Essência da verdade", "O que é metafísica?" e "O fim da filosofia

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO
MESTRADO EM DIREITO PÚBLICO
Disciplina: Metodologia da Pesquisa em Direito
Fichamento das obras:
“Essência da verdade", "O que é metafísica?" e "O fim da filosofia”, de
Heidegger; e “Crítica do Julgamento/Crítica do Juízo”, de Kant
Respostas às questões
Redação de aproveitamento
Aluno: Leandro Santos de Aragão
SALVADOR - BAHIA
2013
Universidade Federal da Bahia
Faculdade de Direito – Programa de Pós-Graduação
Mestrado em Direito Público - 2013.1
Disciplina: Metodologia da Pesquisa em Direito
Prof. Dr. Rodolfo Pamplona Filho
Aluno: Leandro Santos de Aragão
Fichamento 08
Modo de citação:
HEIDEGGER, Martin. Que é metafísica. [s.l]: [s.n], [s.d]. Sobre a essência da verdade. [s.l]: [s.n], [s.d]
O fim da filosofia e a tarefa do pensamento. [s.l]: [s.n], [s.d].
1º texto – O que é metafísica.
“‘Que é metafísica?’ — A pergunta nos dá esperanças de que se falará sobre a metafísica. Não
o faremos. Em vez disso, discutiremos uma determinada questão metafísica. Parece-nos que, desta
maneira, nos situaremos imediatamente dentro da metafísica. Somente assim lhe damos a melhor
possibilidade de se apresentar a nós em si mesma.” (p. 233)
“De um lado, toda questão metafísica abarca sempre a totalidade da problemática metafísica.
Ela é a própria totalidade.” (p. 233)
“Nas ciências se realiza — no plano das ideias — uma aproximação daquilo que é essencial em
todas as coisas.” (p. 234)
“Estas três dimensões — referência ao mundo, comportamento, irrupção — trazem, em sua
radical unidade, uma clara simplicidade e severidade do ser-aí, na existência científica. Se quisermos
apoderar-nos expressamente da existência científica, assim esclarecida, então devemos dizer:
Aquilo para onde se dirige a referência ao mundo é o próprio ente — e nada mais.
Aquilo de onde todo o comportamento recebe sua orientação é o próprio ente — e além dele
nada.
Aquilo com que a discussão investigadora acontece na irrupção é o próprio ente — e além
dele nada.” (p. 234)
“A ciência nada quer saber do nada. Mas não é menos certo também que, justamente, ali,
onde ela procura expressar sua própria essência, ela recorre ao nada. Aquilo que ela rejeita, ela leva
em consideração. Que essência ambivalente se revela ali?” (p. 234)
“A elaboração da questão do nada deve colocar-nos na situação na qual se torne possível a
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resposta ou em que então se patenteie sua impossibilidade. O nada é admitido. A ciência, na sua
sobranceira indiferença com relação a ele, rejeita-o como aquilo que ‘não existe’.” (p. 235)
“Assim, não é preciso, pois, que a ciência primeiro rejeite o nada.” (p. 235)
“Seja como for, nós conhecemos o nada, mesmo que seja apenas aquilo sobre o que
cotidianamente falamos inadvertidamente. Podemos até, sem hesitar, ordenar numa ‘definição’ este
nada vulgar, em toda palidez do óbvio, que tão discretamente ronda em nossa conversa: O nada é a
plena negação da totalidade do ente.” (p. 236)
“A totalidade do ente deve ser previamente dada para que possa ser submetida enquanto tal
simplesmente à negação, na qual, então, o próprio nada se deverá manifestar.” (p. 236)
“Acontece no ser-aí do homem semelhante disposição de humor na qual ele seja levado à
presença do próprio nada? Este acontecer é possível e também real — ainda que bastante raro —
apenas por instantes, na disposição de humor fundamental da angústia. Por esta angústia não
entendemos a assaz frequente ansiedade que, em última análise, pertence aos fenômenos do temor
que com tanta facilidade se mostram. A angústia é radicalmente diferente do temor. Nós nos
atemorizamos sempre diante deste ou daquele ente determinado que, sob um ou outro aspecto
determinado, nos ameaça.” (p. 237)
“A angústia manifesta o nada.” (p. 237)
“’Estamos suspensos’ na angústia. Melhor dito: a angústia nos suspende porque ela põe em
fuga o ente em sua totalidade. Nisto consiste o fato de nós próprios — os homens que somos —
refugiarmo-nos no seio dos entes. É por isso que, em última análise, não sou ‘eu’ ou não és ‘tu’ que
te sentes estranho, mas a gente se sente assim. Somente continua presente o puro ser-aí no
estremecimento deste estar suspenso onde nada há em que apoiar-se.” (p. 237)
“O nada se revela na angústia — mas não enquanto ente. Tampouco nos é dado como
objeto. A angústia não é uma apreensão do nada. Entretanto, o nada se torna manifesto por ela e
nela, ainda que não da maneira como se o nada se mostrasse separado, “ao lado” do ente, em sua
totalidade, o qual caiu na estranheza. Muito antes, e isto á o dissemos: na angústia deparamos com o
nada juntamente com o ente em sua totalidade.” (p. 238)
A angústia torna caduco o ente em sua totalidade; ela se manifesta num retroceder diante de
algo (p. 238).
“Com isto obtivemos a resposta à questão do nada. O nada não é nem um objeto, nem um
ente. O nada não acontece nem para si mesmo, nem ao lado do ente ao qual, por assim dizer,
aderiria. O nada é a possibilitação da revelação do ente enquanto tal para o ser-aí humano. O nada
não é um conceito oposto ao ente, mas pertence originariamente à essência mesma (do ser). No ser
do ente acontece o nadificar do nada.” (p. 239)
“(...): o nada é a origem da negação e não vice-versa, a negação a origem do nada. Se assim se
rompe o poder do entendimento no campo da interrogação pelo nada e pelo ser, então se decide
também, com isto, o destino do domínio da ‘lógica’ no seio da filosofia. A idéia da ‘lógica’ mesma se
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dissolve no redemoinho de uma interrogação mais originária.” (p. 240)
“O estar suspenso do ser-aí no nada originado pela angústia escondida transforma o homem
no lugar-tenente do nada. Tão finitos somos nós que precisamente não somos capazes de nos
colocarmos originariamente diante do nada por decisão e vontade próprias. Tão insondavelmente a
finitização escava as raízes do ser-aí que a mais genuína e profunda finitude escapa à nossa liberdade.
O estar suspenso do ser-aí dentro do nada originado pela angústia escondida é o ultrapassar
do ente em sua totalidade: a transcendência.
Nossa interrogação pelo nada tem por meta apresentar-nos a própria metafísica. O nome
‘metafísica’ vem do grego: tà metaphysiká. Esta surpreendente expressão foi mais tarde interpretada
como caracterização da interrogação que vai meta — trans ‘além’ do ente enquanto tal.” (p. 240)
“Metafísica é o perguntar além do ente para recuperá-lo enquanto tal e em sua totalidade,
para a compreensão.” (p. 241)
“A questão do nada põe a nós mesmos — que perguntamos — em questão. Ela é uma
questão metafísica.
O ser-aí humano somente pode entrar em relação com o ente se se suspende dentro do nada.
O ultrapassar o ente acontece na essência do ser-aí. Este ultrapassar, porém, é a própria metafísica.
