DIEGO PUPO DA MATA E SOUZA

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UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO
DIRETORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA
MESTRADO PROFISSIONAL EM FARMÁCIA
ALESSANDRA MARA DA SILVEIRA CAPPELARO
DESENVOLVIMENTO DE NANOEMULSÃO COMBINANDO OS
FÁRMACOS LEISHMANICIDAS MILTEFOSINA E FLUCONAZOL PARA
USO ORAL
Dissertação apresentada à Universidade
Bandeirante de São Paulo, como requisito
parcial para a obtenção do título de
Mestra em Farmácia, na Área de
Produtos Naturais e Sintéticos Bioativos.
Orientadora: Profa. Dra. Claudete Justina
Valduga.
Co-orientadora: Profa. Dra. Isis Amaral
Zainaghi Arvati.
SÃO PAULO
2012
BANCA EXAMINADORA
Profa. Dra. Claudete Justina Valduga (Presidente – Orientadora)
Profa. Dra. Elizabeth Igne Ferreira
Prof. Dr. Niraldo Paulino
Ao meu grande amor, Amarildo, meu amigo e companheiro na vida e nos sonhos e
aos frutos deste nosso amor, Victor e Camila, que nos dão força para caminhar. Aos
meus tios Glória e Lúcio, que sempre estiveram no papel de meus pais. À minha
mãe Rosa, que em todo o meu tempo de estudo ensinava-me a coragem do
aprender.
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus, pela saúde, fé, perseverança e Seu socorro, que
nunca me faltaram.
Às minhas amigas e irmãs, Vanessa e Renata por todo apoio e por sempre
acreditarem em mim. Sentirei saudades dos nossos cafés nas madrugadas,
acompanhados de lágrimas e risos.
Agradeço ao meu esposo Amarildo, pela força e apoio que tornaram meu sonho
possível. E aos meus filhos Victor e Camila, por terem doado o tempo que lhes
pertencia, para que eu pudesse estudar.
À minha querida professora, orientadora e amiga, Profa. Dra. Claudete
Justina Valduga, por compartilhar seu conhecimento para que eu pudesse
crescer:  Obrigada, por não ter desistido de mim, mesmo quando eu mesma já
havia desistido.
Agradeço a todos os professores do mestrado desta universidade que me apoiaram
para a realização deste trabalho.
À Profa. Dra. Márcia Regina Machado dos Santos por sua constante disposição em
contribuir com este trabalho.
À Profa. Dra. Iolanda Cuccovia (INCT-FCx) do Instituto de Química da Universidade
de São Paulo, pela colaboração nos testes de Light Scattering.
Aos colegas Oseraldo e Alessandra Fagioli, pela colaboração durante os
experimentos e por todo companheirismo.
Ao responsável pelo laboratório de farmacologia experimental Msc. Ivair Donizeti
Gonçalves, por sua colaboração.
À minha mãe Rosa e à minha querida amiga Claudia por cuidarem dos meus filhos e
da minha casa, durante minhas ausências.
A toda minha família, representada aqui por seus núcleos, Rosana, Ivana, Jorge e
Guilherme pelo carinho e incentivo que fizeram parte desta caminhada. Família é a
base que sustenta e impulsiona o crescimento humano.
Não terminaria nunca de agradecer individualmente, aqueles que participaram desta
etapa da minha vida, por isto finalizo agradecendo a todos aqueles que participaram
direta e indiretamente deste trabalho.
A todos, minha eterna gratidão...
“Só sei que nada sei”.
Sócrates
RESUMO
CAPPELARO, A. M. S. Desenvolvimento de nanoemulsão combinado os
fármacos leishmanicidas miltefosina e fluconazol para uso oral. 76p.
Dissertação de mestrado – Mestrado Profissional em Farmácia, Universidade
Bandeirante de São Paulo, 2012.
O emprego de nanomateriais na indústria farmacêutica confere vantagens como:
proteção do fármaco contra possíveis instabilidades no organismo, manutenção de
níveis plasmáticos, aumento da eficácia terapêutica e diminuição da toxicidade pela
redução de doses. Os principais nanomateriais utilizados são: lipossomas,
nanopartículas poliméricas (nanocápsula e nanoesfera), nanoemulsões e complexos
lipídicos. Esta ciência tem despertado interesse no desenvolvimento de novos
medicamentos para o tratamento de doenças negligenciadas, como a leishmaniose
devido ao fato de os medicamentos usados para o tratamento desta patologia serem
antigos e restritos. A miltefosina é um leishmanicida ativo, administrado por via oral,
que teve seu uso aprovado em março de 2002, para o tratamento da Leishmaniose
Visceral (LV) na índia. O fluconazol é um antifúngico utilizado isoladamente ou como
coadjuvante no tratamento da leishmaniose. O objetivo deste estudo foi o de
combinar o fármaco miltefosina com o fluconazol e veiculá-los em nanoemulsões
com a expectativa de obter um produto com vantagens em relação aos
comercializados,
caracterizar
físico-quimicamente
o
produto
e
avaliar
sua
estabilidade. O produto nanotecnológico foi obtido por homogeneização à alta
pressão, atingindo bons resultados quanto às propriedades organolépticas, tamanho
da
partícula,
polidispersidade,
potencial
zeta,
variação
de
temperatura
e
comportamento enzimático frente a fluidos gastrintestinais simulados in vitro. Os
resultados sugerem a viabilidade farmacotécnica da nanoemulsão com miltefosina e
fluconazol associados para administração oral.
Palavras-chave: Nanoemulsão. Miltefosina. Fluconazol. Leishmaniose.
ABSTRACT
CAPPELARO, A. M. S. Development of a nanoemulsion combining the
leishmanicide drugs miltefosine and fluconazole for oral use. 76p. Dissertação
de mestrado – Mestrado Profissional em Farmácia, Universidade Bandeirante de
São Paulo, 2012.
The use of nanomaterials in the pharmaceutical industry provides advantages as
protection against possible instabilities of the drug in the body, maintenance of
plasma levels, increasing the therapeutic efficacy and decreasing toxicity by reducing
the doses. The main nanomaterials used are: liposomes, polymeric nanoparticles
(nanospheres and nanocapsules), nanoemulsions and lipid complex. This science
has aroused interest in the development of new drugs for neglected diseases such
as leishmaniasis, since the drugs used to treat this disease are old and narrow.
Miltefosine is an effective anti-leishmanial drug, administered by oral via, which was
approved for oral use in March of 2002, for treatment of Visceral Leishmaniasis (VL)
in India. Fluconazole is an antifungal agent used alone or as adjuvant in the
treatment of leishmaniasis. The objective of this study was to combine fluconazole
with miltefosine and to associate them to nanoemulsions with the aim of obtaining a
product with advantages over currently marketed, physicochemicaly characterize the
product and to evaluate its stability. The nanotechnological product was obtained by
high pressure homogenization and showed good organoleptic properties, particle
size, polydispersity, zeta potential, temperature variation and behavior under
enzymatic action in simulated gastrointestinal fluids in vitro. These results suggest
the
pharmacotechnical
viability
of
the
fluconazole
and
miltefosine-loaded
nanoemulsion for oral administration.
Keywords: Nanoemulsion. Miltefosine. Fluconazole. Leishmaniasis.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Representação de uma escala nanométrica. ........................................... 18
Figura 2 - Representação esquemática de um lipossoma. ....................................... 21
Figura 3 - Representação esquemática da estrutura química de um fosfolipídio. ..... 21
Figura 4 - Representação esquemática de nanocápsulas (a) e nanoesferas (b). ..... 23
Figura 5 - Representação de uma nanopartícula lipídica sólida. .................................... 24
Figura 6 - Representação de um fulereno. ............................................................... 25
Figura 7 - Representação de nanopartículas de dióxido de titânio (a); Representação
de nanopartículas de óxido de zinco (b). .................................................................. 25
Figura 8 - Representação de uma nanoemulsão (à esquerda) e de uma emulsão
convencional (à direita). .............................................................................................. 26
Figura 9 - Representação de uma nanopartícula lipídica – Nanoemulsão. ............... 27
Figura 10 - Principais áreas endêmicas de leishmaniose cutânea no mundo. .......... 31
Figura 11 - Principais áreas endêmicas de leishmaniose visceral no mundo. .......... 32
Figura 12 - Ciclo parasitário da leishmaniose. .......................................................... 34
Figura 13 - Estrutura química do ergosterol e do colesterol. .................................... 40
Figura 14 - Representação esquemática (a) e imagem (b) do estado de transição da
coalescência de duas partículas de emulsão. .......................................................... 52
Figura 15 - Formulação 5 (a) e formulação 6 (b). ..................................................... 53
Figura 16 - Cromatograma do fluconazol padrão (a) e do precipitado da formulação 5
(b). ........................................................................................................................... 54
Figura 17 - Formulações 13 (A) – com os fármacos; e 14 (B) – sem os fármacos. .. 56
Figura 18 - Tamanho das partículas da formulação 13 (a) e do controle, formulação
14 (b). ...................................................................................................................... 57
Figura 19 - Representação gráfica da polidispersidade da formulação 13 (a) e do
controle, formulação 14 (b). ..................................................................................... 58
Figura 20 - Histograma da freqüência de distribuição do tamanho de partícula da
formulação 13 e do controle, formulação 14. ........................................................... 59
Figura 21 - Distribuição porcentual por tamanho de partícula para a formulação 13 e
controle, formulação 14. ........................................................................................... 60
Figura 22 - Representação gráfica da distribuição das partículas por tamanho para a
formulação 13 e o controle, formulação 14. ............................................................. 61
Figura 23 - Representação gráfica do potencial zeta da formulação 13 (a) e do
controle, formulação 14 (b). ..................................................................................... 62
Figura 24 - Variação da transmitância em função do aumento da temperatura para a
formulação 13. ......................................................................................................... 63
Figura 25 - Comportamento da formulação 13 (contendo os fármacos) em fluido
gástrico simulado (a) e fluido intestinal simulado (b). ............................................... 64
Figura 26 - Comportamento da formulação 14 (controle) em fluido gástrico simulado
(a) e fluído intestinal simulado (b). ........................................................................... 65
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 -
Estrutura química de antimoniais pentavalentes empregados na clínica
médica, com os respectivos nomes químicos e comerciais. ..................................... 36
Tabela 2 -
Outros fármacos empregados na terapia da leishmaniose, com os
respectivos nomes químicos e comerciais. .............................................................. 38
Tabela 3 -
Composição das nanoemulsões. ........................................................ 46
Tabela 4 -
Características gerais das nanoemulsões preparadas. ....................... 51
Tabela 5 -
Análise de pH das Formulações 13 e 14 durante o período de 20 dias,
armazenadas sob refrigeração (2 - 4 ºC). ................................................................ 56
Tabela 6 -
Resultados de tamanho de partícula, polidispersidade e potencial
zeta para as formulações 13 e 14, obtidos por Laser Light-Scattering. .................... 57
LISTA DE ABREVIATURAS
dC
Depois de Cristo
DNA
Ácido Desoxinucleico
DNDi
Iniciativa de Desenvolvimento de Medicamentos para Doenças
Negligenciadas
Fiocruz
Fundação Oswaldo Cruz
IMIQ
Imiquimode
LC
Leishmaniose cutânea
LM
Leishmaniose mucosa
LTA
Leishmaniose Tegumentar Americana
LV
Leishmaniose visceral
MS
Ministério da Saúde
OMS
Organização Mundial da Saúde
ONG
Organização Não Governamental
PCR
Proteína C Reativa
PDP
Parceria para Desenvolvimento de Produtos
RNA
Ácido Desoxirribonucleico
Sbv
Antimoniais Pentavelentes
SIDA
Síndrome de Imunodeficiência Adquirida
WHO
World Health Organization
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 14
2 REVISÃO DE LITERATURA ................................................................................. 18
2.1 NANOTECNOLOGIA ......................................................................................... 18
2.1.1 Principais nanopartículas utilizadas na área de saúde .................................... 20
2.1.1.1 Lipossomas .................................................................................................. 20
2.1.1.2 Nanopartículas poliméricas .......................................................................... 22
2.1.1.3 Nanopartículas lipídicas sólidas ................................................................... 23
2.1.1.4 Nanopartículas insolúveis............................................................................. 24
2.1.1.5 Nanoemulsões ............................................................................................. 26
2.2 DOENÇAS NEGLIGENCIADAS ......................................................................... 28
2.3 LEISHMANIOSE ................................................................................................ 30
2.3.1 Tratamento da Leishmaniose .......................................................................... 35
2.3.1.1 Miltefosina .................................................................................................... 39
2.3.1.2 Fluconazol .................................................................................................... 40
3 OBJETIVOS .......................................................................................................... 43
3.1 OBJETIVO GERAL ............................................................................................ 43
3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS .............................................................................. 43
4 MATERIAL E MÉTODOS ...................................................................................... 44
4.1 MATERIAL ......................................................................................................... 44
4.2 EQUIPAMENTOS .............................................................................................. 44
4.2.1 Espectrofotômetro UV-Visível ......................................................................... 44
4.2.2 Laser Light-scattering ...................................................................................... 44
4.2.3 Processador ultrassônico ................................................................................ 45
4.2.4 Homogeneizador de alta pressão .................................................................... 45
4.2.5 Phmetro .......................................................................................................... 45
4.2.6 Cromatógrafo gasoso (CG) ............................................................................. 45
4.3 MÉTODOS ......................................................................................................... 46
4.3.1 Preparo das nanoemulsões............................................................................. 46
4.3.2 Caracterização físico-química das formulações .............................................. 47
4.3.2.1 Acidez .......................................................................................................... 47
4.3.2.2 Tamanho de partícula, polidispersidade e potencial zeta ............................. 48
4.3.2.3 Análise calorimétrica .................................................................................... 48
4.3.3 Estabilidade preliminar das formulações ......................................................... 48
4.3.3.1 Estabilidade em fluidos gastrointestinais simulados ..................................... 49
4.3.4 Análise Estatística ........................................................................................... 49
5 RESULTADOS E DISCUSSÃO............................................................................. 50
6 CONCLUSÃO ....................................................................................................... 66
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 67
14
1 INTRODUÇÃO
A nanotecnologia tem como escala valores de 1 a 100 nanômetros (nm), se
focaliza em materiais de tamanho atômico, molecular e supramolecular, apontando o
controle e manipulação desses novos materiais em escala celular ou menor, que
não seria possível através da tecnologia convencional (MÉNDEZ CONTRERAS,
2010).
