PNEUMOTÓRAX TRAUMÁTICO EM CACHORRO-DO-MATO, CERDOCYON THOUS (LINNAEUS, 1766): RELATO DE CASO. Andressa Cazetta de Souza (Acadêmica - UNICENTRO), [email protected]. Paulo César Dalla Vecchia (Orientador UNICENTRO), [email protected]. Marcos Vinícios Tranquilim (Coorientador – UNICENTRO), [email protected]. Adriano de Oliveira Torres Carrasco (Co–orientador – UNICENTRO), [email protected]. Universidade Estadual do Centro-Oeste/Departamento de Medicina Veterinária/Guarapuava, PR. Palavras-chave: pneumotórax, cachorro-do-mato, cerdocyon. Resumo: O cachorro-do-mato, Cerdocyon thous (Linnaeus, 1766) pertence à família Canidae e se distribui pela Colômbia, Venezuela, Brasil (nordeste, centro-oeste, sudeste e sul), Paraguai, Uruguai e norte da Argentina, no Brasil, pode ser encontrada em ambientes abertos naturais ou alterados. Há vários relatos que animais desta espécie são atropelados nas rodovias brasileiras e geralmente chegam politraumatizados para atendimento veterinário. Uma manifestação clínica que pode ser encontrada decorrente de atropelamentos é o pneumotórax, definido como o acúmulo de ar no espaço pleural. Um Cerdocyon thous foi encaminhado para atendimento pela Polícia Ambiental do Paraná - Força Verde, apresentando um quadro de dificuldade respiratória e escoriações, decorrente de possível atropelamento. O tratamento dessa alteração em canídeos domésticos é relativamente simples e consiste, entre outras coisas, no alívio da dispnéia por meio de toracocentese com agulha. Aplicou-se a mesma técnica no paciente e o mesmo apresentou remissão completa dos sinais clínicos. Após observação de três dias o animal foi solto na natureza. Introdução O Cachorro-do-mato, Cerdocyon thous (Linnaeus, 1766) tem uma ampla distribuição na América do Sul. No Brasil habita vários biomas, tais como cerrado, caatinga, pantanal, mata atlântica e matas sulinas. Por esta diversidade de habitas, recebe vários nomes comuns como graxaim, raposinha-do-mato, lobinho, rabo-fofo (TORTATO, F. R. e ALTHOFF S. L., 2009; REIS et al., 2006). Tem hábito preferencialmente noturno, desloca-se solitário ou aos pares por trilhas, bordas de matas e estradas à procura de alimentos(ROCHA, V. J. et al., 2004; REIS et al., 2006). Canídeo de médio porte (4 a 11 kg), apresenta dieta onívora. Na estação seca alimenta-se de pequenos mamíferos (principalmente roedores murídeos) e répteis, ao passo que na estação chuvosa frutos e insetos são à base de sua dieta. Ainda pode apresentar o hábito de necrofagia alimentando-se de animais Anais do XIX EAIC – 28 a 30 de outubro de 2010, UNICENTRO, Guarapuava –PR. mortos em decomposição (SANTOS-JUNIOR, T. S. e MACEDO, M., 2007; RAMOS Jr. et al., 2003, ROCHA, 2004 e TURCI, 2009). A pelagem varia do cinzento ao castanho, com faixas de pelos pretos da nuca até a ponta da cauda, com o peito e o ventre claros (REIS et al., 2006). Uma das principais causas de mortalidade destes animais é o atropelamento, seja ele por imprudência dos motoristas pelo abuso de velocidade, pelas péssimas condições das rodovias ou ainda por projetos rodoviários traçados de maneira imprópria (GUSMÃO A. C. e SANTOS W. V., 2009). Normalmente estes animais chegam para atendimento com muitas lesões e com variados sinais clínicos inespecíficos. Uma dessas alterações que pode ser observada é o pneumotórax, definido por Nelson e Couto (2006) como presença de ar ou gás no espaço pleural, confirmado com radiografias, onde se observa opacidade dos vasos ou vias aéreas (brônquios e/ou bronquíolos), entre os lobos pulmonares e parede torácica, se possível buscando causas como lesões cavitárias ou fraturas de costelas. Já Fossum (2001), classifica o pneumotórax em aberto e fechado, onde o primeiro ocorre uma comunicação livre entre o espaço pleural e o ambiente externo e o segundo o ar acumula-se decorrente de um extravasamento a partir do parênquima pulmonar, árvore brônquica ou esôfago. O pneumotórax fechado é subdividido em simples e de tensão, onde no simples ocorre acúmulo de ar não-progressivo na cavidade pleural, decorrente de pequenas lacerações no parênquima e cápsula pulmonares (ARON e ROBERTS, 1998). No de tensão, também denominado hipertensivo, observa-se acúmulo progressivo de ar em virtude de lesão extensa no pulmão, a qual cria válvula de direção única, aumentando a pressão intrapleural e levando ao colapso pulmonar (PIGATTO J. et al., 2008). O tratamento clínico de pacientes com pneumotórax consiste, inicialmente, no alívio da dispnéia por meio de toracocentese com agulha para remoção do ar permitindo a expansão normal dos pulmões (PIGATTO J. et al., 2008; NELSON R. W. e COUTO C. G., 2006; FOSSUM, T. W., 2001). O colapso pulmonar superior a 25% é considerado um pneumotórax de moderado a grave e, freqüentemente, é tratado com dreno de tórax (ARON & ROBERTS, 1998). Crowe e Devey (2002) indicam a colocação do dreno quando ocorrer produção maior que 10mL/kg de ar no espaço pleural num período de 12 horas. Fossum (2001) relata que raramente se exige uma