O PAPEL DA SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÕES NO AJUSTE EXTERNO BRASILEIRO Parte de um estudo mais amplo sobre substituição de importações no Brasil que será publicado na íntegra em breve Julho de 2002 ÍNDICE As Teses Sobre o Ajuste Externo ............................................................................ 3 O Ajuste Externo em Quatro Países e no Brasil .................................................. 5 As Limitações ao Ajuste Externo Brasileiro ....................................................... 13 Queda de Preços Internacionais de Commodities ......................................... 13 Dificuldades Para a Substituição de Importações Espontânea ................... 14 O Peso do Passivo Externo .................................................................................. 19 Os Limites do Modelo de Ajuste Externo ....................................................... 21 Um Novo Modelo de Ajuste ................................................................................... 23 A Política de Exportação...................................................................................... 23 Substituição Competitiva de Importações ....................................................... 24 Esforço de Exportação Versus Substituição de Importações...................... 26 O Papel da Substituição de Importações no Ajuste Externo Brasileiro 1 O Papel da Substituição de Importações no Ajuste Externo O presente trabalho procura mostrar que, para obter um superávit comercial de pelo menos US$ 13 a 14 bilhões por ano até 2005, e aumentar o ritmo de seu crescimento econômico, o Brasil necessita não só de uma política de exportações muito mais eficaz, como de uma estratégia de importações que promova a substituição competitiva de importações. As principais constatações e conclusões são: A seqüência de desvalorizações cambiais e o baixo crescimento médio da economia dos últimos anos – pilares do modelo de ajuste externo – não podem ser mantidos se o Brasil almeja ter um crescimento econômico maior e mais estável. Em um novo modelo, não é necessário nem desejável que as importações totais declinem para que o Brasil chegue ao saldo comercial necessário ao ajuste externo; o requisito é que as exportações cresçam mais que as importações. A recomendação para remover a restrição externa ao crescimento é que, simultaneamente a um esforço concentrado de exportação, o Brasil execute uma política de substituição competitiva de importações. O Papel da Substituição de Importações no Ajuste Externo Brasileiro 2 As Teses sobre o Ajuste Externo Quatro teses muito presentes no debate sobre o ajuste externo da economia brasileira vêm bloqueando a execução de políticas mais audaciosas no campo externo. Ao lado de dificuldades sérias que o ajuste vem enfrentando devido a um quadro internacional desfavorável e a um atraso da estrutura industrial brasileira, elas têm concorrido para que o ajuste iniciado em 1999 venha sendo custoso e lento. As teses são as seguintes: Superávit em Conta Corrente1. O Brasil não deve ter superávit em conta corrente. A justificativa que, em princípio, não merece reparo, é que um país em desenvolvimento precisa da poupança externa. O que não é correto é deduzir que um país que se depara com uma premente necessidade de ajuste externo deva abrir mão de gerar superávits e deixar de executar políticas audaciosas para o setor externo. Saldo Comercial. Um país emergente como o Brasil não deve ter saldo comercial. A tese, prima-irmã da anterior, caiu em desuso ultimamente. Foi dita e repetida até virar “verdade” durante a fase do financiamento externo farto (1994/98). Agora, seus defensores admitem um meio termo: para completar o ajuste, o Brasil necessita apenas de “pequeno” superávit comercial. Exportação. O Brasil não deve promover esforços para diversificar a pauta de exportações, agregar mais valor aos produtos de exportação e elevar o conteúdo tecnológico de sua produção, pois sua vocação natural lhe reserva um papel na especialização internacional como produtor e exportador de produtos básicos. Nessa visão, celulares e aviões, por exemplo, são produtos “clonados”. Importação. O ajuste externo não deve levar à queda de importações. O temor é que a substituição de importações reduza importações e cause um retrocesso na abertura da economia brasileira, o que pode reduzir o acesso aos bens de alta tecnologia e a processos mais avançados que não são produzidos no Brasil. Com relação ao último ponto, de fato, uma forte e prolongada restrição a importar limita os aumentos de produtividade das empresas, restringe a competitividade do produto nacional e estreita as opções de consumo da 1 O resultado em transações correntes é a medida mais geral de resultado externo de um país. Engloba três principais contas: comércio de mercadorias (dinamismo da economia e instabilidade da economia exportação menos importação), serviços (despesas líquidas de receitas de viagens internacionais, transporte, seguros etc) e rendas (despesas líquidas com juros da dívida externa, remessa de lucros e dividendos). O Papel da Substituição de Importações no Ajuste Externo Brasileiro 3 população. Assistimos a isso nos anos 80 e início dos anos 90, quando a crise da dívida externa (e não a “política industrial”) impôs um fechamento ou uma proteção forçada da economia. O erro está em relacionar a política de substituição de importações ou uma redução transitória de importações com a queda permanente das importações totais do país e o conseqüente “fechamento” da economia. A respeito da tese sobre exportação, nosso ponto de vista tem dois aspectos: O primeiro é que não se cogita em negar a competitividade brasileira conquistada em produtos básicos, a qual, aliás, cada vez mais é apoiada em inovações, no aprimoramento tecnológico e no aumento da produtividade