As propriedades da nanoescala permitem proteger materiais em pequenos
pacotes
para
minimizar
invasibilidade
e
facilitar
intervenções
terapêuticas
inteligentes com aumento da especificidade de liberação e ação, diminuição de
efeitos secundários e capacidade de resposta a estímulos externos e de interagir
com receptores externos (MÉNDEZ CONTRERAS, 2010).
O uso de nanopartículas em medicina foi primeiramente realizado no
tratamento do câncer e progrediu rapidamente, sendo bem utilizadas para resolver
as limitações que apresentam os sistemas de liberação de fármacos convencionais,
tais como a biodistribuição inespecífica e falta de seletividade, baixa solubilidade em
água, pobre biodisponibilidade oral e baixos índices terapêuticos. Uma forma efetiva
para obter eficiência na liberação de fármacos é desenvolver de forma racional
nanossistemas baseados no conhecimento de suas interações com o ambiente
biológico, a população de células-alvo, as mudanças dos receptores celulares que
acontecem com a progressão da doença, o mecanismo e sítio de ação e a retenção
do fármaco, a administração de múltiplos medicamentos, o mecanismo molecular e a
fisiopatologia da doença em consideração (SURI et al., 2007).
Nanoemulsões constituem uma classe de emulsões com gotículas uniformes
e de dimensões muito diminutas, na faixa entre 50-200 nm. Estas estão se tornando
cada vez mais populares como veículos para a liberação controlada e dispersão
otimizada de princípios ativos. Muitas vezes são referidas como microemulsões,
emulsões submícron, emulsões ultrafinas, etc. As minúsculas dimensões dessas
gotículas reduzem o impacto sofrido pela força da gravidade, evitando a formação
de sedimentos durante o armazenamento do produto. O pequeno tamanho das
gotículas também evita a floculação, mantendo o sistema disperso, sem separação.
As gotículas também evitam a coalescência por não serem deformáveis e não
apresentarem as alterações da superfície. Além disso, a fina espessura da película
15
(em relação ao diâmetro da gotícula) evita qualquer afinamento ou ruptura da
película de líquido entre as gotículas (TADROS et al., 2004; GARG; KOKKOLI,
2005).
A leishmaniose é uma doença negligenciada, existindo poucas pesquisas
relacionadas a novos fármacos, pois não há interesse comercial por parte das
indústrias farmacêuticas. A elaboração de novas formas farmacêuticas e/ou a
associação de fármacos com comprovada eficácia é, a curto prazo, uma opção
viável. Alguns dos problemas que os medicamentos utilizados atualmente para o
tratamento da leishmaniose apresentam são toxicidade e resistência, que poderiam
ser diminuídos com a administração de formas farmacêuticas com maior poder de
absorção e a associação de fármacos com diferentes mecanismos de ação que
podem levar a resultados mais satisfatórios que as terapias convencionais. Além
disso, é importante desenvolver uma formulação estável e de fácil utilização para
contribuir com a adesão ao tratamento.
A leishmaniose é considerada uma das seis mais importantes doenças
infecciosas, tornando-se um problema de saúde pública em 88 países das Américas,
Europa, África e Ásia, com registro anual de 1 a 1,5 milhões de casos (BRASIL,
2007). A incidência mundial de leishmaniose é de dois milhões de casos. Destes, 1 a
1,5 milhões de novos casos correspondem à leishmaniose cutânea (LC) (SAMPAIO;
RIVITTI, 2008). A LC é um grave problema de saúde no Brasil, com 388.155 casos
relatados nos últimos 15 anos (FUNASA, 2000). O traçado clínico da LC em
humanos incluem leishmaniose mucosa (LM), a leishmaniose cutânea disseminada
e leishmaniose cutânea difusa (NASSIRI-KASHANI et al., 2005). Ainda há o tipo
mais grave de leishmaniose que é a visceral (LV), podendo levar o paciente a óbito.
Mais recentemente, houve um grande aumento de casos de LV associada a
indivíduos portadores de Síndrome de Imunodeficiência Adquirida (SIDA) (WHO,
2012a).
A leishmaniose visceral, também conhecida como calazar, é um dos tipos
mais graves de leishmaniose, que pode ser fatal para o homem, cuja letalidade pode
alcançar 10% quando não se institui o tratamento adequado. É causada por
espécies
do
gênero
Leishmania,
pertencentes
ao
complexo
Leishmania
(Leishmania) donovani (LAINSON; SHAW, 1987).
O arsenal terapêutico contra a leishmaniose é ainda muito restrito
(MACHADO-PINTO, 2002). Antimôniais pentavalentes têm sido os fármacos de
16
escolha para o tratamento da leishmaniose por mais de 50 anos. Os compostos
disponíveis para utilização são o antimoniato de N-metil-glucamina (Glucantime®) e
estibogluconato de sódio (Pentostam®) (LIMA; PORTO; MOTTA, 2007). A
anfotericina B é o fármaco de segunda escolha quando não há resposta ao
tratamento com antimoniato de N-metil-glucamina ou meglumina ou quando não é
possível usá-lo. A eficácia de pentamidina, que é um fármaco de terceira escolha, é
bem pouco conhecida (MACHADO-PINTO, 2002). Os fármacos de segunda e
terceira escolha são menos usuais devido aos problemas associados com o custo e
à toxicidade (GUERIN et al., 2002).
A miltefosina é um leishmanicida ativo, administrado por via oral (SEIFERT et
al., 2003) que teve seu uso aprovado em março de 2002 para o tratamento da LV na
Índia (SUNDAR et al., 1998; BHATTACHARYA; SUNDAR, 2004). Os principais
efeitos colaterais relacionados ao uso de miltefosina constituem-se em náuseas,
vômitos e aumento da creatinina. É um fármaco que apresenta teratogenicidade e
apesar dos bons resultados terapêuticos obtidos foram encontrados parasitas
resistentes ao fármaco em testes laboratoriais, o que pode indicar grande potencial
em desenvolver resistência ao tratamento com o mesmo (SEIFERT et al., 2003).
Alguns fármacos que possuem atividade contra outros parasitas também são
utilizados no combate à leishmaniose, tais como os antifúngicos cetoconazol,
itraconazol, fluconazol e terbinafina, que bloqueiam a síntese de ergosterol. Foram
realizados estudos com azitromicina (SILVA-VERGARA; SILVA; MANEIRA, 2004) e
imiquimode (IMIQ) (SEEBERGER; DAOUD; PAMMER, 2003), que apresentaram
eficácia terapêutica em alguns casos. As enzimas envolvidas no metabolismo de
esterol da Leishmania têm sido estudadas como um alvo potencial para a terapia
nos últimos anos. Parasitas da Leishmania contêm predominantemente esteróis
baseados em ergostano, como o ergosterol, que difere do colesterol, o principal
esterol nas células dos mamíferos, pela presença de um grupo metila na posição 24
(JIMÉNEZ-JIMÉNEZ et al., 2008).
O fluconazol é o composto triazóico mais conhecido; é uma alternativa
terapêutica habitual no tratamento de infecções fúngicas sistêmicas específicas
(FICA, 2004). Estudos preliminares com o fluconazol no tratamento de leishmaniose
causada por L. major (que não ocorre no Brasil) indicam eficácia de 79% quando
comparado ao placebo (34%), sugerindo que o fluconazol constitui uma valiosa
alternativa terapêutica, podendo ser usado isoladamente ou como coadjuvante no
17
tratamento, pois inibe a síntese de esteróides específicos e indispensáveis para o
crescimento e viabilidade celular do parasita (ALRAJHI et al., 2002; MONTE NETO;
VERAS, 2006).
A proposta deste trabalho foi a de combinar o fármaco miltefosina com o
fluconazol e veiculá-los em nanoemulsão para obter um produto com vantagens em
relação aos utilizados, tais como: menor toxicidade e maior eficiência para o
tratamento da leishmaniose.
18
2 REVISÃO DE LITERATURA
2.1 NANOTECNOLOGIA
Desde a antiguidade, o homem tem se preocupado em entender e explicar o
comportamento da matéria do ponto de vista filosófico e a ciência se encarregou de
estudar os elementos da matéria do ponto de vista macroscópico. A manipulação em
escala nanométrica de átomos e/ou moléculas teve seu ponto inicial numa palestra
realizada em 29 de dezembro de 1959, por Richard Feynman ganhador do prêmio
Nobel de Física . Neste evento foi proposto que há manipulação de átomos, e que o
homem não necessita aceitar os materiais da forma que a natureza provê, desde
que as leis da natureza sejam respeitadas. Não obstante, avanços significativos só
ocorreram no início da década de 1980, quando surgiram instrumentos que
possibilitaram a nanomanipulação (DURÁN; MATTOSO; MORAIS, 2006).
Nanotecnologia é a técnica de fabricação ou manipulação de entidades que
tenham, pelo menos, dimensão menor que 100 nanômetros. Um nanômetro (nm) é a
medida que corresponde à bilionésima parte do metro ou milionésima do milímetro.
Esse tamanho de escala é aproximadamente 700 vezes menor que um glóbulo
vermelho ou 100 mil vezes menor que o diâmetro de um fio de cabelo (Figura 1)
(USKOKOVIĆ, 2007; ABDI, 2010).
Figura 1 - Representação de uma escala nanométrica.
Fonte: Adaptado de NANOTECNOLOGIA (2012).
19
A nanotecnologia brasileira tem produzido resultados promissores nas áreas
farmacêuticas e de interface com a biotecnologia, como os nanotransportadores,
utilizados no tratamento do câncer (SILVA, 2004a).
O uso de nanomateriais oferece uma liberação controlada e inteligente,
porque pode modular a velocidade da liberação da substância no organismo e
favorecer, em alguns casos, no direcionamento do fármaco evitando seu acúmulo
em tecidos não específicos. Além disto, reduz a toxicidade sistêmica em relação ao
fármaco convencional, por permitir menor dosagem e/ou diminuir o número de doses
para se atingir o mesmo objetivo (RESCIA et al., 2010). Outro ganho é o aumento de
estabilidade do próprio fármaco quando encapsulado em sistemas que são
biodegradáveis, biocompatíveis, atóxicos (LASIC, 1998).
Outras vantagens são oferecidas pelos nanossistemas destacando-se: a
proteção do fármaco no sistema terapêutico contra possíveis instabilidades no
organismo, a manutenção de níveis plasmáticos em concentração constante;
aumento da eficácia terapêutica; liberação progressiva e controlada do fármaco pelo
condicionamento a estímulos do meio em que se encontram (sensíveis à variação
de pH ou de temperatura); diminuição expressiva da toxicidade pela redução de
picos plasmáticos de concentração máxima; diminuição da instabilidade e
decomposição de fármacos sensíveis; possibilidade de direcionamento a alvos
específicos (sítio-especificidade); possibilidade de incorporação tanto de substâncias
hidrofílicas quanto lipofílicas nos dispositivos; diminuição da dose terapêutica e do
número de administrações e aumento da aceitação da terapia pelo paciente
(VERMA, GARG, 2001; DUNNE et al., 2003; TAO, DESAI, 2003).
Os principais nanomateriais utilizados são: lipossomas, nanopartículas
poliméricas (nanocápsula e nanoesfera), nanoemulsões e complexos lipídicos. Cada
um dos nanomateriais permite a associação de substâncias conforme sua natureza
e composição química, e podem ser administrados pelas vias intravenosa, tópica,
intramuscular, ocular e oral. A grande vantagem destas nanopartículas é que elas
modificam a circulação intracelular de fármacos, o que conduz ao aumento da
eficácia e adesão do paciente ao tratamento em razão da diminuição das doses
pois, com a liberação controlada, o intervalo entre as doses pode ser maior
(MARQUES, 2009).
