UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE DIREITO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO TÂMARA LUZ MIRANDA RÊGO – HEIDEGGER, Martim. O FIM DA FILOSOFIA E A TAREFA DO PENSAMENTO, SOBRE A ESSÊNCIA DA VERDADE, O QUE É METAFÍSICA. – KANT. CRÍTICA DA RAZÃO PRÁTICA. Salvador Maio, 2012. FICHAMENTO I – MARTIM HEIDEGGER Inicialmente, cumpre-nos registrar que o nosso objetivo nessa exposição se resumirá unicamente a apresentar os fichamentos dos textos “O fim da filosofia e a tarefa do pensamento”; O que é Metafísica”; e “A essência da verdade”, de Martim Heidegger. O FIM DA FILOSOFIA E A TAREFA DO PENSAMENTO: Esquecemos que já na época da filosofia grega se manifesta um traço decisivo da Filosofia: é o desenvolvimento das ciências em meio ao horizonte aberto pela Filosofia. O desenvolvimento das ciências é, ao mesmo tempo, sua independência da Filosofia e a inauguração de sua autonomia."Este fenômeno faz parte do acabamento da Filosofia. Seu desdobramento está hoje em plena marcha, em todas as esferas do ente. Parece a pura dissolução da Filosofia; é, no entanto, precisamente seu acabamento, p. 270. As ciências interpretarão tudo o que em sua estrutura ainda lembra a sua origem na Filosofia, segundo as regras de ciência, isto é, sob o ponto de vista da técnica. As categorias das quais cada ciência depende para a articulação e delimitação da área de seu a compreendem de maneira instrumental, sob a forma de hipóteses de trabalho. A verdade destas hipóteses de trabalho não será apenas medida nos efeitos que sua aplicação traz para o progresso da pesquisa. A verdade científica é identificada com a eficiência destes efeitos, p. 271. A Alétheia, o desvelamento, devem ser pensados como a clareira que assegura ser e pensar e seu presentar-se recíproco. Somente o coração silente da clareira é o lugar do silêncio do qual pode irromper algo assim como a possibilidade do comum-pertencer de ser e pensar, isto é, a possibilidade do acordo entre presença e apreensão, p. 277. Significa razão e princípio de todos os princípios? Pode ser isto algum dia satisfatoriamente determinado sem que experimentemos a Alétheia de maneira grega como desvelamento, para pensá-la então, para além dos gregos, como clareira do ocultar-se? Enquanto a Ratio e o racional permanecerem duvidosos no que possuem de próprio, fica também sem fundamento falar irracionalismo. A racionalização técnico-científica que domina a era atual justifica-se, sem dúvida, de maneira cada vez mais surpreendente através de sua inegável eficácia. Mas tal eficácia nada diz ainda daquilo que primeiro gaiante a possibilidade do racional e irracional. A eficácia demonstra a retitude da racionalização técnico-científica. Esgota-se, no entanto, o caráter de revelado daquilo que é, na demonstrabilidade? Não tranca a insistência sobre o demonstrável justamente o caminho para aquilo que é? Talvez exista um pensamento mais sóbrio do que a corrida desenfreada da racionalização e o prestígio da cibernética que tudo arrasta consigo. Justamente esta doida disparada é extremamente irracional. Talvez exista um pensamento fora da distinção entre racional e irracional, mais sóbrio ainda do que a técnica apoiada na ciência, mais sóbrio e por isso à parte, sem a eficácia e, contudo, constituindo uma urgente necessidade provinda dele mesmo. Se perguntarmos pela tarefa deste pensamento, então será questionado primeiro, não apenas este pensamento, mas também o próprio perguntar por ele. Perante toda a tradição da filosofia isto significa: Nós todos precisamos de uma disciplina para o pensamento e antes disso de saber o que significa uma disciplina ou falta de disciplina no pensamento, p. 279. O QUE É METAFÍSICA Aquilo para onde se dirige a referência ao mundo é o próprio ente — e nada mais. Aquilo de onde todo o comportamento recebe sua orientação é o próprio ente — e além dele nada. Aquilo com que a discussão investigadora acontece na irrupção é o próprio ente — e além dele nada. Mas o estranho é que precisamente, no modo como o cientista se assegura o que lhe é mais próprio, ele fala de outra coisa. Pesquisado deve ser apenas o ente e mais — nada; somente o ente e além dele — nada; unicamente o ente e além disso — nada, p. 234. O ser-aí humano somente pode entrar em relação com o ente se suspende dentro do nada. O ultrapassar o ente acontece na essência do ser-aí. Este ultrapassar, porém, é a própria metafísica. Nisto reside o fato de que a metafísica pertence à "natureza do