dosages and periods of incorporation. xxi 1 INTRODUÇÃO A murcha bacteriana é uma das principais doenças que atacam as solanáceas em todo o mundo e quase todas as medidas para o seu controle são de caráter preventivo. A doença ocorre em todo o Brasil, durante o ano inteiro, e apresenta maior gravidade nas regiões quentes e úmidas, onde as condições ambientais favorecem o estabelecimento e disseminação do seu agente causal. Nestas condições, tem-se morfológicas e como resultado, uma série fisiológicas nos hospedeiros, que de alterações acabam por inviabilizar o cultivo e a produção. Até o presente momento, o controle da doença tem sido realizado através de medidas preventivas que objetivam evitar que a doença apareça ou se espalhe nos campos de produção. Ou por meio da aplicação de produtos químicos, medida esta, que tem surtido pouco efeito. Tais medidas têm sido pouco eficientes porque, dentre outros complicadores, há a persistência do patógeno no solo durante muitos anos, prejudicando sua erradicação. A ineficiência do controle da murcha bacteriana, associada à fácil adaptação do seu agente causal, inviabilizam o cultivo econômico do tomate (Lycopersicon esculentum Mill) no Maranhão, exigindo a sua importação de outros Estados (BRINGEL & SILVA, xxii 2001). Isto causa prejuízos, tanto para o produtor quanto para o consumidor, com reflexo negativo na cadeia produtiva. Como uma alternativa à redução dos prejuízos decorrentes desta doença, mencionam-se os benefícios advindos da agricultura orgânica, cuja principal contribuição não é a exploração econômica, imediatista e inconseqüente, mas sim o uso sustentável da terra e com retornos em longo prazo (ZAMBERLAN & FRONCHETI, 2002). Outro fator importante está relacionado aos danos ambientais devido ao uso indiscriminado de agroquímicos. Embora, seja crescente a discussão em torno de temas como: i) alto custo dos produtos fitossanitários, ii) resistência dos patógenos e iii) impacto ambiental negativo resultante do uso indiscriminado de produtos químicos, o que ainda muito se observa, é a preferência pelo uso destes produtos para o controle de doenças de plantas. De acordo com Campanhola & Bettiol (2003), o tomate esteve entre as culturas que mais utilizaram agrotóxicos (t/ha) no ano de 2000, cerca de 1.473 toneladas, das quais 1.125 t foram para controle de patógenos. Na expectativa de se resolver todos, ou parte, dos problemas associados ao controle de doenças de plantas, bem como, visando a redução dos riscos de contaminação ambiental, pesquisas vêm sendo desenvolvidas, na área da Fitopatologia, utilizando medidas alternativas para o controle. Entre os métodos alternativos, destaca- xxiii se a potencialidade do uso de resíduos vegetais incorporados ao solo. Estes apresentam uma complexa e elevada comunidade microbiana, além de metabólitos liberados por microrganismos, que auxiliam na redução da atividade patogênica. Convém lembrar, que resultados bastante satisfatórios foram obtidos em muitos experimentos que testaram a matéria orgânica do solo como condicionador físico, químico e biológico, visando a melhoria de suas qualidade. Baseando-se nas informações anteriormente mencionadas, desenvolveu-se a presente pesquisa, com fundamento agroecológico na utilização de resíduos orgânicos vegetais como medida alternativa para o controle ou redução da murcha bacteriana em tomateiros. Prática potencialmente eficaz, relativamente simples e de baixo custo, portanto, condizente com os princípios agronômicos e ecológicos que regem o desenvolvimento sustentável. 1.1 Objetivos 1.1.1 Geral xxiv Avaliar a eficiência da incorporação dos resíduos orgânicos vegetais: raspa de mandioca (Manihot esculenta Crantz.), nim indiano (Azadirachta indica Juss.) e citronela (Cymbopogon nardus (L.) Rendle), ao solo, em sua forma in natura, no biocontrole de Ralstonia solanacearum (Smith) Yabuuchi, agente causador da murcha bacteriana do tomateiro. 1.1.2 Específicos Detectar se há relação entre a incorporação dos resíduos orgânicos e a manifestação de sintomas da murcha bacteriana em tomateiros; Determinar quais dosagens, ou concentrações, dos resíduos apresentam melhores resultados quanto à redução dos sintomas observados nas plantas; Determinar quais períodos de incorporação dos resíduos ao solo apresentam melhores resultados quanto à redução dos sintomas observados nas plantas. xxv 2 REVISÃO DE LITERATURA 2.1 A murcha bacteriana Murcha bacteriana é a doença causada pela bactéria Ralstonia solanacearum (Smith) Yabuuchi (YABUUCHI et al., 1995), que ataca inúmeras hospedeiras, causando perdas relevantes quando ocorrem, simultaneamente, alta temperatura e alta umidade do solo (LOPES & QUEZADO-SOARES, 1997). Dentre as espécies mais susceptíveis destacam-se o tomateiro (Lycopersicon esculentum Mill.), a batateira (Solanum tuberosum L.) e a bananeira (Musa paradisiaca L.) (BEDENDO, 1995). 2.1.1 Descrição da doença A doença foi observada pela primeira vez, em 1896, nos Estados Unidos em plantas de batata (Solanum tuberosum L.), tomate (Lycopersicon esculentum Mill.) e berinjela (Equisetum arvense L.) (HAYWARD, 1994). No Brasil, a doença encontra-se distribuída em todas regiões, constituindo um fator limitante para o cultivo de tomateiros (PEIXOTO et al., 1995). Estas regiões, onde a bactéria encontra condições favoráveis à sua sobrevivência, são caracterizadas como xxvi áreas de baixa latitude, com temperatura em torno de 26 º C e 32 ºC, e solos úmidos com caráter ácido que facilitam o desenvolvimento de injúrias à raiz das plantas. Kelman et al. (1997) destacam que as altas temperaturas são requisitos principais para o desenvolvimento da doença sob condições de campo. No caso específico do cultivo de tomates, em temperaturas do solo abaixo de 21 ºC, a infecção poderá ocorrer, mas não se manifestarão os sintomas. A murcha pode ser verificada, ainda, em áreas de cerrado recém-desbravadas, pois o patógeno faz parte da microflora destas regiões (KUROZAWA & PAVAN, 1997; BRINGEL et al., 2001). Como grande parte das doenças causadas por patógenos veiculados pelo solo, também a murcha bacteriana é de difícil diagnóstico, que neste caso particular, torna-se ainda mais prejudicado devido à complexa etiologia do seu agente causador, que apresenta um número considerável de raças, bem pouco conhecidas até o momento (CAFÉ FILHO & LOBO JÚNIOR, 2000). French (1994) aponta o solo como a fonte primária de inóculo da bactéria. Além disso, a doença é disseminada facilmente por variadas vias, tais como: água de irrigação em sulcos, máquinas e instrumentos agrícolas, tratos culturais, insetos vetores, mudas contaminadas e o próprio solo (LOPES & SANTOS, 1994). Uma vez presente no solo, a bactéria pode penetrar no hospedeiro por qualquer ferimento ou abertura natural, mas esta é xxvii mais importante quando ocorre através das raízes, seguindo-se a colonização dos vasos lenhosos e, conseqüente obstrução em grande extensão, o que dificulta o fluxo de água e a nutrição da planta (KUROZAWA & PAVAN, 1997). Solos que apresentam alta resistência mecânica, nos quais o enraizamento torna-se comprometido, poderão ser mais favoráveis ao aparecimento natural destas injúrias. Café Filho & Lobo Júnior (2000) fazem referências aos benefícios encontrados pelo produtor que trabalha em solos com estrutura, profundidades e textura adequadas, que, quanto mais forem melhoradas, mais permitirão o crescimento profundo das raízes. Este aprofundamento radicular poderá não somente evitar a carência de água e nutrientes, haja visto que poderão explorar maior número de ambientes no solo, mas também diminuirá o risco de contaminação pelos patógenos. Impossibilitada de se nutrir, a planta murcha totalmente em pouco tempo, ainda verde, como se tivesse sido cortada. Este é o sintoma mais característico desta e de grande parte das doenças vasculares de plantas (BEDENDO, 1995). Quando atacada pela bactéria, a planta começa a murchar a partir dos folíolos na parte superior da planta, e progride para a flacidez do caule e do restante do vegetal. Durante a noite ou nas horas mais frias do dia, os folíolos podem recuperar a turgescência. No entanto, sob condições favoráveis ao patógeno, pode apresentar como sintoma característico xxviii do avanço da doença, a seca das folhas, caule e ramos, até a morte (LOPES & SANTOS, 1994; KUROZAWA & PAVAN, 1997). Segundo Lopes & Santos (1994), plantas cultivadas em ambientes que não oferecem condições ao crescimento e reprodução do patógeno poderão não exibir os sintomas característicos da doença, no entanto, apresentarão um crescimento retardado e raízes aéreas na base do caule. É válido ressaltar, com base em Lopes & Santos (1994), que tais sintomas podem ocorrer devido a fatores abióticos, incluindo excesso nutricionais, ou poluição falta por de água, gases e fitotoxidez, outros. Desta deficiências forma, o conhecimento da interação entre os fatores físicos do solo, ambiente e o hospedeiro é extremamente necessário. Com relação às perdas econômicas, Bringel et al. (2001) afirmam serem as solanáceas as plantas mais afetadas. Nesta família, destacam-se as culturas de tomate, pimentão (Capsicum annuum L.), berinjela, jiló (Solanum gilo R.) e batata, sendo que para esta, conforme a agressividade do agente causador, as perdas podem ser totais. Coelho Netto et al. (2003) explicam que a agressividade de isolados de R. solanacearum é influenciada por fatores como: temperatura, umidade, tipo de solo, intensidade de luz e interação com microorganismos. Embora as bacterioses apresentem-se em número relativamente pequeno em relação às doenças fúngicas e viróticas, esta proporção perde seu valor, quando compara-se as xxix perdas provocadas pelo primeiro grupo de patógenos (LOPES, 2000). As mesmas variam de 10 % a 100 % na produção e, dentre os fatores que mais contribuem para este fato, destacam-se a ausência de medidas de controle eficientes e a escassez de informações sobre a complexa etiologia do agente causal da doença (CAFÉ FILHO & LOBO JÚNIOR, 2000; BRINGEL et al., 2002a). Bringel et al. (2004) afirmam que grande parte de dados reunidos sobre a doença diz respeito à caracterização quimiotaxonômica e molecular do seu agente causal. 