A indústria farmacêutica tem demonstrado interesse nas pesquisas e estudos
de nanopartículas, para modernizar e desenvolver novos sistemas de liberação.
20
Essa tecnologia representa importante avanço no setor farmacêutico e em
várias outras áreas, devido á sua versatilidade, tais como: indústria farmacêutica,
cosmética e de diagnósticos, onde são fabricados medicamentos fundamentados em
nanoestruturas e kits de auto diagnósticos; na indústria automobilística é utilizada na
fabricação de pneus mais resistentes; no setor de fabricação, na construção de
equipamentos para a manipulação de materiais a nível atômico e de novos
microscópios; na indústria de eletrônicos, está sendo utilizada no aumento da
velocidade de processamento; no setor de meio-ambiente, em novos métodos de
reciclagem; na área de defesa, em circuitos de segurança mais eficientes e novos
detectores de agentes químicos (MCTI, 2008).
Sistemas
de
liberação
controlada
como
nanosferas,
nanocápsulas,
lipossomas e nanoemulsões são os principais veículos para incorporação de
princípios ativos. Permitem incorporar mais de um princípio ativo no sistema, com
controle na velocidade de permeação, profundidade e liberação de cada substância,
diminuição da quantidade de princípio ativo e melhor aproveitamento, portanto,
diminuição no custo final do produto. Por isso, o interesse cada vez maior em
sistemas nanométricos, que potencializam de forma significativa os efeitos desejados
em tratamentos farmacêuticos e cosméticos (SILVA, 2004b; NEVES, 2008).
2.1.1 Principais nanopartículas utilizadas na área de saúde
As nanopartículas são classificadas em: nanopartículas lábeis, como os
lipossomas e nanoemulsões, que se dissolvem química e fisicamente após sua
aplicação; e as nanopartículas insolúveis, como os fulerenos e óxidos metálicos, os
quais são incapazes de se desestruturarem nos meios biológicos (ERENO, 2008).
2.1.1.1 Lipossomas
Os lipossomas (Figura 2) são vesículas esféricas compostas de uma ou mais
bicamadas de fosfolipídios (Figura 3), contendo ácidos graxos que constituem a
porção hidrofóbica ou apolar da molécula, capazes de encapsular compostos
21
lipofílicos e a porção hidrofílica ou polar da molécula, formada pelo glicerol, grupo
fosfato e a colina, capaz de encapsular compostos hidrofílicos (LASIC, 1998;
POLOZOVA et al., 1999; VRIES; MARK; MARRINK, 2004; DURÁN et al., 2006).
Embora a fosfatidilcolina seja o principal fosfolipídio utilizado na preparação de
lipossomas, outros fosfolipídios com serina, etanolamina ou inositol ao invés da
colina, também são utilizados.
Na figura 2, deixar o núcleo todo em azul e tirar a palavra “water”, já que você
colocou a indicação do centro aquoso!
Centro aquoso
Bicamada fosfolipídica
Figura 2 - Representação
esquemática
lipossoma.
Fonte: Adaptado de Daniels (2001).
de
um
Figura 3 - Representação esquemática da estrutura química
de um fosfolipídio.
Fonte: Daniels (2001).
A sua estrutura permite a encapsulação de substâncias ativas lipofílicas e
hidrofílicas, sendo formadas por compostos anfifílicos possuem em sua estrutura
uma região apolar e uma região polar, os fosfolipídios (SCARPA, 2004). A bicamada
22
tem propriedades de membrana plasmática, admitindo a permeação dos compostos
encapsulados.
As formulações lipossômicas têm sido de grande utilidade no setor de
cosméticos, visto que estão sendo empregadas na prevenção da queda dos
cabelos, em produtos de rejuvenescimento, clareamento cutâneo, para prevenção e
o tratamento de lipodistrofia ginóide, mais conhecida como celulite, e aumento da
hidratação da pele (PARDEIKE; HOMMOSS; MULLER, 2009).
As principais vantagens dos lipossomas são: transportar substâncias com
propriedades físico-químicas diferentes, como é o caso das hidrofílicas e lipofílicas;
possuir elevada afinidade por membranas biológicas; promover a liberação gradual
das substâncias encapsuladas; proporcionar a entrada mais eficaz através da
camada córnea. Além disso, são compostos biocompatíveis, biodegradáveis,
atóxicos, além de permitir melhor estabilidade química da substância ativa
(SCARPA, 2004).
Os lipossomas, apesar de suas vantagens, apresentam algumas restrições,
tais como: os problemas relacionados à estabilidade, devido à interação dos
fosfolipídios com os componentes do veículo, afetando a estabilidade dos produtos;
a existência de tensoativos em certas concentrações do veículo (superior a 5%), que
resulta na falta de organização da bicamada dos lipossomas, causando seu
rompimento e a formação de micelas mistas (STRÖHER; ARMIJO; RAFFIN, 2010).
2.1.1.2 Nanopartículas poliméricas
As nanopartículas poliméricas (Figura 4) são sistemas transportadores de
substâncias compostas por polímeros biodegradáveis (STRÖHER; ARMIJO;
RAFFIN, 2010). São divididas em nanocápsulas e nanoesferas, que se diferem em
suas organizações estruturais e composições (FRONZA, 2006).
As
nanocápsulas
são
constituídas
por
um
revestimento
polimérico
biodegradável ao redor de um núcleo oleoso, podendo a substância veiculada estar
dissolvida nesse núcleo ou adsorvida na parede polimérica. Enquanto a nanoesfera,
que não apresenta propriedades oleosas em sua composição, é formada por uma
23
matriz polimérica, na qual a substância veiculada pode ficar retida, adsorvida ou
molecularmente dispersa (FRONZA, 2006).
Figura 4 - Representação esquemática de nanocápsulas (a) e nanoesferas (b).
Fonte: Nanomedicina (2012); Diário da saúde (2011).
As principais vantagens das nanopartículas poliméricas usadas como
sistemas transportadores estão ligadas à proteção e à preservação da substância
ativa nelas incorporadas. Isto confere estabilidade frente à degradação enzimática e
química, controle da liberação gradual do ativo em doses favoráveis, aumento da
especificidade de ação, aumento da atividade terapêutica das substâncias,
resultando em doses terapêuticas menores, e conseqüentemente na redução dos
efeitos tóxicos (STRÖHER; ARMIJO; RAFFIN, 2010).
As principais desvantagens são a citotoxicidade dos polímeros, resíduos de
solvente orgânico usado no processo de produção, causando efeito tóxico,
problemas relacionados à estabilidade dos polímeros ou de excipientes, até mesmo
o ativo, devido à agregação de nanopartículas no meio, durante o armazenamento
(STRÖHER; ARMIJO; RAFFIN, 2010).
2.1.1.3 Nanopartículas lipídicas sólidas
As nanopartículas lipídicas sólidas (Figura 5) tem estrutura semelhante à das
nanoemulsões e seu tamanho varia de 5-10 nanômetros, a diferença entre elas está
no núcleo lipídico que se encontra no estado sólido. As nanopartículas lipídicas
sólidas foram desenvolvidas na década de 90 para atuar como um sistema
24
transportador na forma de emulsões, lipossomas, nanopartículas poliméricas e
nanoemulsões; as nanopartículas lipídicas sólidas foram produzidas pela troca do
núcleo oleoso líquido das emulsões por um oleoso sólido (FRONZA, 2006).
Lipídeo
(sólido)
Figura 5 - Representação de uma nanopartícula
lipídica sólida.
Fonte: Adaptado de Daniels (2001).
Uma nova geração de nanopartículas lipídicas sólidas, foi desenvolvida,
devido às limitações das mesmas. Os transportadores lipídicos nanoestruturados,
formados a partir da mistura de lipídeos líquidos e lipídeos sólidos, apresentam
maior capacidade de incorporação dos compostos ativos. Além disso, podem
impedir ou diminuir eventuais expulsões de compostos ativos durante o
armazenamento (STRÖHER; ARMIJO; RAFFIN, 2010).
As desvantagens estão no estado físico do lipídeo, na possibilidade de fusão
por superaquecimento e a capacidade de associação de substâncias, que podem
causar problema na estabilidade durante o armazenamento e administração, com o
aumento do tamanho de partícula, gelificação e a saída do ativo (STRÖHER;
ARMIJO; RAFFIN, 2010).
2.1.1.4 Nanopartículas insolúveis
Existem dois tipos de sistemas nesta classe de nanopartículas: fulerenos
(Figura 6) e óxidos metálicos (dióxido de titânio e óxido de zinco).
25
Figura 6 - Representação de um fulereno.
Fonte: Mundo vestibular (2012).
Os fulerenos, formas alotrópicas do carbono, são moléculas estruturais que
parecem com uma bola de futebol e são formadas por anéis de cinco e seis
carbonos (SOUSA, 2006).
Os fulerenos e seus derivados têm sido alvo de grande investigação nos
últimos anos. Pelo fato de apresentarem dimensões semelhantes às das moléculas
biológicas, podem transportar várias substâncias, com aplicações farmacêuticas e
cosméticas (LENS, 2011).
Nanopartículas de dióxido de titânio e óxido de zinco (Figura 7a e 7b) são
amplamente utilizadas nos protetores solares. Sua função é refletir a luz ultravioleta
e manter a transparência à luz visível, preservando as características de um protetor
solar comum. Sua maior vantagem é deixar apenas uma camada transparente na
pele, se diferenciando dos protetores convencionais, que deixam um aspecto
esbranquiçado (FUNDACENTRO, 2012).
Figura 7 - Representação de nanopartículas de dióxido de titânio (a);
Representação de nanopartículas de óxido de zinco (b).
Fonte: Nanoproduto (2011).
26
2.1.1.5 Nanoemulsões
Uma emulsão (Figura 8) é feita à base de água, óleo e tensoativo ou agente
emulsificante. Macroscopicamente a emulsão é homogênea. Microscopicamente é
composta por gotículas minúsculas dispersas no meio líquido externo contínuo.
Entre as partículas e o meio líquido contínuo está disposto o emulsificante, o
intermediador entre os dois líquidos imiscíveis. O diâmetro das partículas de
emulsão pode ser de alguns poucos nanômetros até alguns micrometros,
dependendo de seus constituintes e, principalmente, de como o emulsificante
consegue estabilizar esta interface (ALMEIDA, TEIXEIRA, KOESTER, 2008;
NANOTECNOLOGIA HOJE, 2011).
Figura 8 - Representação de uma nanoemulsão
(à esquerda) e de uma emulsão convencional (à
direita).
Fonte: Nanotecnologia Hoje (2011).
Um dos grandes desafios da indústria farmacêutica é o desenvolvimento de
medicamentos contendo princípios ativos insolúveis em água. Neste contexto, as
emulsões tornam-se uma ferramenta extremamente útil para aprimoramento de
formulações já existentes, e a introdução de novos fármacos no mercado, uma vez
que, na sua grande maioria, as novas substâncias ativas são insolúveis em água. As
nanoemulsões facilitam a passagem por barreiras biológicas e permitem a liberação
seletiva de fármacos ao tecido. Esta propriedade confere redução dos efeitos
colaterais, que geralmente são decorrentes da ação do fármaco em tecidos onde
este não deveria atuar, e aumento de eficiência.
27
As nanoemulsões (Figura 9) podem ser definidas como uma dispersão
nanométrica de gotículas oleosas em uma fase aquosa externa estabilizada por um
sistema de tensoativos adequados e são utilizadas na fabricação de cosméticos ou
medicamentos (FRONZA; CAMPOS; TEIXEIRA, 2004).
Lipídeo
(Líquido)
Figura 9 - Representação de uma nanopartícula
lipídica – Nanoemulsão.
Fonte: Adaptado de Daniels (2001).
O tamanho reduzido do diâmetro das gotículas faz com que a ação da força
de gravidade se reduza, evitando a formação de sedimentos e floculados durante o
armazenamento do produto, aumentando sua estabilidade (NEVES, 2008;
STRÖHER; ARMIJO; RAFFIN, 2010).
Dentre os procedimentos mais empregados na preparação de nanoemulsões,
tem-se a emulsificação clássica, seguida da redução do diâmetro médio através de
métodos físicos (FRONZA; CAMPOS; TEIXEIRA, 2004; ALMEIDA, TEIXEIRA,
KOESTER, 2008). Este procedimento divide-se em duas etapas: na primeira etapa,
as fases aquosa e oleosa, contendo os componentes hidro ou lipofílicos, são
aquecidas separadamente (a aproximadamente 70 °C); na segunda etapa, as fases
são misturadas e emulsionadas através do uso de homogeneizadores. A emulsão
primária obtida apresenta um diâmetro de gotícula submicrométrico (NAVEH;
MUCHTAR; BENITA, 1994; ALMEIDA, TEIXEIRA, KOESTER, 2008), influenciado
pelo equipamento utilizado e pelas condições operacionais.
