Unidade 1 - Adolescência Sangramento Uterino Anormal na Adolescência CAPÍTULO 10 SAnGRAMEnTO UTERInO AnORMAL nA ADOLESCÊnCIA 1. SINONÍMIA Sangramento uterino disfuncional, hemorragia uterina endócrina, sangramento endometrial disfuncional, hemorragia disfuncional. 2. CONCEITUAçãO Sangramento uterino anormal na ausência de doença orgânica (genital ou extragenital). Para conceituar um sangramento uterino disfuncional é necessário caracterizar o padrão menstrual normal. » Ciclo Normal: • Duração varia entre três e sete dias, • Intervalo de 23 a 35 dias, • Quantidade de 20 a 80 ml. Qualquer desvio para mais ou para menos na duração, quantidade ou no intervalo caracteriza um sangramento disfuncional. 3. ETIOpATOGENIA NA ADOLESCÊNCIA » Ciclos anovulatórios ou ovulatórios, sendo o primeiro bem mais frequente. A imaturidade do eixo hipotálamo-hipóise-ovário coincide com ciclos anovulatórios e secreção isolada, e dominante, de estrogênios. Na ausência da progesterona limitando o crescimento e descamação periódica, o endométrio atinge uma altura anormal sem concomitante 65 Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas Maternidade Escola Assis Chateaubriand suporte estrutural. O tecido demonstra intensa vascularização, com glândulas justapostas e extrema fragilidade, desta forma sofrerá ruptura e sangramento supericial espontâneo. Quando um local se cura, um novo local de ruptura aparecerá perpetuando o sangramento, não só pelo crescimento excessivo, mas preponderantemente em virtude do estímulo estrogênico irregular. O endométrio típico é o proliferativo ou misto. 4. DIAGNóSTICO DIfERENCIAL: » Gestação e problemas relacionados a ela, tais como abortamento e » » » » » » gravidez ectópica. Coagulopatia: 20% das adolescentes com hemorragia uterina têm um defeito na coagulação. A manifestação mais precoce de alterações da coagulação sangüínea poderá ser evidenciada pelo sangramento genital anormal, o qual pode estar relacionado à deiciência de plaquetas, leucemias, púrpura, doença de Von Willebrand, deiciência de protrombina e outros fatores da coagulação. Mal-formações do aparelho genital, traumatismos genitais, presença de corpo estranho. DIP. Tumores uterinos, sarcoma botrióide e tumores anexiais. Hipo ou hipertireoidismo. Insuiciência renal ou hepática. 5. DIAGNóSTICO: Como o diagnóstico de Sangramento uterino anormal é de exclusão, a história, exame físico e exames complementares são feitos no sentido de afastar outras causas de sangramento transvaginal. 1. História clínica minuciosa: • contato sexual sem proteção contraceptiva, • uso de: contraceptivos orais irregularmente, DIU, medicamentos com tropismo para sistema nervoso central, • exercícios físicos extenuantes, • sangramento excessivo anterior, a pequenos ferimentos ou exodontias; • doenças hepáticas ou renais pré-existentes. 66 Unidade 1 - Adolescência Sangramento Uterino Anormal na Adolescência » Exame físico geral Pesquisar: • pontos hemorrágicos na epiderme, • edema de membros inferiores e/ou palpebral, • exoftalmia, fáscies de Cushing, • visceromegalias e outras condições relacionadas a patologia pregressas. » Exame ginecológico: • Inspeção da genitália: sangramento advindo de lesões externas da genitália (lembrar a possibilidade de abuso sexual), da uretra, ou mesmo doença hemorroidária. • Exame especular: poderá demonstrar colo hiperemiado, sangrante ou gravídico. • Toque: pode detectar útero com características gravídicas, pressupor abortamento em curso. Massa anexial sem história compatível com gravidez imporá rastreio de neoplasia benigna ou maligna. Pacientes com hímen íntegro, quando necessário serão submetidas ao toque retal unidigital e/ou colpovirgoscopia. » Exames subsidiários: Como rotina serão solicitados: hemograma completo, coagulograma, sumário de urina e ultra-sonograia pélvica. Poderão ser solicitadas as dosagens de prolactina basal, FSH, LH, T3, T4 e TSH. A endoscopia (histeroscopia ou laparoscopia) poderá ser útil em casos selecionados, porém não é exame obrigatório. 