2.1.2 Características do patógeno A murcha bacteriana é causada pela bactéria Ralstonia solanacearum (Smith) Yabuuchi (COELHO NETTO et al., 2003), que habita o solo e faz desse uma de suas vias de acesso para a colonização dos vasos das plantas hospedeiras. Possui uma ampla gama de hospedeiros suscetíveis, o que contribui para sua ocorrência em grande parte das regiões tropicais, subtropicais e quentes úmidas do mundo. A bactéria foi citada pela primeira vez, por Erwin Smith, em 1896, como Bacillus solanacearum, tendo sido observada em batata, tomate e berinjela (HAYWARD, 1994). Desde então, vem sendo descrita e estudada a fim de se determinar o seu controle (BRINGEL xxx et al., 2002a). Hayward (1994) descreveu Ralstonia solanacearum Y. como um fitopatógeno capaz de desenvolver numerosas raças e subespécies, das quais pode-se separar 40 grupos, baseando-se em suas características in vitro, atividades bioquímicas e reações sorológicas, dentre outras. Ainda segundo este autor, os grupos foram divididos em raças de acordo com os hospedeiros dos patógenos, sendo: raça um, aqueles que atacam as solanáceas e outros hospedeiros; raça dois, os patógenos da bananeira (Musa paradisiaca L.) e raça três, os patógenos da batata (Solanum tuberosum L.). Referências atualizadas comprovam que essa bactéria compreende cinco raças, acrescentando-se, além das anteriormente citadas, a raça quatro, que ataca o gengibre (Zingiber zingiber L.), e a raça 5, que ataca a amora (Morus nigra L.) (BRINGEL et al., 2001). Os biovares I e III, da raça um, são os patógenos do tomateiro, sendo os que predominam no Nordeste do Brasil (KUROZAWA & PAVAN, 1997). Este sistema de classificação, em biovares, tem sido desenvolvido com freqüência em diversos laboratórios devido à facilidade de reprodução da bactéria (BRINGEL et al., 2002a). Após observações detalhadas em uma coleção de Ralstonia solanacearum, foi sugerida uma nova classificação, estabelecida com base em algumas diferenças relacionadas à agressividade de isolados da biovar II, bem como, em algumas diferenças dos isolados da xxxi coleção, em relação ao fenótipo original. Deste modo, a nova classificação incluiu os fenótipos: biovar II-A (de Andes), especializados em atacarem a batata cultivada em climas frios, e biovar 2-T (de tropical), para os isolados que ocorrem em regiões de baixa altitude (BRINGEL et al., 2002a). Conforme Kurozawa & Pavan, (1997) e Bringel et al., (2004) a bactéria faz parte do grupo das não fluorescentes que não crescem a 40 ºC, e é do tipo baciliforme, Gram -, aeróbica, que se move por meio de um tufo de quatro flagelos polares e que forma colônias esbranquiçadas em meio contendo ágar. Em relação às atividades desenvolvidas por R. solanacearum internamente no tomateiro, pode ser verificada a formação de polissacarídeos, gomas, tiloses e fragmentos celulares, principais materiais que obstruem os vasos e as cavidades. Com a morte do tomateiro, à proporção que avança seu processo de decomposição, a bactéria multiplica-se abundantemente, liberando novos talos bacterianos para o solo (BEDENDO, 1995). O principal motivo para o gênero Ralstonia ser prejudicial a diversas espécies vegetais está relacionado à imensa variabilidade patogênica, evidenciada por suas raças fisiológicas. Na ausência do tomateiro a bactéria sobrevive no solo e, dependendo das condições físicas, especialmente temperatura e umidade, mantém-se ali por longo tempo. Conforme KUROZAWA & PAVAN (1997), este período xxxii não ultrapassa dois ou três anos, principalmente se a área for ocupada por gramíneas. 2.2 Controle da murcha bacteriana O controle da murcha bacteriana é extremamente difícil e, na maioria dos casos, pouco econômico. Não é conhecido um método de controle eficiente para a doença, devido aos vários fatores já citados que envolvem tanto a carência de informações sobre as relações patógeno - hospedeiro, quanto à ampla gama de hospedeiros suscetíveis. Conforme Bringel et al. (2002a), uma mesma planta pode ser hospedeira de uma ou mais estirpes do patógeno, o que dificulta ainda mais o controle, pois inviabiliza a seleção de variedades resistentes. Os métodos mais utilizados no sentido de se controlar a murcha envolvem o plantio em áreas novas e sadias, utilização de variedades resistentes e adoção de práticas culturais, tais como: isolamento dos focos iniciais de contaminação com corte e queima das plantas doentes, seguindo-se o plantio de feijão-vagem (Phaseolus vulgaris L.) ou ervilha (Pisum sativum L.), cuidados com a água de irrigação, alterações nas características químicas do solo, desinfecção de materiais de trabalho, controle de insetos e xxxiii nematóides, dentre outras (BEDENDO et al., 1995; KUROZAWA & PAVAN, 1997). O uso de variedades resistentes é, segundo Lopes (2000), a maneira mais clássica e econômica de se controlar doenças de plantas. No entanto, praticamente não existem cultivares comerciais com um bom nível de resistência às variantes do patógeno (LOPES & SANTOS, 1994; UESUGI & TOMITA, 2002). A rotação de cultura com plantas não hospedeiras do patógeno é outro método que pode diminuir o inóculo do solo, reduzindo os danos provocados na cultura de interesse comercial (BEDENDO, 1995). No entanto, segundo Bringel et al. (2001), a falta de conhecimento sobre as estirpes pode inviabilizar este método, bem como a seleção de genótipos resistentes em programas de melhoramento genético. KUROZAWA & PAVAN (1997) também fizeram referências às restrições ao uso de variedades resistentes e às rotações de culturas, devido à estabilidade da resistência do patógeno depender das condições ambientais, que poderão ser favoráveis à bactéria. Contudo, dentre as variedades melhoradas que são utilizadas no controle da murcha, destacam-se a Caraíba, alguns genótipos e o híbrido C 38 – D (BEDENDO, 1995; KUROZAWA & PAVAN, 1997). Este último é recomendado para a região Norte do Brasil e foi selecionado no Centro de Pesquisa Agropecuária do Trópico Úmido CPATU da EMBRAPA, Belém-PA (LOPES & SANTOS, 1994). xxxiv Vale ressaltar que a referida limitação, quanto ao uso de variedades resistentes, se deve a carência de conhecimentos básicos sobre a ecologia, evolução e epidemiologia de Ralstonia solanacearum. No entanto, testes in vitro têm sido realizados no sentido de se ampliar tais conhecimentos para a recomendação de medidas práticas e seguras de controle, inclusive nos trabalhos de melhoramento genético (BRINGEL et al., 2002b). Com relação à irrigação, deve-se ressaltar que a aspersão favorece mais as bactérias que atacam a parte aérea da planta, logo, é recomendada para evitar a murcha bacteriana, bem como, outras doenças de solo. Ressalta-se que a irrigação por sulcos, além de proporcionar umidade, ainda carreia propágulos do patógeno para as partes mais baixas do terreno (LOPES, 2000). Para um foco de infestação pequeno, recomenda-se eliminar as plantas doentes e tratar o solo com formalina a 1 %, através de regas (KUROZAWA & PAVAN, 1997). De um modo geral, as estratégias utilizadas no controle de patógenos de solo, concentramse em exclusão, sanitização e manejo do ambiente, mas estes podem ser eficientes para um grupo de patógenos e apresentarem pouca eficácia para outros. Daí, então, a grande importância do conhecimento dos patossistemas e da epidemiologia das doenças para seu correto manejo (CAFÉ FILHO & LOBO JÚNIOR, 2000). xxxv A utilização da matéria orgânica incorporada ao solo para o controle da murcha bacteriana tem se constituído em uma prática pouco desenvolvida, mas com perspectivas de avanço. Alguns trabalhos já têm sido desenvolvidos utilizando resíduos vegetais para controlar a doença (UESUGI & TOMITA, 2002; SOARES et al., 2004). Estes, no entanto, são em número relativamente pequeno quando comparados aos que envolvem utilização da matéria orgânica para controle de outros patógenos veiculados pelo solo. 2.2.1 Incorporação de resíduos orgânicos no solo A utilização de matéria orgânica poderá se constituir em uma medida prática e segura para o controle da murcha bacteriana. Isto porque sua simples incorporação ao solo, poderá inibir a sobrevivência do seu agente causal por atributos como: efeito tóxico de substâncias liberadas durante a