políticas públicas descentralizadas como estratégia de

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POLÍTICAS PÚBLICAS DESCENTRALIZADAS COMO ESTRATÉGIA DE GESTÃO E
MONITORAMENTO SOCIAL: O CASO DO PRONAF INFRA-ESTRUTURA.
Sidemar Presotto Nunes1
Hieda Maria Pagliosa Corona2
Carlos Alberto Campos3
RESUMO: O objetivo desse artigo é analisar as ações desenvolvidas pelo Estado, no que se
refere às políticas públicas descentralizadas que visam garantir a gestão e o monitoramento
social. Mais especificamente, analisar as ações desenvolvidas pelo governo federal do Brasil,
através do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), na linha de
infraestrutura e serviços e seus impactos nos Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural
que, na sua maioria, originaram dessa linha do programa. A análise considera que os conselhos
são espaços de um jogo social em que as disputas de poder e a reprodução deste estão presentes.
A partir de resultados de trabalhos de pesquisa, foram analisados os processos de transferência de
informação, os mecanismos para o comprometimento dos atores locais em relação à política
(mobilização, publicização e marco legal) e os mecanismos de promoção da equidade. Conclui-se
que o governo central tem um importante papel no sentido de reforçar a gestão e o
monitoramento social das políticas públicas e que a linha do programa falhou ao não considerar o
jogo social local. Por fim, apontam-se algumas sugestões para que as políticas públicas
descentralizadas, que visam a gestão e o monitoramento social, ganhem em eficiência, dentre elas
a criação da figura do assessor em gestão social de políticas públicas, contratado pelo governo
central, cuja função seria a de acompanhar os diversos conselhos de políticas públicas
descentralizadas existentes em um conjunto de municípios rurais (microrregião).
Palavras-chave: políticas públicas descentralizadas, mecanismos de gestão e monitoramento
social, PRONAF Infraestrutura.
I. INTRODUÇÃO
O objetivo desse artigo é analisar as ações desenvolvidas pelo Estado, no que se refere às
políticas públicas descentralizadas que visam garantir a gestão e o monitoramento social. Mais
especificamente, analisar as ações desenvolvidas pelo governo federal através do Programa
Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), na linha de infraestrutura e
serviços e seus impactos nos Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural que, na sua
maioria, originaram dessa linha do programa.
A linha de Infra-estrutura e Serviços Públicos Municipais do PRONAF “foi criada para
apoiar o desenvolvimento rural dos municípios cuja base econômica é a agricultura familiar”
(MDA, 2003). O programa prioriza os municípios com índices de desenvolvimento humano
(IDH) mais baixo e, atualmente, em torno de 1.500 municípios são beneficiários. A sua gestão,
1
Engenheiro Agrônomo; especialista em Desenvolvimento Rural pelo CEFET-PR; técnico do Departamento de
Estudos Sócio-Econômicos Rurais – DESER.
2
Socióloga; Mestre em Sociologia; Doutoranda em Meio Ambiente e Desenvolvimento pela UFPR; professora do
CEFET-PR.
3
Engenheiro Agrônomo; especialista em Educação de Adultos pela PUC-PR; especialista em Desenvolvimento
Rural pelo CEFET-PR; técnico da Empresa Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural – EMATER-PR.
2
no âmbito municipal, é realizada pelos conselhos municipais de desenvolvimento rural
(CMDR’s).
No Brasil, a participação popular na elaboração e gestão de políticas públicas foi prevista
na Constituição Federal de 1988. Isso contribuiu para que inúmeros conselhos fossem criados,
desde o âmbito municipal até o federal. Atualmente, de acordo com o IBGE (1999),
praticamente, todos os municípios brasileiros possuem ao menos um conselho. Estima-se que em
torno de 30% dos municípios brasileiros (aproximadamente 1.800) possuem Conselhos de
Desenvolvimento Rural. Segundo os dados da pesquisa realizada pela Cooperativa Plural/ IICA/
MDA (2002) nos municípios beneficiários do PRONAF Infraestrutura (1500), 73,4% dos
conselhos municipais de desenvolvimento rural tiveram como principal motivação o acesso aos
recursos do programa.
Vários estudos indicam que a maioria dos Conselhos não conseguiu articular a sociedade
civil local, no sentido de desencadear processos que promovessem o desenvolvimento rural, já
que esta é a principal premissa do PRONAF Infraestrutura. Na maioria dos casos, apenas vem
cumprindo um papel meramente formal para atender às exigências do programa. Os estudos
realizados e as críticas das várias instâncias de governo e da sociedade civil vêm colocando as
seguintes questões:
a) O Estado, através do PRONAF, tem cumprido adequadamente seu papel para que haja
condições efetivas para gestão e monitoramento social?
b) Quais são as principais falhas e os principais avanços dessa política e os impactos nos
Conselhos de Desenvolvimento?
c) Como as políticas públicas descentralizadas podem ser aprimoradas para que haja uma
melhor gestão e monitoramento social?
É possível afirmar que, no Brasil, há um relativo consenso sobre a importância da
participação social, na gestão e monitoramento das políticas públicas. Isso porque a participação
social pode contribuir com: o desenvolvimento local (ABRAMOVAY, 2001; PNUD, 2002); a
ampliação de ações coletivas (OSTROM, 1990); o exercício da fiscalização sobre a utilização dos
recursos públicos e o fortalecimento do processo democrático (PNUD, 2002) e da própria
cidadania. Tal importância não se limita às experiências brasileiras, pois esta é uma estratégia que
vem sendo testada e desenvolvida em diversas partes do mundo. Em geral, os mecanismos mais
utilizados são os conselhos e fóruns com representantes da sociedade civil, dos beneficiários das
políticas públicas e dos governos.
Os conselhos gestores são novos instrumentos de expressão, representação e participação; em tese são
dotados de potencial de transformação política. Se efetivamente representativos, poderão imprimir um novo
formato às políticas sociais, pois se relacionam ao processo de formação das políticas e à tomada de
decisões. Com os conselhos, gera-se uma nova institucionalidade pública, pois criam uma nova esfera
social-pública ou pública não-estatal. Trata-se de um novo padrão de relações entre Estado e sociedade
porque viabilizam a participação de segmentos sociais na formulação de políticas sociais, e possibilitam à
população o acesso aos espaços onde se tomam as decisões políticas (GOHN, 2002, p. 04).
Foi com base nestas reflexões que se desenvolveu o estudo que culminou com o presente
artigo. A hipótese que orientou o estudo e a coleta de dados e informações necessárias para a
construção deste trabalho é de que para criar e fortalecer os mecanismos de gestão e
monitoramento social, através dos conselhos, é necessário que haja: a) transferência de
informação, b) mobilização dos atores sociais e do poder público local, c) condições jurídicolegais para o funcionamento dos conselhos, d) mecanismos promotores de equidade entre os
conselheiros e e) publicização do papel, função e obrigação dos conselhos e conselheiros.