Nisto reside o fato de que a metafísica pertence à ‘natureza do homem’. Ela não é uma disciplina da
filosofia ‘acadêmica’, nem um campo de ideias arbitrariamente excogitadas. A metafísica é o
acontecimento essencial no âmbito de ser-aí. Ela é o próprio ser-aí. Pelo fato de a verdade da
metafísica residir neste fundamento abissal possui ela, como vizinhança mais próxima, sempre à
espreita, a possibilidade do erro mais profundo. É por isso que nenhum rigor de qualquer ciência
alcança a seriedade da metafísica. A filosofia jamais pode ser medida pelo padrão da ideia da
ciência.” (p. 242)
“A disposição para a angústia é o sim à insistência para realizar o supremo apelo, o único que
atinge a essência do homem. Somente o homem, em meio a todos os entes, experimenta, chamado
pela voz do ser, a maravilha de todas as maravilhas: que o ente é. Aquele que assim é chamado em
sua essência para a verdade do ser está, por isso, continuamente envolvido, de maneira
fundamental, na disposição de humor. A clara coragem para a angústia essencial garante a misteriosa
possibilidade da experiência do ser. Pois, próximo à angústia essencial, como espanto do abismo,
reside o respeito humilde. Ele ilumina e protege aquele lugar da essência do homem no seio do qual
ele permanece familiar no permanente.” (p. 247)
“Entretanto, a metafísica expressa o ser constantemente e das mais diversas formas. Ela
mesma suscita e fortalece a aparência de que a questão do ser foi por ela levantada e respondida.
Mas a metafísica não responde, em nenhum lugar, à questão da verdade do ser, porque nem a
suscita como questão. Ela não problematiza por que é que somente pensa o ser enquanto representa
o ente enquanto ente. Ela visa ao ente em sua totalidade e fala do ser. Ela nomeia o ser e tem em
mira o ente enquanto ente. Os enunciados da metafísica se desenvolvem de maneira estranha, desde
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o começo até sua plenitude, numa geral troca do ente pelo ser. Esta troca, sem dúvida, deve-ser
pensada como acontecimento” (p. 255)
“Que significa ‘existência’ em Ser e Tempo? A palavra designa um modo de ser e, sem dúvida,
do ser daquele ente que está aberto para a abertura do ser, na qual se situa, enquanto a sustenta.
Este sustentar é experimentado sob o nome ‘preocupação’.” (p. 257)
“O ente que é.ao modo da existência é o homem. Somente o homem existe. O rochedo é, mas
não existe. A árvore é, mas não existe. O anjo é, mas não existe. Deus é, mas não existe. A frase:
‘Somente o homem existe’ de nenhum modo significa apenas que o homem é um ente real, e que
todos os entes restantes são irreais e apenas uma aparência ou a representação do homem. A frase:
‘O homem existe’ significa: o homem é aquele ente cujo ser é assinalado pela insistência existente no
desvelamento do ser a partir do ser e no ser. A essência existencial do homem é a razão pela qual o
homem representa o ente enquanto tal e pode ter consciência do que é representado. Toda
consciência pressupõe a existência pensada estaticamente como a essentia do homem, significando
então essentia aquilo que é o modo próprio de o homem ser na medida em que é homem e não
como engano.” (p. 257)
“A metafísica diz o que é o ente enquanto ente. Ela contém um lógos (enunciação) sobre o ón
(o ente).” (p. 259)
2º texto – Sobre a essência da verdade.
O objetivo do texto é a verdade. [“Trata-se da essência da verdade. A pergunta pela essência
da verdade não se preocupa com o fato de a verdade ser a verdade da experiência prática da vida ou
a da conjetura no campo econômico, a verdade de uma reflexão técnica ou de uma prudência
política; ou, mais especialmente, com o fato de a verdade ser a verdade da pesquisa científica ou da
criação artística, ou mesmo a verdade de uma meditação filosófica ou de uma fé religiosa. A pergunta
pela essência se afasta de tudo isto e dirige seu olhar para aquilo que unicamente caracteriza toda
‘verdade’ enquanto tal.”]
O senso comum não ser o saber essencial. O senso comum é pragmático e não tem ouvidos
para sua própria linguagem.
Em linguagem corrente, o conceito de verdade está ligado à capacidade de representar a
realidade. O verdadeiro é o real autêntico. Por exemplo, o ouro real autêntico é aquele ouro cuja
realidade consiste na concordância com aquilo que própria, prévia e constantemente entendemos
como ouro. Já o falso não é realmente aquilo que aparenta. O falso é uma “aparência” e, por isso,
irreal.
“O verdadeiro, seja uma coisa verdadeira ou uma proposição verdadeira, é aquilo que está de
acordo, que concorda. Ser verdadeiro e verdade significam aqui: estar de acordo, e isto de duas
maneiras: de um lado, a concordância entre uma coisa e o que dela previamente se presume, e, de
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outro lado, a conformidade entre o que é significado pela enunciação e a coisa”. (p. 331)
“A possibilidade da verdade do conhecimento humano se funda, se todo ente é ‘criado’, sobre
o fato de a coisa e a proposição serem igualmente conformes com a ideia e serem, por isso,
coordenados um ao outro a partir da unidade do plano da criação”. (p. 332)
“A não-verdade da proposição (não-conformidade) é a não concordância da enunciação com a
coisa. A não-verdade da coisa (inautenticidade) significa o desacordo de um ente com sua essência. A
não-verdade pode ser compreendida cada vez como não estar de acordo. Isto fica excluído da
essência da verdade. É por isso que a não-verdade, enquanto pensada como parte contrária da
verdade, pode ser negligenciada quando se trata de apreender a pura essência da verdade”. (p. 332)
Apesar da enunciação não ser de modo algum material ou mesmo espacial, o acordo entre a
enunciação e uma coisa, conforme o conceito corrente de verdade, deve ser concebido como uma
adequação. (p. 333)
“O comportamento está aberto sobre o ente. Toda relação de abertura, pela qual se instaura
a abertura para algo: é um comportamento. A abertura que o homem mantém se diferencia
conforme a natureza do ente e o modo do comportamento.” (p. 333)
“A enunciação recebe sua conformidade da abertura do comportamento. Pois, somente
através dela, o que é manifesto pode tornar-se, de maneira geral, a medida diretora de uma
apresentação adequada. Mas o comportamento aberto mesmo deve deixar-se guiar por esta medida.
Isto quer dizer: o comportamento mesmo deve receber antecipadamente o dom prévio desta medida
diretora de toda apresentação. Isto faz parte da abertura que o comportamento mantém. Mas se
somente pela abertura que o comportamento mantém se torna possível a conformidade da
enunciação, então aquilo que torna possível a conformidade possui um direito mais original de ser
considerado como a essência da verdade.” (p. 333)
Com isso, a enunciação perde o monopólio de lugar essencial da verdade. “A verdade
originária não tem sua morada original na proposição” (p. 334)
Heidegger tenta, então, situar a essência da verdade na liberdade. “A abertura que mantém o
comportamento, aquilo que torna intrinsecamente possível a conformidade, se funda na liberdade. A
essência da verdade é a liberdade.” (p. 335). Isso, na visão dele, não significar entregar a verdade
para o arbítrio humano; a verdade é, apenas, deslocada para a subjetividade do sujeito humano.
A relação essencial entre verdade como conformidade e liberdade remete a outra questão: a
essência do homem. A liberdade é a revelação do ente: é o deixa-ser o ente tal como ele é. “A
liberdade em face do que se revela no seio do aberto deixa que cada ente seja o ente que é”. (p. 336)
“Deixar-ser o ente — a saber, como ente que ele é — significa entregar-se ao aberto e à sua abertura,
na qual todo ente entra e permanece, e que cada ente traz, por assim dizer, consigo. Este aberto foi
concebido pelo pensamento ocidental, desde o seu começo, como (...), o desvelado” (p. 336).
