relato de três casos: efeito do uso do selênio na - BVS SMS-SP

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HOSPITAL DO SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL
RELATO DE TRÊS CASOS: EFEITO DO USO DO SELÊNIO
NA OFTALMOPATIA DE GRAVES
RENATA CHIARI DE FÉO MORAES
SÃO PAULO
2012
RENATA CHIARI DE FÉO MORAES
RELATO DE TRÊS CASOS: EFEITO DO USO DO SELÊNIO
NA OFTALMOPATIA DE GRAVES
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado
à Comissão de Residência Médica do
Hospital do Servidor Público Municipal, para
obter o título de Residência Médica.
Área: Clínica Médica
Orientador: Ricardo Ayello Guerra
SÃO PAULO
2012
RENATA CHIARI DE FÉO MORAES
RELATO DE TRÊS CASOS: EFEITO DO USO DO SELÊNIO
NA OFTALMOPATIA DE GRAVES
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado
à Comissão de Residência Médica do
Hospital do Servidor Público Municipal, para
obter o título de Residência Médica.
Área: Clínica Médica
COMISSÃO EXAMINADORA
____________________________________________________
Dra Lucila Maria Bezerra
____________________________________________________
Dr Eduardo Kehde
____________________________________________________
Dr João Batista dos Santos Junior
São Paulo, ______ de ______________________ de 2012.
AUTORIZO A REPRODUÇÃO E DIVULGAÇÃO TOTAL OU PARCIAL DESTE
TRABALHO, POR QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU ELETRÔNICO,
PARA FINS DE ESTUDO E PESQUISA, DESDE QUE CITADA A FONTE E
COMUNICADO AO AUTOR A REFERÊNCIA DA CITAÇÃO.
São Paulo, _______ de _______________________ de 2012
Assinatura do Autor:
___________________________________________________
Renata Chiari de Féo Moraes
E-mail do autor:
RESUMO
A Doença de Graves é um processo autoimune da tireóide caracterizado pela
produção de anticorpos que se ligam ao receptor de tireotropina (TSHr) e estimulam
a produção excessiva de hormônios tireoidianos. A oftalmopatia é a manifestação
extra-tireoidiana mais comum da Doença de Graves. Pode manifestar-se com sinais
inflamatórios, protrusão e dor ocular, causando perda significativa de qualidade de
vida. Há cada vez mais evidências da importância do estresse oxidativo na sua
fisiopatologia.
Conseqüentemente,
trials
terapêuticos
têm
testado
agentes
antioxidantes na tentativa de melhorar os sintomas inflamatórios. Uma dessas
substâncias é o selênio, aparentemente com resultados promissores na redução da
atividade da doença e na diminuição dos sintomas subjetivos. Assim, relatamos três
casos com uso de selênio no tratamento da Oftalmopatia de Graves.
Palavras-chave: oftalmopatia de Graves, estresse oxidativo, selênio
ABSTRACT
Graves disease is an autoimmune process of the thyroid characterized by the
production of antibodies which link to the thyrotropin receptor (TSHr) and stimulate
excessive production of thyroid hormones. Ophthalmopathy is the commonest extrathyroid manifestation of Graves disease. It can appear with inflammatory signs,
protrusion and pain of the eyes, causing significant loss in the quality of life. There is
increasing evidence of the importance of the oxidative stress in its physiopathology.
Thus, therapeutic trials have been testing anti-oxidative agents in an attempt to
minimize inflammatory symptoms. One of these substances is selenium, which
apparently signals promising results in the reduction of activity of the disease and in
the decrease of subjective symptoms. Thus, we report three cases using selenium for
treatment of Graves´ Ophthalmopathy.
Key-words: Graves ophthalmopathy, oxidative stress, selenium.
SUMÁRIO
1. Introdução ........................................................................................................ 7
1.1. Fatores genéticos e ambientais ............................................................ 8
1.2. Fisiopatologia ....................................................................................... 8
1.3. Manifestações Clínicas ....................................................................... 11
1.4. Avaliação Clínica e Laboratorial ......................................................... 12
1.5. Tratamento .......................................................................................... 14
2. Objetivos ........................................................................................................ 18
3. Materiais e Métodos ...................................................................................... 19
4. Relato dos Casos Clínicos ............................................................................. 20
4.1. Caso 1 ................................................................................................. 20
4.2. Caso 2 ................................................................................................. 22
4.3. Caso 3 ................................................................................................. 24
5. Discussão ...................................................................................................... 26
6. Conclusão ...................................................................................................... 29
7. Referências Bibliográficas ............................................................................. 30
7
INTRODUÇÃO
A Doença de Graves é um processo autoimune da tireóide caracterizado pela
produção de anticorpos que se ligam ao receptor de tireotropina (TSHr) e estimulam
a
produção
excessiva
de
hormônios
tireoidianos
(4,6).
Alguns
pacientes
desenvolvem manifestações extra-tireoidianas, localizadas no tecido conjuntivo,
incluindo a oftalmopatia e a dermopatia (4).