3
O meio utilizado para desenvolver o presente artigo ateve-se ao estudo de base conceitual
na literatura sobre o tema e à coleta de dados e informações produzidas por diversas pesquisas de
campo, realizadas junto aos Conselhos de Desenvolvimento Rural existentes. A fonte documental
orientou-se nas publicações das Universidades Federais do Paraná (UFPR) e do Rio Grande do
Sul (UFRGS), do Centro Federal de Educação Tecnológica do Paraná (CEFET-PR), do
Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), do DESER e nos trabalhos de CASTILHOS
(2001) e ABRAMOVAY (2001), que tratam especificamente de uma análise sobre a relação dos
Conselhos de Desenvolvimento Rural e o PRONAF Infra-estrutura. Os resultados das pesquisas
que foram utilizados no presente artigo fazem parte dos estudos do: IBASE4 (2002),
ASSOCENE5 (2001), Plural/IICA/MDA6 (2002) e FAO/DESER7 (2002). Destaca-se que o
estudo, por vezes, contou com a observação e a experiência prática dos autores deste artigo, que
vêm trabalhando com os conselhos municipais de desenvolvimento rural, através dos cursos para
conselheiros (DESER) e da extensão rural (EMATER). Tais observações não pretendem ter um
caráter científico, pois não foram organizadas de acordo com metodologia apropriada, mas como
são relevantes às experiências profissionais (envolvimento direto com em torno de 20 Conselhos)
não é possível assumir uma postura de neutralidade frente à realidade.
II. GESTÃO E MONITORAMENTO
DESENVOLVIMENTO.
SOCIAL
COMO
COMPONENTES
DO
2.1. Desenvolvimento e participação social.
Atualmente, há um esforço de muitos estudiosos no sentido de ultrapassar a idéia
dominante que relaciona crescimento econômico com progresso social. A noção é de que o
4
“Avaliação de planos municipais de desenvolvimento rural – PMDR’s em quatro estados: ES, MS, PE e SC,
realizado pelo Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas – IBASE. A pesquisa apoiou-se em entrevistas
com conselheiros de 44 municípios dos estados citados, observando parâmetros e critérios que permitissem conhecer
o grau de representatividade, o nível técnico e a efetividade do uso do plano na promoção das ações de
desenvolvimento rural do município.
5
O trabalho “Sistematização e análise de resultados da capacitação em gestão social para conselheiros municipais”,
consistiu em uma sistematização nacional, organizada pela Associação de Orientação às Cooperativas do Nordeste
(ASSOCENE), em convênio com o Ministério do Desenvolvimento Agrário. Teve a finalidade de avaliar a
capacitação nacional do PRONAF, realizada no ano de 2000. Este processo de capacitação envolveu 826 municípios,
totalizando 300 cursos, com a participação de 6.581 conselheiros. Baseou-se nas informações geradas nas avaliações
dos conselheiros, instrutores e pelo monitoramento dos grupos de trabalhos estaduais - GTE’s, Grupo de trabalho
nacional – GTN e instituições capacitadoras.
6
“Políticas Públicas, participação social e as instituições para o desenvolvimento rural sustentável: uma avaliação
dos conselhos municipais de desenvolvimento rural”, trabalho realizado pela Plural Cooperativa de Consultoria,
Pesquisa e Serviços. A pesquisa foi realizada em municípios de cinco estados brasileiros, e que teve como foco
principal avaliar a estrutura, o funcionamento e o alcance das ações dos Conselhos Municipais de Desenvolvimento
Rural (CMDRs).
7
“As reformas de descentralização e o desempenho dos serviços públicos no setor agropecuário – o caso do Sul do
Brasil”. A pesquisa é resultado de um trabalho realizado em quatro países: México, Peru, Chile e Brasil, coordenado
pela FAO. Apoiou-se em entrevistas com 50 prefeitos (ou secretários de agricultura) e 100 representantes de
organizações sociais em 50 municípios da região Sul. Buscou analisar o impacto, na visão dos atores, das reformas
de descentralização no desempenho dos serviços agropecuários. Introduz a análise sob a ótica da ação coletiva. No
Brasil, o trabalho coube ao Departamento de Estudos Sócio-Econômicos Rurais (DESER).
4
progresso transformaria naturalmente as sociedades “arcaicas” ou “simples” em sociedades
“modernas” ou “complexas”, conduziria a superação do conhecimento tradicional pelo avanço do
conhecimento científico e o fim da opressão pela liberdade dos cidadãos. Liberdade,
principalmente, para produzir e vender bens segundo as regras “perfeitas” do mercado. Assim, a
evolução “natural” seria responsável pela melhoria nas condições de vida da população através
do crescimento econômico” (CORONA, 2002, p. 05). Segundo ALMEIDA (1997), as crises
econômicas e sociais que ocorreram na primeira metade do século XX, demonstraram que o
progresso não era virtude natural que todos os sistemas econômicos e todas as sociedades
possuíam e que o crescimento econômico era insuficiente para dar conta das transformações
estruturais.
Para ALMEIDA (1997), foi no seio do próprio liberalismo que a idéia de
desenvolvimento substituiu a noção de progresso. A idéia de progresso passou a ter um sentido
parcial e prático, em geral, como uma melhoria, a exemplo da descoberta da penicilina. Para
CORONA (2002), o conceito de desenvolvimento passou a supor a intervenção principalmente
estatal (política) que, a partir de uma base técnico-científica, conduziria os países não
desenvolvidos à prosperidade econômica e, conseqüentemente, ao bem estar da população. O
planejamento estatal passou a ser fundamental para programar as ações governamentais, tanto no
controle da economia como da rede de serviços sociais.
As últimas três décadas do século XX foram emblemáticas para que ocorresse um profundo
questionamento do modelo de desenvolvimento, pretensamente universal. Estudos vêm
demonstrando que “os resultados da racionalidade instrumental e da expansão do capitalismo
causaram danos à sociedade e à natureza. A desigualdade social e a extrema pobreza de grande
parcela da população mundial e os “efeitos inesperados” na natureza (poluição, degradação,
escassez), indicam os limites reais deste modelo de desenvolvimento”. Neste sentido, é que a
noção de desenvolvimento sustentável começa a ser discutida. Mesmo imprecisa, a noção de
sustentabilidade inseriu a problemática ambiental ou ecológica no debate sobre o
desenvolvimento. A expansão deste debate permitiu, ainda, “incorporar o espaço dos
sujeitos/atores que têm demandas e desejos não limitados exclusivamente pelo jogo do mercado,
que visa apenas a eficiência e o lucro no curto prazo, sem atender os limites naturais e humanos
deste processo” (CORONA, 2002, p.11).
O debate sobre sujeitos/atores está circunscrito à idéia da ação enquanto prática, situandose no quadro das relações sociais e orientando-se para a manutenção, transformação ou revolução
de um ou de vários elementos constitutivos de um sistema social (TOURAINE, 1973 citado por
BERNARTT, 2003). Uma ação coletiva é, por conseguinte, um conjunto de práticas conflituais
intervindo em um sistema social, implicando uma luta entre, pelo menos, dois atores, em que
cada um se caracteriza por um tipo de solidariedade específica, ao mesmo tempo em que, se opõe
ao outro pela apropriação e uso que faz de valores e recursos sociais.
Essas afirmações remetem à reflexão sobre as políticas públicas descentralizadas. Os
Conselhos Municipais de Desenvolvimento, sugeridos pela coordenação nacional do programa
como espaços de gestão democrática no âmbito municipal, não são suficientes para garantir as
mudanças sociais almejadas. Tais mudanças são dificultadas por uma série de situações, entre
elas destaca-se o jogo de poder entre os atores locais. Geralmente, por um lado, não é de
interesse do poder tradicional querer fortalecer a organização social e democratizar a gestão
pública, uma vez que isso pode significar perda de poder. Por outro lado, o assistencialismo
pode garantir condições mínimas para a reprodução social e econômica de uma parcela
significativa da população local, o que uma ruptura pode significar perdas que colocam em risco
essa reprodução.