“A liberdade não é somente aquilo que o senso comum faz com facilidade circular sob tal
nome: a veleidade que de vez em quando se manifesta em nós, de oscilarmos, em nossa escolha ora
para este, ora para aquele extremo. A liberdade também não é a ausência pura e simples de
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constrangimento relativa às nossas possibilidades de ação ou inação. A liberdade também não
consiste somente na disponibilidade para uma exigência ou uma necessidade (e, portanto, para um
ente qualquer). Antes de tudo isto (antes da liberdade ‘negativa’ ou ‘positiva’), a liberdade é o
abandono ao desvelamento do ente como tal” (p. 336).
“A liberdade assim compreendida, como deixar-ser do ente, realiza e efetua a essência da
verdade sob a forma do desvelamento do ente. A ‘verdade’ não é uma característica de uma
proposição conforme, enunciada por um ‘sujeito’ relativamente a um ‘objeto’ e que então ‘vale’ não
se sabe em que âmbito; a verdade é o desvelamento do ente graças ao qual se realiza uma abertura.
Em seu âmbito se desenvolve, ex-pondo-se.” (p. 337)
“O exame da não-essência da verdade não vem preencher tardiamente uma lacuna, mas ele
constitui o passo decisivo na posição adequada da questão da essência da verdade. Mas como
devemos nos conceber a não-essência na essência da verdade? Se a essência da verdade não se
esgota na conformidade da enunciação, então a não-verdade também não pode ser igualada com a
não-conformidade do juízo.” (p. 338)
“A essência da verdade se desvelou como liberdade. Esta é o deixar-ser ek-sistente que
desvela o ente. Todo comportamento aberto se movimenta no deixar-ser do ente e se relaciona com
este ou aquele ente particular. A liberdade já colocou previamente o comportamento em harmonia
com o ente em sua totalidade, na medida em que ela é o abandono ao desvelamento do ente em sua
totalidade e enquanto tal. Esta disposição de humor não se deixa, entretanto, conceber como
‘vivência’ ou como ‘estado de alma’. Pois ela é desviada de sua essência quando compreendida a
partir de noções que (como ‘vida’ e ‘alma’) não podem elas próprias pretender uma dignidade de
essência senão aparentemente e enquanto se distorce e falsifica o sentido da disposição de humor.”
(p. 338)
“O homem erra. O homem não cai na errância num momento dado. Ele somente se move
dentro da errância porque in-siste ek-sistindo e já se encontra, desta maneira, sempre na errância. A
errância em cujo seio o homem se movimenta não é algo semelhante a um abismo ao longo do qual
o homem caminha e no qual cai de vez em quando. Pelo contrário, a errância participa da
constituição íntima do ser-aí.” (p. 339)
“A errância é a antiessência fundamental que se opõe à essência da verdade. A errância se
revela como o espaço aberto para tudo o que se opõe à verdade essencial. A errância é o cenário e o
fundamento do erro. O erro não é uma falta ocasional, mas o império desta história onde se
entrelaçam, confundidas, todas as modalidades do errar” (p. 340).
“O desvelamento do ente enquanto tal é, ao mesmo tempo e em si mesmo, a dissimulação do
ente em sua totalidade. É nesta simultaneidade do desvelamento e da dissimulação que se afirma a
errância. A dissimulação do que está velado e a errância pertencem à essência originária da verdade.”
(p. 340) Nessa passagem, Heidegger destaca que o pensamento do qual originariamente se emanou a
indagação sobre o que é o ser enquanto tal na sua totalidade foi a filosofia, que mais tarde recebeu o
nome de metafísica.
Procurando a essência da filosofia e destrinchando as interpretações da metafísica para o
problema da essência da filosofia – principalmente a proposta kantiana – Heidegger diz: “Se. todavia,
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a filosofia realiza sua essência assim como lhe foi originariamente posta enquanto ‘guardiã de suas
próprias leis’ ou se, pelo contrário, é primeiramente sustentada e determinada em sua atitude de
guardiã pela verdade daquilo de onde suas leis recebem o caráter de leis. isto se decide a partir da
originalidade com a qual a essência primeira da filosofia se tornará fundamental para a interrogação
filosófica” (p. 341).
Para Heidegger, é o caso de se perguntar, primeiro, se a questão da essência da verdade não
deve ser, ao mesmo tempo e primeiramente, a questão da verdade da essência.
“A questão da essência da verdade encontra sua resposta na proposição: a essência da
verdade é a verdade da essência.” (p. 343)
3º texto - O fim da filosofia e a tarefa do pensamento.
Heidegger abordou o “fim da filosofia” em termos distintos dos que foram propostos por
Marx e Wittgenstein. Segundo Ernildo Stein, que foi aluno de Heidegger, o “fim da Filosofia é, para o
filósofo alemão, o ‘fim’ da Filosofia enquanto Metafísica. A Metafísica atingiu suas ‘possibilidades
supremas’ dissolvendo-se no surto crescente das ciências que esvaziam a problemática filosófica. O
Filósofo reserva, porém, um novo começo para a Filosofia, superando a Metafísica. Heidegger afirma
que no fim da Filosofia (como Metafísica) resta uma ‘tarefa para o pensamento’. Esta tarefa é a
questão do pensamento. ‘A última possibilidade’ — a dissolução da Filosofia nas ciências tecnicizadas
— acaba revelando uma ‘primeira possibilidade’”. Assim, o fim da filosofia como metafísica suscita a
questão do pensamento. Heidegger tenta investigar, então, quais as condições de possibilidade dessa
questão e como ela se instaura, constitui e se desdobra. O fim da filosofia, para Heidegger, é a última
possibilidade que, se adequadamente enfrentada, abre uma nova oportunidade que se traduz em
enfrentar a questão do pensamento.
Heidegger procura responder duas questões fundamentais: “1. Em que medida entrou a
Filosofia, na época atual, em seu estágio final? 2. Que tarefa ainda permanece reservada para o
pensamento no fim da Filosofia?”
Para a primeira pergunta, Heidegger parte do pressuposto que filosofia é metafísica.
[“Filosofia é Metafísica. Esta pensa o ente em sua totalidade — o mundo, o homem, Deus — sob o
ponto de vista do ser, sob o ponto de vista da recíproca imbricação do ente e ser. A Metafísica pensa o
ente enquanto ente ao modo da representação fundadora. Pois o ser do ente mostrou-se, desde o
começo da Filosofia, e neste próprio começo, como o fundamento (afché, aítion, princípio).”].
Heidegger identifica o fim da filosofia como o fim da metafísica. “Fim”, aí, não no sentido de
cessação, de término: o sentido utilizado por Heidegger parece mais de esgotamento ou acabamento
da metafísica. Tudo o que a metafísica poderia fazer pela filosofia, foi feito. [“Pelo contrário, quando
falamos do fim da Filosofia queremos significar o acabamento da Metafísica. Acabamento não quer
dizer, no entanto, plenitude no sentido que a Filosofia deveria ter atingido, com seu fim. a suprema
perfeição. Falta-nos não apenas qualquer medida que permitisse estimar a perfeição de uma época
da Metafísica em comparação a outra.”]
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Heidegger identifica o fim como a realização total da empreitada filosófica da metafísica [“O
fim da Filosofia é o lugar, é aquilo em que se reúne o todo de sua história, em sua extrema
possibilidade. Fim como acabamento quer dizer esta reunião.” (...) “Fim é, como acabamento, a
concentração nas possibilidades supremas.”]