A Oftalmopatia de Graves é a mais comum manifestação extra-tireoidiana da
Doença de Graves (3,10). Setenta a 90% dos pacientes apresentam alterações
detectadas pela tomografia computadorizada ou ressonância magnética da órbita,
que evidenciam aumento da musculatura extraocular e/ou do tecido adiposo da
órbita (6,13). Quase metade dos pacientes desenvolve sinais e sintomas relevantes
de comprometimento ocular (1,6). Apenas 3 a 5% apresentam doença severa (3, 6).
O mixedema pré-tibial tem sido considerado fator de risco para oftalmopatia grave
(12).
A incidência anual é de 16 mulheres e 3 homens para cada 100 000
indivíduos (6, 13). O acometimento ocular e o hipertireoidismo costumam ser
simultâneos ou têm um intervalo de até 18 meses entre as duas manifestações (6).
Pode ocorrer em pacientes sem manifestação de hipertireoidismo e naqueles com
hipotireoidismo devido a Tireoidite de Hashimoto (3,10). É bilateral em até 95% dos
casos, porém assimétrica (3). Tende a ser mais grave em homens e pacientes mais
velhos (3).
O desconforto físico devido à dor e edema, alterações da função visual e
modificações na aparência têm significativo impacto na qualidade de vida desses
pacientes, independente do grau de atividade e da gravidade do acometimento
ocular. (15)
8
Fatores Genéticos e Ambientais
A suscetibilidade para a Doença de Graves parece estar relacionada à
interação entre fatores genéticos e gatilhos ambientais. O componente genético
implicado no desenvolvimento da oftalmopatia ainda não é bem definido. Diversos
genes têm sido estudados, como loci do HLA, CTLA-4, TNF, INF-γ, ICAM-1 e TSHR, sem resultados conclusivos, pois são encontrados de forma semelhante em
pacientes com Doença de Graves portadores ou não de oftalmopatia. (4,12).
O tabagismo é fortemente associado à oftalmopatia de Graves. Alguns
estudos observaram relação dose-resposta entre o cigarro e a orbitopatia, com
maior risco relativo da doença quanto maior o número de cigarros consumidos. E
outros, mostraram diminuição do risco naqueles que cessaram o tabagismo (3).
A
alteração
prolongada
da
função
tireoidiana
(hipertireoidismo
ou
hipotireoidismo) pode piorar o curso da oftalmopatia (2). Em estudos, houve melhora
clínica após o reestabelecimento do eutireoidismo (3).
A modalidade de tratamento do hipertireoidismo exerce influência na
oftalmopatia. A ablação com iodo radioativo foi seguida de desenvolvimento e
progressão da doença oftalmológica, provavelmente pela liberação de antígenos
tireoidianos, principalmente TSHr, em grande quantidade. Tal piora mostrou ser leve
e transitória. O mesmo não ocorre no tratamento com drogas antitireoidianas e
cirurgia. (4)
O trauma pode ser considerado um fator de risco para o início da
oftalmopatia, pois tem sido relatada dermopatia em sítios de trauma na pele (6).
Fisiopatologia da Oftalmopatia de Graves
Os tecidos orbitários contêm receptores de tireotropina (TSHr) semelhantes
àqueles das células foliculares da tireóide (5), que são considerados os principais
antígenos envolvidos na Oftalmopatia de Graves. Estudos demonstraram elevada
expressão de TSHr nos tecidos orbitários de tais pacientes (5,6), com níveis mais
altos em pacientes com doença ativa (6). Outras proteínas com possível efeito
antigênico são o receptor de fator de crescimento insulina-símile tipo 1 (IGF-IR) dos
9
fibroblastos (6) e antígenos de membrana 64-kDa, G2s e D1 dos músculos oculares
(5).
Evidências apontam que os fibroblastos orbitários são as células-alvo e
participam do processo autoimune na Oftalmopatia de Graves (6).
Os fibroblastos têm como função a produção e organização da matriz
extracelular nos tecidos, bem como a síntese de moléculas sinalizadoras (4). A
diversidade de fenótipos destas células encontrada em cada sítio pode estar
relacionada ao envolvimento de apenas alguns tecidos na Doença de Graves extratireoidiana (5). Na órbita, encontramos fibroblastos que apresentam excessiva
resposta inflamatória aos estímulos (4,6), secretam grande quantidade de ácido
hialurônico e prostaglandina E2 mediados por citocinas (6), e não expressam a
enzima hialuronidase que degrada os glicosaminoglicanos (5).
Os antígenos celulares dos fibroblastos, principalmente TSHr, desencadeiam
resposta imunológica no tecido orbitário, com conseqüente infiltrado linfocitário
difuso no tecido adiposo e no interstício dos músculos extraoculares (4). A maior
parte das células são linfócitos T, do tipo CD4 (Helper) e, predominantemente, CD8
(citotóxica/supressora) (4,5). O recrutamento de mais células T parece ocorrer após
destruição tecidual e expressão de antígenos induzida por citocinas, em fases mais
tardias da doença (4).
Os linfócitos T CD4 sintetizam diversas citocinas, determinando o padrão da
resposta imunológica, conforme o tempo de evolução da doença. Pacientes com
doença recente apresentam resposta imune celular e produzem citocinas como IL-2,
INF-γ e TNF-α, caracterizando uma fase mais inflamatória. Mais tardiamente
predominam citocinas do tipo Th2 como IL-4, IL-5 e IL-10, com provável papel na
fibrose dos músculos extraoculares (4,5).
