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Manejo do
Hiperaldosteronismo Primário
O hiperaldosteronismo primário é uma causa relativamente comum de hipertensão arterial. Ocorre pela produção excessiva, inadequada e autônoma do mais potente
hormônio mineralocorticóide, a aldosterona. Esse hormônio é produzido na zona glomerulosa da córtex adrenal a
partir da ação da enzima aldosintase ligada ao gene
CYP11B2 do cromossomo 8 e regulado, primariamente,
pela angiotensina II e pelo potássio sérico e, secundariamente, pelo hormônio adrenocórticotrófico (ACTH) e pelo
sódio. O hiperaldosteronismo é produzido principalmente
por um adenoma adrenal ou por hiperplasia adrenal uni
ou bilateral. Raramente, pode ocorrer como forma monogênica, decorrente da fusão de partes dos genes CYP11B1
e CYP11B2 resultando em um gene anômalo que determina a produção de aldosterona, em vez de cortisol, na zona
fasciculada, sob estímulo do ACTH. Excepcionalmente, carcinomas de adrenal secretores podem determinar quadros
de hiperaldosteronismo primário(1,2,3).
Marcus Vinícius Bolívar Malachias
Instituto de Pesquisa e Pós-graduação da Faculdade de
Ciências Médicas de Minas Gerais e Instituto de
Hipertensão de Minas Gerais, Belo Horizonte, Brasil.
Fisiopatologia
A fisiopatologia do hiperaldosteronismo primário é a
mesma dos outros modelos de hipertensão por mineralocorticóide, baseada na retenção salina, determinada pelo
excesso de um esteróide, no caso a aldosterona. A retenção salina causada pela ação da aldosterona em receptores mineralocorticóides que atuam em canais de sódio de
células epiteliais do túbulo distal determina um estado de
hipervolemia clinicamente imperceptível. Esse estado
hipervolêmico é suficiente para desencadear um aumento
compensatório da resistência periférica por vasocontrição,
decorrente de ajustes ao hiperfluxo tecidual e da ação de
fatores natriuréticos vaso-constrictores, inibidores da
sódio/potássio ATPase, como a digoxina-simile, deflagrados pelo próprio estado de expansão(2,3).
Luiz Aparecido Bortolotto
Unidade de Hipertensão do Instituto do Coração (InCor) da
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, São
Paulo, Brasil.
Prevalência
A maior investigação de formas secundárias de hipertensão e maior utilização relação AP/APR (relação da concentração da aldosterona pela atividade plasmática da
renina) têm possibiltado a identificação de maior número
de portadores de hiperaldosteronismo primário, representando assim uma das mais freqüentes causas de hipertensão secundária(3-6). A prevalência do hiperaldosteronismo
primário (HAP) na população de hipertensos está em
torno de 6%, mas pode variar de 3% a 22%, sendo mais
alta nos hipertensos estágio 3 e/ou de difícil controle.
Atualmente sabe-se que a prevalência de hipopotassemia
no HAP varia de 9% a 37% dos casos(6).
Diagnóstico
Os critérios clínicos de investigação são baseados na presença de hipertensão resistente, ausência de história familiar e, eventualmente, na presença de hipocalemia, não apenas espontânea, mas também induzida por diuréticos(4-5).
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Recebido para publicação: Janeiro de 2013
Aceite para publicação: Janeiro de 2013
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nismo primário está confirmado. A sobrecarga oral poderá ser potencializada com o mineralocorticóide acetato
de fludrocortisona 0,1 mg 6/6 h, mediante controle rigoroso dos níveis tensionais(1,2).
Confirmado o diagnóstico de hiperaldosteronismo primário, o próximo passo é o diagnóstico por imagem.
Habitualmente usa-se a tomografia computadorizada de
abdômen ou a ressonância magnética, com especial atenção às adrenais, exames esses que podem identificar adenomas, geralmente tumores pequenos de crescimento
lento. Podem ainda identificar aumento homogêneo de
uma ou ambas adrenais ou espessamento de seus ramos,
compatíveis com hiperplasia. Tumores pequenos, com 1 cm
ou menos, podem não produzir imagens nítidas, enquanto que hiperplasias nodulares podem gerar imagens que
se confundem com adenomas. Em casos de nódulos maiores, de 2 a 3 cm, em geral não há muita dúvida na caracterização do aldosteronoma (adenoma produtor de aldosterona)(1-3).