Vem, então, a ciência, nascida pelo horizonte aberto pela filosofia. O acabamento da filosofia
é o surgimento da ciência e sua autonomia. [“O desenvolvimento das ciências é, ao mesmo tempo,
sua independência da Filosofia e a inauguração de sua autonomia. Este fenômeno faz parte do
acabamento da Filosofia. Seu desdobramento está hoje em plena marcha, em todas as esferas do
ente. Parece a pura dissolução da Filosofia; é, no entanto, precisamente seu acabamento.”]
Heidegger destaca a cibernética ou a técnica como a forma pela qual a ciência, como
“acabamento” da filosofia, se liga à prática social. [“Não é necessário ser profeta para reconhecer que
as modernas ciências que estão se instalando serão, em breve, determinadas e dirigidas pela nova
ciência básica que se chama cibernética. Esta ciência corresponde à determinação do homem como
ser ligado à praxis na sociedade. Pois ela é a teoria que permite o controle de todo planejamento
possível e de toda organização do trabalho humano. A cibernética transforma a linguagem num meio
de troca de mensagens. As artes tornam-se instrumentos controlados e controladores da
informação.”]
[“O desdobramento da Filosofia cada vez mais decisivamente nas ciências autônomas e, no
entanto, interligadas, é o acabamento legítimo da Filosofia. Na época presente a Filosofia chega a seu
estágio terminal. Ela encontrou seu lugar no caráter cientifico com que a humanidade se realiza na
praxis social.”]
Heidegger destaca essa relação entre filosofia e ciência [“Aquilo que a Filosofia, no transcurso
de sua história, tentou em etapas, e mesmo nestas de maneira insuficiente, isto é, expor as ontologias
das diversas regiões do ente (natureza, história, direito, arte), as ciências o assumem como tarefa sua.
Seu interesse dirige-se para a teoria dos, em cada caso necessário, conceitos estruturais do campo de
objetividade aí integra.”]. Diz, ainda, que o fim da filosofia corresponde ao triunfo do “equipamento
controlável de um mundo técnico-científico e da ordem social que lhe corresponde. Fim da Filosofia
quer dizer: começo da civilização mundial fundada no pensamento ocidental-europeu”.
Com o “acabamento” da filosofia, Heidegger indaga o que remanesce como tarefa para o
pensamento? A filosofia não estaria à altura da questão do pensamento e, por isso, seria mera
história em decadência?
A pergunta sobre a tarefa do pensamento significa, no horizonte da Filosofia, “determinar
aquilo que interessa ao pensamento, aquilo que para o pensamento ainda é controverso, o caso em
litígio. Isto é dito na língua alemã pela palavra ‘Sache’, a ‘questão’”. Mais precisamente, na “questão
mesma”. Heidegger diz que a “questão mesma” é determinada historialmente e tem estreita relação
com a subjetividade. Será a elucidação da “questão mesma” que determinará a tarefa do
pensamento no fim da filosofia.
Heidegger destaca a diferença de método entre Hegel e Husserl. Heidegger destaca a questão
da intersubjetividade (um ente se reflete especulativamente no outro). Nisso se enxerga uma
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abertura, uma claridade, uma clareira. Clareira vem clarear: tornar algo claro, leve, livre e aberto. “A
clareira é o aberto para tudo que se presenta e ausente”. A tarefa do pensamento seria, portanto,
atentar para a questão que é designada como “clareira”. [“Todo o pensamento da Filosofia, que.
expressamente ou não segue o chamado ‘às coisas mesmas’, já está, em sua marcha, com seu
método, entregue à livre dimensão da clareira. Da clareira, todavia, a Filosofia nada sabe. Não há
dúvida que a Filosofia fala da luz da razão, mas não atenta para a clareira do ser”]. A clareira conduz
ao desvelamento: esse é a possibilidade do caminho em direção da presença e possibilita de a clareira
mesma o presentar-se. Mas clareira e desvelamento ainda não são a verdade: só na passagem do
desvelamento para a retitude é que há transformação essencial da verdade. Daí Heidegger trabalha
com a ratio e o tema em torno da racionalidade e irracionalidade para determinar que todos
precisamos de uma disciplina para o pensamento.
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Fichamento 02
Modo de citação:
“Crítica do Julgamento/Crítica do Juízo”, de Kant
ou
KANT, Immanuel. Crítica da faculdade de julgar. Tradução Daniela Botelho B. Guedes. São Paulo:
Ícone Editora, 2009.
“Porém, só há duas classes de conceitos que admitem outros tantos princípios distintos de
possibilidade de seus objetos: os conceitos de natureza e o conceito de liberdade.” (p. 15)
“E, entretanto, a última distinção é essencial, já que se o conceito que orienta a causalidade for um
conceito de natureza, os princípios são técnico-práticos, enquanto se for um conceito de liberdade,
são estes morais-práticos; e como na divisão de uma ciência racional, é de toda importância o
distinguir entre si os objetos para cujo conhecimento se requerem princípios diferentes, os primeiros
pertencerão à filosofia teórica (como teoria da natureza), enquanto os outros constituirão por si sós a
segunda parte, a saber: a filosofia prática (como teoria dos costumes).” (p. 16)
“Os conceitos da natureza, que contêm o fundamento de todo conhecimento teórico a priori,
repousavam na legislação do entendimento. O conceito de liberdade, que contém os fundamentos
de todos os preceitos práticos a priori sensíveis-incondicionados, repousava na legislação da razão.
Por conseguinte, as duas faculdades, além de que pela forma lógica possam aplicar-se a princípios,
qualquer que seja sua origem, têm também, cada uma delas, sua própria legislação conforme seu
conteúdo, sobre a qual não há outra (a priori), e a qual, portanto, justifica a divisão da filosofia em
teórica e prática.” (p. 21)
“Portanto, mesmo que a filosofia só possa dividir-se em duas partes principais: a teórica e prática;
mesmo que seja preciso incluir na parte teórica, isto é, no conhecimento racional por princípios
naturais, tudo quanto possamos dizer dos princípios peculiares da faculdade de julgar, a crítica da
razão pura, que tem que abarcar tudo isso, antes de elaborar aquele sistema, e com vistas a torná-lo
possível, consistirá em três partes: a crítica do entendimento puro, a da faculdade de julgar pura e a
da razão pura, faculdades que qualificamos de puras porque são legislativas a priori.” (p. 23)
“A faculdade de julgar é a faculdade de conceber o particular como contido no universal.” (p. 24)
“Essa coincidência da natureza com nossa faculdade de conhecimento é suposta a priori pela
faculdade de julgar, a fim de que possa refletir sobre aquela observando suas leis empíricas; já que,
ao mesmo tempo, o entendimento a considerar objetivamente como acidental, e apenas a faculdade
de julgar a atribui à natureza como finalidade transcendental (com respeito à faculdade de conhecer
do sujeito); e ocorre que, sem pressupor essa finalidade, não poderíamos ter nenhuma ordem
natural baseada em leis empíricas, e, portanto, nenhum guia para uma experiência (e para sua
investigação) que se possa dispor de acordo com essas leis em toda sua diversidade.” (p. 30)
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“Nisso se funda a divisão da crítica da faculdade de julgar em estética e teológica, entendendo pela
primeira a faculdade de julgar, a idoneidade formal (denominada subjetiva) por meio do sentimento
de agrado ou desagrado, e pela segunda a de julgar a idoneidade real (objetiva) da natureza por meio
do entendimento e da razão.” (p. 38)
“Para discernir se algo é belo ou não, relacionamos a representação, não pelo entendimento ao
objeto em vista do conhecimento, mas pela faculdade da imaginação (talvez ligada ao entendimento)
ao sujeito e ao seu sentimento de agrado ou desagrado experimentado por este.” (p. 47)
“Quando se qualifica de sensação uma determinação do sentimento de agrado ou desagrado, essa
expressão tem um significado totalmente distinto de quando chamamos de sensação a
representação de uma coisa (por meio dos sentidos, na qualidade de receptividade pertencente à
faculdade de conhecer), pois no último caso a representação está relacionada ao objeto, e apenas ao
sujeito no primeiro de modo que neste não serve para nenhum conhecimento, nem sequer para o
que permite ao sujeito conhecer a si mesmo.” (p. 50).