decomposição, modificações na estrutura química e física do solo, e desenvolvimento de rizobactérias e alguns mutantes avirulentos, que constituem as populações antagônicas da bactéria (PEREIRA et al., 1996; NAKASONE et al., 1999; CAFÉ FILHO & LOBO JÚNIOR, 2000; ROSSI, 2002). Zambolim (1997) afirmam que as medidas de controle acima referidas, para que tenham eficiência, devem ser empregadas associadas e, quando utilizadas, que sejam em maior número xxxvi possível. Ou seja, o plantio em solos livres do patógeno, seria a medida que apresentaria maior valor relativo, enquanto que a incorporação de resíduos orgânicos, desde que realizada de forma isolada, se constituiria em uma medida de pouco valor. Neste sentido, o desenvolvimento de estratégias eficientes para o controle da murcha bacteriana será possível a partir da viabilidade de estudos sobre a sobrevivência e reprodução de R. solanacearum, bem como de sua relação com o grande número de espécies hospedeiras (LOPES & SANTOS, 1994). A adição e incorporação de matéria orgânica ao solo podem ser feitas utilizando-se resíduos orgânicos in natura ou compostados. Pereira et al. (1996) sugerem como proposta alternativa, a utilização da matéria orgânica compostada incorporada ao solo, cujo efeito pode estar associado não apenas à biomassa de microorganismos presentes em seu bojo, mas, principalmente, à atividade de apresentaram microorganismos. eficiência Experimentos contra vários patógenos, realizados incluindo a supressividade para Fusarium oxysporum f. sp. cucumerinum, para Giberella zeae, para Helminthosporium sigmoideum e Glomerella cingulata (PEREIRA et al., 1996). Deve-se ressaltar, no entanto, que testes realizados in vitro somente fazem uma avaliação preliminar do valor antimicrobiano dos compostos, não mantendo correlação com sua efetividade em nível de campo. perfeita xxxvii Nas análises realizadas no composto (resíduo de matéria orgânica), deve-se realizar a caracterização físico-química do material, incluindo: determinação do pH, relação C:N, capacidade de troca catiônica, carbono total e concentração de metais pesados. Conforme Pereira Neto, (1998), tais fatores podem influenciar não apenas na biomassa ou na atividade microbiana, mas também podem se constituir em um impedimento para a utilização destes materiais como insumos agrícolas devido ao risco de fitotoxidade ou contaminação ambiental. No Brasil, os relatos da utilização de compostos orgânicos no controle de doenças de plantas são recentes e referem-se a trabalhos realizados em casa de vegetação ou, em pequena escala, em nível de campo (NAKASONE et al., 1999; VIANA & SOUZA, 2000). Nestes, verificou-se redução na população de fitopatógenos em olerícolas, quando se incorporou material orgânico no solo. Alguns dos resultados satisfatórios foram relatados por Pereira et al. (1996), utilizando esterco bovino para controlar Phytophthora cinnamomi, agente causal da podridão de raiz do abacateiro (Persea americana Mill.), e Streptomyces scabies, agente causal da sarna comum em batata (Solanum tuberosum L.). Segundo Zamberlan & Froncheti (2002), a incorporação de matéria orgânica no solo pode ajudar a equilibrar a sua microfauna ,aumentando seu potencial de controle de doenças. xxxviii A matéria orgânica pode ainda ser incorporada ao solo, na forma de seu extrato aquoso, obtido da mistura e filtragem de materiais orgânicos, compostados ou não, e água. Este método assume, conforme os conceitos de sustentabilidade, duas funções importantes na propriedade: a de melhorar as características físicas, químicas e biológicas do solo, e a de produto fitossanitário. Em análise em casa de vegetação, Nakasone et al. (1999) conseguiram reduzir significativamente populações de fitopatógenos, mediante incorporação de extratos aquosos de composto orgânico no solo. Segundo Café Filho & Lobo Júnior, (2000) a adição de matéria orgânica ao solo altera sua estrutura física, teores de nitrogênio, celulose e lignina, sólidos solúveis totais, pH e deposição de toxinas que alteram o perfil da microbiota do solo e que tornam o ambiente impróprio à sobrevivência de patógenos, ao mesmo tempo em que favorece o aumento das populações de microorganismos benéficos. Embora de vantagem conhecida para o solo, é interessante observar que, de acordo com os resultados obtidos por Nakasone et al. (1999), a matéria orgânica pode, em alguns casos, assumir função inversa no controle dos fitopatógenos, pois poderá funcionar como fonte nutricional e ambiente favorável para os mesmos. A incorporação da matéria orgânica ao solo, à medida que melhora suas características, consegue fazer com que possa xxxix expressar toda a sua potencialidade (BROISLER, 1997). Desta forma, as plantas tornam-se menos suscetíveis ao ataque de patógenos, pois disponibilizarão substâncias sintetizadas em menor quantidade. Tal fato se explica porque os patógenos, de modo geral, são ineficientes quanto à síntese de substâncias de alta complexidade, proteínas, por exemplo, e que são essenciais à sua sobrevivência. Logo, estes organismos buscam nos vegetais a forma simplificada destas substâncias, geralmente aminoácidos, que estarão bem mais disponíveis em solos tratados com substâncias de alta solubilidade, como adubos ou defensivos químicos (SOUZA, 1999). Sistemas de produção estáveis associados a um ambiente equilibrado dificultarão o crescimento populacional dos patógenos e impedirão que estes adquiram resistência. Os resíduos fenólicos vegetais liberados no solo podem apresentar efeitos de toxicidade a algumas espécies de fungos e bactérias. Na rizosfera, os microorganismos encontram condições favoráveis à produção de antibióticos, cuja atuação contribui para a proteção dos vegetais contra agentes patogênicos (SANTOS & CAMARGO, 1999). As micropopulações rizosféricas são predominantemente saprófitas, no entanto, podem também encerrar microorganismos patogênicos potenciais. Quando os microorganismos saprófitas exercem função antagônica sobre os microorganismos patogênicos, o xl crescimento e a reprodução deste último tornam-se prejudicados. Em parte, isso se deve a uma redução de metabólitos livres (menos aminoácidos livres, mais proteínas acabadas, menos açúcares solúveis, mais amido e celulose sintetizados), mas pode ser também um estímulo os processos de defesa da própria planta (OSTERROHT, Excluído: a 2000b). Outra possibilidade de incorporação da matéria orgânica ao solo é feita sob a forma de adubo verde. Esta prática atende a uma série de finalidades na agricultura, sendo uma destas o controle de fitopatógenos de solo. Três princípios podem ser analisados neste tipo de controle: i) escassez de alimento para o patógeno, ii) liberação de substâncias orgânicas tóxicas que inibem o crescimento ou matam o patógeno, o que ocorre durante a decomposição da massa verde, iii) aumento de populações antagonistas que encontram no material decomposto, um ambiente propício ao seu crescimento e reprodução (ROSSI, 2001). Para aumentar ainda mais a efetividade deste tipo de controle, poderá ser adicionado à matéria orgânica, algum tipo de "fertiprotetor natural", como aquele obtido da mistura de água com cinza e cal. A presença de nutrientes na mistura, tais como: potássio, cálcio, magnésio, enxofre e silício, contribuem para melhorias na estrutura e fortalecimento das células vegetais, que estimulam a resistência a doenças, sobretudo, fúngicas e xli bacterianas (CLARO, 2001). O emprego de compostos bioativos, a exemplo dos "fertiprotetores", tanto apresenta uma eficiente atuação na conversão e potencialização de diversos nutrientes e substâncias ativas, quanto na ação fungistática e bacteriostática sobre fitopatógenos (MEDEIROS, 2001). Os benefícios da incorporação de matéria orgânica ao solo somam-se à crescente preocupação em se reduzir os custos de produção e, com isso, de se manter a competitividade e a sustentabilidade da produção agrícola, e à necessidade do uso racional de resíduos agroindustriais, o que corresponde a demanda em crescimento dos produtos orgânicos. Neste sentido, as propostas alternativas para o controle de fitomoléstias terão maiores chances de sucesso se as pesquisas levarem em consideração os seguintes fatores: a complexidade sobrevivência dos do patógenos sistema neste solo, sistema, as a estratégias de dinâmica das populações de microorganismos e a epidemiologia das doenças com seu nicho causal (CAFÉ FILHO & LOBO JÚNIOR, 2000). O extrato aquoso de matéria orgânica é uma das técnicas probióticas mais antigas e mais ecológicas que o agroecologista tem a sua disposição e, por esse motivo, tem sido freqüentemente utilizada sob um enfoque técnico-científico mais atual (GREEN, 2004). Essa solução é aplicada via foliar ou regada no solo, para efeito protetor ou curativo. Segundo Garcia (2002), vários mecanismos estão xlii envolvidos na ação protetora dos estratos de matéria orgânica, dentre os quais destacam-se: resistência induzida, inibição da germinação de esporos, antagonismo e competição por substrato com os agentes patogênicos. Nakasone et al. (1999) testaram o extrato aquoso de matéria orgânica, proveniente da mistura de palha de café com esterco bovino, e de vermicomposto, sobre a germinação de