A diferenciação entre os pacientes com hiperaldosteronismo primário portadores de adenoma daqueles com
hiperplasia bilateral, pode ser feita também com o teste
postural ou de deambulação. Após coleta basal de cortisol e aldosterona pela manhã, na posição deitada, o
paciente deve permanecer em pé, deambulando de duas
a quatro horas, e então novas coletas são feitas. Como o
teste é realizado no início da manhã, a aldosterona sérica será modulada por dois mecanismos opostos: a estimulação do sistema renina-angiotensina pela postura e
deambulação e a inibição do ACTH pela elevação circadiana do cortisol no período da manhã. Os portadores de
adenomas produtores de aldosterona são, em geral, autônomos em relação à angiotensina, mas são modulados
pelo ACTH, observando-se então queda ou estabilidade
nos níveis de aldosterona plasmática mesmo em posição
ortostática, enquanto os portadores de hiperplasia respondem com elevação, pois são sensíveis à angiotensina
II(2,3). O teste postural pode ser potencializado pela administração oral de furosemida 40 g na noite anterior à realização do teste(1).
Os valores diagnósticos da relação AP/APR (aldosterona
plasmática expressa em ng/dl e atividade plasmática da
renina em ng/ml/h) ainda não estão bem determinados.
Sugere-se que indivíduos em que a relação AP/APR alcance valores iguais ou superiores a 30 ng/dl sejam classificados como prováveis portadores. Quando os valores da referida relação alcançam 50ng/ml/h, são considerados como
de altíssima possibilidade de hiperaldosteronismo(1).
Valores da relação AP/ARP da ordem de 20 podem ser
encontrados em pacientes portadores de hipertensão primária com renina baixa, onde valores de aldosterona plasmática podem estar elevados(1,2).
A potencialização da relação AP/APR com captopril 50
mg administrados uma hora antes da coleta, tem sido
sugerida para melhorar a sensibilidade do método. A inibição da enzima conversora com o captopril que normalmente reduz a aldosterona e eleva a renina tende a inverter a ordem de grandeza da relação AP/APR, portanto
reduzindo os seus valores. A persistência de níveis elevados após o captopril seria então um indício ainda mais
forte de hiperaldosteronismo(2,3).
Os casos suspeitos, a partir de uma relação AP/APR
elevada, com ou sem potencialização, devem ser eventualmente submetidos à confirmação do diagnóstico de
hiperaldosteronismo primário por meio de teste de
supressão utilizando expansão volêmica(1).
A expansão volêmica pode ser aguda com soro fisiológico 2000 ml infundidos em quatro horas, lembrandose, por segurnança, que tais indivíduos devem ter boa
função miocárdica. Descarta-se hiperaldosteronismo se
os níveis séricos de aldosterona caírem a valores inferiores a 10 ng/dl, no caso de suspeita de adenoma e 5
ng/dl, no de hiperplasia. Opcionalmente pode-se realizar a sobrecarga oral de sal com 12 gramas de NaCl ao
dia, durante três dias, dosando-se no quarto dia a excreção urinária de sódio e aldosterona. A medida de excreção urinária de sódio serve para monitorar se a ingesta
de sal foi adequada. Nestas condições, se a excreção urinária de aldosterona permanecer elevada (acima de 12
a 14 mcg por 24 horas), o diagnóstico de hiperaldostero-
Quadro 1
Características dos testes para diagnóstico de hiperaldosteronismo primário
Tipo de teste
Sensibilidade (%)
Especificidade (%)
Potássio sérico < 3,5 mEq/l (sem uso de diurético)
87
95
Baixa atividade da renina plasmática (com dieta geral)
95
75
Tomografia computadorizada de adrenal
75
90
Relação aldo/renina estimulada com captopril
100
80
Cintilografia com iodo-colesterol
Aldosterona plasmática ou urinária
Indeterminada
Indeterminada
Não pode ser interpretado sem dosagem
concomitante de renina
100
Indeterminada
Dosagem de aldosterona das veias supra-renais
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Manejo do Hiperaldosteronismo Primário
Suspeita clínica:
Hipertensão refratária
Ausência de história familiar
Hipocalemia espontânea ou severa
Dosar aldosterona (AP) e renina (ARP) plasmáticas
Determinar relação AP/ARP
$3ŕQJGO$53Ļ”QJPOK
relação AP/ARP >30
$3Ļ$53Ļ
UHODomR$3$53”
Provável hiperaldosteronismo primário
Mineralocorticismo
aldo-independente
$3Ĺ$53Ĺ
UHODomR$3$53”
Hiperaldo
secundário
Sobrecarga salina (venosa ou oral)
Níveis elevado de aldosterona plasmática ou urinária
Hiperaldosteronismo primário confirmado
CT ou RM de adrenais
Hiperplasia
ou ausência
de imagem
Adenoma
unilateral
típico
Imagem duvidosa
Teste postural ou dosagem de 18-0H-B plasmática
Negativo para adenoma
Positivo para adenoma
Cateterismo seletivo das veias adrenais
Ausência de
lateralização
Lateralização
Tratamento medicamentoso
(espironoplactona, amiloride epleronoma, etc.)
