® BuscaLegis.ccj.ufsc.br Estratégia de Crescimento no Brasil João Paulo de Almeida Magalhães* Introdução O atual modelo de crescimento do Brasil deve ser compreendido no contexto histórico que determinou seu surgimento. De 1950 a 1980 a substituição de importações, ou o crescimento com base no mercado interno, proporcionou ao país incremento anual médio do PIB em torno de 7%. No triênio 1961 - 64 o modelo apresentou os primeiros sintomas de esgotamento. Os investimentos substituidores de importação, suscetíveis de serem assumidos independentemente pela iniciativa privada, haviam sido realizados. O rápido incremento do PIB foi mantido até 1980 graças ao apoio governamental a investimentos em alguns importantes setores (como aço, alumínio e celulose), que ofereciam as derradeiras oportunidades de substituir importações. O problema era tipicamente de mercado. Esse fato foi amplamente reconhecido. Os analistas que insistiam na manutenção do "crescimento para dentro "se basearam nos paradigmas que continham propostas para criação de mercado. Defendeu-se, assim, a distribuição de renda (Furtado,1973) inspirada no paradigma marxista e investimentos públicos dentro da linha keynesiana (Tavares, 1973). Prevaleceu, contudo, a idéia que, diante do problema da insuficiência do mercado interno, a solução natural era reorientar a economia para o mercado externo. A opção (patrocinada por organismos internacionais e encorajada por experiências bem-sucedidas como as do Leste da Ásia) foi, assim, por uma estratégia de crescimento para fora, batizada de "integração competitiva no mercado mundial". É esta, portanto, que nos cabe examinar. A Estratégia de Crescimento para Fora em Curso no Brasil As estratégias de crescimento para fora disponíveis eram de duas modalidades bastante distintas: a estratégia-ativa e a estratégia-passiva, de integração no mercado mundial. Elas podem ser descritas a partir de quatro aspectos básicos, a saber: papel do Estado, forma de abertura da economia, papel do investimento estrangeiro e origem das poupanças. A estratégia de integração ativa confere ao Estado papel importante na direção da economia e, sobretudo, na criação de vantagens comparativas dinâmicas em setores de rápido crescimento no mercado internacional. Para ela, a abertura da economia deve ser levada adiante através do rápido aumento das exportações. A liberalização das importações ocorreria apenas na medida do sucesso da política exportadora. O comando do processo cabe a empresas de capital nacional e as poupanças devem ser fundamentalmente de origem interna. Exemplos concretos desse tipo de política econômica são oferecidos por Taiwan e Coréia do Sul. Na estratégia de integração passiva (adotada no Brasil), de cunho nitidamente neoliberal e patrocinada pelo Consenso de Washington, o Estado dever se abster de qualquer interferência na economia. Um dos importantes corolários dessa opção é a especialização do país nas vantagens comparativas naturais ("commodities"). Com respeito à abertura, essa estratégia se coloca no pólo oposto do modelo de integração ativa. Neste, começa-se com o incremento das exportações sendo posterior a abertura às importações. Na integração passiva, o primeiro passo é a rápida e irrestrita abertura às importações. Supõe-se que, com isso, a concorrência externa levará a empresa local a níveis internacionais de produtividade, tornando-a grande exportadora. O comando do processo cabe ao capital estrangeiro incorporado em filiais das grandes empresas multinacionais. Finalmente, num mundo globalizado, com enormes e rapidamente crescentes fluxos financeiros circulando entre países, não há motivo para grande esforço interno de poupança. A diferença, sob esse aspecto, entre os dois modelos pode ser ilustrada lembrando-se que, enquanto os países adotando o primeiro, geravam poupanças internas de 30%, ou mais, do PIB, a mesma percentagem nos optantes pela fórmula passiva neoliberal (situados fundamentalmente a América Latina) não ia além de 17%. Vale a pena recapitular a argumentação oficial para justificar a opção pela estratégia de integração passiva no mercado mundial. Gustavo