intervenção cirúrgica em animais com pneumotórax traumático e deve-se realizar uma toracocentese, conforme o necessário, para evitar dispnéia, enquanto a lesão pulmonar cicatriza (três a cinco dias), pois a recorrência é incomum. A toracocentese é um procedimento ambulatorial simples, que utilizado para coleta de material ou remoção de líquido ou gases do espaço pleural com o objetivo de estabilizar pacientes com ventilação pulmonar prejudicada (NELSON R. W. e COUTO C. G., 2006). O procedimento é feito com o animal em decúbito lateral ou esternal, com “scalp” 19G a 23G ou cateter 18G a 20G, acoplado em uma torneira de três vias. Com uma seringa de 10 ou 20 mL acoplada à torneira e à agulha, introduz-se a mesma num ângulo de 45 graus, paralelo à parede torácica e com o bisel voltado para o paciente, reduzindo assim o risco de laceração pulmonar (BARROS, R. C., Anais do XIX EAIC – 28 a 30 de outubro de 2010, UNICENTRO, Guarapuava –PR. 1999; FOSSUM, T. W., 2001; NELSON R. W. e COUTO C. G., 2006; PIGATTO J. et al., 2008). O presente trabalho reporta o atendimento a um exemplar de Cerdocyon thous, cuja avaliação clínica diagnosticou pneumotórax traumático causado por possível atropelamento. Materiais e Métodos Foi encaminhado ao Serviço de Atendimento de Animais Selvagens (SAAS) da UNICENTRO, através da Policia Ambiental do Paraná, um exemplar de Cerdocyon thous, fêmea, adulto jovem, pesando 6,8 Kg e com as seguintes dimensões corpóreas: compr. cauda = 28 cm, compr.corpo = 42 cm, cabeça = 15 cm, membro anterior direito = 24 cm, membro posterior direito = 38 cm, altura de cernelha = 36 cm, orelha = 7 cm, focinho = 6 cm. A única informação fornecida pela Policia Ambiental era a suspeita de atropelamento. O paciente foi contido fisicamente com o uso de puçá e quimicamente com a associação de tiletamina e zolazepam, na dose de sete mg/kg, intramuscular. Ao exame físico observou-se que o animal apresentava dificuldade respiratória acentuada e algumas escoriações na região pélvica. Foi instituída fluidoterapia com glicose a 5% e solução fisiológica, sendo posteriormente encaminhado para exame radiográfico. A presença de pneumotórax foi confirmada devido à opacidade da arvore brônquica do lado direito. Imediatamente foram tomadas medidas para controle do mesmo. Foi utilizado cateter 18G acoplado em uma torneira de três vias, por sua vez acoplada a uma seringa de 20 ml. A agulha foi introduzida em um ângulo de 45 grau, paralelo à parede torácica. Foram retiradas três seringas de 20 ml cada de ar da cavidade torácica do animal, e imediatamente o desconforto respiratório que era evidenciado cessou. As escoriações foram limpas com solução fisiológica e água oxigenada e posteriormente feito curativo com iodo tópico O animal foi mantido por mais três dias em cativeiro, com dieta baseada em carne bovina moída, ração para cães e frutas (principalmente banana e mamão). No quarto dia de internamento o animal foi encaminhado a Polícia Ambiental que fez a soltura do animal. Resultados e Discussão Apesar de haver poucos trabalhos relacionados com animais selvagens atendidos por Médicos Veterinários a relação com pacientes domésticos, onde a literatura é muito mais abrangente, é uma ferramenta de grande valia para auxiliar as pessoas que trabalham com estes animais. A rapidez do diagnóstico e também no tratamento possibilitou que o quadro clínico do paciente não se agravasse possibilitando assim a recuperação e posterior soltura do animal. Como cita Fossum (2001) raramente se exige uma intervenção cirúrgica, a lesão pulmonar cicatriza de três a cinco dias, e a recorrência é incomum. Conclusões Anais do XIX EAIC – 28 a 30 de outubro de 2010, UNICENTRO, Guarapuava –PR. Conclui-se que é extremamente necessária a adequação das rodovias brasileiras, principalmente aquelas com trechos próximos a fragmentos de matas e corredores biológicos, para proteção das espécies selvagens ali ocorrentes e que se deslocam nestas áreas. Por fim, ressalta-se também que na falta de técnica própria descrita para o atendimento da espécie envolvida, a utilização do procedimento aplicado a animais domésticos demonstrou-se altamente eficaz, possibilitando a recuperação e soltura do paciente. Referências Aron, D.N.; Roberts, R.E. Pneumotórax. In: Mecanismos da moléstia na cirurgia dos pequenos animais, M.J. Bojrab, Ed. Manole, (1). São Paulo, 1998; 468-475. Barros, R. C. M. Quilotórax em gatos. Clínica Veterinária. 1999, 21, 31-40. Gusmão, A. C.; dos Santos W. V. Registro de atropelameto de dois cachorros-do-mato (cerdocyon thous) (mammalia) na RO 383 nas proximidades do lixão municípal de Cacoal, Rondônia, Brasil. Faculdade de Ciências Biomédicas de Cacoal. 2009. Crowe, D.T.; Devey, J. Pneumothorax: those not so bad – those real bad. In: Western Veterinary Conference, 2002. Front page: Library: wvc 2002: Critical care: pneumothorax. Acessado em 25/07/2010. On line. Disponível em: http:// [email protected]. Fossum, T.W. 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