gerada pela mecanização. Ou seja, não cabe nesse momento reviver a antiga e ultrapassada oposição entre desenvolvimento baseado na produção primária versus produção manufatureira. O segundo aspecto é que em países com dimensão continental, grande população e diversidade regional, como o Brasil, não se aplica a especialização do ponto de vista industrial. As economias continentais tendem a produzir em todos os segmentos da indústria, muito embora cada uma delas apresente características próprias quanto aos segmentos em que têm liderança e competitividade em nível global. Mas, competitividade em uma economia que cada vez mais é baseada em conhecimento e na atração de investimentos, pode ser conquistada. Portanto, não há porque um país como o Brasil especializar-se na sua “vocação (pretensamente) óbvia”, ou seja, em produtos básicos, se há potencialidades em cada um de seus setores econômicos, da agropecuária à indústria, passando por commodities, serviços e bens industriais da “velha”, bem como da “nova”, economia. Deparando-se com dificuldades internas e externas para o seu ajuste, sem executar políticas contundentes em prol de uma vigorosa transformação da pauta exportadora e da agregação de valor às exportações, e não devendo reduzir importações ou promover uma política de substituição de importações, ficou difícil para o Brasil afastar o fantasma da vulnerabilidade externa. Não é por acaso que o ajuste brasileiro é ainda parcial e limitado, muito embora já se prolongue por três anos e meio. Os que defendem a observância de tantos pretensos cuidados no ajuste externo brasileiro, a ponto de bloquear seu desenlace, afirmam que um dia “chegaremos lá”. Pode ser, mas o percurso da economia até o desenlace deverá seguir o padrão dos últimos anos: forte instabilidade e oscilante O Papel da Substituição de Importações no Ajuste Externo Brasileiro 4 evolução econômica em torno de uma média muito baixa de crescimento e elevado desemprego. Ademais, o caminho trilhado pelo Brasil é atípico no contexto dos ajustes que os países emergentes promoveram recentemente. Para ilustrar que vários casos relevantes não seguiram as teses preconizadas para o Brasil, vamos considerar países que tiveram expressivas desvalorizações em suas moedas, promoveram ajustes significativos e apresentam hoje situação externa mais confortável e avaliação de risco mais favorável: Coréia, México e Rússia. Vamos incluir nas comparações a Espanha. O Ajuste Externo em Quatro Países e no Brasil Os ajustes iniciados em diferentes momentos da década de 1990 (Espanha em 1993, México em 1995, Coréia em 1997 e Rússia em 1998) têm em comum: A rapidez com que transformaram a situação externa desses países. Os países passaram a ter superávit em transações correntes ou chegaram perto disso, partindo de déficits elevados. Os ajustes foram obtidos por uma gigantesca mudança no comércio exterior. Inicialmente e transitoriamente, essa mudança apoiou-se em drástica queda das importações. O ajuste externo viria a ser consolidado por um posterior e vigoroso crescimento das exportações. A despeito desses resultados, nenhum desses países fechou sua economia e, de alguma forma, eles resolveram ou estão resolvendo o problema da redução da poupança externa. Os gráficos a seguir ilustram cada um desses pontos2. Convém observar que todos os dados apresentados nessa seção (resultado em transações correntes, saldo comercial, exportação, importação) correspondem a valores acumulados em doze meses até o fim do trimestre indicado. A série T0, T1, T2, etc, corresponde à seqüência de trimestres iniciada quando do início da desvalorização da moeda em cada país (T0). Nos gráficos, há a indicação do trimestre inicial para cada um dos países selecionados. 2 A fonte dos dados básicos é o FMI. O Papel da Substituição de Importações no Ajuste Externo Brasileiro 5 Resultado em Transações Correntes - Valores Acumulados em Doze Meses Até o Fim do Trimestre Indicado Em US$ bihões T0 = Trimestre de Início da Desvalorização Cambial 60 50 40 30 T0 = Brasil: 1999 T1 Coréia do Sul: 1997 T4 Mexico: 1995 T1 Rússia: 1998 T3 Espanha: 1992 T4 20 10 0 -10 -20 -30 -40 T-2 T-1 T0 T1 T2 T3 Brasil T4 T5 Coréia do Sul T6 T7 México T8 Rússia T9 T10 T11 T12 T13 T12 T13 Espanha Resultado em Transações Correntes - Acumulado em Doze Meses Até o Fim do Trimestre Indicado - Em % das Exportações T0 = Trimestre de Início da Desvalorização Cambial 60 40 20 T0 = Brasil: 1999 T1 Coréia do Sul: 1997 T4 Mexico: 1995 T1 Rússia: 1998 T3 Espanha: 1992 T4 0 -20 -40 -60 -80 T-2 T-1 T0 T1 T2 Brasil T3 T4 T5 Coréia do Sul O Papel da Substituição de Importações no Ajuste Externo Brasileiro T6 México T7 T8 Rússia T9 T10 T11 Espanha 6 O que os dados ressaltam é a rapidez dos processos de ajuste, resultando em superávits em transações correntes (Coréia do Sul e Rússia) ou em déficits muito baixos (México e Espanha). Note-se que os dados também mostram uma progressão no ajuste brasileiro, porém lenta. Como fica evidenciado no segundo gráfico, a despeito desse ajuste, é enorme a distância que separa o Brasil dos demais países em termos de déficit externo. Isso é parte decisiva e determinante da vulnerabilidade externa brasileira. A mudança do saldo comercial foi a peça chave no ajuste. Os países não só reduziram fortemente o déficit comercial prevalecente no início do ajuste, como passaram a gerar superávits comerciais muito elevados. A exceção foi a Espanha, que não obteve saldos de comércio de mercadorias. No entanto, a redução do déficit comercial foi suficiente para aliviar sua conta corrente, já que conta com expressivo superávit em serviços. No caso brasileiro, saldos comerciais de maior expressão só apareceram muito depois do início do ajuste e, ainda assim, sob forte influência do baixo crescimento econômico e de sucessivas desvalorizações da moeda. Quanto às exportações, estas