28
2.2 DOENÇAS NEGLIGENCIADAS
O vocábulo “negligenciada” tem sua origem de um conjunto formado por “nec”
(latim) e “lego” (grego), “nec” está transformado em “neg” e significa “não”; é um
prefixo negativo; já a raiz grega “lego” é “reunir para si”, “escolher”e também “ler”;
portanto, neg-lego é “não reúno para mim”, “não escolho”, “não leio”; e assim
“negligenciada” representa “não escolhida”, “não eleita”. Ocorridas mudanças o
vocábulo assume o papel de definição interpretado por “menosprezo”, “pouca
atenção” e “descaso” (SOUZA, 2010).
As doenças negligenciadas, muitas vezes denominadas doenças tropicais
negligenciadas, correspondem a um grupo de doenças causadas por agentes
infecciosos e parasitários (vírus, bactérias, protozoários e helmintos) que se tornam
endêmicas em locais de clima tropical e subtropical e em populações que vivem em
condições de pobreza. Estabelece-se um ciclo de perpetuação da pobreza,
desigualdade e exclusão social em razão do impacto na saúde infantil, no
comprometimento da população trabalhadora e na marginalização, promovendo
estigmas sociais (BRASIL, 2010; HOTEZ, 2007).
São raras em países desenvolvidos e de alta prevalência em paises em
desenvolvimento de continentes como África, Ásia e América, sendo a pobreza, o
saneamento básico precário e o baixo acesso à saúde, pontos comuns entre estas
regiões. As infecções relacionadas ao grupo de doenças negligenciadas podem
causar deficiência e desconfiguração, causando marginalização e redução da
produtividade produzindo impacto econômico, social e político e refletindo
diretamente na saúde, educação, agricultura e economia. A Organização Mundial da
Saúde, OMS, classifica as doenças negligenciadas em três categorias, levando em
consideração a urgência do controle e a disponibilidade de medicamentos. Na
primeira categoria estão as doenças que não estão sob controle, sendo estas
dengue, tripanossomíase africana e leishmaniose. Na segunda categoria estão as
doenças
que
embora
apresentem
uma
estratégia
de
controle
disponível
permanecem prevalentes como a malária, esquistossomose e tuberculose. Na
terceira categoria encontram-se as doenças com decréscimo na prevalência como a
hanseníase, doença de Chagas, filariose linfática e oncocercose (COHEN; DIBNER;
WILSON, 2010; LINDOSO; LINDOSO, 2009).
29
Algumas das doenças negligenciadas como a tuberculose, afetam a
população global, outras, como a tripanossomíase africana, têm sua disseminação
mais geograficamente confinada (WHO, 2009).
Tais doenças não despertam interesse da indústria farmacêutica para investir
seus recursos financeiros em pesquisas para o desenvolvimento de novos fármacos
destinados ao seu tratamento, uma vez que o interesse industrial é orientado pelo
lucro e estas doenças atingem populações marginalizadas, de baixa renda, pouca
influência política e com prevalência nos países em desenvolvimento (WHO, 2009;
TROUILLER et al., 2002; WERNECK; HASSELMANN; GOUVÊA, 2010).
O interesse no desenvolvimento de novos produtos para tratar ou prevenir
essas doenças, é ressaltado na comunidade acadêmica e necessário para resolver
sérios problemas de saúde, que afligem uma grande parcela da população mundial.
No entanto, os limitados orçamentos da Saúde Pública impossibilitam grandes
avanços na pesquisa e desenvolvimento de novos medicamentos, testes
diagnósticos, vacinas e outras tecnologias para esses mercados (COHEN, DIBNER,
WILSON, 2010; YAMEY, 2002).
No Brasil, em 2008, o Ministério da Saúde juntamente com o Ministério da
Ciência e Tecnologia promoveram a segunda Oficina de Prioridades de Pesquisa em
Doenças Negligenciadas, onde estabeleceram a dengue, doença de Chagas,
leishmanioses, hanseníase, malária, esquistossomose e tuberculose como as sete
prioridades de atuação do programa em doenças negligenciadas (WERNECK;
HASSELMANN; GOUVÊA, 2010).
Em 2003, foi criada pela Organização Não Governamental - ONG Médicos
Sem Fronteiras, a DNDi (Iniciativa de Desenvolvimento de Medicamentos para
Doenças Negligenciadas), que tem como parceiros fundadores, o Instituto Pasteur
na França, a Fundação Oswaldo Cruz - Fiocruz no Brasil, o Ministério da Saúde da
Malásia e os institutos de pesquisa clínica da Índia e do Quênia. É uma parceria
para desenvolvimento de produtos (PDP) sem fins lucrativos, que trabalha para
pesquisar e desenvolver novos tratamentos para as doenças mais negligenciadas. O
principal objetivo da organização é fornecer, até 2014, de seis a oito novos
tratamentos que atendam às necessidades dos pacientes. Além disso, a DNDi se
esforça também para utilizar e fortalecer a capacidade de pesquisa existente nos
países endêmicos e, também de conscientizar a opinião pública, despertando maior
30
responsabilidade dos governos sobre a necessidade de se desenvolver novos
tratamentos para as doenças negligenciadas (PONTES, 2009).
Em 2012, foi firmada uma parceria entre empresas privadas e a Organização
Mundial da Saúde e Banco Mundial, para incentivar a pesquisa e desenvolvimento
de novos produtos para o tratamento e a prevenção para erradicar 17 doenças
negligenciadas com estimativa de alcançar metas até 2020. Dentre estas doenças
estão a leishmaniose, doença de Chagas e hanseníase, presentes também no Brasil
(WHO, 2012).
As doenças negligenciadas requerem esforços mútuos para que resultados
desejáveis sejam alcançados. É necessária educação sanitária visto que muitas
destas doenças são transmitidas por insetos, água e alimentos contaminados,
características presentes nos países em desenvolvimento. Saneamento efetivo,
acesso à água tratada e intervenções não farmacológicas são fatores essenciais
para a prevenção, combate e diminuição de re-infecção dessas doenças.
2.3 LEISHMANIOSE
A falta de conhecimento, o pouco interesse comercial e a falta de incentivo à
pesquisa fazem com que doenças tão antigas, como a leishmaniose, continuem
afetando a população mundial nos dias de hoje.
A leishmaniose é uma doença tropical infecciosa, não contagiosa, causada
por parasitas do gênero Leishmania sp, que invadem e se reproduzem dentro das
células que fazem parte do sistema fagocitário, os macrófagos da pessoa infectada
(MAIA et al.,2007).
As leishmanioses são antropozoonoses consideradas um grande problema de
saúde pública, representam um complexo de doenças com importante espectro
clinico e diversidade epidemiológica, contaminando os animais vertebrados por meio
da picada das fêmeas de mosquitos pertencentes ao gênero Phlebotomus sp,
presente na Europa, Norte da África, Oriente Médio e Ásia e ao gênero Lutzomya
presente na América. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que 350
milhões de pessoas estejam expostas ao risco de contaminação, com registro de
aproximadamente dois milhões de novos casos das diferentes formas clínicas ao
31
ano. É considerada uma das seis mais importantes doenças infecciosas pelo seu
alto coeficiente de detecção e capacidade de produzir deformidades (BRASIL,
2007).
Com o desenvolvimento que acompanha a evolução da humanidade, a
construção de novas estradas e a expansão das cidades, levam o homem a invadir
o ambiente natural de numerosas zoonoses, como é o caso da leishmaniose, tendo
como conseqüência a inclusão do homem no ciclo de desenvolvimento da doença.
O hábito de se criar animais domésticos aumenta ainda mais a probabilidade de
contaminação humana de certas zoonoses (KRAUSS et al., 2003).
A epidemiologia e as características clínicas da leishmaniose variam
conforme a interação de diversos fatores nos parasitas, vetores, hospedeiros e os
ambientes envolvidos e é considera endêmica em 88 países e territórios, conforme
mostrado nas Figuras 10 e 11 (WHO, 2010; TONIN et al., 2010).
Figura 10 - Principais áreas endêmicas de leishmaniose cutânea no mundo.
Fonte: Adaptado (BAILEY; LOCKWOOD, 2007).
32
Figura 11 - Principais áreas endêmicas de leishmaniose visceral no mundo.
Fonte: Adaptado de WHO (2012a).
A Leishmania é um protozoário pertencente ao Reino Protista, Sub-reino
Protozoa ordem Kinetoplastida, família Trypanosomatidae, gênero Leishmania subgênero Leishmania e Viannia (REY, 2008).
Existem relatos e descrições encontradas na literatura desde o século I
depois de Cristo (d.C.) da existência da Leishmaniose Tegumentar Americana (LTA).
Nas Américas, foram encontradas cerâmicas datadas de 400 a 900 anos d.C., feitas
por índios do Peru, que representam mutilações de lábios e nariz, característico na
leishmaniose mucocutânea. Mais tarde, com os estudos de paleomedicina, foram
descobertas múmias com lesões de pele e mucosa características da
leishmaniose (BASANO; CAMARGO, 2004).
Na Índia, em 1885, Cunningham fez a primeira observação do parasita do
gênero Leishmania, em casos de leishmaniose visceral. Ross, em 1903 também
observou o gênero Leishmania e no mesmo ano, Wright descobriu o agente
etiológico do botão do oriente incluindo-o no mesmo gênero com o nome de
Leishmania tropica (MELO et al., 2005).
A leishmaniose foi identificada no Brasil em 1855, ano em que Cerqueira
observou e constatou a existência da moléstia na pele, identificando-a clinicamente
como “botão da Bahia” ou “botão de Briska”. Na Itália, em 1895, Breda descreveu a
moléstia em italianos provenientes de São Paulo. Durante a construção da Estrada
de Ferro no Brasil ocorreram vários casos, especialmente na região de Bauru, o que
levou a doença a ser conhecida como úlcera de Bauru, classificada, em 1911, por
33
Gaspar Vianna como sendo Leishmania braziliensis (BASANO; CAMARGO, 2004;
MELO et al., 2005). Até a década de 1970, todos os casos de LTA eram
classificados como L. braziliensis. Com o avanço e aprimoramento das técnicas
diagnósticas e o maior conhecimento da doença, outras espécies foram descritas
totalizando seis espécies causadoras da LTA (BASANO; CAMARGO, 2004).
No Brasil, a LTA é uma doença com diversidade de agentes, de reservatórios
e de vetores que apresenta diferentes padrões de transmissão e conhecimento
ainda limitado sobre alguns aspectos, o que a torna de difícil controle. É uma das
afecções dermatológicas que demanda maior atenção devido à sua magnitude,
assim como pelo risco de ocorrência de deformidades que pode produzir no ser
humano (BRASIL, 2007).
As leishmanioses são causadas por parasitas que podem ser de diversas
espécies pertencentes ao gênero Leishmania sp.e a família Trypanossomatidae e
estão entre as principais causas de morbidade e mortalidade em todo o mundo e
podem ser classificadas conforme seus sintomas clínicos em Leishmaniose Cutânea
(LC), Leishmaniose Mucocutânea (LMC) e Leishmaniose Visceral (LV), sendo
comum a classificação das formas cutâneas e mucocutâneas em uma única forma a
Leishmaniose Tegumentar Americana (LTA) ( BOSE et al., 2007; REY, 2008).
Nas Américas, são atualmente reconhecidas 11 espécies dermotrópicas de
Leishmania causadoras de doença humana e oito espécies descritas, somente em
animais. No entanto, no Brasil já foram identificadas sete espécies, sendo seis do
subgênero Viannai e uma do subgênero Leishmania. As três principais espécies são:
L. (V.) braziliensis, L.(V.) guyanensis e L.(L.) amazonensis e, mais recentemente, as
espécies L. (V.) lainsoni, L. (V.) naiffi, L. (V.) lindenberg e L. (V.) shawi foram
identificadas em estados das regiões Norte e Nordeste (BRASIL, 2007).
Os vetores da leishmaniose são insetos denominados flebotomíneos,
pertencentes à ordem Díptera, Família Psychodidae, subfamília Phlebotominae,
gênero
Lutzomyia,
conhecidos
popularmente,
dependendo
da
localização
geográfica, como mosquito palha, tatuquira, birigui, entre outros. No Brasil, as
principais espécies envolvidas na transmissão da doença são: Lutzomyia
flaviscutellata, L. whitmani, L. umbratilis, L. intermedia, L. wellcome e, L. migonei
(SVS/MS, 2007). Cerca de 500 espécies diferentes, de tamanho menor que os
pernilongos comuns e que, geralmente, não ultrapassam 0,5 cm de comprimento.
34
Devido aos seus hábitos hematófagos, apenas as fêmeas transmitem o parasita
(BASANO; CAMARGO, 2004).
Durante seu ciclo de vida, o parasita possui dois hospedeiros, sendo um
invertebrado, um inseto, e outro vertebrado, podendo afetar uma grande parte de
mamíferos. No hospedeiro vertebrado a Leishmania sp. é encontrada na sua forma
amastigota e no hospedeiro invertebrado o parasita se desenvolve no tubo digestório
assumindo sua forma promastigota (REY, 2008).