Franco (1999), presidente do banco central e principal teórico da equipe econômica, considerava que o desenvolvimento do país deveria ser obtido pelo aumento da produtividade total dos fatores (PTF). Esta declinara com o fechamento da economia, na fase de substituição de importações, e passara a crescer com a abertura econômica dos anos 90. Segundo ele, mantida e ampliada a abertura, a concorrência das importações faria com que todos setores da economia brasileira atingissem níveis internacionais de produtividade. A implicação subliminar é clara: país em que todos setores usufruem de níveis internacionais de produtividade é país desenvolvido. Mesquita Moreira (1998) economista do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), justifica a especialização do país em "commodities". De acordo com ele, no período de substituição de importações o Brasil cresceu ineficientemente com base em setores que exigiam muito capital e tecnologia, fatores escassos no país. Com a abertura da economia, esses setores declinaram em proveito de segmentos largamente utilizadores dos recursos naturais, abundantes no país. Com isso se corrigia a distorção da fase anterior com grande vantagem para o país. Ambos autores colocam o capital estrangeiro no comando do crescimento nacional. São, porém, Mendonça de Barros e Lígia Goldstein (1997), ambos do BNDES que desenvolvem melhor esse aspecto. Para eles, no período de substituição de importações a economia brasileira era comandada por um tripé: empresa privada nacional, de caráter familiar, empresas estatais e empresas multinacionais. No mundo globalizado, a empresa familiar nacional não teria condições de escala, tecnologia e produtividade para sobreviver. Desapareceria ou seria absorvida pelas multinacionais. Considerando, a par disso, que as empresas estatais estão sendo rapidamente privatizadas, a evolução ( por eles considerada como altamente favorável) seria no sentido de economia totalmente dominada pelo capital estrangeiro. Resultados da Estratégia Adotada Nesta parte começaremos pelos fatos que atestam o fracasso da estratégia adotada passando, em seguida, a sua interpretação. Esta última é importante ao facilitar a escolha dos caminhos alternativos capazes de levar o Brasil a futuro mais promissor. Fatos Contrariamente do otimismo oficial com relação ao modelo neoliberal de integração passiva no mercado mundial, o que se observou foi incremento médio anual do PIB, na década dos 90, de somente 1,8 %. E isso se explica pelo fato de o aumento das exportações, que nos modelos de crescimento para fora constitui a mola mestra do processo dinâmico, ter-se revelado absolutamente inadequado. O necessário era a elevação de nossas vendas externas bem acima do incremento do comércio mundial. O que aconteceu foi exatamente o oposto. A participação de nossas exportações nesse comércio que, em 1984, era de 1,48% caiu para 0,9% em 1997 (Frisctak e Pessoa, 1998). Ocorreu, concomitantemente, rápido processo de desnacionalização da economia. Alguns dados ilustram a gravidade do processo. Segundo Gonçalves ( 2000): "A participação estrangeira no estoque líquido de riqueza total aumentou de 5,7% em 1995 para 9,7% em 1999. O aumento da participação estrangeira no valor bruto da produção não foi menos significativo: 13,5% em 1995 e 24,6% em 1999. Vale ainda mencionar que a participação estrangeira no valor das vendas das 550 maiores empresas aumentou de 33,3% em 1995 para 43,5% em 1998 ". E mais adiante " A participação dos grandes bancos estrangeiros no total dos ativos do sistema bancário brasileiro aumentou de 11,9% em 1995 para 22.5% em 1998 e cerca de 24% em janeiro de 2000" pg 3). A desindustrialização atingiu igualmente grandes proporções. Não se trata certamente da volta do país à economia agrícola mas simplesmente do esvaziamento de setores de tecnologia mais refinada e maior valor adicionado por trabalhador, com especialização crescente em " commodities". Uma das características principais do processo desnacionalizador foi o esvaziamento da cadeia produtiva nacional através da substituição por importações da produção local de componentes (Coutinho 1997), Alguns analistas atribuíram o fenômeno à propensão das multinacionais ( que se expandem rapidamente no país) a utilizar insumos produzidos por filiais situadas em outras partes do mundo. Na verdade, porém, as cadeias causais podem ser mais profundas. As multinacionais investiram no Brasil para contornar o obstáculo da escassez cambial e de barreiras tarifárias que impediam a importação de produtos acabados oriundos das matrizes. Tal solução constituía, claramente, um "second best", no sentido que as multinacionais teriam preferido manter a situação anterior. Nesse contexto, nada mais lógico que, diante da irrestrita abertura da economia às importações, essas empresas preferissem retornar ao "first best", consistente em voltar a trazer do exterior seus produtos e transformar as filiais em pouco mais que simples distribuidoras. Ou seja, acha-se em curso a reversão do processo de substituição de importações que, no passado, comandou a industrialização do Brasil. Estatísticas disponíveis tendem a confirmar esse tipo de evolução. Em 1989 os ramos industriais com predomínio do capital estrangeiro revelavam saldo positivo em sua balança comercial de 1,5 bilhão de dólares. Em 1995, em função da abertura da economia, esse saldo positivo se transformara em déficit de 9,7 bilhões de dólares (CEPAL,1997). Esses dados revelam claramente processo de reversão ao " first best" . Interpretação Passo preliminar para interpretação do que está acontecendo no Brasil é o exame dos argumentos acima, oferecidos pelo Governo para justificar sua opção pela estratégia neoliberal de integração passiva no mercado mundial. A primazia concedida por Gustavo Franco à produtividade total dos fatores, ou PTF, sobre a acumulação de capital, não tem sido confirmada pelas pesquisas mais recentes. Em cuidadosa análise, Young (1995) mostra que os bem-sucedidos países do Leste da Ásia não registram elevação da PTF acima da observada no resto do mundo. Seus cálculos mostram, por exemplo, que o incremento da PTF na dinâmica Cingapura ficou abaixo do registrado na semi -estagnada economia brasileira. Mesmo o relatório do Banco Mundial de 1991, que, por primeiro, concedeu prioridade à elevação da PTF nas políticas de ‘desenvolvimento, não autoriza a posição radical de Franco. Assim, ele mostra que mesmo no Leste Asiático, em que a elevação da PTF teve papel importante, sua contribuição, entre 1960 e 1987, foi de 28%, percentagem largamente superada pelos 57% atribuídos ao aumento de capital. E apesar desse ter sido um período de rápido crescimento para a América Latina, a contribuição da PTF teria sido, segundo o relatório, nula. Quanto à análise de Mesquita Moreira, a primeira restrição se refere ao fato de raciocinar exclusivamente em termos de vantagens econômicas naturais, numa época em que a literatura especializada tende a conferir papel fundamental às vantagens comparativas dinâmicas criadas pelas empresas (no caso dos subdesenvolvidos com importante apoio oficial ). Mais importante, todavia, é que as vantagens comparativas naturais levariam o Brasil a se especializar na exportação de "commodities " as quais, segundo extensa literatura (Velloso, 1998, Erber e Cassiolato, 1997, Frisctak e Pessoa, 1998 ), se caracterizam por baixo valor adicionado por trabalhador ,forte concorrência no mercado mundial e lento crescimento da demanda. O que, em outras palavras, significa não terem qualquer condição de comandar política bem-sucedida de crescimento para fora. A respeito, vale a pena citar as conclusões de Jorge Katz ( 1999) que se referem não somente ao Brasil mas a certo número de países da América Latina. Examinando os fatos resultantes do novo padrão de especialização desses países afirma: "El primero de ellos se relaciona com el hecho de que el proceso de reestructuración internacional y el nuevo patrón de especializacón en el comercio internacional (...) han ido acentuando el papel de las ramas productivas poco dinámicas en comércio internacional como eje de la especializacón doméstica, particularmente en el caso de los países del Cono sur( ...).En efecto las ramas processadoras de recursos