Os fibroblastos expressam proteínas co-estimulatórias CD40, que se ligam
aos linfócitos e aos macrófagos, participando de sua ativação (6).
Macrófagos e fibroblastos produzem outros mediadores inflamatórios,
incluindo IL-1, IL-6, IL-8, IL-16, TGF-β, RANTES e prostaglandina E2 que,
associadas ao TNFα e INF-γ, recrutam mais células T para os tecidos orbitários
10
(5,6), estimulam a expressão de TSHr e outras moléculas como HLA-DR, HSP-72 e
ICAM-1, aumentando o processo inflamatório (4).
Linfócitos e macrófagos ativados produzem espécies reativas de oxigênio (8).
Estudo evidenciou que radicais superóxido (8) e H2O2 (7) poderiam induzir
proliferação celular em culturas de fibroblastos humanos de pacientes com
oftalmopatia de Graves e, que tal proliferação poderia ser inibida por substâncias
antioxidantes (8). A IL-β1 está relacionada a maior produção de radicais livres de
oxigênio nos fibroblastos orbitários (8). Outra pesquisa demonstrou que o acúmulo
de H2O2 estaria relacionado a uma superprodução, associada a uma diminuição da
atividade de enzimas com ação antioxidante (7). O H2O2 também induz a expressão
de citocinas pró-inflamatórias IL-β1 e TNF-α (7).
O hipertireoidismo aumenta a produção de radicais livres de oxigênio e
diminui as substâncias antioxidantes, favorecendo o dano tecidual. Pesquisas
mostraram diminuição dos marcadores de estresse oxidativo após restabelecimento
do eutireoidismo usando Metimazol. Parece que os pacientes com oftalmopatia de
Graves têm maiores níveis de estresse oxidativo que outros pacientes com Doença
de Graves. (14,16)
Citocinas (TNF-α, IL-1, INF-γ) e radicais livres de oxigênio estimulam a
proliferação dos fibroblastos, a adipogênese a partir dos fibroblastos pré-adipócitos a
aumentam a produção de glicosaminoglicanas (4,8,16). As moléculas hidrofílicas de
glicosaminoglicanas atraem água para os tecidos orbitários causando edema (8). O
potencial pró-inflamatório do ácido hialurônico amplifica a resposta imune. (4)
O resultado desse processo é o aumento de volume do conteúdo orbitário, na
maioria dos casos, com envolvimento do tecido muscular e do tecido adiposo.
Existem pacientes com predomínio de um dos componentes. Indivíduos mais jovens
podem manifestar apenas expansão do tecido adiposo. Enquanto pacientes acima
de 70 anos, tendem a desenvolver aumento muscular isolado. Nos estágios iniciais
da doença, o acúmulo de glicosaminoglicanas, edema e infiltrado linfocitário ocorre
apenas no tecido conectivo perimuscular, mantendo intacta a função contrátil. (4,5)
11
A deposição de substâncias e o crescimento das partes moles dentro da
estrutura óssea restrita da órbita implicam em efeitos mecânicos que resultam em
diversos sinais e sintomas da doença. (4,5).
Manifestações clínicas
O espectro de sinais e sintomas da oftalmopatia de Graves abrange desde
dor e edema ocular, injeção conjuntival, fotofobia, diplopia, sensação de areia e
ressecamento nos olhos, retração palpebral, proptose, oftalmoplegia, úlcera de
córnea, disfunção do nervo óptico até perda da visão (12).
A retração da pálpebra superior é manifestação freqüente e mais comum que
o aumento de volume orbitário, causada pelo aumento do tônus simpático do
hipertireoidismo, seguido fibrose no músculo elevador da pálpebra (13).
Edema periorbitário e edema conjuntival estão inicialmente relacionados ao
comprometimento da drenagem venosa e linfática devido à compressão vascular
(5). Protrusão do globo ocular surge como processo adaptativo devido à
incapacidade da órbita em acomodar os tecidos moles aumentados de volume
(4,12).
Sensação de ressecamento dos olhos ocorre devido à retração palpebral,
evaporação da lágrima e fechamento incompleto dos olhos durante o sono (6), e
confere aos pacientes um maior risco de ulceração de córnea (12).
Comprometimento da motilidade e diplopia são conseqüências da disfunção
dos músculos extra-oculares por inflamação, edema e pela proptose (2,5,6).
Alteração na visão colorida pode ser a primeira manifestação da neuropatia
causada pela compressão do nervo óptico (2), cujo maior risco está nos pacientes
com aumento de volume do conteúdo muscular no interior da órbita (13).
12
Avaliação clínica e laboratorial
Avaliação laboratorial da função tireoidiana inclui dosagem de TSH e T4 livre
no sangue (9). A medida dos níveis de anticorpos antirreceptor de TSH (TRAB) é
recomendada, pois foi observada correlação de seus níveis séricos com gravidade,
atividade e prognóstico da oftalmopatia (6,9). Baixos níveis de anticorpos foram
relacionados com ocorrência de doença ocular leve (9).
O grau de protrusão do globo ocular pode ser quantificado através do
exoftalmômetro de Hertel, considerando as variações de medida conforme idade,
sexo e raça. A sua importância reside no acompanhamento evolutivo da oftalmopatia
(13).
