CONFERÊNCIA MASTER "A Experiência de Aprendizagem Mediada: Um Salto para a Modificabilidade Cognitiva Estrutural" Reuven Feuerstein – Israel Modificabilidade Cognitiva Estrutural (MCE) Os seres humanos são vistos como indivíduos que têm a propensão única para modificar-se ou para ser modificado nas estruturas de seu funcionamento cognitivo, à medida que eles respondem às demandas de mudança de situações de vida. Mudanças ocorrem em resposta a estímulos externos e condições internas. A mudança é estrutural quando a mudança de uma parte afeta o todo ao qual pertence; quando o processo de mudança é modificado no seu ritmo, amplitude e direção; quando a mudança produzida é perpetuada refletindo autonomia, natureza auto-regulatória. Diz-se que a MCE ocorre quando as mudanças são caracterizadas por um determinado grau de permanência, profundidade e quando são generalizadas. Os seres humanos são vistos como sistemas abertos, acessíveis a mudanças durante seu tempo de vida, correspondendo às condições de mediação, desde que a intervenção seja apropriadamente direcionada (em quantidade e qualidade) à necessidade do indivíduo. Experiência de Aprendizagem Mediada (EAM) O desenvolvimento cognitivo acontece através de uma interação do indivíduo e o meio ambiente. Desta forma, a interação é afetada por determinadas características do organismo (incluindo aquelas de hereditariedade, maturação e similares) e qualidades do meio ambiente (oportunidades de educação, status socioeconômico, experiência cultural, contatos emocionais com outros significantes). A interação do organismo e o meio ambiente pode acontecer como uma experiência direta de aprendizado, imediatamente posterior à exposição direta à estimulação, e através de uma experiência mediada de aprendizagem que requer a presença e a atividade de um ser humano para filtrar, selecionar, interpretar e elaborar aquilo que foi experimentado. A EAM sustenta que os fatos ambientais e aqueles relacionados ao organismo são determinantes distais do desenvolvimento cognitivo (causando respostas diferenciadas em relação ao meio ambiente), enquanto a EAM constitui o determinante proximal que influencia o desenvolvimento cognitivo estrutural e o potencial da adaptabilidade e da modificabilidade através da experiência. Uma mediação inadequada, direcionada a funções cognitivas, nas fases de entrada, processo e saída do ato mental, não desenvolve, enfraquece ou fragiliza a contribuição para a aprendizagem e para o comportamento cognitivo. Para que a EAM aconteça, um ser humano, intencionalmente, deve colocar-se entre o estímulo e a resposta do aprendiz, com a intenção de mediar o estímulo ou a resposta do aprendiz. Isto é mediação no sentido de que a situação (estímulos e respostas) é modificada pela intensidade da qualidade, pelo contexto, pela freqüência e pela ordem e, ao mesmo tempo, desperta, no indivíduo, a vigilância, a consciência e a sensibilidade. A experiência de interação pode ter a qualidade de repetir ou de eliminar vários estímulos, relacionando eventos no tempo ou no espaço, ou imbuindo a experiência de significado. A EAM requer a presença de três parâmetros que são o objeto de atenção deliberada por parte do mediador: Intencionalidade e Reciprocidade, Transcendência e Significado. Além disso, as variáveis situacionais, no "encontro" (mediador e mediado) apresentam oportunidade para mediar com outros importantes parâmetros de experiência. Regulação e controle do comportamento, sentimentos de competência, diferenciações psicológicas e individualização, comportamento partilhado, persecução de objetivos, planejamento de objetivos e o comportamento para que se possa atingir objetivos, competência/novidade/complexidade, automudança, escolha otimista de alternativas e sentimentos de pertencer a algo – todos esses parâmetros oferecem oportunidade ao mediador de fazer escolhas planejadas e sistemáticas para explorar o potencial de mediação em situações para encorajar o funcionamento cognitivo e estimular a modificabilidade. O processo de mediação vai além de uma simples e orientada tarefa de um produto, de uma orientação de aprendizagem, objetiva tornar o indivíduo capaz de agir independentemente de situações específicas, e isso torna o aprendiz capaz de se adaptar às novas dimensões com as quais ele irá se defrontar. A EAM afeta, de maneira significativa, a capacidade do indivíduo de ser modificado estruturalmente através da exposição direta a estímulos. Quanto mais o indivíduo adquire a EAM, maiores serão os benefícios adquiridos por aquela pessoa em função da exposição direta ao aprendizado; quanto menos EAM for recebida, menos uma pessoa estará apta a aprender a partir da exposição direta e menos adaptável o indivíduo será. Esta é uma parte central da estrutura e da aplicação de LPAD como uma metodologia de avaliação. Funções