5
No entanto, superada a idéia de que o desenvolvimento social resulta exclusivamente do
crescimento econômico, é possível compreender que ele é resultado de uma construção social em
que contam as várias dimensões da vida – social, econômica, ambiental, entre outras - e por isso
faz-se necessário lançar mão de algumas medidas que possam garantir a gestão e o
monitoramento social, no sentido de fortalecer o capital social e promover a democracia. Para
que os Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural sejam espaços democráticos que
conduzam às mudanças sociais faz-se necessário: a) transferência de informação, b) mobilização
dos atores sociais e poder público local, c) condições jurídico-legais para o funcionamento dos
conselhos, d) mecanismos promotores de equidade entre os conselheiros, e) publicização do
papel, função e obrigação dos conselhos e conselheiros.
2.2. Gestão e monitoramento social: democracia e desenvolvimento
Na democracia liberal, como diz SEN (2000), a liberdade é meio e fim do
desenvolvimento, ou seja, a liberdade é fundamental para que haja desenvolvimento e, também, é
o produto dele. Estas liberdades podem ser econômicas (uma renda melhor pode propiciar uma
opção de escolhas maior), políticas e religiosas (pela possibilidade de definir o próprio futuro,
crença, etc). Assim, o desenvolvimento está em função do alargamento das opções de escolhas
das pessoas. No entanto, diz o autor, as opções de escolhas estão diretamente ligadas com as
relações de poder existentes na sociedade. Ou seja, uma pessoa ou um grupo social que possui
poucas condições de intervir na sociedade ou participar de seus benefícios, possuirá poucas
opções de escolhas; ficará sob a boa vontade do grupo social que possui o poder e condições para
decidir.
No Brasil, as diferenças de poder podem ser verificadas pela ampla desigualdade social e
econômica da população. A herança colonizadora que propiciou o acúmulo de ativos e terras, por
pequenos grupos sociais, foi um dos fatores que mais contribuiu com os problemas sociais
verificados atualmente. Pode se dizer que a concentração de renda é decorrente também da
concentração de poder, pois alguns pequenos grupos e um número reduzido de famílias tiveram o
controle político do país. Este processo é histórico e está presente desde a divisão das terras pelo
sistema de sesmarias, como no fato de ser um dos últimos países a abolir a escravatura, e de ter
realizado sua abertura democrática há poucos anos atrás. Uma democracia representativa que, tal
como foi institucionalizada, tem se demonstrado insuficiente para reduzir essas desigualdades,
uma vez que foram poucos os representantes eleitos, oriundos das classes sociais mais
desfavorecidas, embora esse quadro venha sendo mudado nos últimos anos.
O debate a respeito da efetividade da democracia representativa e da democracia direta
vem de longo tempo. Apesar de que a primeira tem apresentado falhas, questiona-se as
possibilidades reais da segunda. Aponta-se, freqüentemente, a necessidade de uma combinação
entre as duas para atingir melhores resultados para a sociedade. Dessa forma, uma poderia servir
de contraponto à outra, uma vez que, teoricamente, poderiam disputar espaços. Ou seja, a
democracia de massas (direta) pode exercer um certo monitoramento sobre a representativa
fazendo com que os representantes eleitos necessitem justificar suas opções políticas e vice-versa,
possibilitando a qualificação de ambos. JAGUARIBE (1985) acredita que a democracia direta é
que garante uma democracia de massas e que esta evolui por etapas.
A primeira conclusão que resulta da análise diacrônica do processo democrático, na experiência
ocidental, é de que tal processo se realiza por etapas. As democracias tendem a se iniciar sob formas
6
restritas de participação no processo decisório – democracia de notáveis – que se expandem para
incorporar setores intermediários – democracia de classe média – e, quando logram realizar-se
plenamente, conduzem à incorporação de toda a cidadania, constituindo-se em democracias de massa.
(JAGUARIBE, 1985, p. 434).
Esse trabalho admite como pressuposto que a democracia é uma das condições para a
redução das desigualdades sociais e para o desenvolvimento das liberdades individuais e
coletivas. Ademais, as pessoas tendem a valorizar também os meios8 e não somente os fins, ou
seja, a participação nas decisões é valorizada pelas pessoas, enquanto conquista de liberdade, e
não somente pela condição de bem estar social. Além disso, as sociedades democráticas, mesmo
as mais pobres, de acordo com SEN (2000), estão menos sujeitas às catástrofes que possam afetar
a sociedade como um todo ou parte dela. Isso se justifica pelo fato de que os ambientes
democráticos, embora geralmente marcados pelos conflitos de interesses, preservam maior
diversidade cultural, científica, política, etc., o que possibilita desenvolver maior número de
alternativas e soluções aos momentos de crise ou até mesmo evitá-la. Uma democracia realmente
efetiva permite a transferência de informação às pessoas e isso faz com que as mesmas cobrem
maior transparência nas relações sociais. Pela pressão social, são reduzidas as desigualdades nas
relações de poder, decorrentes da posse de informação e outros meios, e obriga os representantes
políticos a uma tomada de ação mais coerente para os diversos grupos sociais, o que tende a
reduzir privilégios.
3. POLÍTICAS PÚBLICAS DESCENTRALIZADAS: GESTÃO E MONITORAMENTO
SOCIAL
Nos municípios brasileiros, sob o impacto das mudanças políticas do período recente, vêm
ocorrendo “crescentes inovações na gestão pública, ampliando a participação e o monitoramento
social sobre os fundos públicos, assim, instalando maior transparência e mecanismos de
responsabilização (mais ampla e eficaz governance), provavelmente, significando uma profunda
transformação sócio-política, cujos contornos mais concretos são ainda imprecisos”
(NAVARRO, 2002, p 16). Os Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural (CMDR’s) têm
sido constituídos com vistas a articular os processos de desenvolvimento no âmbito local,
estimulados por políticas públicas ou pela própria organização social.
No atual cenário de desenvolvimento da democracia brasileira, os conselhos representam
a possibilidade de: ampliar as ações coletivas entre o público e o privado (ARENDT, 1973);
contribuir para a elaboração de políticas públicas, ampliando a relação entre formuladores de
políticas e beneficiários (CARVALHO & TEIXEIRA, 2000); ganhar em credibilidade política
pela transparência nas ações (senso de justiça); reduzir as desigualdades sociais manifestadas
pelas desigualdades de poder; proporcionar melhor desempenho dos serviços públicos devido às
melhorias na credibilidade; gerar consensos e adequação das políticas às diversas realidades
locais; fortalecer a democracia. Partindo do princípio de que os conselhos são a manifestação da
democracia direta, os mesmos podem significar o avanço para uma democracia de massas. Ou
seja, através destes (conselhos) os cidadãos podem estar mais próximos dos centros de decisões9,
8
As pessoas podem querer participar, não como um meio de assegurar fins especiais, mas tão somente participar do
poder decisório (LUCAS, 1985).
9
Os funcionários públicos podem exercer instruções que acreditam estar injustificadas, pois são pagos e seus
empregos estão em risco. Quando se conta com a cooperação voluntária dos membros do público, a capacidade do
7
desde que as opções dos conselheiros tenham sido discutidas anteriormente com sua comunidade
e seu grupo social.