“Gosto é a faculdade de julgar um objeto ou modo de representação por um agrado ou desagrado
alheio a todo interesse. O objeto de semelhante agrado é qualificado de belo.” (p. 55)
“Belo é que, sem conceito, agrada universalmente” (p. 63)
“Os juízos estéticos, assim como os teóricos (lógicos), podem dividir-se em empíricos e puros. Os
primeiros são os que predicam de um objeto, ou de seu modo de representação, se é agradável ou
não; os segundos, se é belo ou não. Aqueles são juízos do sentido (juízos estéticos materiais), estes
(enquanto formais) são os únicos juízos de gosto genuínos.” (p. 68)
“A faculdade dos conceitos, sejam estes obscuros ou claros, é o entendimento, e embora para o juízo
de gosto como juízo estético se necessite também (como para todos os juízos) o entendimento, este
não se faz necessário então como faculdade do conhecimento de um objeto, mas como faculdade da
determinação do juízo e de sua representação (sem conceito) que a relaciona ao sujeito e ao seu
sentimento interno, e isso sempre que esse juízo seja possível de acordo com uma regra geral.” (p.
73)
“Existem distintas classes de beleza: a livre (pulchritudo vaga) e a meramente aderente (pulchritudo
adhaerens). A primeira não pressupõe conceito algum do que seja o objeto; a segunda o pressupõe e,
ademais, pressupõe a perfeição do objeto sob esse conceito. As espécies da primeira se chamam
belezas de tal ou qual coisa (existentes em si); a segunda, enquanto anexa a um conceito (beleza
condicional), se atribui aos objetos que se encontram sob o conceito de um fim especial.” (p. 73)
“Beleza é a forma da finalidade de um objeto, quando é percebida nele sem a representação de um
fim.” (p. 80)
“Os conhecimentos e os juízos, juntamente com a convicção anexa a eles, devem poder ser
comunicados universalmente, pois, de outro modo, não lhes corresponderia uma coincidência com o
objeto e seriam todos eles um mero jogo subjetivo das faculdades da representação, exatamente
como pretende o ceticismo. Porém, para que os conhecimentos possam ser comunicados, é preciso
12
porém que se possa comunicar universalmente o estado de espírito, quer dizer, a disposição das
faculdades de conhecimento com respeito a um conhecimento qualquer, e obviamente a proporção
que se requer para uma representação (mediante a qual nos é dado um objeto) para que esta se
converta em conhecimento, visto que, sem essa proporção, condições subjetiva do conhecer, não se
poderia obter como resultado o conhecimento.” (p. 83)
“Belo é o que, sem conceito, se reconhece como objeto de um prazer necessário.” (p. 85)
“O belo coincide com o sublime na medida em que ambos agradam por si mesmos, e, ademais, na
medida em que ambos pressupõem não um juízo que se defina pelos sentimentos nem logicamente,
senão um juízo de reflexão; consequentemente, o prazer não reside numa sensação como a do
agradável, nem num conceito determinado como o do prazer pelo bom, ao contrário, está
relacionado a conceitos, mesmo sem determinar quais, e portanto o prazer está associado à mera
exposição ou à faculdade desta, de modo que, numa intuição dada, a faculdade da exposição ou da
imaginação se considera concordante com a faculdade dos conceitos, do entendimento ou da razão,
resultando assim favorável a esta última.” (p. 91)
“Portanto, às fórmulas anteriores de definição do sublime, podemos incorporar a seguinte: sublime é
o que, por ser só capaz de concebê-lo, revela uma faculdade do espírito que vai além de toda medida
dos sentidos.” (p. 98)
“Com isso se vê também que o verdadeiramente sublime deve ser buscado somente no espírito de
quem julga e não no objeto natural cujo juízo provoca nele estado de ânimo.” (p. 103)
“O sentimento do sublime é, pois, um sentimento de desagrado provocado pelo inadequado da
imaginação, na estimativa estética, de magnitudes à estimativa pela razão, concomitante a um
sentimento de agrado provocado pela coincidência precisamente desse juízo do inadequado do mais
alto da faculdade sensível com as ideias de razão, enquanto a aspiração a estas é lei para nós. De
fato, é lei (de razão) para nós e pertence a nossa distinção que consideremos pequeno, em
comparação com ideias da razão, tudo quanto a natureza, como objeto dos sentidos, contém de
grande para nós, e o suscitado em nós pelo sentimento desta destinação suprassensível coincide com
aquela lei.” (p. 105)
“Por conseguinte, o sublime não está em nenhuma coisa da natureza, mas apenas em nosso espírito,
na medida em somos capazes de adquirir consciência de sermos superiores à natureza em nós e, com
isso, também à natureza fora de nós (na medida em que exerce influência sobre nós). Tudo quanto
suscita em nós esse sentimento, contando entre isso a potência da natureza que provoca nossas
forças, se chama então (ainda que impropriamente) sublime, e somente pressupondo em nós essa
ideia, e com relação a ela, seremos capazes de chegar à ideia da sublimidade daquele ser que não só
provoca em nós íntimo respeito por sua potência que demonstra na natureza, mas também, e ainda
mais, pela capacidade existente em nós de julgar aquela potência sem temos e nossa destinação
como superior a ela.” (p. 112)
“Nessa modalidade dos juízos estéticos, a da pretendida necessidade, temos um fator capital para a
crítica da faculdade de julgar, visto que nos permite conhecer neles, um princípio a priori e os
emancipa da psicologia empírica, na qual de outro modo permaneceriam sepultados sob os
sentimentos de prazer e dor (com a mera qualificação, que nada diz, de ser um sentimento mais
13
delicado), para colocá-los, e por meio deles a faculdade de julgar, na classe dos que têm por
fundamento princípios a priori e, nessa qualidade, passá-los à filosofia transcendental.” (p. 114)
“Belo é o que agrada no mero juízo (ou seja, sem o intermédio da sensação sensorial, segundo um
conceito do entendimento). Disse se deduz de per si que necessita agradar sem nenhum interesse.
Sublime é o que agrada diretamente por sua resistência contra o interesse dos sentidos.
As duas, como definições de um julgar estético de validade universal, se referem a motivos
subjetivos: de um lado, da sensibilidade, na medida em que são idôneos com relação ao sentimento
moral, a favor do entendimento contemplativo, e, por outro, contra ela mesma, mas a favor dos fins
da razão prática, embora uns e outros se encontrem unidos no mesmo sujeito. O belo para nos
prepara para amar algo, até a natureza, sem interesse; o sublime, para estimá-lo altamente, até
contra nosso interesse (sensível).