urediniósporos de Hemileia vastatrix, obtendo resultados comparados ao obtido com o fungicida triadimenol. Tais resultados foram alcançados quando se utilizou o material diluído em água (diluição seriada 1:10, até 10-4), obtendo-se as concentrações de: i) 25 %, 50 % e 100 %, para o extrato e composto orgânico e, ii) nas concentrações de 50 % e 100 %, para o vermicomposto. Resultados pouco satisfatórios foram obtidos utilizando-se o vermicomposto para controlar Alternaria solani (NAKASONE et al, 1999). Nesta análise, foi testado o efeito vermicomposto, nas concentrações de 25 % do extrato de e 50 %, sobre crescimento micelial do fungo. Nestas concentrações, a matéria orgânica tanto foi ineficiente como controle, quanto favoreceu o crescimento do fungo. Tal fato pode ter ocorrido devido ao vermicomposto ter sido utilizado pelo fungo, como fonte nutricional. Pereira et al. (1996), em análises feitas em casa de vegetação, avaliaram a eficácia do uso associado de vermicomposto e xliii solarização no controle de Sclerotium cepivorum, bem como da associação de vermicomposto, solarização, procimidone e do herbicida EPTC, no controle de Sclerotinia sclerotiorum, apresentando uma elevação no nível de controle de 79 % para 98 %, e ganhos ao nível de controle próximos àqueles obtidos pelo tratamento de solarização do solo. Viana & Souza (2000) obtiveram resultados significativos quando incorporaram matéria orgânica ao solo, visando controlar doenças fúngicas, especialmente aquelas cujo agente causal produz escleródios (estruturas que habilitam a sobrevivência do patógeno) sob as mais diferentes condições ambientais, o que por muitas vezes, prejudica o controle químico. Neste ensaio, foi avaliado o efeito de três fontes de matéria orgânica, sendo chorume de porco, bagaço de cana curtido e esterco de curral curtido, aplicadas ao solo no controle de Sclerotinia sclerotiorum, em feijoeiros (Phaseolus vulgaris L.) infestados, contrastando com os biológicos. materiais Os testados tratamentos químicos e foram eficazes como fonte nutricional para as plantas, sobretudo na fase de plântula, bem como apresentaram efeito indireto de estímulo da população microbiana associada, durante a fase de pré-germinação, atuando através de competição, antibiose e lise de propágulos com liberação de metabólitos tóxicos pelos resíduos de matéria orgânica sobre o fitopatógeno. xliv Segundo Rossi (2002), o processo de decomposição da matéria orgânica forma, por si só, um substrato propício ao desenvolvimento de microorganismos (actinomicetos e bactérias) que são inimigos naturais dos patógenos. A citronela (Cymbopogon nardus L.), planta originária do Ceilão e do sul da Índia, já vem sedo utilizada para afugentar insetos domésticos e de grãos armazenados, e como matéria-prima para a síntese de desinfetantes e bactericidas laboratoriais (FEPAGRO, 2003). Da mesma forma, pesquisas apontaram a possibilidade de uso de subprodutos da mandioca (M. esculenta Crantz.) para diversos fins, inclusive de ordem fitossanitária, sendo empregado como nematicida e bactericida (THEODORO & MARINGONI, 2002). O nim (Azadirachta indica Juss.) é largamente utilizado para o controle de diversas fitopatógenos pragas agrícolas, (USHAMALINI et incluindo al., 1997; insetos nocivos e BHATTACHARYA & PRAMANIK, 1998). Segundo Rossi (2001), a adição de matéria orgânica ao solo, tanto como adubo verde quanto como composto orgânico, causará uma redução nas populações de patógenos e, conseqüentemente, no dano associado. Além das modificações nas propriedades químicas, físicas e biológicas do solo, ocorrerá uma redução nos fatores ligados ao estresse, o que proporcionará maior resistência da planta ao parasitismo. xlv 2.2.2 Efeito de antagonistas sobre fitopatógenos A inoculação com antagonistas constitui uma alternativa para o controle de fitopatógenos. Desta forma, é crescente nos agroecossistemas, o emprego de protetores microbianos e do uso de microorganismos entomopatogênicos, tais como fungos, bactérias e vírus, como agentes biocontroladores das doenças de plantas (MEDEIROS, 2001). Trabalhando com sementes microbiolizadas, Moura et al. (1996) relataram a utilização de actinomicetos como antagonistas para o biocontrole da murcha bacteriana do tomateiro. Estes microorganismos, chamados por Sivasithamparam (1998) de agentes de biocontrole, sobrevivem nas células do tecido cortical das raízes e conferem uma proteção a mais ao ataque de patógenos. Vários estudos têm sido desenvolvidos envolvendo incremento das populações rizosféricas para redução da atividade patogênica. Dentre os agentes envolvidos no biocontrole, destacamse as rizobactérias antagônicas, cuja contribuição associa-se a fatores como: indução de resistência no vegetal, antibiose e competição por recursos com os patógenos (PEIXOTO et al., 1995). Sivasithamparam (1998) relata a atuação de Pseudomonas spp. não patogênicas, eficientes colonizadoras do rizoplano, que podem xlvi interferir na produção de hifas de fungos patogênicos. Em geral, estes apresentam características fenotípicas semelhantes às do agente causador de doença, caracterizando um indutor de resistência sistêmica adquirida (RAS). Este tipo de indução de resistência sistêmica adquirida com uso de rizobactérias tem sido demonstrado em testes para o controle de fungos, bactérias e vírus em feijão (Phaseolous vulgaris L.), pepino (Cucumis sativus L.), cravo (Tagetes patula L.) e tomate (Lycopersicon esculentum Mill.) (VAN LOON et al., 1998). Pseudomonas fluorescens rizobactérias associadas à estão entre as redução de mais efetivas doenças de plantas provocadas por patógenos veiculados pelo solo, pois estas interferem na interação entre o patógeno e o hospedeiro. Estudos demonstraram redução na incidência de murcha vascular provocada por Fusarium oxysporum f. sp. lycopersici em tomateiros, devido ao incremento da população de Pseudomonas fluorescens WCS 417 (VAN LOON et al, 1998). Os conhecimentos são ainda insuficientes para dominar os processos de antagonismo que eliminam fitopatógenos, no entanto, sabe-se que através de um correto manejo do ambiente, inclusive da matéria orgânica do solo, as plantas se tornam mais resistentes à proliferação de doenças, (OSTERROHT, 2000a). sobretudo fúngicas e bacterianas xlvii Segundo Agrios (1997), não se sabe ao certo quais os mecanismos que atuam no antagonismo das populações de patógenos. Geralmente, estes estarão relacionados a fatores como: parasitismo direto, competição por condições e recursos de sobrevivência, e, ainda, produção de substâncias antibióticas. 2.2.3 Manipulação dos fatores físicos do solo A manipulação dos fatores físicos do solo através da adoção de práticas culturais é também uma alternativa ao controle de doenças, mas esta ainda necessita de testes científicos para que possa ser reconhecida e utilizada com segurança (CAFÉ FILHO & LOBO JÚNIOR, 2000). A rotação de cultura e o uso da cobertura morta na agricultura merecem especial atenção no que se refere ao conhecimento do patossistema. Segundo Zamberlam & Froncheti (2002), na agricultura alternativa não existem inimigos naturais das plantas, existem, sim, organismos que necessitam se nutrir e que buscam no vegetal cultivado esta fonte de nutrição. Ainda com relação à manipulação dos fatores físicos do solo, Café Filho & Lobo Júnior (2000) afirmam que, quanto mais profundo for o solo, e quanto melhores forem as suas estrutura e textura, melhores serão também as condições de crescimento radicular da planta, que poderá explorar regiões mais profundas do solo, xlviii constituindo uma estratégia para escapar do ataque dos patógenos habitantes de solo, uma vez que estes preferem desenvolver-se nas camadas mais superiores. xlix 3 MATERIAL E MÉTODOS Os três materiais orgânicos utilizados nos tratamentos foram: raspas da mandioca (Manihot esculenta Crantz), folhas secas (trituradas) de nim indiano (Azadirachta indica Juss.) e de citronela (Cymbopogon nardus (L.) Rendle). Para uma melhor visualização dos resultados obtidos nos experimentos, as amostras dos resíduos utilizados foram submetidas à análise química. As avaliações da eficiência do uso dos resíduos sobre a bactéria foram realizadas em duas etapas, diferenciadas pelo método de inoculação utilizado: na primeira, utilizou-se o corte das raízes e imersão em suspensão bacteriana, e, na segunda, utilizou-se a infestação do solo. 3.1 Análise das características químicas dos resíduos orgânicos 3.1.1 Coleta e amostragem dos resíduos As raspas de mandioca foram coletadas em propriedades rurais dos municípios de São Luís (Pólo Bom Jardim I), Chapadinha e Bacabeira (MA). As folhas de nim e de citronela foram coletadas em São Luís, na Universidade Estadual do Maranhão – UEMA. Foram coletados 5 kg de cada material. Com relação à raspa de mandioca, tomou-se o cuidado de coletar amostras em áreas l uniformes da propriedade, levando-se em conta, além da similaridade do solo e da vegetação, o histórico e o manejo do cultivo. As amostras foram acondicionadas em sacos plásticos limpos, com capacidades para 10 L, previamente identificadas. 