A transmissão acontece quando a fêmea do flebotomíneo pica hospedeiros
vertebrados contaminados, adquirindo a forma amastigota do parasita, que no tubo
digestório do inseto evolui para a forma promastigota. Ao ingerir o sangue de um
novo animal vertebrado, o inseto regurgita e inocula a forma promastigota
transmitindo a doença (REY, 2008). Na pele do hospedeiro, os macrófagos
fagocitam o parasita, que retorna à sua forma amastigota, que se multiplica até o
rompimento da célula, liberando os parasitas na corrente sanguínea e infestando
outros macrófagos, desencadeando uma reação inflamatória (MAIA et al., 2007). A
Figura 12 ilustra o ciclo parasitário da leishmaniose.
Figura 12 - Ciclo parasitário da leishmaniose.
Fonte: Adaptado de DPDx (2009).
35
O diagnóstico da leishmaniose é realizado pela avaliação dos aspectos
epidemiológicos, clínicos e laboratoriais. O diagnóstico clínico baseia-se nas
características da lesão associadas à anamnese e o diagnóstico laboratorial
depende da identificação de amastigotas em tecido ou da forma promastigota em
meios de cultura (GONTIJO; CARVALHO, 2003).
O diagnóstico da LTA é realizado por meio de testes parasitológicos com a
biópsia de lesões cutâneas e provas imunológicas (REY, 2008). O diagnóstico da LV
é realizado em material coletado do baço, medula óssea ou linfonodo, assim como a
pesquisa de Leishmania no sangue pela presença de leucócitos. Ambos os testes
não garantem 100% de certeza clínica, pois seus sinais e sintomas clínicos são
comuns a outras doenças negligenciadas como doença de Chagas, malária,
esquistossomose e febre tifóide o que dificulta o diagnóstico (REY, 2008).
As dificuldades de diagnóstico da LV dificultam sua identificação com rapidez,
tornando-o complexo (BRASIL, 2006).
2.3.1 Tratamento da Leishmaniose
Existe grande necessidade de se investir na busca de novos tratamentos para
as leishmanioses, visto que, os atuais modelos consistem na utilização de fármacos
que apresentam toxicidade, alto custo e são comumente administrados por via
parenteral, dificultando a administração, uma vez que estas doenças são endêmicas
nas áreas rurais. Novos fármacos, assim como veículos especiais, e formas não
parenterais de administração devem ser valorizados na tentativa de alcançar um
número maior de doentes.
Os fármacos de primeira escolha para o tratamento das leishmanioses são os
antimoniais pentavalentes como a glucamina e o estibogluconato de sódio sendo a
anfotericina B, miltefosina e pentamidina segunda escolha nos casos em que os
antimoniais não sejam viáveis. O fluconazol e os demais antifúngicos azóis,
apresentam-se como perspectivas para novos tratamentos.
O tratamento da LTA mantém-se com pouca alteração, desde que o médico
brasileiro Gaspar Vianna, em 1912, descobriu a atividade antileishmaniose dos
tártaros eméticos antimoniais trivalentes (RATH et al., 2003).
36
Os antimoniais pentavalentes (SbV) permanecem como os fármacos de
primeira escolha para o tratamento das leishmanioses, utilizados há mais de 50
anos. Dois tipos são comercializados, o antimoniato de N-metilglucamina
(Glucantime®) e o estibogluconato de sódio (Pentostam®) não disponível no Brasil,
conforme mostra a Tabela 1 (LIMA et al., 2007; BRASIL, 2007). Sua taxa de cura é
de 30 a 90% na América, dependendo do tipo e da dosagem utilizada (AMATO et
al., 2008).
Tabela 1 - Estrutura química de antimoniais pentavalentes empregados na clínica médica, com os
respectivos nomes químicos e comerciais.
FÓRMULA ESTRUTURAL
OH
OH
H
N
HO
OH
OH
NOME QUÍMICO / NOME
COMERCIAL
Antimoniato de Nmetilglucamina Glucantime®;
OH
O
O
Sb
Antimoniato de meglumina
OH
OH
O
O
Gluconato de antimônio (V)
HO
OH
sódico ou Estibogluconato de
HO
OH
OH
Sb
O
Sb
sódio
O
Na3 .9H2 O
O
O
O
-
COO
-
COO
Pentostam®
Solustibosan®
OH
O
Sb CH3
Uréia estibamina
Estibamine®
NHCONH2
Fonte: Adaptado Rath et al. (2003).
A administração recomendada pelo Ministério da Saúde do Brasil é de 10 a
20 mg/kg/dia de Glucantime® intravenoso ou intramuscular, por um período de 20
dias, no tratamento das formas cutâneas localizadas e disseminadas. Caso não
37
ocorra a cicatrização completa três meses após o término do tratamento, o esquema
deverá ser repetido por um período de 30 dias. Persistindo o insucesso terapêutico,
deve ser utilizado um dos fármacos de segunda escolha (FUNASA, 2000).
O mecanismo de ação dos Sbv é pouco conhecido. Nos testes in vitro
apresentam pouca eficácia contra a Leishmania, contrastando com os bons
resultados clínicos, possivelmente devido a
estímulo do sistema imunológico
(SILVA, 2006).
Os antimoniais provocam diversos efeitos colaterais, que incluem alterações
gastrintestinais, hepáticas, renais e cardíacas (RATH et al., 2003; SAMPAIO et al.,
1988). As queixas citadas são geralmente discretas ou moderadas e raramente
exigem a suspensão do tratamento, porém, doses de 20 mg/Sb v/kg/dia podem
atingir o limiar de toxicidade, podendo alterar as funções cardíacas ou renais sendo
necessário o abandono do tratamento (FUNASA, 2002).
A anfotericina B, é um fármaco de segunda escolha, quando não se obtém
resposta ao tratamento com antimonial, ou na impossibilidade de seu uso. O
desoxicolato de anfotericina B, é um antibiótico poliênico utilizado em infecções
fúngicas sistêmicas. O fármaco é eficaz in vitro e in vivo contra os parasitas do
gênero Leishmania (BERMAN, 1997).
O produto comercial que contém o fármaco é o Fungizon®, forma
farmacêutica
comercializada,
que
consiste
em
uma
infusão
intravenosa,
apresentada em frasco de 50mg. A dose inicial é de 0,5 mg/kg/dia e deve ser
aumentada gradativamente, conforme a tolerância do paciente. A administração é
feita em dias alternados, respeitando o limite máximo de 50 mg por aplicação, e o
medicamento deve ser diluído em soro glicosado, um empecilho para pacientes
diabéticos (GONTIJO et al., 2003; FUNASA 2002).
Buscando formulações menos tóxicas e mais eficazes de anfotericina B foram
desenvolvidos lipossomas e complexos lipídicos. Dois produtos, anfotericina B
lipossômica (Ambisome ®, Nextar, San Dimas, Califórnia, EUA) e complexo lipídico
de anfotericina B (ABLC anteriormente, agora Abelcet®, da empresa Liposome,
Princeton, New Jersey, EUA) também foram estudados na leishmaniose. Outras
preparações incluem anfotericina B lipossômica produzida na Índia e de dispersão
coloidal de anfotericina B (Amphocil®, Sequus Pharmaceuticals Menlo Park,
Califórnia, EUA) (BODHE, 1999).
38
A anfotericina B liga-se a esteróis na membrana plasmática de fungos e
também do parasita da leishmaniose. Os efeitos colaterais variam entre febre e
calafrios a anemia grave, hipocalemia e insuficiência renal, que pode ser reduzida
por hidratação adequada e infusão mais lenta do fármaco (BERMAN, 1997).
O isotionato de pentamidina é a terceira opção de tratamento. Devido à sua
toxicidade, longos ciclos de tratamento e resultados duvidosos, este é um fármaco
de reserva para o tratamento da leishmaniose visceral (THAKUR; KUMAR;
PANDEY, 1991).
São apresentadas na forma de isotionato de pentamidina (Tabela 2) e
mesilato de pentamidina. No Brasil é comercializado o isotionato de pentamidina. A
dose recomendada é de 4 mg/kg/dia, por via intramuscular profunda, de 2 em 2 dias
e os efeitos colaterais relatados são: dor no local da aplicação, náuseas, vômitos,
tontura, mialgias, cefaleias, hipotensão, lipotimias e hiperglicemia (FUNASA, 2002).
O fármaco danifica o DNA do cinetoplasto do complexo mitocondrial e blocos de
RNA e síntese protéica. A toxicidade da pentamidina impede a sua ampla aplicação
(GOA; CAMPOLI-RICHARDS, 1987).
Tabela 2 - Outros fármacos empregados na terapia da leishmaniose, com os respectivos nomes
químicos e comerciais.
FÓRMULA ESTRUTURAL
NOME QUÍMICO / NOME
COMERCIAL
HN
NH
Isotionato de pentamidina
NH2
Lomidina®
OCH2(CH2)3CH2O
H2N
OH
H3C
H3C
HO
OH
O
O
OH
OH
OH
OH
OH
O
H3C
O
COOH
NH2 OH
HO
O
Anfotericina B
Fungizone®
CH3
-
O
O P O
+
N (CH3)3
Miltefosina
O
Fluconazol
Fonte: Adaptado Rath et al. (2003).
39
Aminosidina é um antibiótico aminoglicosídeo idêntico à paramomicina
produzido por Strepromyces. Apresenta atividade contra a Leishmania in vitro e em
animais. Seu mecanismo de ação ainda é desconhecido (SCOTT, 1992).
Estudos no Quênia, Sudão e Índia demonstraram a eficácia da aminosidina
na dose de 16 a 20 mg/kg/dia, durante 21 dias, apresentando eficácia de 93-97%; a
avaliação da toxicidade está limitada ao pequeno número de estudos (THAKUR et
al., 1993). Parece um fármaco seguro e eficaz, mas a produção e comercialização
não estão disponíveis (SUNDAR, 2001; LOCKWOOD, 1998).
2.3.1.1 Miltefosina
A miltefosina (Tabela 2) é um alquilfosfolipídio, cuja substância química é
denominada
hexadecilfosfocolina,
inicialmente
desenvolvido
como
agente
antineoplásico. Apresentou bons resultados em estudos, primeiramente, com LV na
Índia e posteriormente com a LC no Velho Mundo, sendo que nos últimos dez anos
tem sido estudado contra a LTA na América Latina, apresentando bons resultados.
Sua atividade antileishmaniose foi demonstrada in vitro e in vivo, em estudos
realizados em animais, tanto para as formas amastigotas como promastigotas do
parasita (MORE et al., 2003). Sua ação sobre as formas amastigotas está
relacionada ao efeito sobre os macrófagos ou sobre a resposta imune dependente
da ativação das células T (KUHLENCORD et al., 1992).
A miltefosina, comercializada como Impavido®, está disponível em caixas
com 56 cápsulas com apresentação de 10 e 50 mg. O fármaco foi aprovado pelas
autoridades indianas em março de 2002, para o tratamento da LV. Autoridades
sanitárias da Alemanha e da Colômbia também aprovaram sua comercialização. É o
primeiro medicamento oral, eficaz contra leishmaniose visceral (GUTTERIDGE,
2006).
O estudo de Dorlo e colaboradores (2008), realizado em militares holandeses
que contraíram a LC durante os combates no Afeganistão, e que foram tratados com
doses de 150 mg/dia durante 28 dias, relata que a extrapolação desta dose pode
causar graves efeitos colaterais gastrointestinais.
40
A farmacocinética da miltefosina no tratamento das leishmanioses é escassa.
A ligação às proteínas plasmáticas é de aproximadamente 95% sendo metabolizada
principalmente por fosfolipase D colina, liberando colina contendo metabólitos e
hexadecanol. A meia vida do fármaco é de aproximadamente 7 dias, sendo excretada
principalmente nas fezes (BERMAN, 2005). No estudo realizado nos militares
holandeses, concentrações de miltefosina foram detectadas no sangue num período de
cinco meses após o término do tratamento. Este fator, provavelmente, contribui para o
surgimento de parasitas resistentes (DORLO et al., 2008).
O efeito colateral mais importante apresentado é o vômito, que não ocorre
logo depois da ingestão do fármaco, e, geralmente, desaparece dentro de poucos
dias. Estudos em animais indicam que o uso durante a gravidez deve ser evitado e
que a influência sobre o sistema reprodutivo masculino é possível (SEIFERT et al.,
2003).
A miltefosina tem sido utilizada no tratamento da leishmaniose canina, porém
no Brasil, o procedimento comum é o de sacrificar o animal, o que reduz o número
de reservatórios do parasita e evita o desenvolvimento de resistência ao
medicamento (CROFT; ENGEL, 2006).
2.3.1.2 Fluconazol
Antibióticos antifúngicos azólicos, como fluconazol, cetoconazol, itraconazol e
terbinafina vêm sendo estudados quanto à sua atividade antileishmaniose, pois
bloqueiam
a
síntese
de
ergosterol
(Figura
13).