levaram um certo tempo para reagir às desvalorizações das moedas, caindo inicialmente. Isso significa dizer que o ajuste comercial (e também o ajuste em transações correntes) recaiu inicialmente sobre as importações (ver os gráficos e tabela seguinte). No primeiro ano de ajuste de todos os países, salvo o México, a totalidade (ou até mais do que 100%) da redução do déficit em transações correntes teve origem na queda de importações. Mesmo após dois anos de ajuste, quando as exportações já reagem, o recuo das importações foi preponderante, como nos casos de Coréia, Rússia e Espanha. Nesse período (de dois anos de ajuste), os valores de importação acumularam queda (com relação ao trimestre “T-1”) de 45,6% na Rússia, 28% na Coréia e 15,8% na Espanha. As exportações nesses países crescem relativamente pouco. Três anos e meio depois, a situação é outra: as exportações crescem muito e as importações passam a registrar aumento. O Papel da Substituição de Importações no Ajuste Externo Brasileiro 7 Saldo Comercial - Valores Acumulados em Doze Meses Até o Fim do Trimestre Indicado Em US$ bihões T0 = Trimestre de Início da Desvalorização Cambial 80 T0 = Brasil: 1999 T1 Coréia do Sul: 1997 T4 Mexico: 1995 T1 Rússia: 1998 T3 Espanha: 1992 T4 60 40 20 0 -20 -40 T-2 T-1 T0 T1 T2 T3 Brasil T4 T5 Coréia do Sul T6 T7 México T8 T9 Rússia T10 T11 T12 T13 T12 T13 Espanha Exportações - Valores Acumulados em Doze Meses Até o Fim do Trimestre Indicado - Em US$ bihões T0 = Trimestre de Início da Desvalorização Cambial 200 T0 = Brasil: 1999 T1 Coréia do Sul: 1997 T4 Mexico: 1995 T1 Rússia: 1998 T3 Espanha: 1992 T4 180 160 140 120 100 80 60 40 20 0 T-2 T-1 T0 T1 T2 T3 Brasil T4 T5 Coréia do Sul O Papel da Substituição de Importações no Ajuste Externo Brasileiro T6 México T7 T8 Rússia T9 T10 T11 Espanha 8 Exportações - Acumulado em Doze Meses Até o Fim do Trimestre Indicado "T-1" = 100 T0 = Trimestre de Início da Desvalorização Cambial 200 T0 = Brasil: 1999 T1 Coréia do Sul: 1997 T4 Mexico: 1995 T1 Rússia: 1998 T3 Espanha: 1992 T4 150 100 50 T-2 T-1 T0 T1 T2 T3 Brasil T4 T5 Coréia do Sul T6 T7 México T8 T9 Rússia T10 T11 T12 T13 Espanha Contribuição do Aumento de Exportações Para a Redução do Déficit em Transações Correntes Após a Desvalorização Cambial - Em % 350 322 300 250 200 150 128 120 125 100 66 63 50 44 34 18 17 1 0 -3 -15 -15 -50 -67 -100 Brasil Coréia do Sul Após 1 ano México Após 2 anos O Papel da Substituição de Importações no Ajuste Externo Brasileiro Rússia Espanha Após 3 anos e meio 9 Importações - Valores Acumulados em Doze Meses Até o Fim do Trimestre Indicado - Em US$ bihões T0 = Trimestre de Início da Desvalorização Cambial 180 T0 = Brasil: 1999 T1 Coréia do Sul: 1997 T4 Mexico: 1995 T1 Rússia: 1998 T3 Espanha: 1992 T4 160 140 120 100 80 60 40 20 0 T-2 T-1 T0 T1 T2 T3 Brasil T4 T5 Coréia do Sul T6 México T7 T8 Rússia T9 T10 T11 T12 T13 T11 T12 T13 Espanha Importações - Acumulado em Doze Meses Até o Fim do Trimestre Indicado "T-1" = 100 T0 = Trimestre de Início da Desvalorização Cambial 160 T0 = Brasil: 1999 T1 Coréia do Sul: 1997 T4 Mexico: 1995 T1 Rússia: 1998 T3 Espanha: 1992 T4 100 40 T-2 T-1 T0 T1 T2 Brasil T3 T4 T5 Coréia do Sul O Papel da Substituição de Importações no Ajuste Externo Brasileiro T6 México T7 T8 Rússia T9 T10 Espanha 10 Contribuição da Redução de Importações Para a Redução do Déficit em Transações Correntes Após a Desvalorização Cambial - Em % 200 149 150 113 100 87 100 90 50 83 74 59 50 25 21 0 -33 -50 -37 -68 -100 -150 -200 -250 -240 -300 Brasil Coréia do Sul Após 1 ano México Após 2 anos Rússia Espanha Após 3 anos e meio Evolução das Exportações e Importações - Acumuladas em Doze Meses Brasil Coréia do Sul México Rússia Espanha Variação % das Importações* Após 1 ano -14,7 -31,7 -8,7 -43,8 -18,5 Após 2 anos -3,4 -28,1 12,8 -45,6 -15,8 Após 3 anos e meio -15,1 7,1 51,7 -28,1 17,0 Variação % das Exportações* Após 1 ano -6,1 -1,2 30,6 -17,3 -3,7 Após 2 anos 7,7 0,2 57,7 9,3 5,2 Após 3 anos e meio 10,3 27,9 90,3 21,9 46,8 * Base para o cálculo das variações: trimestre "T-1" Por razões diferentes, México e Brasil não seguiram inteiramente as linhas gerais do processo descrito acima. O México porque seu ajuste apoiou-se, desde o início, no crescimento das exportações e não em queda de importações. As exportações mexicanas cresceram 90% em três anos e meio e as importações, 51,7%. O Brasil porque, mesmo após um já longo ajuste, nem “decolou” nas exportações (crescimento de apenas 10% em três anos e meio após o início do ajuste), nem se livrou da contenção das importações como meio de ajuste. Estas não sofreram as reduções dramáticas observadas em outros países nos O Papel da Substituição de Importações no Ajuste Externo Brasileiro 11 anos iniciais do ajuste, mas, até o presente, permanecem oscilando em torno de uma tendência de queda – uma condição para não comprometer o frágil ajuste brasileiro. Desde o início do ajuste até agora as importações brasileiras caíram 15%. O ajuste de cada país dependeu do contexto da economia em questão em relação ao comércio mundial e regional no qual se insere no momento em que ocorreram os ajustes, além das estruturas internas das economias dos países. Assim, por exemplo, o ajuste na Espanha beneficiou-se da unificação européia; no México, de uma conjuntura muito favorável do comércio exterior e do boom da grande economia próxima (à qual está comercialmente integrada através do NAFTA), a economia norte-americana; na Rússia, do aumento do preço do petróleo; na Coréia, da forte e diversificada indústria local e do crescimento do comércio mundial de bens de alta tecnologia. Outros fatores foram a magnitude das desvalorizações reais das moedas e as recessões das economias determinadas pelos próprios ajustes. O declínio do PIB foi muito forte no primeiro ano de ajuste na Coréia, México e Rússia (ver o gráfico a