3.1.2 Análise química do substrato de resíduo orgânico As amostras dos resíduos vegetais passaram por processos de trituração e secagem. A trituração foi realizada em máquina trituradora (marca TRAPP; modelo TR 200) e a secagem, em estufa de secagem e esterilização, por 15 minutos (marca FANEM; modelo 315 SE). Os resíduos secos e triturados, antes de submetidos à pesagem, foram moídos em moinho (marca MARCONI; modelo TE 340). A pesagem dos resíduos foi realizada em balança analítica, modelo BG 400 (calibrada), marca GEHAKA. As amostras trituradas e secas foram enviadas ao Laboratório de Análises de Solos, da UEMA, no qual foram submetidas à análise química, para determinação dos nutrientes presentes no resíduo. As análises químicas foram realizadas segundo metodologia de VAN RAIJ et al. (1987), conforme segue: a) o cálcio (Ca), o magnésio (Mg) e o potássio (K) foram extraídos pela resina de troca iônica iR - 120 (catiônica), e determinados em espectrofotômetro de li absorção atômica; b) o fósforo (P) foi extraído pela resina de troca iônica IRA - 400 (aniônica) e determinado por leitura a 660nm no espectrofotômetro UV-VIS; c) o enxofre (S) foi determinado pelo método do BaCl2 em pó. A extração foi feita pela solução 0,01 M de Ca(H2PO4) 2 e a leitura foi feita a 420nm no espectrofotômetro UVVIS; d) o pH foi determinado em solução 0,01 M de CaCl2 e lido em pHmetro; e) a acidez potencial (H+Al) foi determinada pela mistura SMP (mistura de sais tamponantes) e lida em pHmetro. 3.2 Avaliação do material orgânico sobre Ralstonia solanacearum Os ensaios foram realizados em casa-de-vegetação e no Laboratório de Fitopatologia, pertencentes ao Núcleo de Biotecnologia Agronômica da UEMA, São Luís - MA. 3.2.1 Análise microbiológica dos resíduos orgânicos Para a análise microbiológica dos resíduos orgânicos, utilizou-se a metodologia apresentada por Nakasone et al., (1999). A quantificação do número de colônias de bactérias formadas foi realizada utilizando-se cinco amostras homogêneas (10 g), lii correspondentes a cada resíduo. De cada uma, foi coletada uma subamostra (1,0 g), que foi posteriormente transferida, individualmente, para béqueres (250 mL) contendo 100 mL de água destilada e esterilizada. Os compostos diluídos foram, em seguida, filtrados em gaze, obtendo-se os extratos aquosos. Quando não utilizados no mesmo dia, os extratos foram mantidos em geladeira. Para a determinação das comunidades bacterianas presentes nos resíduos, foi utilizada uma alíquota de 100 l de cada extrato aquoso, distribuída sobre meio BDA (batata–dextrose–ágar) e espalhada com auxílio da alça de Drigalski. Para determinação e identificação das populações fúngicas, foi utilizado meio BDA (batata–dextrose–ágar), com adição de 1 mg/L de ampicilina, sobre o qual foi espalhado 1,0 g de cada resíduo. As placas de Petri foram mantidas sobre bancada, em temperatura ambiente, até o término das avaliações. As populações bacterianas foram avaliadas após 24 horas e os fungos totais, após 72 horas. Para cada população, obteve-se um número médio de colônias formadas por placas. O delineamento experimental utilizado foi o inteiramente casualizado, com cinco repetições (placas experimentais). Como testemunha, observou-se a formação de colônias de microorganismos em placas contendo água destilada (100 L) sobre meio BDA. liii 3.2.2 Obtenção dos isolados de Ralstonia solanacearum biovar 1e3 Foram utilizadas culturas preservadas da coleção de bactérias fitopatogênicas do Centro Nacional de Pesquisas em Hortaliças (CNPH) – EMBRAPA - DF. No total, foram utilizados 8 isolados de R. solanacearum pertencentes às biovares 1 e 3, provenientes de diferentes regiões geográficas do país, todos obtidos em tomateiro (Tabela 1). Tabela 1. Descrição dos isolados de Ralstonia solanacearum (Smith) Yabuuchi biovar 1 e 3, utilizados no trabalho ISOLADO CNPH* nº BIOVAR 103 I Tomateiro Distrito Federal 183 III Tomateiro Ceará 206 I Tomateiro Goiás 211 III Tomateiro São Paulo 32 I Tomateiro São Paulo 66 III Tomateiro São Paulo 1150 I Tomateiro São Paulo 1675 III Tomateiro São Paulo *CNPH HOSPEDEIRO PROCEDÊNCIA – Centro Nacional de Pesquisas em Hortaliças – EMBRAPA - DF liv As bactérias foram transferidas inicialmente para meio de cultura MB-1 e 523 de Kado & Heskett (1970). O meio MB-1 foi constituído por sacarose (10 g), caseína hidrolizada (2 g), extrato de levedura (4 g), peptona (1 g), K 2HPO4 (2 g), MgSO4.7H2O (0,3 g), ágar (20 g), água para completar 1 litro e pH ajustado para 6,8-7,0. O meio 523 de Kado & Heskett (1970) foi preparado a partir dos componentes: sacarose (5 g), dextrose (5 g), peptona (4 g), extrato de levedura (4 g), caseína hidrolizada (4 g), K2HPO4 (2-4 g), MgSO4.7H2O (0,3 g), ágar (20 g), água para completar 1 litro e pH ajustado para 6,8-7,0. Em seguida, a seleção dos isolados foi feita com base nas características morfológicas, selecionando-se as colônias brancas e fluídas que se desenvolveram em meio de cultura seletivo de Kelman (1953) cuja composição apresentava: glicerol (5,0 mL), peptona (10,0 g), caseína (1,0 g), ágar (18 g), cloreto de tretazólio (1%) (5,0 mL), água para completar 1 litro e pH ajustado para 6,8-7,0. Os isolados foram identificados de acordo com a classificação de Hayward (1964) e posteriormente preservados em água (WAKIMOTO et al., 1982) até a sua utilização. destilada esterilizada lv 3.2.3 Avaliação da agressividade dos isolados de Ralstonia solanacearum biovar 1 e 3 em tomateiro Os isolados selecionados foram obtidos de amostras coletadas em diferentes épocas, havendo, portanto, a necessidade de se realizar uma verificação quanto à agressividade. As culturas dos diferentes isolados, mantidas em água, foram transferidas para meio Kelman (KELMAN, 1953) e incubadas por 48 horas a 28 0C. Em seguida, foram transferidas para meio 523 somente colônias que apresentavam coloração branca, fluída e de formato arredondado. Após 72 horas de incubação a 28 oC, as colônias foram transferidas para frascos Erlernmeyer de 250 mL contendo 100 mL de água esterilizada. A concentração da suspensão bacteriana foi determinada através de leitura em espectrofotômetro (550 nm), por absorbância, de acordo com uma equação previamente estabelecida. Foi utilizada para a inoculação a suspensão bacteriana com concentração de 108 ufc/mL. A cultivar de tomate usada na inoculação para avaliação da agressividade dos isolados foi a Santa Cruz, por ser padrão de suscetibilidade. Foi feita a semeadura diretamente em bandejas e as mudas com 25 dias de idade foram transplantadas para vasos de 1 L, contendo solo previamente autoclavado. O método de inoculação consistiu em ferimento no caule das plantas causado pela lvi introdução de um alfinete entomológico número 3, que transpassava uma gota de 10µL da suspensão do inóculo, depositada na axila foliar (MORGADO et al., 1994), conforme a Figura 1. A testemunha foi inoculada com água destilada. As plantas foram mantidas em casa de vegetação, à temperatura ambiente. O experimento foi avaliado do 5º ao 10º dias após a inoculação através de uma escala de notas com variações de 1 a 5 (NIELSEN; RAINES JÚNIOR, 1960), com a seguinte correspondência: 1 = ausência de sintomas; 2 = planta com 1/3 das folhas murchas; 3 = planta com 2/3 das folhas murchas; 4 = planta totalmente murcha; 5 = planta morta. As notas obtidas foram transformadas em índice de murcha bacteriana (IMB) (MORGADO et al., 1992), através da equação: IMB = Σ (C x P/N), onde, C, corresponde a nota atribuída a cada classe de sintoma; P, corresponde ao número de plântulas em cada classe de sintomas e N, corresponde ao número total de plântulas inoculadas. O delineamento experimental utilizado foi o de blocos casualizados com seis repetições. A parcela experimental foi constituída por uma planta por vaso. A análise estatística foi realizada com os dados de IMB provenientes da leitura aos 10 dias após inoculação. A análise de variância foi efetuada através do teste F e a comparação das médias, pelo teste Tukey a 5 % de probabilidade. lvii Figura 1. Esquema do método de inoculação de Ralstonia solanacearum através do ferimento da haste (MORGADO et al., 1994). lviii 3.2.4 Avaliação das dosagens dos resíduos orgânicos usados no biocontrole de Ralstonia solanacearum Foram testados três resíduos orgânicos separadamente em cinco dosagens: 20, 40, 60, 80 e 100 g.L-1, incorporados em solo peneirado e autoclavado. O tratamento controle (testemunha) foi constituído de solo sem incorporação de resíduos. Os resíduos orgânicos utilizados foram raspa de mandioca, folhas de nim e folhas de citronela. Os solos foram colocados em vasos com capacidade de 1 litro e mantidos em casa de vegetação. Sementes de tomate (Santa Cruz, Kadá Gigante) foram plantadas previamente em bandejas com solos peneirados e autoclavados. O transplante foi realizado aos 30 dias após a semeadura, simultaneamente à inoculação das plantas, deixando-se uma planta por vaso. A incorporação dos resíduos foi feita em cinco datas distintas: 0, 15, 30, 45 e 60 dias antes do transplante. Para cada data e resíduo, foi feita uma única aplicação. 