A graduação quanto à gravidade e atividade da doença torna-se importante
devido às suas implicações terapêuticas (13).
O escore de atividade clínica (CAS) é baseado em achados inflamatórios
(9,13). São listados sete parâmetros que podem ser avaliados pelo próprio médico
assistente, que dará um ponto para cada sinal e sintoma presente. Dentre eles: dor
retrobulbar espontânea; dor a movimentação ocular para cima, para os lados ou
para baixo; hiperemia palpebral; hiperemia conjuntival; edema palpebral; edema
conjuntival (quemose); edema da carúncula (9). Um escore maior ou igual a três
indica oftalmopatia de Graves ativa (12). Um índice de CAS ampliado, mais
completo, inclui também: aumento da proptose acima de 2 mm em 1 a 3 meses,
queda de acuidade visual em 1 a 3 meses e diminuição da motilidade ocular maior
que 5º em qualquer direção em 1 a 3 meses (13).
A gravidade da oftalmopatia é avaliada conforme recomendações do Grupo
Europeu de Orbitopatia de Graves (9,10) enquadrando os pacientes nos seguintes
achados: ausência de sinais ou sintomas (classe 0); apenas sinais, com retração
palpebral (classe 1); comprometimento dos tecidos moles da órbita (classe 2);
proptose
(classe
3);
envolvimento
da
musculatura
extraocular
(classe
4);comprometimento da córnea (classe 5) e perda da visão devido a envolvimento
do nervo óptico (classe 6). (9, 13)
Conforme os parâmetros acima, dividimos os pacientes em três grupos de
gravidade.
13
Tabela 1. Escore de Atividade Clínica da Oftalmopatia de Graves (CAS)
Sintomas
Pontuação
Dor retrobulbar espontânea
Dor à movimentação ocular para cima, para baixo e/ou
lateral
Hiperemia palpebral
Hiperemia conjuntival
Edema palpebral
Edema conjuntival (quemose)
Edema de carúncula
1
1
1
1
1
1
1
Na forma leve podemos encontrar um ou mais dos achados que seguem:
retração palpebral menor que 2mm, leve comprometimento de partes moles,
exoftalmo menor que 3mm acima do normal, diplopia transitória ou ausente e
exposição da córnea responsiva a lubrificantes. Traz pequeno impacto na qualidade
de vida (10,12).
Pacientes com a forma moderada a grave, sem ameaça a visão, têm maior
impacto na sua vida diária, o que justifica tratamentos mais agressivos. Apresentam
uma ou mais das seguintes características: retração palpebral maior ou igual a 2mm,
maior comprometimento de partes moles, exoftalmo maior ou igual a 3mm acima do
normal e diplopia constante ou intermitente
(10,12).
A terceira categoria, dos pacientes com oftalmopatia que ameaça a visão,
caracteriza-se por neuropatia óptica (DON – dysthyroid optic neuropathy) e/ou
ulceração de córnea. Essa classe requer intervenção imediata (10,12).
Tomografia Computadorizada ou Ressonância Nuclear Magnética da órbita é
recomendada na suspeita de neuropatia do óptico (DON), doença unilateral e
quando o diagnóstico de oftalmopatia de Graves ainda é incerto (9). Exames de
imagem também são úteis quando há limitação da movimentação ocular. O achado
de aumento dos músculos extraoculares com o desaparecimento do tecido adiposo
no ápice da órbita é sugestivo do desenvolvimento de neuropatia (12).
14
Tratamento
A história natural da oftalmopatia é geralmente autolimitada. Pacientes podem
ter melhora espontânea com diminuição da atividade da doença (13). No entanto, a
oftalmopatia leve tem melhora espontânea em apenas 20% dos casos, 65% mantêm
doença estável e 15% sofre progressão (1). A decisão quanto ao tratamento
depende do grau de atividade da doença avaliado pela inflamação e do impacto
funcional e estético para o paciente (13). O tratamento a ser escolhido baseia-se no
estágio da doença (13).
A abordagem inicial consiste em tratamento da disfunção tireoidiana,
cessação do tabagismo e tratamento sintomático local (12).
Pacientes com função tireoidiana mal controlada têm maior probabilidade de
oftalmopatia grave do que aqueles eutireoidianos (9,10,12). Portanto, tais pacientes
devem ser mantidos em eutireoidismo da forma mais estável possível (13). O
tratamento com medicamentos antitireoidianos e tireoidectomia subtotal não
parecem afetar o curso da oftalmopatia (9,10). A associação entre drogas
antitireoidianas e reposição de tiroxina pode ser útil na manutenção da estabilidade
da função tireoidiana e dos sintomas oculares (9).
A terapia com iodo (I131) pode
levar à progressão ou ao desenvolvimento da doença ocular em 15% dos pacientes,
devido a liberação de novos antígenos tireoidianos (TSHr) na circulação com
conseqüente ativação da resposta imune (9,10,13). A maioria dos pacientes terá
alterações oculares leves e transitórias (9). Em 5%, a piora dos sintomas oculares
persiste até um ano após o iodo, necessitando de tratamento adicional da
oftalmopatia (10).
