Redução da maioridade penal - Luiz Flávio Gomes

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Redução da maioridade penal
Publicado por Luiz Flávio Gomes
Disponível em: <http://professorlfg.jusbrasil.com.br/artigos/178865734/reducao-damaioridade-penal?ref=news_feed>. 06 abr. 2015.
Para além de ser uma medida inconstitucional (violadora do art. 228 da CF e tantos
outros dispositivos que asseguram o tratamento diferenciado do adolescente que está
em fase de desenvolvimento da sua personalidade), a redução da maioridade penal
tende a ser inócua: de 1940 (data do Código Penal) até março de 2015 o legislador
brasileiro reformou nossas leis penais 156 vezes. Nenhuma reforma legal jamais
diminuiu qualquer tipo de crime no país, a médio ou longo prazo. Se 156 leis penais
novas não funcionaram, qual a base empírica para se acreditar que uma nova lei,
justamente a decorrente da PEC 171 (Proposta de Emenda Constitucional), seria
diferente? “Insanidade é continuar fazendo sempre a mesma coisa e esperar
resultados diferentes” (Albert Einstein).
Não há dúvida que as leis possuem o efeito mágico (simbólico) de aplacar a
indignação da população irada, que já não suporta mais tanta insegurança. Mas como
as leis não mudam a realidade, em pouco tempo a população volta com carga
redobrada de ira. A desgraça, que emana da consciência ingênua, típica mas não
exclusiva das massas insurgentes, é que ela e a mídia voltam a pedir a mesma coisa:
vão implorar por uma nova lei baixando a idade penal para 14 anos. Depois, vão
demandar nova reforma para atingir os adolescentes de 12 anos. Ad absurdum, esse
raciocínio chegaria à proposta do aborto generalizado para não nascer mais ninguém.
Alguns religiosos mais radicais talvez recuperem a ideia de que o humano não deve
mais fazer sexo.
Em 1990 o Brasil vivia uma onda avassaladora de sequestros, extorsões e
assassinatos. Em 1989 havíamos chegado a 23,7 assassinatos para cada 100 mil
pessoas (fonte: Datasus), contra 11,5 em 1980. O legislador prontamente editou a
mais dura lei penal do país redemocratizado, lei dos crimes hediondos, afirmando que,
com ela, o problema seria resolvido. Em 1990 já chegamos a 26,4 homicídios para 100
mil habitantes. No ano 2000, alcançamos 26,7; em 2005, 28,1; no ano 2010, 27, 4; em
2012, últimos números disponíveis, veio o patamar de 29 para cada 100 mil
habitantes. Com as leis de trânsito e Maria da Penha aconteceu a mesma coisa: a
mera mudança da lei não altera a realidade. Se estatisticamente sabemos que a
simples alteração da lei não diminui a criminalidade, por que agora seria diferente?
A Unicef calcula que cerca de 1% dos homicídios são cometidos (no Brasil) por
menores de 16 e 17 anos (O Globo 2/4/15). Isso significa mais ou menos 600 mortes
anuais. Nas outras mais de 59 mil mortes a polícia investigativa (sucateada) consegue
apurar apenas de 5% a 8% dos casos; 92% contam com impunidade imediata. O
nosso problema, portanto, reside na falta de certeza do castigo. Essa seria a bandeira
correta a ser levantada, fazendo-se um ajuste no ECA para, nos casos de menores
assassinos, aumentar o tempo de internação, de três para seis ou oito anos (como
acontece em vários países europeus). Para além desse ajuste legal, a solução da
criminalidade exige educação de qualidade em período integral, para todos, prevenção
e certeza do castigo previsto na lei. Nada dessas coisas certas fazemos no Brasil.
Teimamos em fazer o errado. Por isso que é insanidade esperar resultados diferentes.
Com 150 milhões de analfabetos funcionais ainda vamos demorar muito para alcançar
a consciência crítica. A redução da maioridade penal como solução de um problema
social é a exploração do humano de consciência ingênua pelo humano demagogo.
Luiz Flávio Gomes
Professor
Jurista e professor. Fundador da Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Foi
Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001).
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