3.2.4.1 Inoculação da bactéria Para a inoculação da bactéria nos tomateiros utilizou-se o método do ferimento de raiz que consistiu no corte do sistema radicular com tesoura, seguido de imersão na suspensão bacteriana lix (LOPES, 1981), conforme a Figura 2. Cuidadosamente, toda a terra das raízes das plantas foi removida, a partir de sua lavagem com jato de água. Com auxílio de uma tesoura flambada em álcool, as extremidades de algumas raízes secundárias foram seccionadas e, imediatamente após este procedimento, foram imersas na suspensão bacteriana (10 seg). Após a imersão, as mudas foram transplantadas para os vasos contendo os substratos e mantidas em casa de vegetação até o término das avaliações. 3.2.4.2 Avaliações do experimento As avaliações dos sintomas foram feitas em função do número de plântulas sadias, murchas ou mortas, seguindo o procedimento descrito no item 3.2.3. O delineamento experimental utilizado foi o de blocos casualizados com seis repetições. A parcela experimental foi constituída de um vaso, com uma planta. A análise de variância foi efetuada através do teste F e a comparação das médias, pelo teste Tukey a 5 % de probabilidade. lx Figura 2. Esquema do método de inoculação de Ralstonia solanacearum pelo ferimento de raiz (LOPES, 1981). lxi 3.2.5 Avaliação do período de incorporação dos resíduos orgânicos ao solo Os períodos de incorporação dos compostos orgânicos ao solo foram: 0 dias; 15 dias; 30 dias, 45 dias e 60 dias antes da inoculação. Foi utilizado a concentração do inóculo de 1 x 108 ufc/mL (ajustada em espectrofotômetro). O método de inoculação utilizado foi àquele proposto por Lopes (1981). Também neste experimento, as avaliações foram feitas em função do número de plântulas sadias, murchas ou mortas (MORGADO, et al., 1992). Foram feitas leituras diárias do desenvolvimento da doença do quinto ao décimo dia após a inoculação. O delineamento experimental utilizado foi o de blocos inteiramente casualizados com seis repetições para cada material orgânico testado. A parcela experimental foi constituída de um vaso com uma planta. Utilizou-se o programa estatístico ESTAT para efetuar as análises dos dados. lxii 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO 4.1 Análise das características químicas dos resíduos orgânicos Os resultados referentes às análises químicas realizadas nos resíduos estão representados na Tabela 2. Tabela 2. Características químicas de resíduos orgânicos vegetais (Manihot esculenta, Azadirachta indica e Cymbopogon nardus) Resíduo Ca Mg K Al+H CTC SB* ______________(cmolc.dm-3)_____________ MO V** P pH ____%____ (mg.dm-3) (CsCl2) Mandioca 35 23 6,3 24 88,3 64,3 12,6 72 145 5,9 Nim 6,0 4,0 2,1 21 33,1 12,1 14,7 36,5 13 5,4 Citronela 8,1 0,9 16 0,54 25,5 25 20,3 0,1 368 5,6 2,1 4,8 4,9 3,4 15,2 11,8 32 78 118 4,8 Solo s/ resíduo * SB = CTC – (Al+H) ** V = SB/CTC . 100 Os resultados das análises químicas do resíduo de mandioca, apresentados na tabela 2, indicam que o mesmo apresenta teores satisfatórios de Ca, Mg e K, bem como elevada saturação de bases (V % = 72), associada a um pH levemente ácido (pH = 5,9). Estes nutrientes, apresentam um papel fundamental na resistência das lxiii plantas a pragas e doenças, com destaque para aquelas fúngicas e bacterianas (CLARO, 2001). Alguns componentes como óxido nítrico, proteínas quinases ativadas por mitógenos e proteínas quinases, dependem do Ca, Mg e K, e podem funcionar como sinalizadores ao ataque de patógenos estimulando, portanto, a auto-defesa do vegetal (TAIZ & ZEIGER, 2004). Em relação ao pH, Theodoro & Maringoni (2002), afirmam que as bactérias encontram condições favoráveis para seu desenvolvimento em faixas de pH entre 6,5 a 7,5. Em situação de acidificação (aumento da acidez e diminuição de pH) do meio a viabilidade das células bacterianas é reduzida, podendo manter-se sob esta condição apenas no momento da infestação. As alterações químicas do resíduo de mandioca são mais intensas nos primeiros 15 dias de sua incorporação (pH = 3,0 – 4,0; acidez total % = 15 – 30). Nestas condições, espera-se que a atividade microbiana seja baixa, portanto, ficando pouco evidente a associação de alto índice de morte de plantas à atividade patogênica. Gava (2004) também observou que a densidade populacional de microorganismos, se apresenta relativamente baixa em meio ácido. Estes, sobretudo os antagonistas, apresentam crescimento e antibiose nas faixas de pH entre 6,0 e 7,5, observando-se os resultados mais significativos nas faixas acima de 8,0. A caracterização química da raspa de mandioca aponta para o não lxiv favorecimento da população de R. solanacearum no solo e para o comprometimento do crescimento das plantas apenas em períodos de incorporação abaixo de 30 dias. Embora as alterações físicas do solo não tenham sido verificadas neste experimento, observou-se que a incorporação da raspa de mandioca ao solo influenciou de forma negativa a sua estrutura. Em todos os períodos de incorporação estudados, o solo apresentou-se excessivamente compactado, quando seco, e com excesso de umidade, após ser irrigado. A caracterização química do nim indiano apontou valores equilibrados de Ca, Mg e K. No entanto, os valores referentes à acidez do meio foram considerados insatisfatórios sob o ponto de vista nutricional (H+Al = 21). Altos valores de Al+3 no solo podem indicar o deslocamento de elementos essenciais para as plantas, tais como Ca, Mg, K e Na, que podem ser percolados, aumentando a acidez total do solo e reduzindo sua fertilidade (SILVA & MOURA, 2004). Os valores de H+Al+3 podem ser, um indicativo da acidez potencial dos solos. Cabe lembrar que, segundo Silva & Moura (2004), o alumínio quimicamente ativo do solo é regulado, dentre outros fatores, pelo pH, que pode ter ainda seus valores reduzidos dependendo das reações que envolvem liberação de íons H+ para o meio. Pode-se supor, então, que a acidez potencial e o pH do solo são lxv mutuamente influenciados e dependendo da forma com que se apresentam comprometem a sanidade das plantas. Os resultados representados na tabela 2, referentes à caracterização química do resíduo de citronela, apontam para teores mais elevados dos elementos Ca, K e P. Com relação à acidificação do meio, não foram constatadas alterações acentuadas durante as épocas de incorporação, com o pH mantendo-se equilibrado entre 5,3 – 5,6; e a acidez em torno de 54 %. Embora os resultados apresentados neste trabalho apontem para uma maior influência das alterações químicas realizadas no solo durante a decomposição da matéria orgânica, acredita-se que o baixo percentual de plantas murchas ou mortas se deve à interação de um conjunto de fatores e de elementos (Ca, Mg, K e P). Os altos valores de Ca e K obtidos nas três análises também foram relacionados à redução da murcha bacteriana nos tomateiros. Com relação às alterações físicas do solo, devido à incorporação deste resíduo, diferentemente do que foi observado nos casos acima relatados, pôde ser observado um solo com características estruturais bastante satisfatórias. Acredita-se, portanto, que a incorporação de resíduo de citronela ao solo pode ser um método alternativo de controle para a doença estudada. lxvi 4.2 Avaliação dos resíduos orgânicos sobre Ralstonia solanacearum 4.2.1 Análise microbiológica dos resíduos orgânicos Os resultados da análise microbiológica dos resíduos apontaram grande quantidade de microorganismos presentes nos resíduos (Tabela 3). Tabela 3. População microbiana presente nos resíduos orgânicos de mandioca, nim e citronela RESÍDUO FUNGOS TOTAIS BACTÉRIAS TOTAIS (Nº de espécies (Média das repetições identificadas} do número de colônias) Raspa de mandioca 3 88 Nim indiano 6 87 Citronela 5 572 Considerando os resultados apresentados na Tabela 3, a qual refere-se ao número de colônias de microorganismos formadas nos resíduos, acredita-se que o substrato interfere na atividade lxvii biocontroladora. Sabe-se que o sucesso de um antagonista depende da eficiência de sua atividade saprofítica, diante do seu competidor (patógeno) (SIVASITHAMPARAM, 1998). Sabendo-se que os solos abrigam uma comunidade biológica rica e complexa, acredita-se que microorganismos presentes nos resíduos possam ter atuado como antagonistas da bactéria no presente estudo. Uesugi & Tomita (2002) fazem referência à influência dos microorganismos antagonistas sobre os resultados obtidos em seus experimentos. Nestes, foi comparada a utilização de matéria orgânica fresca e matéria orgânica esterilizada, incorporadas ao solo para controle de murcha bacteriana. Na forma esterilizada, o percentual de plantas com sintomas foi significativamente superior (40 %) à matéria orgânica em sua forma natural (26,31 %). Os microorganismos que auxiliam na supressão biológica de patógenos residentes no solo podem se desenvolver tanto na região rizosférica deste, quanto nos tecidos corticais das raízes do hospedeiro (SIVASITHAMPARAM, 1998). Este tipo de biocontrole pode se dar, sobretudo, devido à competição existente entre o patógeno e a flora antagonista do solo (MARIANO et al., 2000). Embora não se possa identificar com certeza os principais antagonistas envolvidos em biocontrole por competição, espera-se que este aconteça devido a uma interação perfeita entre lxviii antagonistas, hospedeiros e ambiente, que acaba por desfavorecer o patógeno. As bactérias foram mais freqüentes no resíduo de citronela, seguido pelos resíduos de mandioca e