seguir), o que, em grande parte, explica a retração das importações, esta, como foi visto, uma destacada fonte de ajuste externo dos países, sobretudo nos dois primeiros anos. Taxa Anual de Crescimento do PIB - Em % A0 = Ano da Desvalorização Cambial 12 10,9 10 9,3 9,0 7,7 8 6,8 6 5,2 5,0 6,5 5,7 5,4 5,0 5,0 4,4 4,4 4 3,0 2,5 2,4 2,8 2,4 2,5 1,5 1,5 2 0,9 0,8 0,7 0,2 0 -2 -4 -6 -1,0 A0 = Brasil: 1999 Coréia do Sul: 1998 México: 1995 Rússia: 1998 Espanha: 1993 -4,9 -6,2 -6,7 -8 Brasil Coréia do Sul México A-1 A0 A1 O Papel da Substituição de Importações no Ajuste Externo Brasileiro A2 Rússia A3 Espanha Média A1-A3 12 No Brasil, a recessão não foi da mesma magnitude, um fator que, em parte, explica a queda não tão dramática das importações como em outros casos. Mas, por outro lado, os países que ajustaram seus setores externos mais rapidamente obtiveram um crescimento muito maior do que o do Brasil após a recessão do ano inicial. Nos três anos seguintes ao ano inicial de ajuste (A0), as médias anuais de crescimento foram de 7,5% na Coréia, 6,5% na Rússia e 5,7% no México. No Brasil, o crescimento médio de 2,5%3 igualou-se ao da Espanha. As Limitações ao Ajuste Externo Brasileiro Se no ajuste brasileiro as importações não seguiram o padrão de outros países – queda dramática (porém, transitória), formando a base do ajuste inicial que depois seria consolidado pelo crescimento das exportações –, o país deveria ter adotado políticas muito consistentes e incisivas para substituir importações e alavancar mais rapidamente as exportações. Não fez isso e ainda contou com diversos outros fatores adversos em seu ajuste. Queda de Preços Internacionais de Commodities Iniciada em 1998, a queda dos preços internacionais limitou fortemente o crescimento das exportações brasileiras. Não é verdade que a mudança da política cambial em 1999 e as desvalorizações da moeda que se seguiram “não funcionaram”. Desde o início das desvalorizações até 2001, o índice de quantum das exportações registrou aumento de 31%, demonstrando que as exportações reagiram ao estímulo das desvalorizações. A queda de preços em dólar (de 15% no período 1999-2001) determinou um crescimento muito inferior dos valores exportados. A nossa estimativa é que, nesses anos, a redução de preços subtraiu US$ 19 bilhões (ou cerca de US$ 6 bilhões ao ano) somente em exportações de produtos básicos. O ajuste externo brasileiro teria avançado muito mais do que de fato avançou se a retração mundial e o protecionismo internacional – os destacados fatores que explicam essa redução de preços – não tivessem afetado tanto as exportações de produtos em que o Brasil é forte e competitivo exportador. 3 Corresponde à média do período 2000/2002. A projeção de crescimento para 2002 é de 1,5%. O Papel da Substituição de Importações no Ajuste Externo Brasileiro 13 Em um trabalho de fins de 1999, o IEDI já diagnosticava esse problema, recomendando a adoção de políticas industriais cujo objetivo seria, sem prejuízo das exportações de produtos básicos, ampliar as possibilidades de exportação de produtos com preços mais resistentes às conjunturas internacionais, ou seja, produtos com maior valor agregado e conteúdo tecnológico. A política também visava agregar mais valor à exportação de produtos básicos, da agroindústria e da indústria tradicional (ver “A Mudança da Política Cambial e os Efeitos da Maxidesvalorização do Real”, disponível no site do IEDI, www.iedi.org.br). Uma política como essa, se implementada na época, já estaria dando frutos e representaria uma diversificação e um avanço da pauta de exportação, sem prejuízo, como já foi observado, da exportação de produtos em que o Brasil detém grande competitividade, a qual, até então, encontrava-se “travada” pela política de sobrevalorização cambial. Estudos realizados pelo IEDI mostraram que, como resultado de políticas industriais executadas anteriormente, as exportações brasileiras de produtos de maior conteúdo tecnológico também cresceram após a desvalorização cambial de 1999, casos da indústria automobilística, aeronaves e equipamentos e bens acabados de informática e telecomunicações, numa demonstração de que políticas industriais funcionam e podem trazer resultados satisfatórios para o setor externo da economia (ver o trabalho de dezembro de 2001, “Exportações Líquidas e Substituição de Importações - Análise da Década de 1990, os Efeitos da Mudança da Política Cambial de 1999 e as Perspectivas Brasileiras diante da Desvalorização de 2001”, disponível no site do IEDI, www.iedi.org.br). Dificuldades para a Substituição de Importações Espontânea A evolução significativa das importações, iniciada com a abertura do país ao comércio exterior, perdurou até 1998, quando atingiram US$ 60 bilhões. A partir daí, a tendência é de queda, somente interrompida em 2000 devido ao maior crescimento da economia naquele ano (ver o gráfico a seguir). Se as importações alcançarem US$ 50 bilhões em 2002 (até junho somaram US$ 22,5 bilhões e no acumulado de doze meses findos nesse mês alcançaram US$ 49,1 bilhões) serão US$ 10 bilhões (ou 15%) inferiores ao valor máximo registrado nos anos 1990. A queda das importações não foi abrupta, como já se observou, mas acompanhou as oscilações do crescimento da economia e as desvalorizações cambiais. O Papel da Substituição de Importações no Ajuste Externo Brasileiro 14 Certamente processou-se uma substituição de importações incentivada pela mudança da taxa de câmbio, a qual, segundo os indícios reunidos em trabalhos realizados pelo IEDI, não foi desprezível (ver “Exportações Líquidas e Substituição de Importações - Análise da Década de 1990, os Efeitos da Mudança da Política Cambial de 1999 e as Perspectivas Brasileiras diante da Desvalorização de 2001”, disponível no site do IEDI, www.iedi.org.br). Ocorre que se desenvolveu, predominantemente, a substituição