Adrenalectomia
videolaparoscópica unilateral
Figura 1
Sugestão para abordagem do hiperaldosteronismo primário
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Níveis plasmáticos basais de precursores de aldosterona como a 18 hidroxicorticorterona (18-OH-B) encontram-se elevados no hiperaldosteronismo, principalmente nos
adenomas, sendo úteis, se disponíveis, não apenas para
confirmar o diagnóstico, mas também para diferenciar as
duas formas principais. Níveis de 18-OH-B iguais ou superiores a 100 ou até mesmo a 65 ng/dl indicam adenoma
e níveis inferiores sugerem hiperplasia, com elevado índice de discriminação(2,3).
Imagens funcionais, obtidas pela cintilografia da adrenal, que se baseiam na sua afinidade com o colesterol
marcado com iodo ou selênio radioativos (I131 ou Se75)
podem ser usadas. Particularmente, a cintilografia com o
iodo colesterol (NP59) pode ser útil na detecção dos adenomas, podendo diferenciá-los das hiperplasias nodulares
em até 90% dos casos, desde que realizada após a supressão com dexametasona (4mg/dia) por uma semana(2,3). A
cintilografia para a pesquisa de hiperaldosteronismo, contudo, tem sido o método menos utilizado na prática clínica dos maiores centros de referência.
O Quadro 1 resume as características operativas (sensibilidade e especificidade) destes métodos(4,5).
Atualmente tem se dado maior ênfase à realização de
cateterização seletiva das veias adrenais para coleta de
amostras de sangue e dosagens de aldosterona e cortisol
para confirmação diagnóstica do hiperaldosteronismo(3-4).
Frequentemente, à partir da história clínica sugestiva e do
achado de uma relação AP/APR elevada, tem sido indicada a realização de cateterização seletiva das veias adrenais para coleta de amostras de sangue e dosagens de
aldosterona e cortisol para confirmação diagnóstica, sem a
fase de testes de sobrecarga salina ou deambulação. A
lateralização dos níveis de aldosterona ou da relação
aldosterona/cortisol, indica fortemente adenoma ou
hiperplasia unilateral, passíveis de indicação cirúrgica.
Contudo, insucessos ocorrem com freqüência por dificuldades técnicas de cateterização venosa adrenal ou por contaminação com sangue de outras veias tributárias, principalmente da veia hepática à direita. A dosagem simultânea do cortisol confirma que a cateterização foi efetivamente realizada nas adrenais e também identifica e corrige uma eventual diluição por veias tributárias, quando se
analisa a relação aldosterona/cortisol(1-3).
A Figura 1 traz um algoritmo, sugerido pela VI Diretriz
Brasileira de Hipertensão, para a pesquisa de
Hiperaldosteronismo Primário(6).
vascular causada pela hipertensão secundária(37). Os portadores de hiperplasia bilateral devem ser tratados com um
bloqueador de aldosterona, espironolactona ou eplerenona, se necessário, associado a diuréticos tiazídicos ou
outros antihipertensivos(1,5,6). O caso específico de hiperaldosteronismo decorrente da fusão de partes dos genes
CYP11B1 e CYP11B2 que determina a produção de aldosterona, em vez de cortisol, na zona fasciculada, sob estímulo do ACTH, é suprimível e tratável com dexametasona.
Marcus Vinícius Bolívar Malachias
Luiz Aparecido Bortolotto
Referências Bibliográficas
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tratamento das principais causas de
secundária/New concepts on the diagnosis and
secondary hypertension. Rev Bras Hipertens 2011:
diagnóstico e
hipertensão
treatment of
18: 46-66.
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Ann Clin Biochem 2003;40: 439-452.
6. Diretriz Brasileira de Hipertensão. Arq Bras Cardiol 2010; 95(1
supl1):1-51.
Tratamento
Pacientes com um adenoma solitário devem ser submetidos a adrenalectomia, preferencialmente por via
laparoscópica. Cerca de metade dos pacientes operados
tornam-se normotensos, enquanto que os demais, embora com melhor controle, permanecem hipertensos devido
à hipertensão primária co-existente ou por lesão renal e
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