6. TRATAMENTO: É imperioso ser dito que o diagnóstico inicial de Sangramento uterino anormal poderá ser modiicado quando a terapêutica hormonal não solucionar o quadro hemorrágico. A terapêutica utilizada dependerá da gravidade do sangramento. Quadros Leves: sangramento que não comprometem o estado geral da paciente, nem o hemograma, serão tratados com suporte psicológico, 67 Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas Maternidade Escola Assis Chateaubriand reasseguramento da paciente, suplementação de ferro e por vezes medicamentos a base de Ácido Mefenâmico, 500 mg, 1 comprimido de 8 em 8 horas ou Piroxicam, 1 comprimido até de 12 em 12 horas, que irão reduzir as cólicas e em alguns casos a quantidade do luxo menstrual. Vale salientar que os casos leves respondem ao suporte psicológico isoladamente em 80 % das vezes. » Sangramentos Moderados: que ultrapassem 10 dias de duração, comprometem o hemograma, porém com hemoglobina não abaixo de 10 g/dl e causem algum grau de comprometimento do estado geral da paciente, serão selecionados para tratamento medicamentoso que poderá ser: » Terapia Progestínica: A progesterona e as progestinas são potentes antiestrogênicos quando dados em doses farmacológicas e em sendo o estímulo estrogênico contínuo o causador do Sangramento uterino anormal da adolescente, na grande maioria das vezes, esta será a terapia de escolha. Será utilizado o Acetato de Medroxiprogesterona na dose de 10 mg/dia durante 10 dias a 2 semanas (a im de induzir alterações estabilizadoras no estroma pré decidual) seguidos por um luxo de supressão a denominada “curetagem clínica”. A partir de então repetese a progestina ciclicamente, do 15o ao 24o dia do período menstrual, a im de assegurar efeito terapêutico. » Terapia combinada estrógeno/progesterona: A falta de resposta à terapia progestínica isolada levará a suspeita de Sangramneto uterino anormal ovulatório e nos conduzirá a segunda opção terapêutica com uso de contraceptivos orais hormonais de baixa dosagem: 1 comprimido, 2 vezes ao dia, durante 5 a 7 dias. Após o próximo sangramento, que deverá ocorrer, em média, 5 dias após a parada da medicação, reiniciar o mesmo contraceptivo 1 comprimido ao dia a partir do primeiro dia do luxo de supressão, durante 21 dias seguidos de uma pausa de 7 dias após a qual novo ciclo será iniciado. A terapêutica medicamentosa deverá ser mantida por 3 a 6 meses quando será suspensa para uma reavaliação da paciente. Casos Graves merecerão dois tipos de tratamento: o da fase aguda e o tratamento de manutenção. » Na fase aguda utilizamos o Acetato de Medroxiprogesterona 150 mg IM (dose única). » O tratamento de manutenção será feito com o Acetato de Medroxiprogesterona 10 mg/dia durante 10 dias /mês logo que a paciente volte a menstruar o que acontecerá num período que varia 68 Unidade 1 - Adolescência Sangramento Uterino Anormal na Adolescência de 30 a 90 dias. Se persistir a irregularidade menstrual a manutenção poderá ser feita utilizando-se os contraceptivos hormonais orais de baixa dosagem durante 21 dias/mês seguidos de pausa de 7 dias durante 3 a 6 meses quando serão interrompidos para reavaliação da paciente. Outros serviços utilizam como terapêutica nos casos graves os estrogênios conjugados 20 mg/EV/ de 6 em 6 horas até cessar o sangramento, não sendo este porém o nosso tratamento de escolha, por perpetuar o estímulo estrogênico continuado e por produzir sangramento de deprivação rápido, o que virá a ocasionar distúrbio emocional na paciente pelo retorno do sangramento. Em persistindo o sangramento abundante poderá ser realizada curetagem uterina mesmo em pacientes com hímen íntegro, utilizando-se nestes casos o espéculo vaginal para virgens. 69