de importações que não requeria investimentos adicionais expressivos em ampliação da capacidade de produção. Nos casos em que eram requeridos investimentos mais amplos, o custo do capital no Brasil, que é mais alto do que no exterior, bem como os custos financeiros e tributários para produzir um produto internamente, que também são mais altos no Brasil, limitaram a substituição. Ademais, persistiu a dependência muito acentuada do Brasil com relação ao fornecimento externo de bens de capital e de insumos, notadamente os dos segmentos químico e eletrônico. Importações - Em US$ bilhões 60 60 58 56 55 56 53 50 50 49 50 45 40 33 35 30 25 25 21 21 21 1990 1991 1992 20 15 10 5 0 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 (proj.) Por isso, quando a economia cresceu mais fortemente e o câmbio real valorizou-se em 2000, as importações se elevaram e o pequeno superávit comercial se transformou em déficit, voltando a se agravar a situação das contas externas. O Papel da Substituição de Importações no Ajuste Externo Brasileiro 15 Em 2001, dada uma nova e forte rodada de desvalorizações (motivada por fatores externos, como a crise na Argentina, mas também pela deterioração das contas externas) e a recessão industrial a partir de maio desse ano (causada pela crise de energia e elevação das taxas de juros), as importações voltam a cair e de novo é registrado um pequeno superávit comercial. Uma recuperação industrial tênue após a crise de energia, o baixo crescimento da economia como um todo no primeiro semestre do corrente ano e uma outra forte desvalorização cambial, que se seguiu à valorização ocorrida entre os meses de novembro de 2001 e março 2002, acentuaram ainda mais a queda das importações em 2002. Convém avaliar se essa redução de importações também não estaria refletindo uma nova rodada de substituição de importações. O comportamento do quantum de importação de bens intermediários em relação à produção física industrial e ao quantum de exportação de manufaturados (ver os gráficos abaixo) é um fator adicional que sugere a ocorrência de substituição de importações de produtos intermediários. 150 150 140 140 130 130 120 120 110 110 100 100 90 90 80 80 70 Produção Industrial - Base jan-1999=100 Quantum Importado - Base jan-1999=100 Quantum Importado de Bens Intermediários e Produção Industrial 70 jan/98 jul/98 jan/99 jul/99 jan/00 Tendência do Índice de Produção Industrial jul/00 jan/01 jul/01 jan/02 Tendência do Quantum Importado de Bens Intermediários Fonte: Dados básicos do IBGE e FUNCEX. Obs.: Tendência é estimada pelo filtro de Kalman; metodologia desenvolvida por Andrew C. Harvey. O Papel da Substituição de Importações no Ajuste Externo Brasileiro 16 150 150 140 140 130 130 120 120 110 110 100 100 90 90 80 80 70 Quantum de Exportação de Manufaturados - Base jan1999=100 Quantum Importado - Base jan-1999=100 Quantum Exportado de Bens Manufaturados e Quantum Importado de Bens Intermediários 70 jan/98 jul/98 jan/99 jul/99 jan/00 Tendência do Quantum Exportado de manufaturados jul/00 jan/01 jul/01 jan/02 Tendência do Quantum Importado de Bens Intermediários Fonte: Dados básicos da FUNCEX. Obs.: Tendência é estimada pelo filtro de Kalman; metodologia desenvolvida por Andrew C. Harvey. Para analisar a questão, vamos tomar o primeiro trimestre de 2002 comparado ao mesmo trimestre de 2001, e considerar a classificação setorial discriminada no gráfico abaixo (para detalhes, ver “É Sustentável a Melhora do Resultado Comercial?”, disponível no site do IEDI, www.iedi.org.br). A melhora do resultado comercial entre um período e outro foi de US$ 1,7 bilhão, toda ela originada da queda de importações. Essa queda foi geral, mas teve maior importância nos segmentos da indústria intensiva em escala, fornecedores especializados e indústria intensiva em P&D.4 No primeiro caso, 4 Esses segmentos incluem: Indústria intensiva em escala - indústria automobilística, tratores, indústria do ferro, indústria siderúrgica, pneus, vidro, ferramentas, cimento, produtos químicos para uso doméstico, armas e munição, bens eletrônicos de consumo. Fornecedores especializados - máquinas agrícolas, caldeiras, turbinas, outras máquinas para geração de energia, maquinaria especializada (para as indústrias da construção, têxtil, papel, gráfica, alimentos, maquinaria para metal), filtros, bombas, ventoinhas, rolamentos, torneiras e válvulas, equipamentos de engenharia, máquinas de escritório, equipamentos de computador; equipamento de circuito elétrico, equipamento de distribuição elétrica, equipamentos/veículos para ferrovias Indústria intensiva em P&D - componentes eletrônicos, equipamentos de telecomunicações, indústria aeroespacial, produtos farmacêuticos e medicamentos, pigmentos, tintas, verniz, essências e perfumes, perfumaria, cosméticos, instrumentos médicos, instrumentos ópticos, relógios e aparelhos de medição, equipamento fotográfico, artigos para fotografia, cinema e material óptico. O Papel da Substituição de Importações no Ajuste Externo Brasileiro 17 as importações de produtos como tratores, automóveis e bens eletrônicos de consumo (televisores, gravadores etc) tiveram grande declínio, o mesmo ocorrendo com máquinas e bens de capital, maquinaria agrícola, computadores, equipamentos para geração e transmissão de energia, todos pertencentes a “fornecedores especializados”. É prematuro afirmar que nesses dois grupos houve substituição de importações, pois a redução de importações pode estar associada à queda do consumo e do investimento na economia. De um modo geral, desde meados de 2001, o investimento vem declinando. Em alguns segmentos desses grupos deve estar ocorrendo alguma substituição de importações, como em bens de capital, tratores, indústria automobilística e eletrônica de consumo. De qualquer forma, é aí onde é possível que a produção doméstica venha a produzir e atender a uma demanda até então suprida por importações. Não nos parece que isso venha ocorrendo na indústria intensiva em P&D, o grupo que, destacadamente, mais contribuiu (54%) para a melhora do resultado comercial brasileiro entre 2001 e 2002. Para esse grupo, as importações caíram de US$ 3,1 bilhões no 1.