Fatores como tabagismo, níveis séricos de anticorpos anti-
receptor de TSH, gravidade do hipertireoidismo e orbitopatia preexistente aumentam
o risco de progressão no curso do tratamento com I131 (13). Esses pacientes podem
receber corticosteróides por um período de até três meses após o iodo para prevenir
manifestação ou piora da doença ocular (10). Pacientes sem os fatores de risco
acima e com doença inativa não necessitam receber corticóides (10). Evitar
hipotireoidismo após o procedimento (10).
O tabagismo, principal fator de risco modificável para a oftalmopatia de
Graves, deve ser interrompido devido a sua implicação no desenvolvimento da
15
oftalmopatia, deterioração da doença preexistente, comprometimento da eficácia do
tratamento e progressão após iodo (10,13).
Colírios lubrificantes são usados para alívio dos sintomas em pacientes com
retração palpebral que impede fechamento adequado dos olhos com exposição
permanente da córnea (10). Curativos oclusivos e pomadas são indicados durante o
sono para os pacientes com lagoftalmo (9). Dormir com cabeceira elevada pode
ajudar a reduzir o edema palpebral (10). Óculos escuros para fotofobia e prismas em
caso de diplopia também devem ser utilizados (9).
Na maioria dos pacientes com oftalmopatia leve, o acompanhamento vigilante
sem intervenções terapêuticas pode ser adequado. Acredita-se que nesses casos,
os riscos do tratamento com glicocorticóides ou radioterapia superam os benefícios.
Porém, indivíduos que apresentam prejuízo em sua qualidade de vida apesar da
classificação da doença como leve, são candidatos a tratamento semelhante às
formas moderadas e graves
(9,10,13). O selênio vem mostrando eficácia na
oftalmopatia leve (13).
Entre os pacientes com oftalmopatia moderada e grave deve ser feita a
avaliação do grau de atividade da doença conforme o CAS (10). Aqueles com CAS
maior ou igual a três têm doença ativa, com indicação de terapia imunossupressora
(10,13). O glicocorticóide intravenoso (metilprednisolona) é o tratamento de escolha
(9,10). A administração de corticóides via oral, retrobulbar ou subconjuntival também
foram avaliados (9,10).
Estudos mostraram que os pacientes tratados com
corticóide intravenoso tiveram melhor redução da atividade inflamatória medida pelo
CAS. Em comparação às altas doses de corticóides orais por tempo prolongado, os
efeitos colaterais como osteoporose, hipertensão arterial, diabetes, ganho de peso e
achados Cushingóides, foram menores nos indivíduos tratados com pulsoterapia
intravenosa (9,10,11). Injeção retrobulbar ou subconjuntival de corticóide é menos
efetiva que a terapia oral (10,12).
A radioterapia orbitária é tratamento alternativo para a oftalmopatia moderada
e grave em atividade (13), com boa resposta em cerca de 60% dos casos (10). É
administrada em dez doses de 2 Gy em um período de 2 semanas. Doses mais altas
não se mostraram mais eficazes (10,11). A radioterapia é mais efetiva em melhorar a
diplopia e motilidade ocular (10,12). Alguns recomendam seu uso adjuvante aos
16
corticóides e/ou a cirurgia de descompressão (12). Controle da atividade
inflamatória, proptose e abertura palpebral são pobres com essa modalidade de
tratamento (11). Costuma ser bem tolerada, mas pode ocorrer piora transitória dos
sintomas oculares, prevenida com o uso de corticóides (10). Retinopatia diabética e
hipertensão grave são contra-indicações absolutas ao procedimento (10).
O
tratamento
combinado
com
radioterapia
orbitária
associada
a
glicocorticóides orais ou intravenosos foi significativamente mais eficaz que cada
terapêutica isolada. A proptose e acuidade visual não sofreram alterações ao longo
do seguimento desses pacientes (11).
Os agentes imunomoduladores como rituximab (anticorpo monoclonal
antiCD20) e etanercept (antiTNF) vêm sendo estudados, com melhora do escore de
atividade da doença (CAS), porém ainda necessitam de maiores trabalhos
confirmatórios (10,12,13). A associação de ciclosporina e corticóides mostrou
melhora da doença moderada e grave, podendo ser usada na falha terapêutica dos
corticóides isoladamente (13).
A oftalmopatia com ameaça a visão deve ser identificada e tratada
imediatamente (10). O acometimento do nervo óptico (DON - dysthyroid optic
neuropathy) pode ser tratado inicialmente com corticóide intravenoso em altas doses
(10). O esquema utilizado em estudo foi 1g de metilprednisolona intravenosa durante
três dias consecutivos, repetidos novamente após uma semana, e manutenção com
via oral (13). Espera-se melhora do comprometimento do nervo em uma a duas
semanas após o início do tratamento (10). Caso não haja resposta a pulsoterapia e
ocorra deterioração clínica, cirurgia para descompressão da órbita deve ser indicada
(10,13). Até o momento, descompressão orbitária cirúrgica imediata não mostrou
melhores resultados quando comparada ao uso dos glicocorticóides intravenosos
como primeira linha (10). Os casos com risco de úlcera e perfuração de córnea são
considerados emergência, e medidas além de colírios lubrificantes de hora em hora,
tornam-se necessárias. A oclusão ocular temporária com blefarorrafia, tarsorrafia ou
toxina botulínica pode ser utilizada até recuperação da córnea. (10). O corticóide e a
cirurgia descompressiva isoladamente não são efetivos (10).