O sublime pode ser descrito dizendo-se que é um objeto (da natureza), cuja representação determina
o espírito a pensar o inacessível da natureza como exposição de ideias.” (p. 116)
“O objeto de um prazer intelectual puro e incondicionado é a lei moral em sua potência que exerce
em nós sobre todos e cada um dos recursos do espírito que a precedem, e como esteticamente essa
potência só se dá a conhecer propriamente por meio de sacrifícios (que constituem uma privação,
embora com vistas à liberdade interior, descobrindo, em contrapartida, em nós uma profundidade
incomensurável dessa faculdade suprassensível com todas suas consequências que se estendem
além dos alcances da nossa visão), o prazer é negativo visto pelo lado estético (em relação à
sensibilidade), quer dizer, contrário a esse interesse, mas é positivo e associado ao interesse se
considerado pelo lado intelectual. Segue-se disso que o bem (moral) intelectual conforme em si
mesmo aos fins, esteticamente julgado, tem que ser representado não tanto como belo, quanto
como sublime, de modo que despertará antes o sentimento do respeito (que desdenha os atrativos)
que o de amor e íntima inclinação, visto que, com esse bem, a natureza humana não coincide
espontaneamente senão graças à violência que a razão exerce sobre a sensibilidade.” (p. 120)
“Portanto, só nos resta buscar a dedução dos juízos de gosto, quer dizer, dos juízos sobre a beleza
das coisas naturais, com o que teremos cumprido toda a obrigação correspondente à totalidade da
faculdade de julgar estética (p. 129)
“Na realidade, o juízo de gosto se formula sempre e totalmente com o juízo singular do objeto.” (p.
134)
“Esta dedução é tão fácil porque não precisa justificar uma realidade objetiva de um conceito, pois a
beleza não é um conceito do objeto, nem o juízo de gosto um juízo de conhecimento. Sustenta
apenas que estamos a autorizados a pressupor em todos os homens em geral as mesmas condições
subjetivas da faculdade de julgar que encontramos em nós com a única condição de que tenhamos
subsumido devidamente sob essas condições o objeto dado.” (p. 140)
“O gosto é, pois, a faculdade de julgar a priori, a comunicabilidade dos sentimentos associados a uma
representação dada (sem mediação de um conceito).” (p. 145).
“Empiricamente, o belo interessa apenas em sociedade, e se admite a tendência à sociedade como
natural no homem, e a aptidão para ela e a propensão a ela, quer dizer, a sociabilidade, como
requisito do homem como criatura destinada à sociedade, isto é, como qualidade correspondente à
14
humanidade, é impossível que se deixe de considerar também o gosto como uma faculdade de julgar
tudo aquilo mediante o qual é possível comunicar até o sentimento próprio a todos os demais, e,
portanto, como meio de fomentar aquilo a que por inclinação natural todos tendemos.” (p. 146)
“A arte se distingue da natureza, como o fazer (facere) do obrar ou atuar em geral (agere), e o
produto ou consequência da primeira, como obra (opus), do da segunda, como efeito (effectus).” (p.
152)
“A arte como habilidade do homem se distingue também da ciência (o poder, do saber), como a
faculdade prática da teórica, como a técnica da teoria (como a agrimensura da geometria).” (p. 153)
“Arte bela é, pelo contrário, um modo de representação idôneo por si mesmo e que, mesmo sem
finalidade, estimula o cultivo das forças espirituais para a comunicação social.
A comunicabilidade universal de um agrado implica já em seu conceito que esse agrado não pode ser
de gozo, proveniente de mera sensação, mas precisa ser da reflexão; e assim, a arte estética, como
arte bela, é a que tem como norma a faculdade de julgar especulativa e não a sensação sensorial.” (p.
155)
“Gênio é o talento (dom natural) que dá a regra à arte. E como o talento, como faculdade inata
produtiva do artista, pertence à natureza, poder-se-ia dizer que gênio é a disposição natural do
espírito (engenho) mediante a qual a natureza dá a regra à arte.” (p. 157)
“Para julgar os objetos belos como tais, se requer gosto, e para a arte bela, ou seja, para produzi-los,
gênio.” (p. 160)
“Uma beleza natural é uma coisa bela; a beleza artística é uma representação bela de uma coisa.” (p.
161)
“No sentido estético, chama-se de espírito o princípio vivificante do ânimo. Mas aquilo mediante o
qual esse princípio aviva a alma, a matéria empregada ao efeito, é o que põe idoneamente as
energias espirituais em vibração, quer dizer, num jogo que se sustenta por si mesmo e que, por sua
vez, robustece as energias que requer.” (p. 163) “Pois bem, eu sustento que esse princípio não é
outra coisa senão a faculdade de representar ideias estéticas, porém entendendo por ideia estética
aquela representação da imaginação que induz muito a pensar, sem que possa ter, não obstante,
nenhum pensamento determinado, ou seja, conceito adequado, representação, pois, à qual
nenhuma linguagem chega totalmente, nem consegue tornar completamente compreensível. Vê-se
facilmente que constitui a contrapartida (pendant) de uma ideia racional, a qual, pelo contrário, é um
conceito que não pode ter nenhuma intuição (representação da imaginação) adequada.” (p. 163)
“Partindo dessas suposições, gênio é a originalidade exemplar do dom natural de um sujeito no uso
livre de suas faculdades de conhecimento.” (p. 167)
“Para alcançar a beleza não é tão necessário ter muitas ideias e originais como o acerto em
harmonizar com a legalidade do entendimento aquela imaginação em sua liberdade. De fato, a
liberdade desenfreada da primeira, por fecunda que seja, não produz mais que absurdos, enquanto a
faculdade de julgar é a que permite conciliá-la com o entendimento.” (p. 169)
15
“As artes elocutórias são a eloquência e a poesia. Eloquência é a arte de tratar como livre jogo da
imaginação um assunto do entendimento; poesia, a de executar como assunto do entendimento um
livre jogo da imaginação.” (p. 170)
“As artes figurativas, ou da expressão de ideias em intuição sensível (não por meio de representações
da mera imaginação suscitadas mediantes palavras), são a da verdade sensível e da aparência
sensível. A primeira se chama plástica; a segunda, pintura. Ambas fazem figuras no espaço para
expressão de ideias; aquela faz figuras cognoscíveis para dois sentidos: a visão e o tato (embora para
o último não com vistas à beleza); a segunda, apenas para a visão.” (p. 171)
“A eloquência pode unir-se a uma exposição pictórica, tanto de seus temas quanto objetos, numa
representação cênica, a poesia à música no canto, e este ao mesmo tempo à exposição pictórica
(teatral) numa ópera, o jogo de sensações de uma música com o faz figuras na dança etc.” (p. 175)
“Entre todas mantém a mais alta hierarquia a poesia (que deve quase exclusivamente ao gênio sua
origem, e é a que menos admite ser dirigida por preceitos ou modelos). Expande o espírito ao libertar
a imaginação e, dentro dos limites de um conceito dado, dentre a ilimitada variedade de formas
possíveis que podem conciliar-se com ele, oferece aquela que une a exposição desse conceito a uma
plenitude de pensamento, à qual nenhuma linguagem pode acomodar-se totalmente, elevando-se
assim esteticamente a ideias. Fortalece o espírito fazendo-o sentir sua capacidade (livre, autônoma e
independente da natureza) de considerar e julgar a natureza, enquanto fenômeno, segundo aspectos
que não se oferecem por si mesmos na experiência, nem aos sentidos nem ao entendimento, e de
utilizá-la com vistas ao suprassensível e como uma espécie de esquema para ele.” (p. 176)
“Atentando ao atrativo e ao movimento do ânimo, colocaria eu depois da poesia a arte que mais dela
se aproxima entre as elocutórias e que de modo muito natural pode associar-se a ela, a saber: a
música, (...).” (p. 177)
“Entre o regozijante, muito próximo do deleite precedente do riso, e a originalidade do espírito,
ainda que não pertencente ao talento da arte bela, pode figurar também o modo humorístico. No
bom entendimento, humor significa o talento de colocar-se voluntariamente em certa disposição de
ânimo em que todas as coisas se julgam de modo muito distinto (e até oposto) ao comum, ainda que
em semelhante disposição de espírito se atente a certos princípios racionais. O submetido
involuntariamente a essas transformações se chama caprichoso; porém o que sabe adotá-las
voluntariamente e com vistas a um fim (desejando oferecer uma exposição animada por meio de um
contraste que induza ao riso) é qualificado de humorista.” (p. 185)
“Para que uma faculdade de julgar seja dialética, necessita, antes de mais nada, ser raciocinante, isto
é, seus juízos têm que aspirar a ser universais e ainda a priori, pois a dialética consiste na oposição de
tais juízos. É por isso que não é dialética a inconciliabilidade de juízos estéticos sensíveis (sobre o
agradável e o desagradável).” (p. 187)
“Tese: O juízo de gosto não se baseia em conceitos, pois do contrário poder-se-ia debater sobre dele
(decidir por demonstração).