º trimestre de 2001 para US$ 2,1 bilhões no 1.º trimestre de 2002 (-32%), queda essa concentrada em dois segmentos: equipamentos de telecomunicação, cuja importação caiu US$ 600 milhões (60%), e transistores e válvulas, com redução de US$ 250 milhões (40%). A grande queda das importações nesses itens encontra explicação na retração dos mercados internos de bens eletrônicos de consumo e de informática (uma herança ainda da crise de energia, agravada pela incerteza, juros elevados no crédito e declínio da renda do consumidor no corrente ano) e, sobretudo, de equipamentos e produtos para o setor de telecomunicações, após um boom sem precedentes no Brasil. O segundo motivo é que, devido à suspensão da Lei de Informática, em 2001, o imposto sobre produtos industrializados, IPI, dos bens de eletrônica (inclusive dos importados) foi reduzido para apenas 2%, o que incentivou sobremaneira a importação de componentes eletrônicos e de outros produtos do setor. Em 2002, uma demanda muito aquém do que é capaz o mercado interno consumidor brasileiro e, em 2001, importações excessivas, explicam a variação na importação de equipamentos e bens intermediários eletrônicos. A conclusão é que, embora haja indícios de que esteja em curso uma substituição de importações, a retração do consumo e dos investimentos na economia, além de uma conjuntura de mercado desfavorável à indústria intensiva em P&D, são os fatores mais importantes que explicam o melhor O Papel da Substituição de Importações no Ajuste Externo Brasileiro 18 resultado comercial. Por isso, é ainda significativo o risco de que um maior crescimento econômico, acompanhado da recuperação dos setores de tecnologia de informação e telecomunicações, leve a um novo retrocesso da balança comercial. Contribuição à Redução do Déficit Comercial Entre o 1o. Trimestre de 2001 e o 1o. Trimestre de 2002 (Redução do Déficit Comercial em Valor: US$ 1.708 milhões) - Em % Ind. Intensiva em P&D 57 54 -2 Fornecedores Especializados 33 -9 Ind. Intensiva em Escala 24 34 -16 18 Ind. Intensiva em Trabalho 13 -9 Ind. Intensiva em Rec. Energéticos 3 32 -16 Ind. Intensiva em Rec. Minerais 16 15 -11 Ind. Intensiva em Outros Rec. Agrícolas -15 Ind. Agroalimentar 4 4 -11 -14 4 -10 Prod. Primários Energéticos 10 12 2 Prod. Primários Minerais -9 Prod. Primários Agrícolas 7 -2 0 -30 -20 -10 Total 3 3 0 10 20 30 Aumento de Exportação 40 50 60 70 Redução de Importação O Peso do Passivo Externo O ajuste brasileiro foi contido também pelo enorme passivo externo acumulado nos anos de fartura de financiamento externo. Entre 1994 e 1998, o passivo externo cresceu US$ 30 bilhões ao ano devido ao aumento tanto da dívida externa, quanto do estoque de capital estrangeiro investido no país, acumulando US$ 370 bilhões ao final desse período. Desde então a dívida externa declinou discretamente e o estoque de capital aumentou em ritmo menor, devido às desvalorizações cambiais. Em dezembro de 2001, o passivo externo somava US$ 372,6 bilhões, de acordo com estimativa do Banco Central, com base no censo de capital estrangeiro recentemente concluído. Nossa estimativa é que some US$ 380 bilhões em 2002, um dos mais elevados do mundo. O Papel da Substituição de Importações no Ajuste Externo Brasileiro 19 Um passivo externo tão alto determina valores muito elevados de gastos na conta de rendas (juros e remessas de lucros). O gráfico a seguir mostra a enorme distância que separa o Brasil dos outros países no que diz respeito aos gastos líquidos com rendas, a despeito da redução obtida nos últimos anos. Rendas - Valores Líquidos Acumulados em Doze Meses Até o Fim do Trimestre Indicado - Em % das Exportações T0 = Trimestre de Início da Desvalorização Cambial 0 -5 -10 -15 -20 -25 -30 -35 T0 = Brasil: 1999 T1 Coréia do Sul: 1997 T4 Mexico: 1995 T1 Rússia: 1998 T3 Espanha: 1992 T4 -40 -45 -50 T-2 T-1 T0 T1 T2 T3 Brasil T4 T5 Coréia do Sul T6 México T7 T8 Rússia T9 T10 T11 T12 T13 Espanha Dado o passivo externo e a correspondente conta de rendas a ser paga anualmente, para ajustar seu setor externo de forma comparável a outros países emergentes (que não têm passivo externo em igual magnitude), o Brasil deveria promover um ajuste no comércio exterior proporcionalmente maior. Alternativamente, se pode afirmar que, devido ao peso do passivo externo brasileiro, se o país tivesse realizado um ajuste de comércio exterior semelhante ao de outros países emergentes, ainda assim, não obteria igual resultado em transações correntes. Por isso, nas simulações apresentadas a seguir, estaremos considerando, realisticamente, que, ao contrário de outros países, o ajuste brasileiro não levará a um saldo em transações correntes, mas, sim, a uma redução expressiva do déficit. O Papel da Substituição de Importações no Ajuste Externo Brasileiro 20 Os Limites do Modelo de Ajuste Externo Um crescimento contido das exportações e a queda de importações foram as bases do limitado e prolongado ajuste brasileiro. As expressivas desvalorizações cambiais de 1999, 2001 e no corrente ano, além do crescimento econômico baixo (2% ao ano, em média, entre 1999 e 2002), foram os fatores que impulsionaram as exportações e contiveram as importações. Houve também, como vimos, um processo limitado de substituição de importações. O gráfico a seguir mostra como esse modelo vem conduzindo a uma estagnação da corrente de comércio (exportação mais importação), além da já referida queda das importações. O gráfico seguinte ilustra que, projetado para o futuro, o presente modelo poderá, em tese, levar a um saldo comercial