Cirurgia ocular de reabilitação está indicada quando a doença está inativa e
estável por três a seis meses, com fins estéticos e de melhora visual (9). Três
17
diferentes procedimentos cirúrgicos podem ser necessários. A descompressão
orbitária é realizada através da retirada de parte da parede da órbita, aumentando o
espaço para o conteúdo muscular e adiposo (9,13). Está indicada quando há
exoftalmia proeminente, dor retroocular intensa, sintomas de exposição corneana
não aliviados com tratamento tópico (10). O próximo passo é a correção da diplopia,
com abordagem cirúrgica dos músculos extraoculares, vários meses após a
descompressão (9,10,13). A toxina botulínica pode ajudar na correção da diplopia
(9). Por último, pacientes com retração palpebral superior ou inferior podem ser
submetidos
a
procedimento
cirúrgico
para
alongamento
palpebral
(9,10).
Blefaroplastia pode corrigir o edema palpebral remanescente (9).
Em caso de reativação da oftalmopatia após as cirurgias reparadoras, não há
contra-indicação ao uso de corticóides e radioterapia (10).
O uso de substâncias antioxidantes no tratamento da Doença de Graves e da
oftalmopatia vem sendo estudado recentemente com base nas evidências de
expressiva participação do estresse oxidativo na fisiopatologia da doença (16). Um
estudo avaliou o uso de alopurinol e nicotinamida versus placebo em pacientes com
oftalmopatia leve a moderada em atividade. Foi constatada melhora dos escores de
atividade
em
aproximadamente
80%
dos
pacientes
que
receberam
tais
medicamentos, alívio da dor em todos eles e alguma melhora da diplopia. A
proptose não sofreu alteração (8,14,16). A pentoxifilina também foi estudada,
observando-se diminuição da atividade da doença e das alterações de partes moles
(8). O selênio é outra substância antioxidante que vem sendo testada para o
tratamento da oftalmopatia de Graves (1,14,16).
18
OBJETIVO
O objetivo deste trabalho é relatar três casos clínicos de pacientes com
Oftalmopatia de Graves tratados com selênio, uma substância antioxidante que vem
sendo utilizada recentemente como opção terapêutica desta manifestação extratireoideana da Doença de Graves. Os três pacientes foram informados da exposição
de seus casos clínicos no trabalho e assinaram o Termo de Consentimento
Esclarecido.
19
MATERIAIS E MÉTODOS
Este trabalho foi realizado através da coleta de dados nos prontuários dos
pacientes e de participação em suas consultas ambulatoriais. As imagens são
fotografias tiradas por mim (Renata Chiari de Féo Moraes) e pelas residentes do
serviço de Endocrinologia do HSPM (Raquel Resende Silva e Leila Guastapaglia).
20
RELATO DOS CASOS CLÍNICOS
Caso 1
Paciente M.O.T., 46 anos, sexo feminino, diagnosticada com hipertireoidismo
em setembro de 2008, quando apresentou níveis séricos de TSH de 0,004 mIU/ml
(VR= 0,40-4,0 mIU/ml) e de T4 livre de 2,65 ng/dl (VR= 0,890-1,760 ng/dl), com
níveis séricos de anticorpos antirreceptor de TSH (TRAB), antitireoglobulina e
antiperoxidase negativos. O ultrassom de tireóide mostrou lobo direito medindo
5,9cm3 e lobo esquerdo de 3,0cm3 com nódulo de 1,0x0,7cm, cuja PAAF constatou
tireoidite linfocitária. Cintilografia realizada em agosto de 2010 evidenciou tireóide
tópica, com dimensões diminuídas e lobo direito hipercaptante. Foi tratada com
Propiltiouracil desde o diagnóstico. Após dois anos usando antitireoidiano sem
remissão, foi submetida ao tratamento com Radioiodo (I131) em setembro de 2010,
quando entrou em hipotireoidismo. Passou a tomar Levotiroxina desde então,
permanecendo eutireoidiana.
Na ocasião do diagnóstico, a tomografia computadorizada de órbita era
normal. Porém evoluiu com edema palpebral, hiperemia e dor à movimentação
ocular, chegando a totalizar um CAS igual a cinco em olho esquerdo, associado à
exoftalmia e retração palpebral. Recebeu colchicina 0,5mg duas vezes ao dia
durante 2 anos, com poucos períodos de cessação da atividade da doença. Neste
intervalo de tempo, foi cogitada a utilização de glicocorticóides ou radioterapia em
olho esquerdo devido às recorrências freqüentes de doença ativa, com escore de
atividade em torno de quatro ou cinco. Em julho de 2011, iniciou tratamento com
selênio na dose de 100mcg 2x por dia. Desde então, paciente vem se mantendo
sem atividade da doença, com CAS igual a zero ou um. Em março de 2012, a dose
foi reduzida pela metade e paciente manteve com doença inativa, retornando
apenas com edema palpebral bilateral, porém maior em olho esquerdo.
21
Figura 1. Paciente M.O.T. antes
do uso do selênio.
Fotografia de Raquel Resende Silva –
Residente de Endocrinologia do HSPM SP. Em junho/2011.
o selênio.
Figura 2. Paciente M.O.T. antes
do uso do selênio.