A descentralização, entendida como transferência de poder decisório aos estados,
municípios e atores locais, expressa, por um lado, as tendências democratizantes, participativas e
de responsabilização e, por outro, os processos de modernização gerencial da gestão pública. Os
conselhos, enquanto instrumento da vida em sociedade, são defendidos pelos liberais e pela
esquerda, em seus diferentes matizes. Para GOHN (2002, p 02) “a diferença é que eles são
pensados como instrumentos ou mecanismos de colaboração, pelos liberais; e como vias ou
possibilidades de mudanças sociais no sentido de democratização das relações de poder, pela
esquerda”. ARENDT (1973) defendeu a existência dos conselhos ao analisar as revoluções
francesa e americana. Para a autora, os conselhos são a única forma possível de um governo
horizontal; um governo que tenha como condição de existência a participação10 e a cidadania,
podendo, ainda, resultar em uma forma de estado, não somente de governo.
O último relatório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento Humano
(PNUD, 2002), aponta que hoje existe um consenso entre os países que se tornaram
desenvolvidos, de que a descentralização, isto é, de que a transferência de mais autoridade às
administrações locais e a concessão de mais liberdade às organizações populares e nãogovernamentais (ONG's) representam pré-requisitos para o desenvolvimento sócio econômico. O
relatório aponta ainda que, nos países onde a democracia está ganhando mais espaço, existe uma
descentralização de poder das capitais para as regiões, das cidades para os povoados, e que esta
parece ser a melhor forma de conferir poder ao povo e aumentar a eficiência dos governos. Como
resultados, as políticas de desenvolvimento regional de muitos países desenvolvidos, com
processos de descentralização de políticas e recursos, têm sido responsáveis por uma melhor
distribuição geográfica da população, evitando os grandes problemas das metrópoles e garantido
que parcela significativa da população continue vivendo em pequenas comunidades.
Após a redemocratização do Brasil multiplicaram-se, de forma muito rápida, o número de
organizações, espaços de participação e conselhos enquanto espaço de concertação11. De acordo
com a pesquisa FAO/DESER12 (2002), 58% das organizações pesquisadas foram criadas após
1990. Para GOHN (2002), as experiências “conselheiristas” passaram pelos conselhos
comunitários criados para atuarem junto à administração municipal no final dos anos de 1970; os
conselhos populares do final dos anos de 1970 e parte dos anos de 1980 e os conselhos gestores
institucionalizados (objeto desse estudo). A autora acrescenta que, além desses, há os tradicionais
conselhos de “notáveis” que se configuram como assessorias especializadas existentes em
algumas áreas de governo. A linha de Infraestrutura e serviços do PRONAF é uma política
pública descentralizada que assume os conselhos gestores institucionalizados (CMDR’s)
enquanto espaço de gestão de seus recursos.
governo em implementar suas decisões depende, em grande parte, das mesmas serem toleráveis pelo público em
geral, justificáveis (LUCAS, 1985).
10
Para LUCAS (1985), a participação não só ajuda as pessoas a interpretarem o fenômeno do governo como uma
forma de ação, e não de um mero tipo de acontecimento, mas leva-as a criticar do ponto de vista de agentes, e não de
espectadores. O autor acrescenta que uma consideração mais prática predominou durante muitos séculos no
pensamento político inglês: a participação é a melhor garantia contra a tirania.
11
Neste estudo, concertar significa ajustar, dar melhor forma. Parte-se do princípio de que é necessário corrigir
problemas e vícios provocados pelo atual institucionalismo para gerar maior eqüidade e avançar para um novo
institucionalismo.
12
A pesquisa indicou, também, que 84% das organizações consideram que as reformas de descentralização
contribuíram para o que os problemas locais fossem mais facilmente resolvidos. Também, que 61% dos prefeitos
afirmaram que recorrem aos conselhos para levantar as demandas da população rural.
8
3.1. O PRONAF Infraestrutura e serviços: proposta e ações concretas
De acordo com o MDA (2003), a linha de Infra-estrutura e Serviços Públicos Municipais
do PRONAF foi criada para apoiar o desenvolvimento rural dos municípios cuja base econômica
é a agricultura familiar. Esta tem como objetivos específicos: a) estimular o fortalecimento das
organizações sociais locais (sindicatos, associações, etc.); b) despertar a participação dos
agricultores familiares, por meio de suas organizações, nos debates em que são discutidos
assuntos de seu interesse; c) viabilizar a criação dos Conselhos Municipais de Desenvolvimento
Rural Sustentável (CMDRS), e dos Planos Municipais de Desenvolvimento Rural Sustentável
(PMDRS); d) despertar o interesse pelas políticas públicas; e) resolver os problemas e gargalos
que impedem o desenvolvimento local; f) suprir as comunidades rurais de infra-estrutura pública,
reduzindo o risco de aplicação do crédito rural (ex: investimento na qualidade tecnológica e
produtividade - energia-água-irrigação, condições de escoamento da produção e condições de
comercialização). Nota-se que o programa tem por objetivo articular processos em torno do
desenvolvimento rural, fortalecendo organizações e a gestão social. Dotar os municípios em
infraestrutura e serviços está explícito nos dois últimos objetivos específicos.
O PRONAF foi criado em 1995 e a linha infraestrutura e serviços aos municípios em
1997. Atualmente, em torno de 1.500 municípios já se beneficiaram dessa linha do programa.
Cada município recebe anualmente volumes de recursos que variam entre R$ 100.000,00 e R$
200.000,00, durante cinco anos. Os municípios que são beneficiários do programa são escolhidos
pela equipe gestora, em nível nacional, através de critérios que combinam a importância da
agricultura familiar e os baixos indicadores sociais. “Após a definição dos critérios de seleção
pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável - CNDRS, a Secretaria da
Agricultura Familiar - SAF elabora listagem dos Municípios por Estado, classificados em ordem
decrescente da pontuação obtida e encaminha aos Estados e ao Distrito Federal para que os
Conselhos Estaduais de Desenvolvimento Rural Sustentável - CEDRS, façam os ajustes
necessários, de acordo com os parâmetros determinados pelo CNDRS” (MDA, 2003).
A grande maioria das CMDR’s teve origem no período posterior à criação do PRONAF e,
quando indagados sobre a motivação que levou à criação do Conselho, os informantes da
pesquisa corroboraram com a idéia de que é a exigência formal o principal fator. Essa indução à
criação dos CMDR’s pelo PRONAF Infraestrutura torna quase inevitável que o principal agente
desse processo seja o poder público municipal. A possibilidade de trazer para os municípios os
recursos referentes a essa linha do programa faz com que as administrações municipais se
mobilizem para cumprir os requisitos legais necessários. Logo, o poder público é o principal
agente na constituição dos CMDR’s (PLURAL, 2002).
De acordo com a pesquisa da PLURAL (2002), depois do poder público municipal, os
agentes que mais participaram na constituição dos CMDR’s foram os Sindicatos, seguidos pelas
Associações de agricultores e pelo pessoal ligado à Igreja Católica. A pesquisa mostra, ainda, que
o envolvimento dos agricultores e das suas organizações, normalmente, é formal. Isso pode ser
explicado, tanto pela falta de um comportamento habitual de interação entre agricultores e as
forças do poder público, como pelo fato de que a presidência do Conselho, em 37,2 % dos casos,
é exercida pelo Secretário da Agricultura e, em 31,9%, por outros membros do executivo
municipal.