que consideramos mínimo para o ajuste externo (US$ 13 a US$ 14 bilhões), mas isso significará o prolongamento do baixo crescimento econômico, das desvalorizações cambiais e da contenção das importações e da corrente de comércio. Por isso, o atual modelo não é adequado para um prazo mais amplo. Não é desejável e talvez nem seja possível manter a quantidade e o ritmo das desvalorizações cambiais sucessivas dos últimos quatro anos e represar o crescimento por mais tempo. Há uma possibilidade de que esse modelo venha a dispensar o baixo crescimento e as desvalorizações cambiais como mecanismos de ajuste. A condição para isso é uma repentina mudança do protecionismo internacional e dos preços de commodities no mercado mundial, o que daria um grande impulso às exportações. Essa possibilidade, que representaria uma adaptação do atual modelo em direção à “vertente mexicana”, deve ser levada em conta, mas não há garantia de que venha a ocorrer. Convém observar que estimativas de saldos comerciais expressivos feitas com base na recuperação dos preços internacionais de commodities vêm sendo frustradas repetidamente, a começar pela projeção que o FMI e o governo brasileiro fizeram do superávit comercial em 1999 após a maxidesvalorização de janeiro daquele ano (US$ 11 bilhões). Com as indicações disponíveis atualmente, nem é seguro o caminho da recuperação da economia mundial, nem há perspectiva de que a curto prazo seja removido o protecionismo internacional, de forma que essa possibilidade, a qual, como convém sublinhar, ajudaria enormente o ajuste externo e reduziria a necessidade de execução de políticas adicionais, não é considerada nas projeções apresentadas a seguir. O Papel da Substituição de Importações no Ajuste Externo Brasileiro 21 Exportação, Importação, Saldo Comercial e Corrente de Comércio (Export. Mais Import.) - Em US$ bilhões 120 113 110 104 101 97 96 100 114 111 109 90 77 80 70 64 60 53 52 60 56 50 47 44 58 55 56 51 48 58 56 54 50 48 49 33 32 31 50 53 39 36 40 53 30 25 21 21 21 20 10,6 10,8 15,2 13,3 10,5 10 4,1 2,6 -0,7 0 -1,2 -3,5 -10 -5,5 -6,9 -6,6 -20 1990 1991 1992 1993 1994 Exportação 1995 1996 Importação 1997 Saldo 1998 1999 2000 2001 2002 (proj.) Corrente de Comércio Exportação, Importação, Saldo Comercial e Corrente de Comércio (Export. Mais Import.) - Em US$ bilhões Projeção do "Modelo Atual" - Modelo do Período PósDesvalorização de 1999 (1999-2001) Cresc. Anual em 2003-05: Export.: 4,4% ; Impot.: -1,2% 150 140 130 114 120 110 108 106 104 110 100 90 80 70 60 58 56 54 62 59 56 50 49 49 50 48 40 30 20 10 2,6 13,5 10,2 7,1 4,1 0 2001 2002 2003 Exportação Importação O Papel da Substituição de Importações no Ajuste Externo Brasileiro 2004 Saldo 2005 Comércio 22 Um Novo Modelo de Ajuste O objetivo de um novo modelo de comércio exterior é a geração de saldos comerciais crescentes, mas com menor dependência de desvalorizações cambiais e de baixo crescimento da economia. Um ajuste mínimo do setor externo brasileiro recomenda um superávit comercial de US$ 13 a US$ 14 bilhões a ser obtido em um período de três anos. O que é necessário mudar no modelo atual não é a política cambial. Todavia, deve-se procurar evitar que uma eventual valorização cambial (a exemplo do que ocorreu entre fins de 2001 e início de 2002) reduza a remuneração do exportador e neutralize os efeitos de uma política de exportação. O novo modelo não deve admitir uma queda tão intensa nas importações como a que ocorreu em outros países porque o pressuposto disso é uma forte recessão da economia, mas deve procurar interromper a atual tendência de declínio das importações. O suposto é que no novo modelo as importações cresçam, porém a uma taxa inferior ao crescimento das exportações. A Política de Exportação O novo modelo deve contemplar um crescimento expressivo das exportações, como 10% ao ano ou aproximadamente duas vezes mais do que o obtido até agora com as desvalorizações cambiais (4,4% ao ano entre 1999 e 2001). Tal resultado pressupõe um “esforço concentrado” para estimular a exportação e o investimento voltado à exportação. Em um contexto em que o mercado externo não tem se mostrado favorável, o IEDI tem sugerido os seguintes instrumentos para tentarmos acelerar a evolução das exportações: Total e ampla desoneração fiscal. Nas atuais circunstâncias, em que ainda exportamos impostos, isso significaria um incentivo fiscal. Consistiria na fixação de índices substancialmente maiores do que os atuais para a desoneração dos impostos incidentes sobre as exportações. A desoneração cobriria, além do PIS e COFINS, o CPMF e o custo de carregar créditos sem contrapartida de débitos fiscais por parte das empresas exportadoras, incluindo créditos do ICMS. O incentivo perduraria até que uma reforma tributária estivesse em pleno vigor no país. Ampliação tanto quanto possível do crédito à exportação por intermédio do Banco do Brasil e do BNDES, incluindo o financiamento do O Papel da Substituição de Importações no Ajuste Externo Brasileiro 23 investimento necessário para expandir as exportações, e maior premiação dos exportadores que cumprem suas metas nos programas de financiamento do BNDES-Exim na modalidade de capital de giro. Financiamento e incentivo fiscal para gastos com marketing e promoção comercial no exterior e apoio aos investimentos externos de empresas brasileiras. É também importante que o Brasil desenvolva outras linhas de política, como, apenas para citar um exemplo, as ações que ultimamente vem executando para diversificar mercados para produtos brasileiros e remover o protecionismo nos países mais desenvolvidos. Já foi observado que o protecionismo concorre para deprimir preços e estreita os mercados de produtos em que temos grande vantagem competitiva. Substituição Competitiva de Importações Se desejarmos um maior crescimento da economia, será inevitável o aumento das