naturales en que há ido ganando especialización países como Argentina, Chile, Brasil y Colombia constituyen campos de la producción manufacturera en que la demanda mundial crece relativamente despacio". (pg. 42) Passando diretamente à interpretação das causas do fracasso da experiência neoliberal no Brasil vou me permitir rápida recapitulação de alguns aspectos das teorizações sobre o desenvolvimento econômico. O êxito dos processos de crescimento depende, do lado da oferta, de níveis satisfatórios de poupança e, do lado da demanda, de mercado de dimensões adequadas. As teorizações sobre o processo dinâmico de longo prazo, tanto das atuais economias maduras quanto dos subdesenvolvidos, colocou-se compulsivamente da perspectiva da oferta, numa demonstração prática de que se continua a aceitar a validade da lei de Say, segundo a qual a oferta cria sua própria procura. Sem dúvida no modelo Harrod-Domar (1957) se inclui a demanda, mas esta é estritamente monetária não se confundindo com o mercado, que pode ser qualificado como demanda real. De qualquer maneira, nos modelos neoclássicos e de crescimento endógeno, o lado da demanda foi completamente ignorado. Somente na literatura sobre o desenvolvimento econômico vamos encontrar as contribuições de Rosenstein- Rodan (1961 ) e Nurkse (1953) que não tiveram, contudo seguimento. Presentemente, pelo menos no caso das economias retardatárias, a ênfase na perspectiva da oferta tende a ser reconsiderada. Essa evolução teve como uma de suas origens o relatório do Banco Mundial (1993) intitulado "The East Asian Miracle". Ele mostra que todos países do Leste Asiático registram poupanças acima de 30% do PIB sem ser possível identificar política uniforme que tenha levado a tal resultado. A experiência do Chile não é muito diferente Surgiu então a hipótese de que, em qualquer país que adote modelo viável e confiável de desenvolvimento, as poupanças tendem a crescer endogenamente. Ora, se a poupança deixa de ser o obstáculo principal a ser vencido, o eixo analítico se transfere para a insuficiência o mercado. Estamos ,assim, diante de uma revolução no que se refere às políticas de desenvolvimento. Trata-se, em última análise, da inversão da lei de Say passando-se a considerar que a produção cria sua própria oferta. Ou, em outras palavras, garantido mercado de dimensões e dinamismo adequados, as poupanças se elevarão espontaneamente para o nível requerido. O que os asiáticos têm em comum é, de fato, a penetração nos mercados dinâmicos externos de manufaturas de elevado grau de refinamento. O sucesso chileno se deveu, também, fundamentalmente, à exploração do mercado que as diferenças climáticas lhe abriam nos Estados Unidos. Finalmente o rápido crescimento registrado pelo Brasil no período de substituição de importações, não se deveu a qualquer esforço especial de poupança mas ao fato de nossas dificuldades cambiais terem transferido para o produtor interno mercado anteriormente atendido pelas importações. Com base nesse enfoque é possível explicar a causa principal do fracasso de estratégia, como a brasileira, fortemente apoiada no capital estrangeiro e comandada por abertura determinante de mudanças estruturais incompatíveis com o modelo adotado. No período de substituição de importações, os investimentos estrangeiros tiveram importante papel no desenvolvimento do país. Segundo as estimativas disponíveis as empresas multinacionais são hoje responsáveis entre 35% e 45% (Gonçalves, 1994, e Beaud, 1989) do faturamento da indústria brasileira. A título de comparação pode-se lembrar que, na Coréia do Sul, essa percentagem não vai além de 11%. Outro ponto importante foi o fato de ter o capital estrangeiro ocupado os setores que exigiam mais capital e tecnologia de maior refinamento. Esses são exatamente os de crescimento mais rápido no comércio internacional. E estudos disponíveis ( Batista e Fritsch,1998 ) mostram que as exportações crescem pouco nesses segmentos exceto no caso de vendas para países vizinhos. A explicação é óbvia: as matrizes não têm interesse em permitir que suas filiais, instaladas no Brasil, entrem em força nos grandes