Antítese: O juízo de gosto se baseia em conceitos, pois do contrário, prescindindo de sua diversidade,
nem sequer se poderia discutir sobre ele (aspirar ao necessário sentimento de outros a esse juízo).”
(p. 188-189)
16
“Em atenção a isso, pode-se definir também o gênio como capacidade de ideias estéticas, com o que
se indica ao mesmo tempo a razão de que nos produtos do gênio é a natureza (do sujeito), e não um
fim reflexivo, o que dá a regra à arte (à produção do belo).” (p. 194)
“Assim, temos: 1º uma antinomia da razão com relação ao uso teórico do entendimento chegando
até o incondicionado para a faculdade do conhecimento; 2º uma antinomia da razão com relação ao
uso estético da faculdade de julgar para o sentimento de agrado e desagrado; 3º uma antinomia com
relação ao uso prática da razão legisladora em si mesma para a faculdade de desejar; na medida em
que todas essas faculdades têm seus princípios superiores a priori e, em virtude de uma exigência
ineludível da razão, precisam poder julgar também incondicionalmente segundo esses princípios e
determinar seu objeto.” (p. 195)
“Assim como a idealidade dos objetos dos sentidos, como fenômenos, é o único modo de explicar a
possibilidade de que suas formas sejam determinadas a priori, assim também o idealismo da
idoneidade no juízo do belo da natureza e da arte é o único pressuposto que permite à crítica explicar
a possibilidade de um juízo de gosto que a priori reclama validade para todos (apesar de não basear
em conceitos a idoneidade representada no objeto).” (p. 201)
“1º O belo agrada diretamente (porém apenas na intuição reflexionante, não, como a moralidade, no
conceito). 2º Agrada independentemente de todo interesse. (O moralmente bom encontra-se
necessariamente associado a um interesse, mas não como o que precede o juízo sobre o prazer, mas
apenas por esse é produzido). 3º A liberdade da imaginação (ou seja, da sensibilidade de nossa
capacidade se representa de acordo com a legalidade do entendimento do juízo do belo. (No juízo
moral, a liberdade da vontade se concebe como coincidência desta última consigo mesma segundo as
leis universais da razão.) 4º O princípio subjetivo do juízo do belo se representa como universal, isto
é, como válido para todos, porém não como cognoscível por meio de um conceito universal. (O
princípio objetivo da moralidade é declarado também universal, isto é, para todos os sujeitos, e ao
mesmo tempo também para todos os atos do mesmo sujeito, e como cognoscível então por meio de
um conceito universal.) É por isso que o juízo moral é suscetível não somente a princípios
constitutivos determinados, mas é unicamente possível mediante a fundamentação de máximas
neles e em sua universalidade.” (p. 204)
“Contudo, para a investigação da natureza, é lícito que se utilize, pelo menos problematicamente, o
modo de julgar teleológico; porém apenas com a condição de que, por analogia com a causalidade
por fins, ele seja subordinado a princípios de observação e exploração, porém sem pretender explicálos por meio dele. Consequentemente, pertence à faculdade de julgar reflexionante, não à
determinante.” (p. 208-209)
“Sendo assim, o fato de que precisamente essa harmonia, apesar de toda essa idoneidade, não seja
conhecida empiricamente mas a priori teria de implicar que o espaço, cuja determinação (mediante a
imaginação, e em conformidade com um conceito) é a única coisa que torna possível o objeto, não é
uma qualidade das coisas alheias a mim, mas sim um mero modo de representação em mim, e sou
eu, consequentemente, que introduzo a idoneidade na figura que desenho em conformidade com
um conceito, ou seja, em minha própria representação do que é dado fora de mim, seja o que for em
si, e não que isso me ensine empiricamente a idoneidade, a qual, consequentemente, não necessita
no objeto nenhum fim especial alheio a mim. E como essa reflexão já requer um uso crítico da razão,
17
não podendo, portanto, ser contida imediatamente no juízo do objeto por suas qualidades, esse juízo
não me proporciona diretamente mais que uma combinação de regras heterogêneas (e ainda
segundo o que em si têm de heterogêneo) num princípio que, todavia, é reconhecido a priori por
mim como verdadeiro, sem que para isso requeira um fundamento especial situado a priori fora do
meu conceito e sobretudo de minha representação”. (p. 213)
“A experiência conduz nossa faculdade de julgar ao conceito de uma idoneidade objetiva e material,
isto é, ao conceito de um fim da natureza, unicamente quando há que se julgar uma relação de causa
e efeito, que só nós vemos capazes de considerar legal atribuindo a ideia do efeito da causalidade a
sua causa como condição que serve de fundamento a esta para a possibilidade da primeira.” (p. 215)
“Para compreender que uma coisa apenas é possível como fim, isto é, para ter que buscar a
causalidade de sua origem, não no mecanismo da natureza, mas sim numa causa cuja faculdade de
operar se determina por conceitos, é necessário: que sua forma não seja possível por meio de meras
leis naturais, isto é, daquelas que conhecemos apenas pelo entendimento aplicado a objetos dos
sentidos, e ainda que seu conhecimento empírico, por suas causas e efeitos, pressuponha conceitos
da razão.” (p. 218)
“Consequentemente para que um corpo seja julgado fim natural em si e em sua possibilidade
intrínseca, se necessita que toldas as suas partes, tanto por sua forma como por sua união,
produzam-se entre si alternadamente, formando assim por causalidade própria um todo cujo
conceito possa ser julgado, por sua vez, inversamente, causa desse corpo segundo um princípio (num
ser que possua a causalidade segundo conceitos, adequada a tal produto), e, assim, a união das
causas eficientes ao mesmo tempo efeito por causas finais.” (p. 222)
“Portanto, os seres organizados são os únicos da natureza que, mesmo considerando-os em si e sem
relação com outras coisas, unicamente como fins dela têm que ser concebidos possíveis, e que, por
isso, imprimem pela primeira vez realidade objetiva ao conceito de um fim, que não é fim prático,
mas fim da natureza, e que assim proporciona à ciência natural uma base para a teleologia, isto é,
para um modo de julgar seus objetos segundo um princípio particular tal que de modo algum seria
lícito introduzir de outro modo (porque não pode ser compreendida a priori a possibilidade de
semelhante tipo de causalidade.” (p. 224)
“Esse princípio, que ao mesmo tempo os define, diz assim: Produto organizado da natureza é aquele
em que tudo é fim e alternadamente também meio. Nada nele é porque sim, sem fim ou atribuível a
um mecanismo natural cego.” (p. 224)
“Os princípios de uma ciência poderiam ser: intrínsecos a ela, e então se chamam interiores (principia
domestica), ou fundar-se em conceitos que apenas fora dela encontram lugar, e se chamam
princípios exteriores (peregrina). As ciências que contêm os últimos tomam por fundamentos de suas
doutrinas princípios emprestados (lemmata), quer dizer, tomam emprestado de outra ciência algum
conceito e com ele um fundamento de estruturação.” (p. 230)
“A faculdade de julgar determinante não tem por si princípios que sirvam de fundamentos a
conceitos de objetos. Não é uma autonomia, pois se limita a subsumir sob conceitos ou leis dados, a
título de princípios. Precisamente por isso não se encontra exposta a nenhum perigo de parte de sua