importações. O crescimento das importações é desejável para auxiliar no crescimento interno e elevar a competitividade do produto nacional. No entanto, uma expansão das importações pode neutralizar o aumento das exportações, frustrando o ajuste externo. Suponhamos um crescimento do PIB de 5% ao ano nos próximos três anos e que as importações avancem o dobro disso, ou seja, 10%.5 Se isso ocorrer, mesmo na hipótese de um expressivo crescimento das exportações, dificilmente faremos o ajuste externo. O “Cenário A” do gráfico abaixo mostra que, nesse caso, o superávit comercial será baixo e insuficiente para o ajuste. Esse resultado ilustra a necessidade de complemento da política de exportações com uma política de substituição de importações. A crítica mais comum à substituição de importações é que levaria a uma queda de importações, significando isso “fechar” a economia. Ora, vimos que o que está levando à persistente queda das importações e acabará “fechando” a economia é o modelo atual de ajuste externo. É evidente que se um produto antes importado passa a ser produzido internamente, e a produção doméstica 5 Em valor, esta foi aproximadamente a relação média entre crescimento das importações e crescimento do PIB do biênio 2000/2001; a “elasticidade das importações”, avaliada pela relação entre o crescimento do quantum importado e o crescimento real do PIB no mesmo período foi de 2,75. O Papel da Substituição de Importações no Ajuste Externo Brasileiro 24 abastece o mercado consumidor, há uma queda da importação desse produto. Porém a queda das importações totais vai depender de outros fatores, como, por exemplo, o crescimento econômico. Em outras palavras: se a economia crescer mais, a importação que se deixa de fazer de um produto ou grupo de produtos, mediante a substituição de importações, se faz de outros, e as importações totais podem crescer. A substituição de importações abre espaço para o aumento de importações de outros produtos que a economia e os consumidores do país mais necessitam, razão pela qual ela não “fecha” a economia, mas, sim, auxilia em prosseguir a abertura. É necessário um programa para substituir importações porque, como foi visto, em muitos casos, os produtos não são fabricados no Brasil devido aos custos de capital e tributário proibitivos, se comparados aos de outros países. É a esse diferencial de custo que deve remeter uma política de substituição de importação. Ela deve procurar igualar os custos brasileiros com os do exterior, de forma a deixar exclusivamente para os fatores empresariais de análise de projetos a decisão sobre o investimento a ser feito. Com isso, estará assegurada a substituição competitiva de importações. As sugestões de instrumentos para uma política de incentivo a projetos de substituição de importações são: Desoneração dos custos tributários de investir e produzir, que são maiores no Brasil. Programa de financiamento que procure igualar os custos e prazos de financiamento no país, em relação às condições internacionais. Atração de investimentos, visando a produção não só para o mercado doméstico, ou seja, a substituição de importação, mas também para a venda em mercados globais. Cabe sublinhar que o objetivo da substituição de importações é assegurar um crescimento das importações menor do que o das exportações, condição para ampliar o superávit comercial. Para ilustrar, suponhamos que uma substituição de importações permita um crescimento das importações igual ao crescimento projetado do PIB (5%). Os resultados, que correspondem ao “Cenário B” do gráfico abaixo, mostram que isso é suficiente para o ajuste externo. O Papel da Substituição de Importações no Ajuste Externo Brasileiro 25 Exportação, Importação, Saldo Comercial e Corrente de Comércio (Export. Mais Import.) em Dois Cenários - Em US$ bilhões Cenário A Cresc. Anual em 2003-05: Export.: 10% ; Impot.: 10% Cenário B Cresc. Anual em 2003-05: Export.: 10% ; Impot.: 5% 160 150 137 140 130 125 130 120 121 114 114 114 112 104 110 104 100 90 80 70 64 70 60 58 56 54 59 50 72 67 65 61 60 58 56 55 54 58 55 53 50 50 40 30 20 10 4,0 4,1 2,6 3,5 3,8 4,1 2,6 7,0 10,3 14,1 0 2001 2002 2003 2004 Exportação 2005 Importação 2001 2002 Saldo 2003 2004 2005 Comércio Esforço de Exportação versus Substituição de Importações Qual deve ser o “esforço concentrado” de exportação e quanto é requerido de substituição de importações? O gráfico abaixo mostra os resultados de simulações que resultam da diferença entre os valores de exportação e importação correspondentes ao “Cenário B”, e os valores da projeção de exportação caso estas evoluíssem de acordo com o modelo de ajuste atual (4,4% ao ano, a mesma taxa do período 1999/2001) e de importações, caso estas crescessem 10% ao ano, (ou seja, em um múltiplo de 2 do crescimento real do PIB de 5% anuais). Ambos têm contribuição relevante, mas a do primeiro é maior: para o triênio 2003/2005, a promoção de exportação contribui com US$ 13,8 bilhões e a substituição de importações com US$ 8,7 bilhões. A tabela final mostra que, em obtendo êxito, as políticas de exportação e substituição de importações reduziriam à metade a atual relação déficit em transações correntes / exportações em 2005. Muito antes disso, a avaliação internacional do risco brasileiro melhoraria e a vulnerabilidade externa seria menor. O Papel da Substituição de Importações no Ajuste Externo Brasileiro 26 Exportações Adicionais e Substituição de Importações - Resultados das Políticas de Exportação e de Substituição Competitiva de Importações - Em US$ bilhões 2003-2005 13,8 2005 6,5 3,3 6,0 2004 1,3 2003 0 8,7 2,9 2,5 5 10 Política de Exportação 15 20 25 Substituição Competitiva de Importação Déficit em Transações Correntes - Em % das Exportações 2001 39,8 2002 38,6 2003 31,9 2004 25,5 2005 19,3 O Papel da Substituição de Importações no Ajuste Externo Brasileiro 27