mercados mundiais que elas já controlam. Não têm, em sentido oposto, qualquer objeção no que se refere ao mercado regional, onde as filiais usufruem de toda sorte de preferências. Ou seja, o Brasil optou por crescimento para fora atribuindo à empresa multinacional o mesmo papel que teve na substituição de importações. Como os grandes mercados mundiais, monopolizados pelas matrizes lhes são fechados, essa estratégia é estruturalmente inviável. O processo de desnacionalização agrava o problema ao eliminar empresas nacionais únicas que não têm restrições à entrada nos grandes mercados mundiais. Finalmente, a ampla e unilateral abertura da economia debilitou os segmentos da indústria de rápido crescimento no mercado mundial levando o país a crescente especialização na exportação de "commodities" de lento crescimento nesse mercado. Em suma, a dependência do capital estrangeiro e a abertura da economia (nas condições em que foi realizada ) inviabilizaram irremediavelmente a estratégia de crescimento para fora adotada. Perspectivas Futuras O passo seguinte é indagar quais as perspectivas da economia brasileira para os próximos anos. Dois cenários podem ser considerados: um resultante da permanência da atual estratégia econômica e outro, decorrente de sua mudança. A manutenção da atual política não significará apenas a continuidade do atual lento crescimento do PIB, mas colocará o país diante da possibilidade de grave crise econômica em futuro não muito distante. Isso porque essa política se acha substancialmente centrada na absorção do capital estrangeiro. Este se desloca de um país para outro atraído por boa rentabilidade e na convicção de que não terá dificuldade em converter seus ganhos para a moeda de origem. Essa convicção se revelou bem fundada no modelo primário - exportador (quanto mais capital alienígena entrava, maior era a capacidade do país em colocar no exterior sua produção) e no modelo de substituição de importações (onde o investimento estrangeiro permitia economizar as divisas necessárias à sua remuneração). Na integração passiva no mercado mundial, diante da restrição de mercado externo antes referida, o capital estrangeiro entra no país para atender ao mercado nacional e regional. Não são, assim, gerados os dólares necessários à remessa de "royalties" e dividendos. Durante algum tempo a própria poupança externa, ao entrar no país, é utilizada para atender a essa necessidade. Mais cedo ou mais tarde, porém, o colapso se torna inevitável. E, antes disso, o país sofrerá pressão no sentido de manter taxas moderadas de crescimento, a fim de não elevar as importações e de reservar parcela significativa da produção para exportações. Em sucessivos pronunciamentos as autoridades econômicas brasileiras já estão tentando convencer a opinião pública de que o crescimento do PIB, de 4% a 5% ao ano, é plenamente satisfatório. Indaga-se: porque não os 7% revelados possíveis no passado, ou os 8,5% defendidos por Dias Leite (1999) em livro recente, ou ainda os 9% comuns na Ásia? Diante, contudo, dos maus resultados da estratégia neoliberal mudança pode ser esperada, possivelmente através de eleição, dentro de três anos, de candidato da oposição. Paradoxalmente, o risco é que as grandes entradas de capital estrangeiro proporcionem ao Brasil melhores taxas de crescimento (de 4% a 5% ao ano) durante os dois ou três próximos anos, taxas que o Governo anunciará como os primeiros passos da prometida, e longamente adiada, retomada do desenvolvimento. Se, contudo, ocorrer a mudança, o país estará diante de duas alternativas de política econômica: crescimento para fora na modalidade de integração - ativa, no mercado mundial e crescimento para dentro, baseado no mercado interno. No crescimento para fora, teremos Governo de ampla ação na economia, adotando como um de seus objetivos básicos a criação de vantagens comparativas em segmentos de elevado dinamismo no comércio internacional. Outro ponto importante será a criação, ou ampliação, em tais setores de empresas exportadoras de capital nacional encarregadas de penetrar em força nos grandes mercados dos Estados Unidos, União Européia