Segundo os dados da pesquisa do IBASE (2001), em 63% dos municípios investigados
(em quatro Estados) a pessoa que ocupa a Presidência do CMDR é eleita diretamente pelos
membros do Conselho, em 17% ela é indicada e nos outros 18% é definida em lei ou regimento.
9
Mesmo nos Conselhos em que o presidente é um agricultor familiar, em 78% dos casos (IBASE,
2001), o secretário executivo é alguém ligado ao poder público ou à extensão rural e é quem
efetivamente preside o conselho, mesmo que formalmente não seja essa sua função. Isso se deve
ao fato de o mesmo possuir, em geral, um maior conhecimento e domínio dos procedimentos
formais.
Os dados e informações parecem corroborar a idéia de que os CMDR’s são constituídos
no afogadilho e fundamentalmente por uma exigência do PRONAF Infraestrutura. De acordo
com a pesquisa FAO/ DESER (2002), a opinião das organizações locais pesquisadas demonstra
que metade dos Conselhos não possui qualidade adequada. Os Conselhos têm, em geral, um
caráter reativo e dependente do programa, e com um forte peso do executivo municipal. Um dos
pontos positivos é o respeito ao percentual mínimo de representação dos agricultores, e da forma
de escolha dos membros (PLURAL, 2002).
3.2. Informação para a gestão e o monitoramento social.
A informação consiste em algo muito relevante. DEMO (1996) afirma que informação é
poder e esta faz parte dos conteúdos legítimos da democracia. A transferência de informação
consiste, portanto, numa condição para a gestão e o monitoramento social. Para que os
conselheiros desempenhem seu papel necessitam de informações sobre diversos aspectos técnicos
e políticos. No nível local, por exemplo:
“a) um prefeito poderia controlar o fluxo de informação sobre as atividades de sua gestão de tal maneira que
os cidadãos não possam jamais avaliar seu desempenho, b) pode ocorrer que os mesmos cidadãos não
estejam organizados para poder exigir uma maior transparência do governo municipal e, (c) talvez a mesma
estrutura legal impeça tal transparência na gestão pública. Em todo caso, as assimetrias de informação que
se produzem são barreiras institucionais para uma gestão pública que pretenda ser eficaz, eficiente e
eqüitativa” (FAO/DESER, 2002).
Na prática, é comum ver conselhos que não conhecem os mecanismos legais que dão
condições para que os mesmos possam atuar, ficando dependentes da avaliação do poder público
local (prefeito, geralmente) sobre as possibilidades das propostas de trabalho, o qual poderá dar
apenas a informação que lhe convier.
O mais importante é o tipo de conhecimento e de habilidade dos atores sociais que
compõem a organização. Este conhecimento é, em parte, adquirido na prática e, em parte,
transmitido formalmente. “O tipo de conhecimento, habilidades e aprendizagem que os membros
de uma organização adquirem vai refletir a compensação – os incentivos - incorporados às
restrições institucionais” (NORTH, 1990/1994, p.74; citado por ABRAMOVAY, 2001).
O primeiro curso de formação para conselheiros do PRONAF Infraestrutura, por sua vez,
aconteceu em 2000, embora o programa tenha sido iniciado em 1997. Naquele momento já havia
826 municípios que acessaram recursos do programa (ASSOCENE, 2001). Anterior a isso, não
houve capacitação que contribuísse com o processo de elaboração, execução e avaliação dos
PMDRs, dos técnicos, agricultores e responsáveis pelas administrações públicas locais. A
segunda capacitação (2002/ 2003) ainda não foi concluída. No Estado do Paraná, mesmo que não
houvesse um processo de capacitação coordenado no âmbito nacional, a Empresa Paranaense de
assistência técnica e extensão rural – EMATER conduziu cursos de formação de conselheiros, em
alguns municípios, a partir de 1998.
10
As informações a respeito do programa chegam através da prefeitura municipal a partir do
momento em que esta é comunicada sobre a pré-seleção pela coordenação nacional ou estadual
do programa. A prefeitura é quem se responsabiliza por mobilizar a sociedade civil para
constituir o Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural. Conforme já tratado anteriormente,
não houve um processo de transferência de informação efetivo e coordenado, em nível nacional,
pelo programa. Sendo assim, as condições para transferência de informação aos atores locais se
revelaram muito precárias.
De acordo com a pesquisa PLURAL (2002), os pesquisadores dizem que, pelas
características da amostra trabalhada, não foi possível traçar o perfil dos conselheiros de maneira
a inferir se eles possuem ou não competência necessária ao bom exercício dessa função. Metade
dos entrevistados afirmou ter conhecimento da existência de formação e capacitação, no entanto,
apenas um em cada três conselheiros participou de tais atividades. E, entre os que participaram
dessas ações de formação, dois terços deles avaliaram como boa/proveitosa, enquanto 31% as
consideraram como razoável.
Na pesquisa do IBASE (2001), é frisado que a participação dos conselheiros na gestão dos
planos ainda é insatisfatória, em grande medida, reporta para o problema da falta de capacitação
desses conselheiros. O problema é que, até hoje, o enfoque da capacitação desses conselheiros
ocorre no âmbito eminentemente técnico, deixando-se de considerar a necessidade de uma
capacitação no nível político, que talvez tivesse uma maior contribuição para a
instrumentalização dos mesmos conselheiros, frente à natureza das questões que enfrentam.
Em todas as pesquisas realizadas com Conselhos, chega-se à conclusão de que a
capacitação dos conselheiros deixou a desejar. É baixo o percentual de conselheiros que
participam da capacitação e que a capacitação oferecida não tem sido totalmente apropriada para
que os conselheiros possam fazer mudanças no ambiente institucional. O que se propaga hoje, é
que os Conselhos têm a obrigação de agir para que haja um desenvolvimento sustentável em sua
comunidade, seu município e seu território. No entanto, parece haver poucas condições para que
isso se efetive.
3.3. Comprometimento dos atores locais: mobilização, publicização e marco legal.
Para que uma política pública descentralizada tenha seus recursos bem aplicados é
importante que comprometa os atores locais. Para isso, além da transferência de informação, é
importante que haja uma mobilização dos atores sociais e poder público local (FAO/ DESER,
2002), para levar adiante essa política pública descentralizada. A mobilização pode ser feita,
preferencialmente, por agentes externos que motivem para executar uma ação coletiva e
explicitem quais poderão ser os benefícios futuros desse trabalho conjunto. Para isso, faz-se
necessário um tempo mínimo, variando com a dinâmica social existente, para que haja a
mobilização e uma articulação local das forças, elaboração de diagnósticos e planos. O trabalho
de mobilização pode ser conjugado com a publicização (GOHN, 2002) do papel, função e
obrigação dos conselhos e conselheiros, no sentido de que a comunidade tenha condições de
exercer uma certa cobrança. Além dessas condições, é necessário um marco jurídico que dê
amparo legal à existência dos conselhos para possibilitar que os mesmos tenham condições de
gerir as políticas públicas e sobre as quais possuam direitos e obrigações reconhecidos por lei.
A constituição dos Conselhos, de modo geral, foi muito rápida, sem a devida mobilização
da comunidade. A principal motivação para a sua constituição é a exigência legal do CMDR,
para possibilitar o acesso aos recursos do programa. Por conta disso, o poder executivo municipal
tem sido o principal agente envolvido na criação dos Conselhos.