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própria autonomia nem a colisões entre seus princípios.” (p. 233)
“Em contrapartida, a faculdade de jugar reflexionante há de subsumir sob uma lei que ainda não está
dada e que, por conseguinte, não é na realidade senão um princípio da reflexão sobre objetos para os
quais objetivamente carecemos em absoluto de lei, ou de um conceito do objeto que resulte
suficiente como princípio para os casos que se apresentem.” (p. 234)
“Consequentemente, toda aparência de antinomia entre as máximas do modo de explicação
propriamente físico (mecânico) e teleológico (técnico) se baseia em que se confunde um princípio da
faculdade de julgar reflexionante com o da determinante, e a autonomia da primeira (válida apenas
subjetivamente para o uso de nossa razão com relação às leis particulares da experiência) com a
heteronomia da outra, que precisa ser regida pelas leis (universais ou particulares) dadas pelo
entendimento.” (p. 238)
“Os sistemas relativos à técnica da natureza, ou seja, a sua força produtiva segundo a regra dos fins,
são de duas classes: os do idealismo e os do realismo dos fins naturais. O primeiro sustenta que toda
a idoneidade da natureza é não internacional; o segundo, que alguma dessa idoneidade (nos seres
organizados) é intencional; de onde também se poderia retirar, pois, a consequência de que é
intencionada, isto é, fim, a técnica da natureza, o que se aplica também a toldos seus demais
produtos com relação ao toldo da natureza.” (p.240)
“O que perseguem toldos esses sistemas? Explicar nossos juízos teleológicos sobre a natureza. Para
isso, uns negam a verdade desses juízos, declarando, consequentemente, que são um idealismo da
natureza(apresentada como arte), enquanto outros os reconhecem como verdadeiros e prometem
expor a possibilidade de uma natureza segunda a ideia das causas finais.” (p. 241)
“Em todo caso, o conceito de uma causalidade por fins (arte) tem realidade objetiva, assim como o
de uma causalidade pelo mecanismo da natureza. Porem, o conceito de uma causalidade da natureza
pela regra dos fins, e mais ainda de um ser tal que não nos pode ser dado na experiência, como é o
considerado fundamento original da natureza, pode ser concebido, sim, sem contradição, mas não
servir para determinações dogmáticas, visto que não se pode assegurar por nada sua realidade
objetiva porque não pode ser deduzida da experiência nem é exigível para a possibilidade desta.” (p.
246)
“Sendo assim, as coisas cognociveis são de três classes: coisas de opinião (opinabile), fatols (scibile) e
coisas de fé (mere credibile).” (p. 318)
“A fé (como habitus, não como actus) é o modo de pensamento moral da razão na aquiescência
àquilo que é inacessível para o conhecimento teórico. É, por conseguinte, o principio firme do
espírito a considerar como verdadeiro, o que é necessário supor como condição para a possibilidade
do supremo fim final moral, devido à obrigatoriedade deste, apesar de que não se possa conhecer
por nós sua possibilidade, como tampouco sua impossibilidade.” (p.322)
“Se nos perguntarem porque nos interessamos por ter uma teologia, vê-se claramente que esta não é
necessária para expandir ou retificar nosso conhecimento da natureza sem para qualquer teoria,
senão simplesmente para a religião, isto é, para o uso prático, ou seja: moral, da razão no aspecto
subjetivo. Sendo assim, caso se julgue ser moral o único argumento que conduz um conceito
19
determinado do objeto da teologia, não apenas não estranhará, mas também, em atenção ao
suficiente da aquiescência obtida para o proposito final com base nessa argumentação, tampouco se
perde algo caso se conceda que esse argumento moral apenas para nossa determinação moral, isto
é, no aspecto prático, expõe suficientemente a existência de Deus, e que nele nem a especulação
demonstra sua força nem amplia o alcance de sua jurisdição.” (p. 333)
“Por conseguinte, é perfeitamente possível uma teologia ética, pois amoral pode, sem teologia,
subsistir certamente com sua regra, mas não com o desígnio final que esta impõe, sem deixar a razão
a descoberto com relação a teologia. Em contrapartida, é impossível uma ética teológica da razão
pura), porque não poderiam ser morais as leis que não desse originalmente a mesma razão, e cuja
observância obtivesse também na condição de faculdade prática pura.” (p.336)
20
Respostas às questões:
I)
Quais as interfaces entre verdade e angústia em Heidegger? Ilustrar
A angústia, em Heidegger, é uma revelação do nada. Por ser isso, a angústia lança
dubiedade sobre o ser-aí do homem. Se a angústia manifesta o nada, como apoiar o ente e a
ideia do ser-aí sobre o nada. A angústia revelaria uma postura niilista, uma objeção ontológica
que não se compatibilidade com a ideia de totalidade do ente. A angústia também é uma
postura de desconhecimento: o nada, o desconhecido, se expressa por meio dela. Por isso
que a angústia é uma retrocessão diante de algo.
Mas a transcendência supera a angústia. Aquela representa o ente ir além do
próprio ente como tal. A transferência e sua correlata busca da verdade implicam a
diminuição do nada e, consequentemente, da sua representação: a angústia.
Assim, a correlação entre angústia e verdade se dá em razão do conhecimento:
quanto mais conheço (verdade), menos angústia (nada).
II)
Qual a relação entre Urteilskraft (Poder de Julgamento) e julgamento reflexivo para o
direito e para a arte, como discutido por Kant? Ilustrar com base na temática de nosso
seminário.
Kant afirma que a capacidade de julgar pode ser considerada, seja como mera
faculdade de refletir sobre uma representação dada, segundo certo princípio e em função de
um conceito tornado possível através disso, ou como uma faculdade de determinar um
conceito, que está no fundamento, por uma representação empírica dada. No primeiro caso,
tem-se o julgamento reflexivo, em que o particular é dado e, em razão dele, deve-se
encontrar o universal. A busca de um universal por meio de um particular dado é o juízo
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reflexivo. Já o poder de julgamento representa a capacidade de pensar um particular como
contido sob um universal: é a subsunção (aliás, modo clássico de aplicação do direito). Ele
representa a universalidade de um juízo que tem como fundamento de determinação não um
conceito, mas o poder de julgar enquanto tal. Ambas as ideias kantianas se ligam com a
questão estética, com o belo. Mas o juízo reflexivo tem maior conotação empírica que o
poder de julgar, já que nesse as coisas estão dadas a priori. Nesse sentido, a arte (como maior
expressão do belo) pode ser um método de juízo reflexivo para o direito marcadamente
monopolizado pela subsunção. O seminário, muito certamente, abordará essa nova estratégia
metodológica de ver o direito não como algo dominado pela subsunção.
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Redação de aproveitamento:
O texto de Heidegger pode ser útil na minha dissertação para demonstra o trabalho de investigar a
essência do ente e a busca da verdade em razão da angústia com se depara diante do nada. A
possibilidade de arbitragem de pretensões jurídicas de insolvência empresarial, hoje vista como o
nada, pode-se revelar como verdade. Já o texto kantiano pode ser útil na monografia na medida em
que se pretende formular, na monografia, um juízo que não está fundado no conceito atual de
arbitrabilidade.
23
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