e Japão. Essa proposta não se inspira em qualquer viés nacionalista. As multinacionais continuarão a ter relevante papel em setores onde inexiste o problema do choque de interesses com as matrizes, ou seja, no atendimento dos mercados interno e regional, nos investimentos de infra-estrutura e na exportação de "commodities". Esta, contudo, será uma função de apoio e não de comando, diferentemente do que sucedeu no modelo de substituição de importações e se está tentando na integração passiva. A par disso, se abandonar o abstencionismo neoliberal do passado, o Governo poderá inclusive conseguir que as multinacionais ampliem os nichos que já nos proporcionam nos mercados internacionais dinâmicos. Os defensores da estratégia de crescimento para dentro tomam como base as dimensões continentais da economia brasileira, ampliadas pelo acordo do MERCOSUL. O problema é que sua proposta ainda não foi adequadamente formalizada. No Brasil, o caso de sucesso de crescimento com base no mercado interno foi o modelo de substituição de importações. Nesse período, o desenvolvimento era viabilizado seja pelo mercado representado pelas importações substituíveis, seja pelo decorrente do acelerado incremento do PIB. Supunhase que, esgotadas as oportunidades de substituição, se ingressaria no crescimento auto sustentado, ou seja, baseado apenas no crescimento do PIB. A previsão não foi confirmada, possivelmente porque o tamanho mínimo das unidades produtivas, exigido pela tecnologia moderna, era superior ao adicional de mercado proporcionado pelo crescimento do PIB. O problema deixou de existir? Se não, como contorná-lo? Até agora os defensores do crescimento para dentro não conseguiram propor mais que a distribuição de renda como forma de ampliar o mercado interno, sem qualquer esforço para demonstrar que isso será suficiente. Na verdade, porém, o Brasil, dadas suas dimensões continentais, não poderá deixar de ter, ao lado da política de crescimento para fora, estratégia complementar de mercado interno. Em primeiro lugar, porque o mercado internacional dificilmente absorveria as exportações a que estaríamos obrigados em estratégia pura de mercado externo. Em segundo lugar, porque em países de dimensões continentais as exportações representam parte relativamente pequena do PIB. No Brasil, essa parcela dificilmente irá além de 20%. Portanto, para cada real investido na exportação, quatro reais deverão ser aplicados no atendimento do mercado interno. Ou, em outras palavras, a política de mercado interno permitirá maximizar o impulso oriundo de rápido incremento das exportações. O modelo básico deve ser chamado de "crescimento para fora" porque o setor externo será o impulsionador principal do crescimento. Parece desnecessário lembrar que, também na fase de substituição de importações, os investimentos destinados a produzir internamente os bens antes adquiridos no exterior, não iam além de 20% do total. E nem por isso se deixou de considerar o processo substituidor como o mecanismo principal do crescimento Na verdade, o que irá de fato acontecer no futuro dependerá do comportamento da economia. Na medida em que a estratégia de crescimento para fora se revelar difícil, ou mesmo inviável, a ênfase se deslocará para a política de mercado interno. E, se isso acontecer, a integração regional, hoje importante, se tornará simplesmente de vital relevância. E a referência não é aqui, claro, à ALCA, mas ao MERCOSUL e a uma eventual Área de Livre Comércio Sul Americana, ALCSA. OBRAS CITADAS Banco Mundial (1991) World Development Report ( 1991). ________. - (1993 ) The Asian Miracle : Economic Growth and Public Policy , Oxford University Press, New York. Barros, J. R. Mendonça de e L. Goldstein (1996) Reestruturação Industrial, Gazeta Mercantil 12 / 8 e em Revista de Economia Política abr - jun abr 1997. Batista C. e Fritsch W.( 1994 ), Dinâmica Recente das Exportações Brasileiras em Velloso J. P. R. (org) A Nova Inserção Internacional do Brasil, José Olympio, Rio de Janeiro. Beaud, M, (1989) L’Économie Mondiale dans les Années 80, La Decouverte, Paris. 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