Cognitivas Deficientes Uma mediação inadequada, direcionada a funções cognitivas, nas fases de entrada, processo e saída do ato mental, não desenvolve, enfraquece ou fragiliza a contribuição para a aprendizagem e para o comportamento cognitivo. Estas deficiências não necessariamente aparecem “in totum” como um repertório completo de características cognitivas do indivíduo que apresenta baixo funcionamento (por exemplo, os que são privados de cultura, os deficientes em aprendizagem, etc). Determinadas deficiências podem aparecer num determinado indivíduo enquanto que em outros podem estar ausentes. De maneiras diferentes, indivíduos diferentes irão necessitar de maior ou menor investimento numa dada função ao invés de outra e serão mais ou menos resistentes a mudanças, de acordo com o perfil de modificabilidade que emerge do processo de avaliação. A presença de uma função cognitiva deficiente, o equilíbrio entre deficiências e funções bem estabelecidas e/ou que possam ser modificadas, e sua evidência no perfil do indivíduo, irão determinar a natureza da intervenção, de acordo com a quantidade de resistência encontrada e a extensão do investimento que se faz necessário para vencê-la. As funções cognitivas deficientes podem ser analisadas à medida em que se manifestam nas três fases do ato mental: a fase de entrada, a fase de elaboração e a fase de saída. As fases de entrada e saída podem ser descritas como periféricas quando comparadas à fase de elaboração, que se constitui no núcleo do ato mental. Esta orientação estabelece uma conexão de funções deficientes e fases do ato mental e ajuda a definir os fatores específicos que estão prejudicando o término da tarefa com sucesso, sugerindo tipos de estratégias para correção. Embora esta divisão seja artificial, de certa maneira (no sentido de que a atividade mental entre as fases é indivisível), ela ajuda tanto no diagnóstico quanto na prescrição. As interações de duas ou mais fases são de vital significado para o entendimento da profundidade da deficiência cognitiva. Uma dimensão adicional – o fator afetivo-motivacional – tem um efeito significativo nas três fases do ato mental. O Mapa Cognitivo Para entender a origem da deficiência cognitiva, faz-se necessária uma análise das características da tarefa para a qual o indivíduo foi convidado a responder. A análise é feita com a ajuda do mapa cognitivo no qual elementos críticos requerem do indivíduo respostas relevantes para o que é solicitado nas tarefas. Os componentes da tarefa interagem com as funções cognitivas na elaboração e na produção de respostas que podem ser adequadas, apropriadas, facilitando o aprendizado e a solução de problemas, ou combinadas, o que poderá gerar falha, inadequação ou ineficiência de desempenho. O mapa cognitivo inclui sete parâmetros através dos quais pode-se analisar uma tarefa: conteúdo, modalidade, fase, operação, nível de complexidade, nível de abstração e nível de eficiência. As tarefas, assim, requerem domínio de elementos que, por sua vez, requerem funções cognitivas adequadas para que o pensamento eficiente aconteça num processo orientado. Objetivos do Programa de Enriquecimento Instrumental Inúmeros objetivos podem servir como normas na seleção e na produção de tarefas a serem incluídas em programas projetados para desenvolver processos cognitivos, comportamento para solução de problemas, raciocínio criativo, raciocínio crítico, modos filosóficos de pensar, ou mesmo o pensamento lateral (como está presente no Programa De Bono). Para se beneficiar de qualquer programa, os alunos devem ter a capacidade de aprender a partir de experiências, quer essas experiências sejam intencionalmente produzidas para desenvolver o raciocínio que venham a emergir de circunstâncias informais às quais os indivíduos podem ser expostos em sua vida cotidiana. A capacidade para aprender não pode ser considerada como algo universalmente e igualmente presente em todos os indivíduos. Algumas pessoas se beneficiam de cada exposição, seja ela acidental ou incidental, não importa o quão organizada seja a experiência, ou se ela não significa uma situação de aprendizado. Outros têm uma capacidade extremamente limitada de se beneficiar destas oportunidades de aprendizado. Estes indivíduos são expostos a experiências, são confrontados com muitas e freqüentemente poderosas fontes de estímulo, e, no entanto, são muito pouco afetados por elas. Para os aprendizes que estão em desvantagem, não é o suficiente disponibilizar esses estímulos; eles precisam ajudar para que os estímulos se tornem acessíveis a eles. Estes indivíduos necessitam de ampliar o número de encontros com estímulos, para que possam se tornar modificados e possam adquirir mais experiência a partir desta exposição. Eles devem se tornar mais flexíveis para que as suas formas anteriores de raciocínio e o esquema