11
Apesar do predomínio do poder executivo, o envolvimento das organizações dos
agricultores também tem sido expressivo. Em quase todos os conselhos, tem sido respeitada a
indicação de que, ao menos, 50% dos membros sejam agricultores, o que confere aos CMDR um
grau razoável de representatividade dos agricultores familiares. De acordo com a PLURAL
(2002), o processo de escolha destes representantes ocorre basicamente de duas formas: com a
realização de reuniões nas comunidades, nas quais são indicados os nomes; ou a indicação ocorre
por intermédio das entidades dos agricultores (Sindicatos, Associações e Cooperativas).
Através desta pesquisa, verificou-se que os principais atores dos CMDR, por ordem de
importância, na sua criação são: poder público, sindicatos, associações/cooperativas, igrejas e
outros. E, após a criação, os principais atores que dão continuidade às atividades, são
basicamente os agricultores, a extensão rural e o poder público. Outras entidades ou atores são
em minoria. Um fato que dificulta a consolidação e coesão de um CMDR é a mudança do grupo
político no poder municipal. Em geral, a cada quatro anos se muda o grupo político, mudam os
membros indicados pelo Executivo Municipal, quando o grupo político se mantém, o grau de
renovação é menor.
A relação entre os CMDR e outros Conselhos é muito pequena. Quando acontece é
porque uma mesma pessoa participa em vários conselhos. A relação entre os CMDR e outras
instituições que dele não fazem parte já é maior, mas na maioria dos casos trata-se de instituições
tradicionalmente ligadas à agricultura – raramente se mantém relações com universidades e
centros de pesquisa, ou com organizações dos setores comercial ou industrial. As relações entre
os CMDR e os demais municípios de uma mesma região também praticamente inexistem.
Na quase totalidade dos CMDR, os assuntos que são discutidos se referem aos Planos
Municipais de Desenvolvimento Rural. Se, por um lado, isso é positivo, pois se espera que o
conjunto de problemas e demandas dos municípios seja pensado de maneira articulada num Plano
de Desenvolvimento, por outro lado, é preciso reconhecer que esses planos não têm conseguido
absorver de maneira consistente esse conjunto de problemas e demandas.
Em boa parte dos casos, os planos são feitos de maneira muito rápida através de consultas
às comunidades e organizações, ou de breves diagnósticos. Normalmente, as formas de consulta
são insuficientes para identificar corretamente e em profundidade os problemas e as
potencialidades dos espaços rurais. O importante deste processo é que, mesmo que precário,
acaba envolvendo os agricultores e os agentes locais. Precário porque os representantes de
organizações sociais ou das comunidades são, muitas vezes, indicados sem passar pela devida
discussão. Isto ocorre, principalmente, pelo fato de haver pouco tempo para a constituição dos
Conselhos e a elaboração do plano, além da inadequada publicização.
O resultado é que os planos acabam refletindo uma visão muito superficial e restrita dos
municípios. Como conseqüência, as ações desencadeadas a partir deles também ficam restritas às
proposições tradicionais dos agentes. Ou seja, são reproduzidos os limites de se pensar o
desenvolvimento apenas nos marcos da agricultura, do município e de maneira reativa ao
entendimento que os próprios agentes têm dos problemas.
Quando indagados sobre os principais pontos positivos na experiência dos CMDR, os
conselheiros representantes dos agricultores apontaram: 1) democratização; 2) viabilização de
obras e serviços; 3) melhoria de renda e da qualidade de vida; 4) desenvolvimento do município.
os representantes do poder público também responderam, e as respostas coincidiram com as dos
representantes dos agricultores, acrescido do item: 5) fortalecimento da agricultura familiar
(PLURAL, 2002).
Quanto aos pontos negativos, de acordo com a mesma pesquisa, há maior diversidade. Os
representantes dos agricultores apontam: 1) problemas de relação entre o conselho e o executivo
12
municipal; 2) dificuldades de funcionamento dos conselhos; 3) os limites de atribuições e
competências; 4) pouca capacitação dos membros do CMDR. Os representantes do poder público
apontam: 1) funcionamento dos conselhos; 2) limitações do PRONAF para a promoção do
desenvolvimento rural e 3) capacitação dos membros dos conselhos.
Quando perguntados sobre o que fazer para melhorar a atuação dos conselheiros, tanto os
representantes dos agricultores quanto os representantes do Poder Público Municipal, indicaram:
1) investimento na capacitação dos conselheiros; 2) ter mais participação dos agricultores.
Para GOHN, “o número de conselhos está crescendo progressivamente dado o fato de
serem exigência da Constituição nacional. Entretanto, para sua implementação, dependem de leis
ordinárias estaduais e municipais. Em algumas áreas, essas leis já foram estabelecidas ou há
prazos para sua criação” (GOHN, 2002, p. 04). Os Conselhos Municipais de Desenvolvimento
Rural são criados a partir de decreto do prefeito municipal ou de lei da câmara municipal de
vereadores. Na pesquisa elaborada pelo IBASE (2001), verificou-se que em 86% dos municípios
os Conselhos foram criados a partir de lei aprovada pela câmara municipal, sendo que a
regulamentação por decreto incidiu em apenas 11% dos municípios. “No que se refere à forma de
nomeação dos conselheiros, o decreto (30%), a portaria (30%) e o registro em ata (26%) tiveram
praticamente a mesma importância entre os municípios investigados nos quatro estados. A
nomeação informal ocorreu em 10% desses municípios” (IBASE, 2001, p. 15).
Os Conselhos têm como responsabilidade elaborar o plano municipal de desenvolvimento
rural e o plano de trabalho para que o município possa acessar os recursos do PRONAF Infraestrutura. No entanto, os recursos liberados são geridos pelas prefeituras municipais. Sem entrar
no mérito do grau de eficácia na realização dos investimentos, praticamente não há casos de
desvio de recursos. Há, por parte da Caixa Econômica Federal (CEF), fiscalização efetiva da
aplicação dos recursos do programa, que devem estar de acordo com o Plano de Trabalho
apresentado a esta. Este fato ajuda e inibe eventuais desvios de recursos. No entanto, “ocorre uma
“prefeiturização” das demandas de investimentos contidos nos Planos de Trabalho. Segundo o
mesmo testemunho, é normal identificar nos investimentos realizados a existência de
equipamentos que representam mais as necessidades das Prefeituras do que do público abrangido
pelo programa” (CASTILHOS, 2001, p. 119).
Tornar público o papel, a função e a obrigação dos conselheiros é uma forma de garantir
mais participação e monitoramento social. A comunidade necessita saber de seu poder de decisão
sobre o planejamento do desenvolvimento municipal e as obrigações que o Conselho e os
conselheiros possuem em relação ao uso dos recursos. Portanto, é importante que todos
conheçam a política que vem sendo desenvolvida no município. ABRAMOVAY (2001, p. 06),
tratando da institucionalização das práticas sociais, comenta que “um conselho que se abre a
formas variadas de participação pública em suas reuniões, garantindo não só ampla difusão da
pauta, mas estimulando que os temas a serem tratados sejam previamente discutidos pela
população em seus locais de moradia e em suas organizações informais (linhas, capelas, bairros,
comunidades) contribui de forma decisiva para alterar as regras do jogo e fazer das organizações
fonte de mudança social”.