nim, respectivamente (Figura 3). Figura 3. Colônias de bactérias formadas nos meios contendo extratos aquosos de resíduos orgânicos vegetais: raspa de mandioca, nim e citronela. lxix Peixoto et al. (1995) associaram a inibição de Ralstonia solanacearum (raça 1, biovar III) em tomateiros ao antagonismo de mutantes de isolados de Pseudomonas fluorescentes, habitantes no rizoplano destas plantas. E, ainda, ressaltaram que estas populações contribuem para o aumento da emergência das plântulas, bem como para o aumento da altura e peso dos tomateiros. Estes mesmos resultados foram discutidos por Sher et al. (1987), cujo trabalho associou a presença de Pseudomonas fluorescentes no rizoplano das plantas ao aumento da emergência de plântulas e dos pesos, seco e fresco, de feijoeiros (Phaseolus vulgaris L.) e canola (Brassica campestris L.). Avaliando a atividade antagônica de microorganismos obtidos de húmus de minhoca, Pessoa et al. (2004) associaram a presença de Pseudomonas subtilis e Pseudomonas fluorescens ao potencial aumento da supressão de fitopatógenos veiculados pelo solo. As espécies de fungos identificadas, com suas respectivas freqüências relativas, nos resíduos orgânicos são apresentadas na Tabela 4. A freqüência foi dada em função do número de colônias formadas nos meios de cultura. lxx Tabela 4. Número total e freqüências relativas de colônias fúngicas obtidas nos resíduos de mandioca, nim e citronela ESPÉCIE Nº DE FREQUÊNCIA COLÔNIAS1 RELATIVA (%) Aspergillus niger 178 22,25 Aspergillus flavus 369 46,12 Rhizoctonia sp. 5 0,63 Penicillium spp. 149 18,62 Rhizopus stolonifer 53 6,63 Não identificados 46 5,75 800 100 TOTAL DE COLÔNIAS 1Somatório de todas as colônias formadas nos tratamentos em todas as repetições. Os resultados apresentados na tabela 4 revelam uma maior quantidade das espécies Aspergillus flavus (46,12 %), Aspergillus niger (22,25 %) e Penicillium spp. (18,62 %). Estas espécies foram mais freqüentes em todos os resíduos (Figura 4), sendo Aspergillus niger, na raspa de mandioca; Aspergillus flavus, nos resíduos de nim e citronela; e Penicillium spp., no resíduo de nim. lxxi Raspa de Mandioca 11,47 % 78,69 % 9,84 % Aspergillus niger Aspergillus flavus Rhizopus stolonifer Nim Indiano 8,86% 58,12% 8,86% 22,66% 1,98% Aspergillus niger Aspergillus niger Rhizopus stolonifer Rhizopus stolonifer Penicillium spp. Penicillium spp. 7,88% Aspergillus flavus Aspergillus flavus Rhizoctonia sp. Rhizoctonia sp. Não Nãoidentificados identificados Citronela 61,62% 23,61% 4,43% 1,11% Aspergillus niger Aspergillus niger Rhizopus stolonifer Rhizopus stolonifer Não Nãoidentificados identificados 9,23% Aspergillus flavus Aspergillus flavus Penicillium spp. Penicillium spp. Figura 4. Frequências (%) de espécies de fungos identificados nos resíduos de mandioca, nim e citronela. lxxii Testes realizados "in vitro" indicaram que as raízes do tomateiro são um ambiente favorável à colonização (ectofítica e endofítica) de actinomicetos (Streptomyces griseus), apresentando 70 % de sobrevivência de plantas inoculadas com R. solanacearum (GAVA, 1998). Peixoto et al. (1995) afirmam que a multiplicação de bactérias e fungos no rizoplano de tomateiros se deve à liberação de exsudatos radiculares, sendo esta, o principal fator responsável pelo estabelecimento destas populações. Pôde-se observar um maior vigor das mudas transplantadas para os vasos contendo a mistura de solo e resíduo, que daquelas transplantadas para solo autoclavado. Vários autores concordam que, quanto maiores forem as populações de fungos e bactérias benéficas no solo, mais produtivo este será (DUNN, 1994; SANTOS & CAMARGO, 1999; MARIANO et al., 2000). 4.3 Avaliação da agressividade dos isolados de Ralstonia solanacearum biovar 1 e 3 em tomateiros As avaliações da agressividade foram feitas com base no aparecimento de sintomas da doença, entre o 5º e 10º dias de observação. Estas apontaram o isolado 206 (biovar I), procedente de Excluído: à Goiás, como o mais agressivo em relação a cultivar suscetível Santa Cruz de tomateiros. Este isolado não diferiu estatisticamente dos lxxiii isolados 32 (biovar I; São Paulo), 211 (biovar III; São Paulo), 183 (biovar III; Ceará), 1150 (biovar I; São Paulo) (Tabela 5), no entanto, foi escolhido por apresentar a maior média geral entre os tratamentos estudados. Tabela 5. Agressividade dos isolados de Ralstonia solanacearum biovar 1 e 3 em tomateiros, avaliada através do índice de murcha bacteriana (IMB), aos 10 dias após inoculação. Isolado IMB 103 2,20 ab* 211 4,53 c 206 4,80 c 32 4,73 c 1150 4,10 c 183 4,10 c 1675 1,65 a 66 2,81 ab * Médias seguidas de mesma letra não diferem entre si, pelo teste de Tukey, a 5 % de probabilidade. lxxiv Ressalta-se que o isolado 206 (biovar I) proporcionou aparecimento de sintomas característicos da doença antes do início das avaliações (5º dia após inoculação), com plantas de algumas repetições já mortas nesta ocasião. A figura 5 ilustra a situação das plantas inoculadas e avaliadas no teste de agressividade de isolados de R. solanacearum em tomateiros, no 10º dia de observação. Figura 5. Tomateiros inoculados com diferentes isolados de Ralstonia solanacearum, biovares 1 e 3 para avaliação de agressividade. lxxv 4.4 Avaliação das dosagens e períodos de incorporação A análise estatística indicou haver diferença significativa entre os índices de doenças obtidos das plantas com sintomas em solo suplementado com os resíduos e em solo autoclavado. As interações dosagem x período de incorporação foram significativas a 5 % de probabilidade (Teste de Tukey), em alguns tratamentos. Os resultados estão representados nas tabelas 6, 7 e 8. Tabela 6. Índice de murcha bacteriana obtido na incorporação de raspa de mandioca ao solo DOSAGENS ÉPOCAS DE INCORPORAÇÃO (g.L-1) (dias antes da inoculação) 0 15 30 45 60 MÉDIAS 20 4,67 Aa 4,50 Aa 2,00 Bb* 1,00 Bb* 1,00 Ab* 2,63 40 5,00 Aa 5,00 Aa 5,00 Aa 1,17 Bb* 1,00 Ab* 3,43 60 5,00 Aa 4,83 Aa 5,00 Aa 1,67 Bb* 1,00 Ab* 3,50 80 5,00 Aa 5,00 Aa 5,00 Aa 3,00 Ab* 1,00 Ac* 3,80 100 5,00 Aa 5,00 Aa 4,83 Aa 1,83 ABb* 1,17 Ab* 3,57 4,37 1,73 1,03 MÉDIAS 4,93 TESTEMUNHA A,B – comparação na coluna 4,87 5,00 a, b – comparação na linha * - diferem da Testemunha pelo teste de Tukey, a 5 % de probabilidade (d.m.s. = 1,62) lxxvi Em se tratando do resíduo de mandioca (tabela 6), a dosagem que apresentou os melhores resultados foi a de 20 g.L-1 de solo. Estes resultados foram observados aos 30, 45 e 60 dias de incorporação. As demais dosagens diferiram significativamente da testemunha, apenas quando incorporadas em épocas maiores (45 e 60 dias), sendo que, a de 80 g.L-1, foi mais significativa com 60 dias de incorporação. Atribui-se estes resultados, à liberação de metabólitos tóxicos do resíduo, que, conforme Viana & Souza (2000), pode suprimir a população de microorganismos, bem como ao incremento das densidades populacionais de antagonistas, sobretudo de actinomicetos, prováveis inimigos naturais da bactéria. Ressalta-se, ainda, que grande parte dos agentes de biocontrole sobrevivem nas regiões rizosféricas do solo ou no tecido cortical das raízes (SIVASITHAMPARAM, 1998). Estes têm a função de ativar os mecanismos de defesa vegetal, haja visto sobreviverem nas células do tecido. A ação sinalizadora pode ser tanto direta, quanto indireta. No primeiro caso, a defesa é ativada por estímulos físicos ou químicos resultantes da própria atividade metabólica dos microorganismos patogênicos (HOFFLAND et al., 1996; ROMEIRO, 2000). Os antagonistas aparecem como atuantes indiretos, pois a planta os percebe e é estimulada a desencadear, antecipadamente mecanismos de autodefesa. Neste último caso, é quase certo que os agentes se tratem de rizobactérias promotoras de crescimento de lxxvii plantas (PGPR – Plant Growth–Promoting Rhizobacteria) (ROMEIRO, 2000). A incorporação de raspa de mandioca em dosagens menores (20, 40 e 60 g.L-1) é mais significativa, isto, tendo sido observado aos 45 e 60 dias de incorporação. Quando comparados os resultados nestas épocas, a dosagem de 80 g.L-1, apresenta-se como intermediária. Acredita-se que a incorporação deste resíduo em dosagens menores seja menos prejudicial aos atributos físicos do solo. Em dosagens maiores (80 e 100 g.L-1), conforme foi observado, o substrato apresentou-se, quando seco, excessivamente endurecido, e, quando irrigado, excessivamente encharcado. Cabe lembrar que tal situação compromete a penetração das raízes e pode contribuir para a formação de aberturas naturais ao patógeno. O tecido cortical das raízes é uma última fronteira contra o ataque de patógenos. Caso uma abertura natural seja promovida, o tecido cortical providencia uma barreira contra a invasão do inimigo natural, fabricada com os próprios elementos de raízes. Este mecanismo falha quando a planta é atacada por um patógeno virulento, pois este evita o desencadeamento de reações de resistência ou supressão, que conferem um tipo defesa ativada (SIVASITHAMPARAM, 1998). Soares et al., (2004) obtiveram resultado semelhante incorporando resíduo da parte aérea de guandu (Cajanus cajan) e lxxviii crotalária (Crotalaria juncea L.) ao solo. Nas concentrações utilizadas naquele trabalho (10, 20 e 30 %), obtiveram 