estabelecido possam interagir com os novos dados, através de novas formas de percebê-los, novas maneiras de elaborá-los, e maneiras novas e mais adequadas de responder a eles. Através deste processo de assimilação do novo e do mais complexo, e de ser modificado justamente por meio deste processo de assimilação em direção a uma melhor acomodação à nova situação, eles se tornarão mais aptos a se beneficiarem da experiência. Sem o aumento do processo de assimilação e acomodação, a simples apresentação de dados afetará muito pouco a população de indivíduos de baixo funcionamento. Em outras palavras, o objetivo principal de um programa que visa enriquecer indivíduos de baixo funcionamento será o de torná-los permeáveis ao programa, através da criação, nesses indivíduos, de pré-requisitos para o aprendizado, que é o aumento de sua modificabilidade. Para este fim, inúmeros subobjetivos tornam-se necessários. Estes subobjetivos devem guiar a construção do programa e a seleção de seus materiais e conteúdo. Mais ainda, eles devem ser considerados na elaboração didática e técnica do programa, que guiará a interação do professor (transformado em mediador) e o aprendiz (transformado em mediado). Na subseção que segue, apresentaremos os seis subobjetivos que escolhemos como base para o Programa de Enriquecimento Instrumental, cujo objetivo principal é capacitar indivíduos a aprender melhor o que lhes está sendo oferecido pela vida ou pela educação. Subobjetivos do Programa de Enriquecimento Instrumental Correção de Funções Cognitivas Deficientes O que apresentamos como pré-requisitos de aprendizado definimos neste momento como objetivos. O objetivo mais importante está direcionado para a correção de funções deficientes que caracterizem o indivíduo que tem problemas de aprendizado e modificabilidade reduzida. Este objetivo requer que o programa tanto seja projetado quanto aplicado de maneira implícita, na forma em que as tarefas são estruturadas, e de maneira explícita, na forma em que as tarefas são apresentadas. O programa é, portanto, projetado para corrigir aquelas funções cognitivas deficientes, que são responsáveis pela reduzida propensão do indivíduo para a aprendizagem. Aquisição do Repertório de Pré-requisitos O segundo subobjetivo é o de preparar os alunos de maneira sistemática e intencional com os pré-requisitos informacionais, padrões verbais, tipos de relações e modos de operação que eles necessitam para fazer os exercícios. Produção de Generalização e Transferência O terceiro subobjetivo é construir, no próprio programa, uma propensão à generalização e transferência, como uma dimensão do processo de aprendizagem. Este subobjetivo, o mais negligenciado em muitos outros programas, é atingido, principalmente, através do insight. O insight capacita o aprendiz a reconhecer que as funções que se aplicam numa dada tarefa são relevantes e podem ser aplicadas em outras. O insight é, também, orientado para a descoberta (através de um processo de auto-reflexão) dos tipos de modificações produzidas na própria estrutura cognitiva de uma pessoa através da exposição a determinadas experiências. Estas serão a fonte de novas estratégias que podem ser aplicadas a outras situações. Desenvolvimento da Motivação Intrínseca O desenvolvimento de um sistema motivacional intrínseco é o quarto subobjetivo que não deve ser esquecido durante o desenvolvimento de programas para o aprendiz que apresenta desvantagem. Esta motivação intrínseca se faz necessária para assegurar que o aprendiz irá aplicar aquelas regras, princípios, estratégias e conjuntos aprendidos, mais os comportamentos para solução de problemas em situações nas quais não existe uma solicitação explícita para que se aja dessa forma, como na sala de aula (em particular), ou em situações da própria vida (em geral). Desenvolvimento de Motivação Intrínseca voltada para Tarefas A criação de uma motivação intrínseca voltada para tarefas requer a produção de tipos de tarefas que irão motivar o aprendiz em desvantagem e estimular a prontidão para agir em resposta ao apelo da própria tarefa. Para que seja estimulante, o Enriquecimento Instrumental torna estas tarefas acessíveis aos que estão aprendendo, oferecendo-lhes a mediação necessária, cuidadosamente monitorada com relação a necessidades individuais, para ajudá-los a terem sucesso. Quando os alunos alcançam o sucesso, o mediador deixa que trabalhem de maneira independente. Modificação no Papel do Aprendiz O sexto subobjetivo, provavelmente o mais importante para que se possa lidar com os alunos que estão em desvantagem, é criar um sentimento de não serem apenas reprodutores passivos de unidades de informação que lhes são oferecidas como algo pronto, mas como pessoas que são convocadas a gerar novas informações que não existiriam sem a sua contribuição direta. R.F. de MLE para SCM