Em que pese os questionamentos acerca da capacidade de uma política mudar a cultura
institucional da sociedade, uma política pública descentralizada que tem como objetivo articular
as iniciativas da sociedade para o desenvolvimento rural deve contribuir para a publicização, de
forma a levar seus objetivos e ações a todos atores sociais. Além disso, criar condições para que a
sociedade tenha condições de exercer uma certa fiscalização sobre as decisões tomadas e sobre a
utilização dos recursos públicos.
13
A equipe nacional do PRONAF Infra-estrutura é relativamente pequena. Dessa forma,
coube aos atores locais (prefeitura e órgão oficiais de assistência técnica e extensão rural) e às
secretarias estaduais, grande parte do trabalho em relação à execução do programa. Da parte da
política nacional coube, apenas, divulgar e informar os municípios contemplados com recursos
do programa de acordo com os seus critérios. Os municípios tinham um curto período para
mobilizar as forças locais para a constituição dos Conselhos e para a elaboração do plano
municipal de desenvolvimento rural. Em 2001, ficou em torno de três meses (PLURAL, 2002).
A publicização ao nível de município e comunidades coube, embora não fosse colocada
enquanto condição pelo programa, aos atores locais, na maioria das vezes, à própria prefeitura. O
que a prática nos indica é que as famílias e as comunidades não conhecem a existência dos
Conselhos e nem quem são seus representantes. Isso dificulta para que os conselheiros tenham
uma base social sobre a qual apóiem suas propostas e, a comunidade, por sua vez, não sabe de
quem cobrar.
Pelo que as pesquisas apresentam e pela prática do dia a dia, pode-se afirmar que a grande
maioria dos CMDR tem como atores principais: Agricultores, Prefeitos, Secretários da
Agricultura e técnicos da Extensão Rural. Se pensarmos em Desenvolvimento Rural Sustentável,
é fundamental uma maior representatividade dos atores dos CMDR, de modo a atingir todo o
município e a incluir mulheres e jovens. Quando se pensa em Desenvolvimento Rural
Sustentável, é necessário incluir atores de outras áreas como: meio ambiente, turismo, saúde, bem
estar social, educação, transportes, obras, indústria e comércio. Estes atores poderiam participar
dos CMDR, como parceiros, seja na resolução de problemas, na elaboração de projetos, na
fiscalização das obras e, principalmente, na capacitação dos agricultores.
3.4. Equidade
Além dos aspectos mencionados anteriormente, a preocupação com a equidade (GOHN,
2002) é algo a ser levado em conta por uma política pública descentralizada, que pretende
mobilizar os atores sociais para a construção de um plano municipal de desenvolvimento, bem
como, de executá-lo. Os conselhos, muitas vezes, tendem a reproduzir as desigualdades sociais.
Como exemplo disso, pode-se levar em conta o fato de que representantes do poder
público e de algumas organizações são remunerados pelo tempo em que estão em função dos
Conselhos, possuem infra-estrutura para trabalho e acesso as informações em relação aos trâmites
burocráticos dos programas, enquanto a maioria dos agricultores (e outros conselheiros) não
possui tais condições e, portanto, necessita desembolsar as despesas com alimentação,
hospedagens e transporte. Ou seja, os diversos sujeitos sociais não se encontram em igualdade de
condições para dialogar e disputar por seus interesses.
Uma das formas de se reduzir as possíveis desigualdades presentes nos Conselhos é a
transferência de informação através dos cursos de formação, o que já vem sendo feito, mas que
possui problemas (conforme já se comentou) e por si só é insuficiente. Da parte do governo
federal e estadual não foi adotada nenhuma medida, além dos cursos de formação, para
possibilitar uma certa igualdade de condições. No nível local, são poucos os municípios que
criaram um fundo com vistas a contribuir com o pagamento das despesas dos conselheiros que
tinham dificuldades em pagá-las com recursos próprios.
Apesar disso, metade dos Conselhos pesquisados pelo IBASE (2001) possuíam uma infraestrutura mínima (sala, computador e telefone) em parceria com a prefeitura ou com o órgão
oficial de assistência técnica e extensão rural. Essa foi uma condição colocada pelo programa a
14
partir de 2001. Mesmo que isso não represente condições para equidade, é um indicador positivo
no sentido da possibilidade de democratizar a utilização dessa infra-estrutura pelos conselheiros.
Mesmo assim, pode-se considerar que houve poucos esforços no sentido de promover a equidade.
IV. CONSIDERAÇÕES FINAIS.
A agricultura familiar brasileira, de acordo com o convênio FAO/INCRA (2000),
representa 85% dos 4,6 milhões estabelecimentos agropecuários e ocupa 79% da mão-de-obra,
responde por 38% do valor bruto da produção e possui maior capacidade de gerar renda por
unidade de área em relação à agricultura empresarial. No entanto, somente nos últimos anos ela
tem recebido uma atenção diferenciada, por ser uma categoria social distinta; através do
PRONAF, possui apenas 30% da área total e parte dela possui renda familiar muito baixa para
uma adequada condição de reprodução social e econômica.
Um tema que tem sido amplamente discutido, também, é a multiplicidade de
contribuições da agricultura familiar nos processos de desenvolvimento local: dinamização
econômica, conservação do patrimônio histórico-cultural e preservação da diversidade dos
recursos genéticos e ambientais (TORRENS, 2003). Para NAVARRO (2002, p. 08), “a recente
condensação de demandas sociais centradas em torno da noção de “agricultura familiar” tem
reforçado a tendência de reivindicar novos padrões de desenvolvimento rural que incluam
mecanismos de repercussão local”.
Nesse sentido, verifica-se que o PRONAF Infraestrutura tem tido poucos resultados
efetivos para promover o desenvolvimento rural. Na maioria dos casos, os recursos financeiros
previstos pelo programa foram aplicados de forma inadequada, e não conseguiram fazer com que
os Conselhos articulassem processos de desenvolvimento rural. CASTILHOS (2001) afirma que
o programa possui baixa capacidade de formar capital social, sendo que fortalecer a organização
social é um dos quesitos para melhorar as possibilidades de gestão e monitoramento social no
âmbito local e, também, um dos objetivos específicos do programa.
De acordo com a pesquisa da PLURAL (2002), 85% dos Conselhos foram constituídos
após 1995, indicando que, além de ser uma inovação recente na busca da participação social e na
gestão de políticas públicas, trata-se de um aprendizado em construção, tanto para a sociedade
civil quanto para os governos. Além disso, tende a representar um novo rearranjo nas relações de
poder, por representar uma nova disputa por espaços e, por isso, as políticas públicas
descentralizadas necessitam atentar-se para esse processo.
O programa têm uma baixa capacidade de intervir e modificar a realidade local. Isto porque sua estratégia
operacional é facilmente manipulável pelo poder dominante local [...] A estratégia operacional da “Linha
Infra-estrutura” não reconhece que os ambientes institucionais autoritários e clientelistas locais são o
principal obstáculo a ser superado para o seu maior êxito e, desta forma, não prevê modos de operação em
tais situações. Neste caso, além da falta de vontade da maioria das administrações públicas locais em
assumir novas formas de planejamento e gestão social, a inadequada estratégia operacional dos gestores do
programa também é responsável pela inutilidade prática da maioria dos PMDR [...] Os prazos dados para a
elaboração dos PMDRs, pela coordenação do programa, também foram incondizentes com qualquer
objetivo mais factível de promover processos sustentados de planejamento e gestão de desenvolvimento
local” (CASTILHOS, 2001, p.116).