Fotografia de Raquel Resende Silva –
Residente de Endocrinologia do
HSPM-SP. Em junho/2011.
Figura 3. Paciente M.O.T. após
uso do selênio.
Fotografia de Renata Chiari de Féo
Moraes – Residente de Clínica
Médica do HSPM-SP. Em julho/2012.
22
Caso 2
K.B., 46 anos, sexo feminino, foi diagnosticada com hipertireoidismo em
outubro de 2010, com níveis séricos de TSH de 0,006 mUI/ml (VR= 0,4-4,0 mUI/ml),
T4 livre de 4,3 ng/dl (VR= 0,890-1,760 ng/dl), T3 total de 530 ng/dl (VR= 84-172
ng/dl). Os níveis de anticorpos antitireoperoxidase eram de 41,9 UI/ml (VR < 15
UI/ml) e os anticorpos antitireoglobulina eram negativos. Já apresentava desconforto
ocular ao diagnóstico da doença, embora o CAS estimado fosse de zero. Iniciou
imediatamente tratamento com Metimazol e Propranolol. Foi acrescentada ao
esquema a Levotiroxina, para tratamento combinado. Mantendo-se eutireoidiana a
partir de então.
Depois de aproximadamente um ano do diagnóstico da Doença de Graves,
surgiram edema palpebral, lacrimejamento ocular e exoftalmia discreta, quando
começou a utilizar colírio lubrificante. Evoluiu com CAS igual a dois pelo edema
palpebral e dor à movimentação ocular, mantendo discreta exoftalmia, e teve
definida oftalmopatia leve. Foi medicada com selênio 100mcg 2x ao dia. Após três
meses de tratamento, houve melhora significativa dos sintomas e CAS de zero. Ao
interromper o uso de selênio por conta própria durante dois meses, a oftalmopatia
atingiu três pontos no CAS em ambos os olhos. Duas semanas depois da
reintrodução do selênio, apresentava apenas discreto edema palpebral, com
melhora
importante
da
inflamação
ocular,
definindo
um ponto no CAS.
Figura 4. Paciente K.B. sem
uso de selênio.
Fotografia de Renata Chiari de Féo
Moraes – Residente de Clínica
Médica
do
HSPM-SP.
Em
01/junho/2012.
23
Figura 5. Paciente K.B. sem
uso de selênio.
Fotografia de Renata Chiari de Féo
Moraes – Residente de Clínica
Médica do HSPM-SP. Em 01/
junho/2012.
Figura 6. Paciente K.B. em
uso de selênio 100mcg/dia.
Fotografia de Renata Chiari de Féo
Moraes – Residente de Clínica
Médica
do
HSPM-SP.
Em
16/junho/2012.
Figura 7. Paciente K.B. em
uso de selênio 200mcg/dia.
Fotografia de Leila Guastapaglia –
Residente de Endocrinologia do
HSPM-SP. Em agosto/2012.
24
Caso 3
A.C.D., 66 anos, sexo masculino, recebeu diagnóstico de Doença de Graves
há cerca de oito anos, com níveis séricos de T4 livre de 2,79 ng/dl (VR= 0,890-1,760
ng/dl), TSH de 0,00 uIU/ml (VR= 0,4-4,0 uIU/ml), anticorpo antirreceptor de TSH
(TRAB) menor que 11 U/L (VR < 2 U/L), cintilografia evidenciando bócio difuso tóxico
com captação de 62%. Tratou com Tapazol de maneira irregular durante pouco mais
de um ano, sem alcançar o eutireoidismo. Em maio de 2005, foi submetido à terapia
com 20 mCi de Radioiodo (I131), evoluindo com hipotireoidismo após nove meses.
Desde então vem usando Levotiroxina, ficando eutireoideano a partir de agosto de
2006. Em maio de 2012, feito novo ajuste de dose devido a T4 livre de 1,49 e TSH
de 0,20, com normalização do TSH.
No momento do diagnóstico da Doença de Graves, paciente apresentava
CAS igual a quatro em ambos os olhos, às custas de hiperemia conjuntival, edema
palpebral, conjuntival e de carúnculas. Tinha lid lag positivo. Foi primeiramente
tratado com colchicina 0,5mg 2x/dia e colírio de lágrima artificial, usados
incorretamente. Manteve exoftalmia discreta e hiperemia conjuntival bilateral
associada, algumas vezes, a edema palpebral durante mais ou menos um ano. Em
agosto de 2006, passou a apresentar CAS de zero. Até que em maio de 2012,
retorna em consulta com queixa de olhos vermelhos, totalizando quatro pontos
novamente no CAS. Devido à atividade da oftalmopatia, foi iniciado tratamento com
selênio 100mcg 2x/dia e colírio lubrificante. Após um mês e meio de medicação,
obteve melhora significativa da hiperemia conjuntival e manteve discreto edema
palpebral, totalizando apenas dois pontos no CAS.
25
Figura 8. Paciente A.C.D. antes
do uso do selênio.
Fotografia de Leila Guastapaglia –
Residente de Endocrinologia do
HSPM-SP. Em maio/2012.
Figura 9. Paciente A.C.D.
após uso do selênio.
Fotografia de Renata Chiari de
Féo Moraes – Residente de
Clínica Médica do HSPM-SP.
Em julho/2012.