100 % de controle de murcha bacteriana em tomateiros. O maior índice de doença das plantas foi observado, no presente estudo em épocas inferiores a 30 dias de incorporação do resíduo de mandioca. Neste período, o resíduo de mandioca está em intenso processo de fermentação, o que, se acredita, tenha influenciado negativamente nos resultados obtidos. Nesta situação, a liberação de subprodutos do processo pode comprometer o desenvolvimento das plântulas, ou por efeito fitotóxico, ou por comprometimento da respiração radicular (THEODORO & MARINGONI, 2002), isto porém, não foi observado no presente experimento. Não foram observados sintomas da doença nas plantas inoculadas aos 45 e 60 dias de incorporação. lxxix Tabela 7. Índice de murcha bacteriana obtido na incorporação de nim ao solo DOSAGENS ÉPOCAS DE INCORPORAÇÃO (g.L-1) (dias antes da inoculação) 0 15 30 45 60 MÉDIAS 20 2,50 3,67 4,33 2,33 3,33 3,23 A 40 2,67 3,50 2,33 1,00* 2,83 2,47 AB 60 2,33 1,67* 2,67 1,00* 2,00 1,93 B 80 2,17 1,83 1,00* 1,00* 4,00 2,00 B 100 2,17 2,33 1,50* 1,00* 3,67 2,13 B 2,37 a 2,60 a 2,37 a 1,27 b 3,17 a MÉDIAS TESTEMUNHA A,B – comparação na coluna 5,00 a, b – comparação na linha * - diferem da Testemunha pelo teste de Tukey, a 5 % de probabilidade (d.m.s. = 3,18) Para o resíduo de nim, as dosagens que apresentaram os melhores resultados foram 40, 60, 80 e 100 g.L-1 de solo, estes, tendo sido observados aos 45. A dosagem de 40 g.L-1 foi considerada intermediária. Bhattacharya & Pramanik (1998), relataram a ação da torta de Nim sobre Plasmodiophora brassicae, colonizador das raízes de crucíferas, obtendo baixos índices de incidência da doença (45,08 lxxx %) contra 61,11 % apresentados pela testemunha, a partir da adição de 10 kg/ha de torta de nim. Supõe-se que os resultados obtidos neste trabalho se devem à influência da atividade microbiana sobre a bactéria. No entanto, há que se considerar a ação de uma série de fatores, bem como de elementos constituintes do resíduo que contribuem para a redução da doença. O resíduo, na forma em que foi utilizado, disponibiliza açúcares e outros carboidratos que são usados pelos decompositores, favorecendo o antagonismo bacteriano (DUNN, 1994). Incorporando-se resíduo de nim ao solo, observou-se os melhores resultados 30 e 45 dias de incorporação, embora esta última época tenha sido significativamente melhor, para quase todas as dosagens (exceto 20 g.L-1). Sabendo-se que os solos abrigam uma comunidade biológica microorganismos rica presentes e no complexa, resíduo, acredita-se especialmente que fungos saprófitas, possam ter atuado como antagonistas da bactéria. Tal fato demonstra haver influência do tempo de incorporação do resíduo, tanto sobre a bactéria quanto a saúde das plantas. Neste sentido, a época de incorporação em que as plantas apresentaram os menores índices de sintomas foi aos 15 dias. lxxxi Ushamalini et al. (1997) obtiveram resultados semelhantes aos apresentados no trabalho, quando adicionaram torta de nim ao solo, como tratamento da podridão cinzenta do caupi (Vigna Unguiculata L.). Neste experimento, os menores valores para incidência da doença foram constatados aos 20, 30, 40 e 50 dias após o plantio. Tanto naquele, quanto no presente estudo, supõe-se que os baixos índices de sintomas e morte das plantas tenham sido devidos ao aumento da atividade de antagonistas que se proliferaram no solo, juntamente com a quebra do ciclo de seus respectivos patógenos. Mariano et al., (2000) e Taiz & Zeiger (2004) fazem referências à indução de resistência nos vegetais, devido ao contato com microorganismos ou com metabólitos liberados durante a decomposição da matéria orgânica no solo. Este fato se torna bem representado no presente trabalho, quando se observam os valores obtidos nos maiores períodos de incorporação do resíduo, ou seja, quando este, já em fase adiantada de decomposição, libera para o solo uma certa quantidade de substâncias (ácidos e álcoois) que ativam os mecanismos de defesa da planta. Por outro lado, os altos índices de sintomas (83,3 % e 100 %) sugerem que tenha havido efeito fitotóxico do resíduo sobre as plantas. Tal fato comprova a necessidade de se efetuarem novos estudos envolvendo testes de fitotoxicidade dos resíduos. lxxxii Tabela 8. Índice de murcha bacteriana obtido na incorporação de citronela ao solo, inoculadas com ferimento de raiz DOSAGENS ÉPOCAS DE INCORPORAÇÃO (g.L-1) (dias antes da inoculação) 0 15 30 45 60 MÉDIAS 20 1,50* 1,50* 2,17* 1,67* 1,00* 1,57 A 40 1,67* 1,00* 1,67* 1,00* 1,00* 1,27 A 60 1,50* 1,00* 1,67* 1,00* 1,00* 1,23 A 80 1,00* 1,00* 1,00* 1,00* 1,67* 1,13 A 100 1,00* 1,33* 1,67* 1,33* 1,00* 1,27 A 1,33 a 1,17 a 1,63 a 1,20 a 1,13 a MÉDIAS TESTEMUNHA 5,00 A,B – comparação na coluna a, b – comparação na linha * - diferem da Testemunha pelo teste de Tukey, a 5 % de probabilidade (d.m.s. = 1,83) As análises estatísticas (Tukey 5 %) demonstraram não haver diferença significativa entre os tratamentos, considerando as dosagens e épocas estudadas para o resíduo de citronela (tabela 8). Todas foram capazes de inibir a manifestação da doença nos períodos avaliados e diferiram significativamente da testemunha . A incorporação de citronela ao solo foi eficiente em todos os períodos de incorporação estudados. lxxxiii Este experimento indicou a possibilidade de utilização de resíduo de citronela no solo, nas dosagens de 20 a 100 g.L-1, em todas as épocas de incorporação. Para um cultivo economicamente viável, recomenda-se a utilização do resíduo em doses medianas (40 – 60 g.L-1), com 30 dias de incorporação que, segundo Campbell (1999), consiste na época ideal para maturação dos resíduos e atendimento de suas características desejadas. A comparação dos efeitos da incorporação de citronela com os demais resíduos pode ser visualizada na figura 6. 5 10 20 30 (g.L-1) 40 50 3 4 5 4,5 4 3,5 3 IMB 2,5 2 1,5 1 0,5 0 1 2 Dosagens Mandioca Figura 6. Índices de Nim Citronela murcha Testemunha bacteriana incorporações de mandioca, nim e citronela. obtidos nas lxxxiv Em todos os tratamentos, atribuem-se os bons resultados observados às alterações químicas no solo devido à decomposição dos resíduos, bem como ao incremento de populações antagonistas no mesmo. No entanto, Uesugi & Tomita (2002) alertam para o uso de matéria orgânica incorporada ao solo em dosagens crescentes e indiscriminadas, sob o risco de, ao invés de se estar controlando a doença, se contribuir para o aumento de sua incidência. Os autores concordam que a dosagem ideal de matéria orgânica circula em torno de 2 %, atribuindo ao fator aumento de dosagem do material, os altos índices de plantas com sintomas da doença. Neste trabalho ficou clara a influência das épocas de incorporação utilizadas sobre o aparecimento de sintomas nas plantas. A possibilidade dos metabólitos liberados durante o processo de decomposição do resíduo terem causado efeito fitotóxico nas plantas foi descartada por Uesugi & Tomita (2002), quando estes aumentaram as dosagens de resíduos orgânicos incorporados ao solo (20 % para 80 %). Neste experimento, tomou-se o cuidado de deixar uma bordadura constituída de uma planta por vaso, contendo solo autoclavado misturado ao resíduo, sem inoculação, nesta situação o índice de plantas sadias não inoculadas foi de 100 %. A incorporação de resíduos orgânicos ao solo pode através do equilíbrio da sua microfauna, aumentar seu potencial de controle de doenças, pois deste modo, desenvolve-se uma planta sadia. As lxxxv figuras 7 e 8 ilustram o equilíbrio na ausência de sintomas da doença nas plantas, durante as épocas avaliadas. A comprovação dos resultados obtidos para os períodos de incorporação poderá ser realizada gradativamente, com o desenvolvimento de novas pesquisas em diferentes épocas e regiões, lembrando-se ainda, da necessidade de obtenção de dados sob condições de campo, efetuadas preferencialmente em solos naturalmente infestados, haja vista que, sob estas condições, a manifestação da doença dependerá de fatores tais como: tipo e composição microbiana do solo, regime de chuvas, e outros (BRINGEL et al., 2001). Figura 7. Tomateiros inoculados plantados em substrato contendo resíduo de citronela, com 0 dia de incorporação. lxxxvi Figura 8. Tomateiros inoculados plantados em substrato contendo resíduo de citronela, com 60 dias de incorporação. lxxxvii 5 CONCLUSÕES Os resultados obtidos neste experimento foram base para as seguintes conclusões: É possível a redução da incidência da murcha bacteriana em tomateiros, mediante a incorporação de raspa de mandioca, nim indiano e citronela ao solo; A incorporação dos resíduos de nim e citronela não diferiram significativamente entre si, considerando as dosagens estudadas. A incorporação de citronela apresentou resultados satisfatórios em todas as dosagens estudadas; A incorporação de raspa de mandioca ao solo é mais eficiente em menores dosagens; lxxxviii REFERÊNCIAS AGRIOS, G. N. Plant pathology. 4. ed. San Diego: Academic Press, 1997. 635p. BEDENDO, I. P. Ambiente e Doença. In: BERGAMIN FILHO, A.; KIMATI, H.; AMORIM, L. Manual de Fitopatologia. São Paulo: Agronômica Ceres, 3 ed., v. 1, 1995. p. 331-341. BETTIOL, W. 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