A pesquisa do IBASE (2001) apontou que os conselheiros consideram que os principais
benefícios foram: infra-estrutura; condições técnicas de produção, transformação e
comercialização; e empoderamento dos agricultores familiares. O empoderamento indica que, ao
15
menos, a agricultura familiar conseguiu adquirir uma maior visibilidade social através do seu
reconhecimento por uma política pública. Apesar dos diversos questionamentos acerca da
política, esse é um mérito.
Uma efetiva descentralização de políticas públicas exige muito mais do governo central,
conforme observou TENDLER (1998), na sua análise sobre a política pública descentralizada no
campo da saúde, no estado do Ceará. A autora afirma que, nesse caso, “as melhorias no governo
local revelaram-se decorrentes (...) de uma dinâmica de três direções entre o governo local, a
sociedade civil e o governo central dinâmico” (TENDLER, 1998, p. 199, citada por
CASTILHOS, 2001). Acrescenta, ainda, que políticas de governos centrais possuem maior
capacidade de realizar induções na sociedade civil, no sentido de promover a sua organização e
seu fortalecimento. Isso ocorre porque, em grande parte dos pequenos municípios,
principalmente, nos mais pobres, a política local tende a ser altamente clientelista e vertical, além
de que, a organização social e o capital social tendem a serem mais frágeis (CASTILHOS, 2001).
A maior capacidade do governo central em intervir no local não se deve ao fato de que este não
esteja interessado em se manter no poder, mas porque o local não é, geralmente, seu ambiente de
disputa. Sendo assim, há possibilidades de que as relações entre poder público e sociedade civil
sejam altamente desiguais e com pequenas condições de se provocar mudanças na cultura política
e institucional, sem que haja um ator externo para mediar.
A partir dessa análise, pode-se afirmar que o Estado tem um papel importante para que as
políticas públicas tornem-se efetivamente descentralizadas, não há como o mesmo desencadear
um processo e retirar-se para aguardar os acontecimentos. O Estado, visando a gestão e o
monitoramento social, pode atuar no sentido de garantir o acesso a informação, o
comprometimento dos atores locais em relação aos recursos destinados pela política e uma
relativa equidade entre os conselheiros.
Os Conselhos são importantes para a gestão e o monitoramento social, mas deve-se levar
em conta que os mesmos estão em um ambiente em que o jogo social coloca dificuldades à
transformação social. Nesse sentido é fundamental a presença de um agente externo como
mediador, nesse caso, a instância de Estado promotora da descentralização. Os Conselhos podem
melhor representar a expectativa da sociedade local e adequar as políticas públicas em benefício
da comunidade, já que as realidades são diferentes. As experiências locais, geridas através dos
Conselhos podem também contribuir para qualificar as políticas do governo central. Para isso,
faz-se necessário a existência de canais eficientes para a troca de informações entre os diversos
níveis.
Com base nesse trabalho, é possível fazer algumas sugestões para o aperfeiçoamento das
políticas públicas descentralizadas, que visam a gestão e o monitoramento social. Em relação à
transferência de informação, propõe-se que: a mesma deve começar antes do início do programa;
seja realizada por profissionais e com conteúdos multidisciplinares; haja um certo nivelamento de
informações quando o conhecimento dos conselheiros sobre gestão de políticas for muito
diferenciado; seja evitada a padronização de conteúdos, pois as realidades e a capacidade de
absorção de cada pessoa são diferentes; haja um processo de formação continuado,
problematizando e inserindo conteúdos a partir de questões reais; seja um processo de formação
que possua efeitos multiplicadores (de especialistas para técnicos formadores, de técnicos para
conselheiros e de conselheiros para a população em geral); cada microrregião possa contar
permanentemente com o apoio de um assessor (facilitador/formador) contratado pelo Estado
(governo central) e inteiramente disponível para acompanhar a gestão social de políticas públicas
descentralizadas, não sujeito à ingerência política, já que em muitos municípios rurais há mais de
20 conselhos que pouco dialogam entre si e possuem muitos problemas semelhantes. No futuro,
16
já que o país pretende aprofundar a democracia, poderá haver um órgão responsável para tratar de
políticas públicas descentralizadas.
Em relação ao comprometimento dos atores locais, entendemos que mobilizar e publicizar
são papéis do Estado e que isso poderá ser feito pelo referido assessor que representaria este e
que não teria compromissos diretos com o poder local. Uma política que pretenda ser
descentralizada necessita, além de ser adequadamente divulgada, ser formulada levando em conta
a necessidade de um tempo hábil para que haja a sensibilização e articulações políticas antes de
iniciar sua execução. Contrapartidas efetivas da parte da prefeitura municipal e dos beneficiários
também são necessárias para que haja uma maior responsabilização. Outra forma, talvez mais
adequada, é exigir o retorno de um percentual dos recursos destinados, variando entre projetos na
área de produção (econômicos) e sociais. Os conselhos podem-se fortalecer e os conselheiros
podem-se motivar mais se os projetos forem reconhecidos como iniciativa desse colegiado, não
somente da prefeitura. Além disso, os conselheiros (atores) necessitam ser escolhidos pela sua
base de representação e o conselho implantado através de lei municipal.
Em relação à equidade, salientamos que não houve nenhuma preocupação do programa
em relação a esse aspecto. É importante que os Conselhos possuam um fundo financeiro, com
vistas a cobrir despesas de conselheiros que tenham dificuldades financeiras (pagamento de
despesas) para exercer sua função e sejam remunerados pelo seu dia de trabalho, pois estão em
função de um trabalho público, em que alguns conselheiros possuem remuneração. Para a
equidade, faz-se necessário também que os Conselhos possuam estrutura de trabalho (sala,
telefone, computador, internet, documentos) acessível a todos conselheiros. Além disso, a
informação necessita chegar a todos em tempo hábil, já que alguns poderão se adiantar em
relação a outros pela informação privilegiada, ou seja, necessita-se de uma política de
comunicação eficiente.
Entendemos que a gestão social é um aprendizado e os diversos atores locais levam um
certo tempo para entender os procedimentos e trâmites das políticas, variando conforme o nível
de participação e organização social. Propõe-se, então a: motivar os diversos agentes
comunitários; estimular o associativismo, inclusive administrando pequenos fundos públicos;
avaliar o nível de aprendizado em gestão social ou de organização social existente na hora de
decidir que tipo de contribuição o Estado pode dar, inclusive, sobre o volume de recursos a ser
destinado; promover intercâmbios entre Conselhos com vistas à integração de pessoas e projetos,
socialização de informações, entre outras.
O que é importante considerar é que a gestão do desenvolvimento local e de políticas
públicas é um processo de aprendizado pelo qual a sociedade brasileira vem passando, tanto para
os formuladores de políticas, quanto para os diversos atores sociais. Além disso, especificamente
no que se refere ao PRONAF Infraestrutura, é importante considerar que gerir recursos
destinados à saúde, educação, assistência social e outros tendem a ser mais fáceis, do que
articular uma série de projetos, diversas áreas, não obstante articular o trabalho de diversos
conselhos, para promover o desenvolvimento rural.
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