A
Leishmania
contém
predominantemente esteróis baseados em ergostano, como o ergosterol, que difere
do colesterol (Figura 13), o principal esterol presente nas células dos mamíferos
(JIMÉNEZ et al., 2008).
HO
Ergosterol
HO
Figura 13 - Estrutura química do ergosterol e do colesterol.
Colesterol
41
O ergosterol é um esterol precursor da Vitamina D2, constituinte da
membrana celular dos fungos, com funções semelhantes às do colesterol em células
animais. O fato de os componentes da parede celular de muitos fungos patogênicos
não estarem presentes nas células mamíferas, faz com que a membrana celular dos
fungos se tornem um alvo para o desenvolvimento de antifúngico de menor impacto
para os humanos (REY, 2008).
Os azóis são compostos sintéticos cujo mecanismo de ação consiste na
inibição
da
esterol-14α-desmetilase,
um
sistema
enzimático
microssômico
dependente do citocromo P450, alterando a síntese do ergosterol na membrana
citoplasmática e levando ao acúmulo de 14 α-metilesteróis. Esses metilesteróis não
possuem a mesma forma e propriedades físicas que o ergosterol, levando à
formação da membrana com propriedades alteradas, que não desempenha as
funções básicas necessárias ao desenvolvimento do fungo. Apresentam ação
fungistática ou fungicida (GOODMAN; GILMAN, 1996). A Leishmania lembra um
fungo quanto à síntese de ergosterol na membrana celular, por isso esta via de ação
vem sendo explorada para o tratamento da doença.
O fluconazol não apresenta diferenças significativas quando administrado por
via intravenosa e oral. Os níveis plasmáticos, após administração oral, é cerca de
90% dos níveis obtidos após administração intravenosa. A absorção oral não é
afetada pela ingestão concomitante de alimentos. Em jejum, os picos de
concentração plasmática ocorrem entre 0,5 e 1,5 h após a dose, com meia-vida de
eliminação plasmática de aproximadamente 30 h. As concentrações plasmáticas são
proporcionais à dose. Após 4-5 dias com doses únicas diárias, são alcançados 90%
dos níveis de equilíbrio (PDAMED; 2012).
Tem boa penetração nos fluidos corpóreos e baixa ligação às proteínas
plasmáticas. A principal via de excreção é a renal, com aproximadamente 80% da
dose administrada é encontrada como fármaco inalterado na urina. O clearance do
fluconazol é proporcional ao clearance da creatinina. Não há evidência de
metabólitos circulantes (PDAMED; 2012).
Os efeitos colaterais são geralmente leves e incluem náusea, cefaléia e dor
abdominal.
42
Alguns trabalhos e estudos clínicos têm demonstrado que o fluconazol pode
ser promissor no tratamento da leishmaniose. O fluconazol está sendo testado para
a forma cutânea com resultados favoráveis, devido à sua alta concentração na pele.
O mecanismo de ação destes compostos consiste na inibição da síntese do
lanosterol (PEREIRA; SACRAMENTO; MARQUES, 2011).
Conforme relatado anteriormente, existem vários problemas relacionados ao
tratamento da leishmaniose, como carência de novas entidades moleculares,
desenvolvimento
exclusivamente
de
resistência
endovenosa,
aos
medicamentos,
toxicidade
dos
via
fármacos
de
administração
utilizados
e
baixo
investimento em pesquisa. Por isso, o uso de sistemas nanotecnológicos, como
nanoemulsões baseadas em lipídios e a combinação de fármacos leishmanicidas,
como a miltefosina e o fluconazol, apresentados neste trabalho, representam uma
expectativa promissora quanto ao desenvolvimento de novas formas farmacêuticas
de uso oral mais eficientes e com menor toxicidade.
43
3 OBJETIVOS
3.1 OBJETIVO GERAL
Desenvolver uma nova formulação para administração por via oral,
combinando os fármacos fluconazol e miltefosina, estudar suas propriedades físicoquímicas e estabilidade preliminar.
3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

Desenvolver nanoemulsões para veicular os fármacos miltefosina e
fluconazol;

Caracterização físico-química das formulações;

Avaliar
a
estabilidade
preliminar
da
formulação
durante
o
armazenamento;

Avaliar o comportamento das formulações desenvolvidas em fluidos
gástricos e intestinais simulados;
44
4 MATERIAL E MÉTODOS
4.1 MATERIAL
Os reagentes pepsina A, pancreatina, óleo de semente de algodão, ácido
oléico, Monooleato de Sorbitan Etoxilado 20 EO (Tween® 80), ácido acético,
clorofórmio e metanol foram adquiridos da Sigma Aldrich. A miltefosina foi adquirida
da Hangzhou Dayangchem Co., LTD. (China), fosfatidilcolina e Phosal 53® da Lipoid
GmbH;
glicerina
da
Gerbras
Química
Farmacêutica
Ltda.
O
fluconazol,
butilidroxitolueno (BHT), ácido dietilaminotetracético (EDTA) e manitol da Deg
Importação
e
Exportação
Ltda.
Todos
os
reagentes
e
solventes
foram
disponibilizados pelo Laboratório de Síntese e Formulações.
4.2 EQUIPAMENTOS
4.2.1 Espectrofotômetro UV-Visível
Foi empregado espectrofotômetro da marca FEMTO (São Paulo, Brasil),
localizado no Laboratório de Síntese de Compostos de Coordenação da UNIBAN,
sob responsabilidade da Profa. Regina Mara Pereira. Foram realizadas leituras de
absorbância e transmitância, na região do ultravioleta/visível (UV-VIS) no modo
varredura e em comprimento de onda específico.
4.2.2 Laser Light-scattering
A medida de diâmetro das partículas de emulsão foi realizada por
espalhamento de luz em analisador de potencial Zeta, Zetasizer Nano da marca
Malvern Instruments (Malvern, Reino Unido), no Laboratório coordenado pela Profa.
45
Iolanda Midea Cuccovia (INCT-FCx), Instituto de Química da Universidade de São
Paulo – USP.
4.2.3 Processador ultrassônico
A emulsão foi obtida através da homogeneização em ultrassom, da marca
Sonics® (Alemanha) no Laboratório Síntese e Formulações da Universidade
Bandeirante de São Paulo.
4.2.4 Homogeneizador de alta pressão
O emulsificador Emulsiflex 05 da Avestin (Canadá) foi utilizado para
preparação das formulações a alta pressão.
4.2.5 Phmetro
Foi utilizado para avaliar a estabilidade das formulações quanto à variação de
pH durante o processo de armazenamento, foi utilizado pHmetro Quimis, modelo
Q488RS, do laboratório do professor José Agustín Quincoces Suarez.
4.2.6 Cromatógrafo gasoso (CG)
A análise qualitativa de precipitados presentes nas formulações foi realizada
por cromatografia gasosa em aparelho Agilent 6850, utilizando-se coluna HP-1
(metilsiloxano) de 30 metros, com diâmetro interno de 0,320 mm e espessura do
filme 0,25 µm, com temperatura inicial de 50 ºC, com variação de 30 ºC/min até 300
ºC, permanecendo nesta temperatura por 5 minutos. Utilizou-se nitrogênio como gás
46
de arraste a um fluxo constante de 50 mL/min. As amostras foram diluídas em
metanol para serem injetadas.
4.3 MÉTODOS
4.3.1 Preparo das nanoemulsões
Para se obter uma formulação contendo os fármacos miltefosina e fluconazol,
que apresentasse propriedades organolépticas e físico-químicas adequadas, foram
realizados vários experimentos utilizando as composições descritas na Tabela 3.
Tabela 3 -
Composição das nanoemulsões.
SUBSTÂNCIA
FORMULAÇÃO (mg)
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
Glicerina
100
100
-
200
100
-
100
500
500
-
-
-
500
500
Óleo semente
de algodão
100
100
-
200
100
-
100
500
500
-
-
100
500
500
Ácido oleico
100
100
-
200
100
-
100
500
500
-
-
100
500
500
Fosfatidilcolina
200
200
-
400
200
-
200
1000 1000
-
-
200
1000 1000
Tween 80
100
100
-
200
100
-
100
500
500
-
-
100
500
500
miltefosina
150
82
82
165
165
165
150
750
-
750
-
150
750
-
fluconazol
75
62
62
125
125
125
50
375
-
375
-
75
375
-
Phosal 53®
-
-
500
-
-
500
-
-
-
2500 2500
-
-
-
Manitol
-
-
-
-
-
-
-
-
-
-
-
180
900
900
BHT
-
-
-
-
-
-
-
-
-
-
-
5
25
25
EDTA
-
-
-
-
-
-
-
-
-
-
-
20
100
100
10 g
10 g
10 g
10 g
10 g
10 g
10 g
50 g
50 g
50 g
50 g
10 g
50 g
50 g
Água (qsp)
Foram pesados em um béquer de 10 mL, glicerina, óleo de semente de
algodão, ácido oléico, que correspondem à fase oleosa, e os fármacos fluconazol e
miltefosina.
Em outro béquer de 10 mL, foram pesados a fosfatidilcolina, Tween 80® e a
água em quantidade suficiente para perfazer o total da formulação (fase aquosa). A
47
solubilização da fosfatilcolina foi feita com auxílio do agitador magnético a 60 °C. A
fase oleosa foi vertida sobre a fase aquosa. A mistura foi pré-homogeneizada em
agitador magnético e posteriormente em ultrassom durante 1 minuto, a uma
freqüência de 20 kHz e potência de 130 W. A mistura foi emulsificada em
homogeneizador mantendo-se a pressão entre 10.000 e 25.000 Psi. Durante todo o
processo de emulsificação, a temperatura foi monitorada de modo a permanecer na
faixa de 50 a 65 °C.
Após o processo de emulsificação, as formulações foram transferidas para
tubos plásticos com tampa e centrifugadas durante 30 minutos a 2.500 rpm. As
formulações
produzidas
foram
armazenadas
em
condição
específica
de
temperatura, sendo: sob refrigeração, em temperatura ambiente e/ou incubadas a 40
ºC.
As nanoemulsões 8-11, 13 e 14 foram submetidas a testes de estabilidade
(Tabela 3).
4.3.2 Caracterização físico-química das formulações
As formulações foram caracterizadas através das seguintes análises:
características organolépticas, pH, tamanho das partículas, polidispersidade,
potencial zeta e calorimetria (variação de temperatura para observar transição de
fase).
4.3.2.1 Acidez
A acidez da emulsão é causada pela hidrólise dos triglicerídeos, originando
ácidos graxos livres. O pH das formulações foi medido diretamente através de
pHmetro e por titulação com solução de hidróxido de sódio 0,005N em presença de
fenolftaleína. Diluíram-se 0,25 mL das formulações em 5,0 mL de etanol e titulados
até o aparecimento da coloração rosa.
48
4.3.2.2 Tamanho de partícula, polidispersidade e potencial zeta
Quando ocorre variação nas propriedades físico-químicas das partículas de
emulsão, há variação do tamanho e aumento da polidispersidade, devido à
coalescência entre partículas que pode ocorrer com perda de alguns dos
componentes da emulsão. Para avaliar o tamanho, polidispersidade e potencial zeta
foram diluídos 50 μL das formulações 13 e 14 em 4,0 mL de água purificada.
Adicionou-se 1,0 mL desta solução em cubeta de vidro e realizou-se a análise no
equipamento de Laser Light-scattering.
4.3.2.3 Análise calorimétrica
Uma alíquota de 5,0 mL da formulação 13, nanoemulsão contendo os ativos
miltefosina e fluconazol, foi submetida à variação de temperatura de 20-80 oC. Foi
realizada uma primeira leitura no UV a 20 oC e, em seguida, a amostra foi aquecida
até alcançar 25 oC, sendo mantida nesta temperatura por 5 minutos, e realizando-se
nova leitura no UV. Este mesmo processo foi repetido sucessivamente até atingir
80.oC, elevando-se a temperatura a cada 5 oC.
4.3.3 Estabilidade preliminar das formulações
A estabilidade preliminar foi analisada através da centrifugação das
formulações
imediatamente
após
o
preparo
(item
4.3.1
-
preparo
das
nanoemulsões), comportamento em fluidos gastrointestinais simulados e variações
de pH (item 4.3.2.1 - acidez) e propriedades organolépticas durante o período de 3
semanas, armazenadas sob refrigeração (4 a 8 oC).
49
4.3.3.1 Estabilidade em fluidos gastrointestinais simulados
As formulações 13 e 14 na concentração de 1% (m/v) foram incubadas a
37°C, sob agitação branda em meio gástrico simulado (USP XXIV; pH.1,2; pepsina
0,32% m/v) e em meio intestinal simulado (USP XXIV; pH 7,5; pancreatina 1% m/v).
Foram coletadas amostras nos tempos 0, 1, 2, 3 e 4 h, as quais foram analisadas
em UV-Vis.