homem". Ela não é uma disciplina dã filosofia "acadêmica", nem um campo de idéias arbitrariamente excogitadas. A metafísica é o acontecimento essencial no âmbito de ser-aí. Ela é o próprio seraí, Pelo fato de a verdade da metafísica residir neste fundamento abissal possui ela, como vizinhança mais próxima, sempre à espreita, a possibilidade do erro mais profundo. É por isso que nenhum rigor de qualquer ciência alcança a seriedade da metafísica. A filosofia jamais pode ser medida pelo padrão da idéia da ciência.,p. 242. SOBRE A ESSÊNCIA DA VERDADE: O que constantemente se impôs ao bom senso durante a discussão manifestase agora de modo mais claro : a verdade é aqui deslocada para a subjetividade do sujeito humano. Mesmo que este sujeito tenha acesso a uma objetividade, ela permanece, porém, do mesmo modo humana como esta subjetividade e posta à disposição do homem, p. 335. A hostilidade contra a tese que diz que a essência da verdade é a liberdade apóia-se em preconceitos dos quais os mais obstinados são: a liberdade é uma propriedade do homem; a essência da liberdade não necessita nem tolera mais amplo exame; o que é o homem, cada qual sabe, p. 335. A questão da essência da verdade se origina da questão da verdade da essência. Aquela questão entende essência, primeiramente, no sentido de qüididade (quidditas) ou de realidade (realilas) e entende a verdade como uma característica do conhecimento. A questão da verdade da essência entende essência em sentido verbal e pensa, nesta palavra, ainda permanecendo no âmbito da representação metafísica, o ser (Seyn) como a diferença que impera entre ser e ente. Verdade significa o velar iluminador enquanto traço essencial do ser (Seyn). A questão da essência da verdade encontra sua resposta na proposição: a essência da verdade é a verdade da essência. Após a explicação descobre-se com facilidade, que a proposição não inverte simplesmente um a glomerado de palavras. nem quer suscitar a impressão de paradoxo. O sujeito da proposição é, caso esta fatal categoria gramatical ainda possa ser usada, a verdade da essência. O velar ilumina dor é, quer dizer, faz com que se desdobre (Wesen) a concordância entre conhecimento e ente. A proposição não é dialética. Não é de maneira alguma uma proposição no sentido de uma enunciação. A resposta à questão da essência da verdade é adicção de um viravolta no seio da história do ser (Seyn). Porque ao ser pertence o velar iluminado aparece ele originariamente à luz da retração que dissimula. O nome desta clareira alétheia, p. 343. FICHAMENTO II – Crítica da razão prática. Princípios práticos são proposições que encerram uma determinação universal da vontade, subordinando-se a essa determinação diversas regras práticas. São subjetivos, ou máximas, quando a condição é considerada pelo sujeito como verdadeira só para a sua vontade; são, por outro lado, objetivos ou leis práticas quando a condição é conhecida como objetiva, isto é, válida para a vontade de todo ser natural, p.16. A razão pura é por si mesma prática, facultando (ao homem) uma lei universal que denominamos lei moral.É inegável o que acabamos de dizer. Resta apenas por analisar os juízos que os homens articulam sobre a correlação de suas ações à lei, p. 27. É exclusivamente prática a significação que lhe proporciona a razão por meio da lei moral, pois a idéia da lei de uma causalidade (da vontade) tem umacausalidade em si mesma ou constitui o motivo determinante dessa causalidade, p.41. O bem (Güte) ou o mal (Böse) significam contudo sempre uma relação na vontade, quando esta for determinada pela lei da razão a formular com algo um objeto que consentaneamente, porquanto a vontade nunca se determina imediatamente pelo objeto e sua representação, constitui uma faculdade de fazer, mediante uma regra da razão e para si mesma, a causa geradora de uma ação (mediante a qual um objeto pode ser realizado), Güte ou Böse contém pois o sentido que se deve referir às ações e não ao estado sensível da pessoa; e se alguma coisa tivesse de ser absolutamente boa ou má (gut ou böse), em todo o sentido e sem qualquer condição ulterior, ou ser como tal considerada, seria apenas o modo de agir, a máxima da vontade, e conseqüentemente a própria pessoa operante, não, porém, uma coisa que fosse denominada boa ou má. Desse modo poderemos rir do estóico, que espezinhado pela mais violenta das dores artríticas, exclamava: Dor ainda me podes atormentar outro tanto, mas nunca reconhecerei que sejas um mal! Contudo