26
DISCUSSÃO
Na Doença de Graves há um excesso de produção de radicais livres na
glândula tireóide e nos tecidos retro oculares. O estresse oxidativo devido ao
desbalanço entre produção e degradação de espécies reativas de oxigênio tem
justificado trials clínicos utilizando substâncias com ação antioxidante, como o
selênio.
O selênio é um microelemento essencial à saúde humana (17). Tem como
principal fonte a alimentação (18,20). É encontrado em carnes, grãos, vegetais e
castanhas (23). Incorporado à cisteína, dá origem à diversas selenoproteínas
fundamentais para funções biológicas do organismo, como metabolismo dos
hormônios tireoidianos, resposta imune e ação antioxidante (19,21,22). Esta última é
mediada primeiramente pelas enzimas superóxido desmutase e catalase (14). Uma
segunda
linha
de
defesa
antioxidante
do
organismo
é
composta
pelas
selenoproteínas glutationa peroxidase (GPx) e tiorredoxina redutase (TRx), que
também têm importante papel na proteção das células contra o estresse oxidativo,
ao eliminar as espécies reativas de oxigênio do organismo (14,20,21). A
suplementação de selênio tem o potencial de aumentar a atividade de tais
selenoproteínas (18). Também pode exercer influência na modulação da atividade
inflamatória (21). E mostrou diminuir de forma reversível o crescimento de
fibroblastos (22).
Atualmente, recomenda-se uma ingestão dietética diária de selênio de
55mcg/dia para adultos (18,23). Entretanto, a dose máxima tolerada diariamente
chega a 400mcg/dia (23).
Estudo recente controlado randomizado duplo-cego desenvolvido pela
EUGOGO (European Group on Graves’ Orbitopathy) testou o impacto do selênio e
da pentoxifilina comparados ao placebo no curso da orbitopatia de Graves, em um
ano de seguimento. Foram 159 participantes randomizados nos três grupos de
intervenção. O selênio foi administrado na forma de selenato de sódio, na dose de
100 mcg duas vezes por dia e a pentoxifilina, 600mg duas vezes por dia. Todos os
pacientes eram eutireoidianos. Naqueles que usaram selênio houve melhora da
27
visão e da aparência, traduzindo significativo impacto positivo na qualidade de vida.
A piora da oftalmopatia em comparação às outras intervenções também foi menor.
Apesar da diminuição da atividade da doença em todos os grupos no período, o
CAS foi expressivamente menor naqueles que receberam selênio. Melhora na
abertura palpebral e no comprometimento dos tecidos moles foram os principais
responsáveis pelos bons resultados do selênio. (1)
Em nossos pacientes, observamos diferentes estágios de oftalmopatia ao
início do tratamento, variando de um escore de atividade estimado em torno de
quatro ou cinco pontos que configura doença ativa, até doença leve com CAS igual a
dois. Todos eles receberam o selênio sob a forma de selenato de sódio 100mcg
administrado duas vezes ao dia. Não houve queixas de efeitos colaterais.
Todos os três pacientes, após serem submetidos ao uso do selênio,
apresentaram melhora clínica evidenciada por redução da pontuação no escore de
atividade da doença (CAS), diminuição dos sinais inflamatórios, melhora sintomática
subjetiva e dos sintomas compressivos.
O impacto positivo do selênio no curso da oftalmopatia foi comprovado pela
nítida piora clínica após a suspensão do tratamento por conta própria por uma das
pacientes. Hiperemia conjuntival, edema palpebral e dor ocular à movimentação
voltaram a aparecer, caracterizando doença ativa, com escore de atividade igual à
três. Após duas semanas da reintrodução da medicação, os sinais e sintomas
regrediram expressivamente. Houve nova melhora sintomática subjetiva e na
qualidade de vida.
Os efeitos do selênio na interrupção da atividade da oftalmopatia em nossos
pacientes mais graves, acabaram por poupá-los, pelo menos em um primeiro
momento, de tratamentos mais agressivos e com mais efeitos adversos como a
imunossupressão com corticosteroides, geralmente preconizada para tais casos.
28
Tabela 2. Resultados após uso do selênio
CAS
Paciente 1
Paciente 2
Paciente 3
Inicial
5 pontos
zero
4 pontos
Tratamento
colchicina
----------
colchicina
Zero
(por 6 anos)
Após
tratamento
5 pontos*
----------
Evolução
5 pontos
2-3 pontos
4 pontos
Após selênio
1 ponto
1 ponto
2 pontos
*Considerada a possibilidade de tratamento com glicocorticóides e com radioterapia
em olho esquerdo.
29
CONCLUSÃO
Com estes casos observamos o impacto positivo do selênio no tratamento da
oftalmopatia, com melhora inflamatória e sintomática significativa tanto da doença
leve quanto da doença ativa, trazendo novamente qualidade de vida para tais
pacientes, sem efeitos adversos pronunciados.
Dessa forma, podemos passar a considerar uma nova modalidade terapêutica
para a oftalmopatia, que tem como alvo o estresse oxidativo claramente envolvido
na fisiopatologia da doença. O selênio, ao potencializar mecanismos antioxidantes
do organismo, consegue diminuir um dos componentes do processo inflamatório
ocular, com importante melhora sinais e sintomas flogísticos locais.
30
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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