4.3.4 Análise Estatística
Os valores obtidos nas análises de caracterização físico-química referentes
ao pH, tamanho de partícula e polidispersidade foram representados como valor
médio. O conjunto de dados referente às populações com diferentes tamanhos de
partículas (polidispersidade) foi analisado pelo teste Mann-Whitney e Levene’s,
utilizando software Minitab versão 16.
50
5 RESULTADOS E DISCUSSÃO
Para o desenvolvimento deste projeto, as matérias-primas foram selecionadas
considerando-se a disponibilidade e viabilidade técnica, sendo: fase oleosa: glicerina
1%, óleo de semente de algodão 1%, ácido oléico 1%; fase aquosa: fosfatidilcolina
2%, Tween 80® 1% e água purificada em quantidade suficiente para completar o
volume da formulação. Foram testadas diferentes concentrações das substâncias
ativas miltefosina e fluconazol. A Tabela 3 (página 46) apresenta a composição das
nanoemulsões.
O trabalho de Bitencourt (2011) descreve estabilidade físico-química
satisfatória da formulação base, fase oleosa e fase aquosa supracitada, e que foi
adotada para o desenvolvimento desta pesquisa. Neste mesmo trabalho, também foi
demonstrado que o uso de miltefosina na concentração de 150 mg possui, além de
sua ação terapêutica, uma função auxiliar de co-emulsificante, resultando em
formulação com aspecto translúcido.
O uso de fluconazol 75 mg, em associação com miltefosina 150 mg, foi
proposto a fim de obter uma formulação em nanoemulsão, que em geral, apresenta
maior biodisponibilidade e menor toxicidade. A estabilidade físico-química da
formulação mostrou-se satisfatória para concentração máxima de 0,75 % (p/v) de
fluconazol, a qual poderá ser futuramente estudada quanto à sua aplicação clínica.
Foram produzidas 14 formulações (Tabela 3 – página 46), das quais, as sete
primeiras tiveram caráter preliminar para definição de composição. As formulações
de 8 a 11 formam submetidas a diferentes condições de armazenamento. A
formulação 12 foi preparada para estudo informativo, sem adição de glicerina, não
fazendo parte do escopo de testes deste trabalho.
As formulações 13 (amostra) e 14 (controle) mostraram-se promissoras ao
estudo e foram submetidas a testes de controle de qualidade, que incluíram:
aspecto; pH; acidez; tamanho de partícula; polidispersidade; potencial zeta;
calorimetria e estabilidade em fluidos gastrointestinais simulados, ambos com leitura
em UV-Vis.
A Tabela 4 mostra uma visão geral dos resultados obtidos para as diferentes
formulações estudadas.
51
Tabela 4 FORMULAÇÃO
Características gerais das nanoemulsões preparadas.
FORMOU FORMOU
NANOPRECIPIEMULSÃO? TADO?
HOUVE
CONDIÇÃO DE
SEPARAÇÃO ARMAZENADE FASE?
MENTO
COMENTÁRIO
1
sim
Sim
Não
Ref
Formou ppt de cor cinza, que foi analisado por CCD,
que demonstrou ausência dos ativos.
2
sim
Sim
Não
Ref
Após 5 dias, formou ppt branco, característico de um
aglomerado e flóculos brancos em suspensão.
3
sim
Sim
Não
Ref
Após 5 dias, formou ppt branco, característico de um
aglomerado e flóculos brancos em suspensão.
4
não
n/a
n/a
n/a
Foi descartada devido a não formação de
nanoemulsão.
5
sim
Sim
Não
Ref
Após 5 dias, formou cristais finos, bem definidos, de
tamanho aproximado de 0,5 a 1 cm.
6
sim
Sim
Não
Ref
Após 5 dias, formou cristais finos, bem definidos, de
tamanho aproximado de 0,5 a 1 cm.
7
sim
Não
Não
Ref
Após 15 dias, foi observada coalescência, formando
aglomerados.
8
sim
Sim
Sim
Ref; TAmb
T 40°C
Após 15 dias, formou ppt nas amostras armazenadas
a 40°C, e por isto, o estudo foi interrompido.
9
sim
Não
Não
Ref; TAmb
T 40°C
Formulação controle referente à formulação 8, cujo
estudo foi interrompido conjuntamente.
10
sim
Sim
Sim
Ref; TAmb
T 40°C
Após 15 dias, formou ppt nas amostras armazenadas
a 40°C, e por isto, o estudo foi interrompido.
11
sim
Não
Não
Ref; TAmb
T 40°C
12
sim
Não
Não
Ref; TAmb
T 40°C
Formulação controle referente à formulação 10, cujo
estudo foi interrompido conjuntamente.
Formulação sem o uso da glicerina, para estudo
informativo, formou ppt após 10 dias, sem aplicação
de controle de qualidade.
13
sim
Não
Não
Ref
Apresenta estabilidade físico-química.
14
sim
Não
Não
Ref
Apresenta estabilidade físico-química.
NOTA: Ref; sob refrigeração; TAmb: temperatura ambiente; n/a: não aplicável.
Na formulação 1 o precipitado foi analisado por cromatografia de camada
delgada (CCD), e não se identificou miltefosina ou fluconazol. A característica cinza
do precipitado foi atribuída à formação de um possível complexo de coordenação
entre algum dos componentes da nanoemulsão e o titânio liberado do equipamento
de ultrassom.
As concentrações de miltefosina e fluconazol foram diminuídas na formulação
2, com o propósito de obter um equilíbrio molar de 0,2 mmol entre os fármacos. A
formulação
produzida
apresentou-se
límpida
e
translúcida
com
coloração
esbranquiçada, de odor característico das substâncias que a compõem e não houve
formação de precipitado. Isto reforça o estudo prévio (BITENCOURT, 2011), o qual
52
demonstra que a miltefosina, na sua dose terapêutica, também age como coemulsificante. Esta formulação foi acondicionada em tubo plástico fechado e
armazenada sob refrigeração. Após cinco dias observou-se a formação de pequeno
precipitado de cor branca, característico de um aglomerado e a presença de
pequenos flóculos brancos em suspensão. Isto demonstra que houve coalescência
das partículas de nanoemulsão.
A coalescência é um fenômeno de instabilidade que ocorre quando a interface
de duas partículas interage e se fundem, formando uma nova partícula (Figura 14).
Este processo pode produzir agregados macromoleculares e levar à perda dos
fármacos ou outros componentes dissolvidos na fase oleosa do interior da partícula
(SAITO et al., 1999).
W
O
O
W
(a)
(b)
Figura 14 - Representação esquemática (a) e imagem (b) do estado de transição da coalescência
de duas partículas de emulsão.
A figura superior representa duas partículas de emulsão lipídica o/a em contato. Na figura inferior, a
superfície da monocamada está curvada negativamente. “O” representa a fase oleosa e “W” a fase
aquosa.
Fonte: Saito et al. (1999) (a) e Laboratório de Síntese e Formulações (b).
Para avaliar uma alternativa de formulação base, foi usado o produto
comercial Phosal 53®, da empresa Lipoid, a qual não fornece as porcentagens de
cada componente presente na fórmula (Formulação 3). Sabe-se que o Phosal 53®é
composto por lecitina, triglicerídeos dos ácidos capróico e caprílico, etanol, estearato
de glicerila e palmitato de ascorbila, e que a fração de fosfolipídios supera 50%.
53
O uso da base pronta Phosal 53® resultou em formulação sem alterações
macroscópicas, quando comparado com o uso da base preparada para este estudo,
no momento da preparação. Porém, cinco dias após a preparação observou-se um
precipitado branco, característico de um aglomerado e flóculos brancos em
suspensão.
Na formulação 4, ambas as fases foram concentradas, na tentativa de
melhorar a estabilidade físico-química, esperando-se reduzir a migração do fármaco
de dentro da partícula para a fase contínua. Mesmo após o preparo tecnológico, no
emulsificador, a formulação permaneceu com cor branca leitosa e muito opaca,
sugerindo que a formulação não apresentava características de uma nanoemulsão.
Esta formulação foi descartada, pois macroscopicamente, suas características foram
insatisfatórias.
Nos estudos subseqüentes (Formulação 5, com base preparada e
Formulação 6, com base pronta) foram mantidas as concentrações iniciais dos
componentes base da formulação, aumentando-se as massas da miltefosina para
165 mg e do fluconazol 125 mg. Após cinco dias observou-se a formação de
precipitado, característico de cristais, bem definidos, de tamanho aproximado
de 0,5 a 1 cm, que estão mostrados na Figura 15.
(a)
Figura 15 - Formulação 5 (a) e formulação 6 (b).
(b)
O precipitado formado foi analisado em cromatógrafo a gás e foi confirmado
tratar-se do fluconazol (Figura 16). Esta observação foi de suma importância, pois se
constatou que a característica anfifílica do fluconazol favorece a migração e/ou
incorporação parcial da substância na partícula. Em decorrência deste resultado os
estudos foram conduzidos com propósito de diminuir a força iônica da fase contínua,
e as interações intermoleculares do tipo ligações de hidrogênio entre o fluconazol e
a fase aquosa e do tipo Van der Waals.
54
Figura 16 - Cromatograma do fluconazol padrão (a) e do precipitado da formulação 5 (b).
De acordo com a figura anterior (Figura 16a), o tempo de retenção do
fluconazol utilizado no desenvolvimento das formulações é de 6,9 minutos e o
precipitado da formulação 5 (Figura 16b), apresenta um pico no mesmo tempo de
retenção, confirmando tratar-se do fluconazol. A análise foi apenas de caráter
qualitativo.
55
Na formulação 7, diminuiu-se a massa de ambos os fármacos, sendo
miltefosina 150 mg e fluconazol 50 mg, respectivamente, na tentativa de evitar a
formação de precipitado. Após 15 dias observou-se coalescência das partículas
levando à formação de aglomerados. Como inicialmente a formulação permaneceu
estável, foram preparados lotes maiores para estudos de estabilidade. Portanto,
foram produzidos lotes de 50 g para as formulações 8, 9, 10 e 11 (Tabela 3). Os
lotes produzidos foram submetidos a diferentes temperaturas de armazenamento
(Ambiente, refrigeração e 40 ºC) e durante o período de incubação a 40 ºC, as
formulações precipitaram. Desta forma, os estudos foram focados na investigação
das interações intermoleculares entre o fluconazol com a fase aquosa e com os
demais componentes da formulação.
No intuito de minimizar a atração do fluconazol pela fase aquosa e melhorar a
retenção do mesmo nas partículas de emulsão, foi proposto a adição de manitol, que
interage com os grupos hidroxila da fase aquosa. As interações intermoleculares do
manitol com a água, por meio de ligações de hidrogênio, são mais fortes quando
comparadas com as interações intermoleculares do fluconazol com a água, devido à
maior eletronegatividade do oxigênio (grupos hidroxila do manitol) em relação ao
nitrogênio, presente nos anéis azólicos do fluconazol. Desta forma, o fármaco
mantém-se no interior das partículas ou entrelaçado na monocamada. A estabilidade
do sistema como um todo, depende da interação entre as moléculas que formam as
partículas e a fase contínua.
Com base nas considerações anteriores foram produzidas as formulações 13
(15 mg/mL de miltefosina e 7,5 mg/mL de fluconazol) e 14 (controle sem os
fármacos) (Figura 17), com adição de manitol, butilidroxitolueno (BHT) e ácido
etilenodiaminotetracético (EDTA). Obtiveram-se formulações com as seguintes
características:

Formulação 13, contendo os fármacos: límpida, translúcida de cor
levemente esbranquiçada, característica de uma nanoemulsão e de odor
característico dos componentes.

Formulação 14, controle sem os fármacos: límpida, opaca, leitosa, de cor
branca, não apresentando características visuais de uma nanoemulsão;
o odor é característico dos componentes da formulação.
56
Figura 17 - Formulações 13 (A) – com os
fármacos; e 14 (B) – sem os fármacos.
As formulações 13 e 14 foram acondicionadas em frascos plásticos fechados,
armazenadas sob refrigeração e submetidas à caracterização físico-química e
estabilidade preliminar.
Variações de pH são um indicativo de instabilidade química dos componentes
da formulação passíveis de hidrólise, como é o caso dos triglicerídeos e
fosfatidilcolina, além dos próprios fármacos. Isto pode afetar a estabilidade das
nanopartículas levando à coalescência e posterior separação de fases. Por isso,
dados de variação de pH são de extrema importância para prever fenômenos de
instabilidade em sistemas nanoemulsionados. A análise direta de pH, com auxílio de
pHmetro, mostrou que durante o período analisado não houve alteração (Tabela 5).