tinha ele razão. O que afetava e o que o seu grito acusava era um übel, mas nem por isso poderia ele conceder que por ele sofria um Böse, porque a dor não diminuía em nada o valor de sua pessoa; o que resultava diminuído era o valor do seu estado, p. 49. A lei moral, portanto, assim como é fundamento formal de determinação da ação mediante a razão pura prática, assim como, também é fundamento material, embora só objetivo da determinação dos objetos da ação sob o nome de bem e de mal, constitui também fundamento subjetivo de determinação, isto é, o motor dessa ação, porque tem influência sobre a sensibilidade do sujeito, produzindo um sentimento que fomenta o influxo da lei sobre a vontade,p. 6061. A analítica da razão pura teórica trata do conhecimento dos objetos que possam ser dados ao entendimento, devendo, portanto, iniciar-se pela intuição, e por isso (já que esta é sempre sensível), pela sensibilidade, avançando só depois aos conceitos (dos objetos desta intuição) para, após essa dupla preparação, terminar com princípios., p. 71. Uma freqüente observação já me convenceu de que, quando este assunto se conduziu a seu fim, o que em meio dele e em relação a outras doutrinas se me afigurava quiçá muito incerto, desde que eu não atendesse a essa incerteza e me consagrasse simplesmente ao meu objetivo, uma vez terminada essa tarefa, concordava a mesma, de um modo inesperado mas perfeitamente bem, com o que encontrara ela por si mesma sem a mínima consideração para com as citadas doutrinas, sem qualquer parcialidade ou deferência para com elas. Os escritores evitariam muitos erros e demasiados esforços inúteis (porquanto foram empregados em ilusões) se determinassem pôr mãos à obra com um pouco mais de sinceridade., p. 84. A lei moral é o único motivo determinante da vontade pura. Mas, embora esta lei seja formal (isto é, só exige que a forma da máxima possa ser universalmente legisladora), vem abstrair-se, como princípio determinante, de toda matéria e, conseqüentemente, de todo objeto do querer. Por conseguinte, ainda que o sumo bem seja o objeto de uma razão pura prática, isto é, de uma vontade pura, não se deve considerá-lo como o fundamento de determinação da mesma, devendo a lei moral ser considerada só apenas como o fundamento para propor-se como objeto àquele supremo bem, o que poderá ser obtido mediante a sua realização ou antecipação., p. 86. O primado na união da razão pura especulativa com a razão pura prática em um conhecimento correspondente à última, sempre na suposição de que a referida união não seja contingente e arbitrária, mas fundamentada a priori sobre a mesma razão e, portanto, necessária., p. 95. Uma exigência da razão pura no seu uso especulativo conduz somente à hipótese, enquanto uma necessidade da razão pura prática conduz a postulados, porque, no primeiro caso, eu me elevo do derivado na série de fundamentos tão alto quanto quero, necessitando de um fundamento primário, não para dar realidade objetiva àquele derivado (por exemplo, a relação causal das coisas e das mutações no mundo), mas só para satisfazer inteiramente a minha razão investigadora em consideração ao mesmo., p. 109. A primeira começa no lugar que eu ocupo no mundo exterior sensível e congloba a conexão em que me encontro com incalculável magnificência de mundos sobre mundos e de sistemas, nos tempos ilimitados do seu movimento periódico, do seu começo e da sua duração. A segunda começa em meu invisível eu, na minha personalidade, expondo-me em um mundo que tem verdadeira infinidade, porém que só resulta penetrável pelo entendimento e com o qual eu me reconheço (e, portanto, também com todos aqueles mundos visíveis) em uma conexão universal e necessária, não apenas contingente, como em relação àquele outro. O primeiro espetáculo de uma inumerável multidão de mundos aniquila, por assim dizer, a minha importância como criatura animal que tem que devolver ao planeta (um mero ponto no universo) a matéria de que foi feito depois de ter sido dotado (não se sabe como) por um curto tempo, de força vital. O segundo, por outro lado, realça infinitamente o meu valor como inteligência por meio de minha personalidade, na qual a lei moral me revela uma vida independente da animalidade e também de todo o mundo sensível, pelo menos enquanto se possa inferir da determinação consoante a um fim que recebe a minha existência por meio dessa lei que não está limitada a condições e limites desta vida, mas, pelo contrário, vai ao infinito., p. 121-122