Tabela 5 - Análise de pH das Formulações 13 e 14 durante o período de 20 dias, armazenadas sob
refrigeração (2 - 4 ºC).
pH
Inicial
Após 10 dias
Após 20 dias
Formulação 13
4,2
4,2
4,2
Formulação 14
4,2
4,2
4,3
Nos experimentos para avaliação do pH através da acidez titulável, utilizando
hidróxido de sódio como base, observou-se que os valores de pH são inferiores
àqueles encontrados na medida direta, indicando que por esta metodologia o índice
de acidez é maior. Por este método, ocorre quebra das partículas e é medida a
acidez total do sistema. Porém, a maior acidez pode ser conferida pela hidrólise dos
57
triglicerídeos a ácidos graxos livres, sendo, portanto, um método inadequado para
esta análise.
O tamanho da partícula é um parâmetro importante no processo
de controle de qualidade, pois a estabilidade física de dispersões depende do
tamanho e distribuição das partículas (MULLER-GOYMANN, 2004).
As análises de tamanho de partícula medidas através de espalhamento de luz
a Lazer em equipamento Light-Scattering mostraram que o tamanho das partículas é
de ordem nanométrica para ambas as formulações, com e sem os fármacos. A
presença do miltefosina, na formulação 13, favoreceu a formação de partículas
menores quando comparadas com a formulação 14 (Tabela 6), atingindo o objetivo
proposto de formular uma nanoemulsão conforme ilustrado no gráfico da Figura 18.
Tabela 6 - Resultados de tamanho de partícula, polidispersidade e potencial zeta para as
formulações 13 e 14, obtidos por Laser Light-Scattering.
Parâmetros analisados
Formulação 13
Formulação 14
Tamanho de partículas (nm)
49,75
202,5
Polidispersidade
0,256
0,227
Potencial Zeta (mV)
-24,3
-44,3
(a)
(b)
Figura 18 - Tamanho das partículas da formulação 13 (a) e do controle, formulação 14 (b).
58
A polidispersidade é uma característica importante para a estabilidade
físico-química da formulação. Quanto menos polidispersas estiverem as partículas,
mais estável a formulação se apresenta, evitando a agregação e a coalescência
(MULLER-GOYMANN, 2004). Numericamente, o valor da polidispersidade da
nanoemulsão controle (14) é um pouco menor que da nanoemulsão contendo os
fármacos (Tabela 6). A polidispersidade das formulações 13 e 14 está representada
na Figura 19.
(a)
(b)
Figura 19 - Representação gráfica da polidispersidade da formulação 13 (a) e do controle,
formulação 14 (b).
O equipamento Light-Scattering faz a medição do tamanho de partículas
presentes na porção analisada da amostra ou do controle. A partir dos resultados
obtidos, o software realiza uma extrapolação estatística para fornecer a
polidispersidade correspondente ao tamanho de partículas. O gráfico obtido para a
Formulação 14, controle (Figura 18b), apresenta-se mais afinado em relação ao
gráfico correspondente à Formulação 13, indicando menor polidispersidade para a
formulação controle do que para a formulação contendo os fármacos, conforme
apresentado na Tabela 6. Conforme preconizado para o teste de polidispersidade, a
interpretação gráfica deve ser avaliada frente à significância técnica em relação às
59
formulações farmacêuticas. Com o objetivo de comparar os resultados obtidos para
o controle e para a amostra, foi realizado tratamento estatístico, empregando
software Minitab®, a partir dos dados de tamanho de partícula e correspondente
freqüência fornecidos pelo software de análise de Light-Scattering.
Inicialmente, foram construídos os gráficos tipo histograma para as duas
formulações (Figura 20). A normalidade dos dados foi avaliada e então foi feita
análise de variação do tamanho de partícula da formulação controle e da formulação
contendo os fármacos e foi feita a comparação da média de tamanho de partícula
entre estes dois grupos.
A Figura 20 mostra que a formulação que contém as substâncias ativas,
apresenta menor média estatística de tamanho de partícula e menor variação entre
os tamanhos de partícula.
Histograma da Formulação 13; Formulação 14
Frequência da distribuição de tamanho de partícula
0
Formulação 13
14
25
100 200 300 400 500
Formulação 14
12
20
10
Formulação 13
Média
67,20
Desv io padrão 38,05
N
89
Formulação 14
Média
248,9
Desv io Padrão 110,8
N
97
15
8
6
10
4
5
2
0
0
30
60
0
90 120 150
Tamanho de partícula (nm)
Figura 20 - Histograma da freqüência de distribuição do tamanho de partícula da formulação 13 e
do controle, formulação 14.
Foi verificado que o tamanho de partícula segue distribuição não normal para
ambas as formulações (Figura 21). Esta informação foi considerada para a escolha
da estatística a ser empregada para a comparação da variação do tamanho de
partícula entre os grupos.
60
Gráfico de probabilidade - Formulação 13; Formulação 14
99,9
Variáv el
Formulação 13
Formulação 14
Número de partículas (%)
99
Desv io
Média padrão N
A D v alor-p
67,20 38,05 89 1,921 <0,005
248,9 110,8 97 1,540 <0,005
95
90
80
70
60
50
40
30
20
10
5
1
0,1
-200 -100
0
100
200
300
400
500
600
700
Tamanho de partícula (nm)
Figura 21 - Distribuição porcentual por tamanho de partícula para a formulação 13 e
controle, formulação 14.
Para a comparação da variabilidade do conjunto de dados, foi empregado o
teste de Levene's, por se tratar de distribuição não normal do tamanho de partícula.
O teste retornou valor p < 0,05, o que demonstra que a variação do tamanho de
partícula da Formulação 14 é maior do que a variação do tamanho de partícula da
Fórmula 13, que contém as substâncias ativas. Isto indica que a presença dos
fármacos, em especial da miltefosina, em razão de sua conhecida função de coemulsificador, contribui para a obtenção de nanoemulsão com tamanho de partícula
mais uniforme. A Figura 22 representa a variabilidade do tamanho de partícula para
cada formulação. Observa-se que o tamanho de partícula da Formulação 13, além
de mais uniforme, apresenta menor variação, também apresenta valor médio
significativamente menor do que a média de tamanho de partícula da formulação
controle, a qual não contém os ativos.
61
Gráfico de valores individuais - Formulação 14; Formulação 13
600
Tamanho de partícula (nm)
500
400
300
200
100
0
Formulação 14
Formulação 13
Figura 22 - Representação gráfica da distribuição das partículas por tamanho para a
formulação 13 e o controle, formulação 14.
A obtenção de partículas de tamanho menor na nanoemulsão que contém os
fármacos foi estatisticamente demonstrada empregando teste não paramétrico de
Mann-Whitney, o qual retornou significância nula para a igualdade das medianas
para o tamanho de partícula.
As análises de tamanho de partícula e polidispersidade, em conjunto com o
tratamento estatístico indicam que, embora a dispersão entre as partículas
presentes na nanoemulsão controle seja menor, a nanoemulsão contendo os
fármacos possui tamanho de partícula médio menor e mais uniforme, com menor
variabilidade entre elas.
O arranjo de íons ao redor das partículas, potencial zeta, é importante para a
manutenção da estabilidade das nanoemulsões. Por isso, é ideal que o valor de
potencial zeta seja superior a +30 mV ou inferior a -30 mV para que haja a máxima
repulsão entre partículas de emulsão e as mesmas tenham maior estabilidade . As
formulações 13 e 14 apresentaram valor médio de potencial zeta de -24,3 mV e
-44,3 mV, respectivamente (Figura 23). Valores elevados de potencial zeta
contribuem para estabilidade das nanoemulsões, porém existem outros parâmetros
como polidispersidade, temperatura, pressão, incidência de luz, pH do meio e
estabilidade química dos componentes, que também contribuem para a estabilidade
das mesmas.
62
(a)
(b)
Figura 23 - Representação gráfica do potencial zeta da formulação 13 (a) e do controle, formulação
14 (b).
Nanopartículas lipídicas podem ser sólidas ou líquidas, porém existem
estados físicos intermediários pelos quais elas podem passar com a variação da
temperatura. Na transição de fase ocorre reorganização das moléculas que
compõem as partículas, podendo levar à perda de material do seu interior, ou ainda
coalescência, dando início a um processo de progressivo de decomposição das
partículas. Ao submeter a nanoemulsão contendo os fármacos (Formulação 13) à
variação de temperatura observou-se que a transmitância diminui com o aumento da
temperatura (Figura 24).
63
Figura 24 - Variação da transmitância em função do aumento da temperatura para a formulação 13.
Analisando o gráfico anterior, observa-se que a partir de 50 oC a transmitância
começa a diminuir mais rapidamente e na faixa entre 55 e 70 oC devem ocorrer
transições de fase. Até 40 oC não se observa variação expressiva na transmitância,
portanto dentro desta faixa de temperatura é possível boa estabilidade da
nanoemulsão com os fármacos associados, quanto às transições de fase.
Avaliou-se a estabilidade das formulações em fluidos gastrintestinais
simulados, os quais podem degradar as partículas da nanoemulsão liberando os
fármacos, que na forma livre podem sofrer agregação, ou outros fenômenos de
instabilidade, como alteração no tamanho das partículas por coalescência (aumento)
ou contração das mesmas pela ação enzimática (FATOUROS; MULLERTZ, 2007).
Na formulação contendo os fármacos observou-se apenas pequena variação da
absorbância em presença do fluido gástrico simulado (Figura 25a), enquanto que em
presença do fluido intestinal simulado não se observou variação (Figura 25b). De
acordo com estes dados, é possível prever boa estabilidade para a nanoemulsão em
ambas as situações.
64
3,5
Formulação 13 - Em fluido gástrico simulado.
3
2,5
2
ABS
0h
1h
2h
1,5
3h
4h
1
0,5
0
200
250
300
350
400
450
500
550
600
650
Comprimento de onda (nm)
(a)
3
Formulação 13 - Em fluido intestinal simulado.
2,5
2
0h
1h
ABS
2h
1,5
3h
4h
1
0,5
0
200
250
300
350
400
450
500
550
600
Comprimento de onda (nm)
(b)
Figura 25 - Comportamento da formulação 13 (contendo os fármacos) em fluido
gástrico simulado (a) e fluido intestinal simulado (b).
A nanoemulsão controle sofreu maior ação das enzimas, principalmente da
pepsina, presente em fluido gástrico simulado (Figura 26a), isto provavelmente se
deve ao maior tamanho das partículas, que sofrem maior influência da enzima. Já,
no fluido intestinal simulado, a variação foi muito pequena (Figura 26b).
65
3,5
Formulação 14 - Em fluido gástrico simulado.
3
2,5
2
ABS
T0
T1
T2
T3
T4
1,5
1
0,5
0
200
250
300
350
400
450
Comprimento de onda (nm)
500
550
600
(a)
3,5
Formulação 14 - Em fluido intestinal simulado.
3
2,5
2
ABS
T0
T1
T2
1,5
T3
T4
1
0,5
0
200
250
300
350
400
450
500
550
600
Comprimento de onda (nm)
(b)
Figura 26 - Comportamento da formulação 14 (controle) em fluido gástrico simulado (a) e
fluído intestinal simulado (b).
Os resultados obtidos mostram que as formulações 13 e 14 apresentam boa
estabilidade, podendo ter uso promissor para administração dos fármacos estudados
em nanoemulsão.
Os resíduos oriundos das atividades laboratoriais da presente pesquisa foram
recolhidos, segundo protocolo estabelecido pela instituição, encaminhados para
tratamento específico contribuindo com o meio ambiente e a biossegurança.
66
6 CONCLUSÃO
O objetivo de desenvolver uma nanoemulsão contendo a combinação dos
fármacos
miltefosina
e
fluconazol
foi
alcançado.
Ultrapassar
o
desafio
farmacotécnico de manter os fármacos associados às partículas foi possível com a
adição do manitol, que diminuiu a afinidade do fluconazol impedindo sua migração
para fase aquosa.
Os testes de caracterização físico-química e estabilidade preliminar
demonstraram que as formulações 13 (contendo os fármacos associados) e 14
(controle)
se
organolépticas
apresentaram
e
estáveis
físico-químicas,
quando
tais
como:
avaliadas
pH,
as
tamanho
características
da
partícula,
polidispersidade, potencial zeta e calorimetria.
Considerando o impacto das leishmanioses nas sociedades atuais, e por se
tratarem de doenças que afetam endemicamente as populações carentes dos
países em desenvolvimento, são necessárias alternativas novas e urgentes para
tratamento da doença, como via de administração facilitada, melhora da
biodisponibilidade
e
diminuição
da
toxicidade
dos
fármacos.
Portanto,
a
nanoemulsão contendo os fármacos miltefosina e fluconazol, para uso oral,
desenvolvida neste trabalho, representa uma alternativa promissora a ser explorada
no tratamento da leishmaniose, pois pode contribuir para sanar uma necessidade de
melhora da saúde pública nas regiões afetadas.
O desafio farmacotécnico de se obter uma formulação oral na forma de
nanoemulsão combinando os fármacos miltefosina e fluconazol, promissora para
tratamento de uma doença negligenciada importante como a leishmaniose, foi
alcançado neste trabalho. Como perspectiva de continuidade dos estudos
envolvendo a formulação obtida, será avaliada a atividade leishmanicida in vitro e
posteriormente in vivo, em modelo animal.
67
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