Licença especial: possibilidade de contagem em dobro, para fins de aposentadoria, e períodos adquiridos antes da Emenda Constitucional nº 20/98 Parecer nº 04/02–JMS Contagem em dobro, para fins de aposentadoria, de períodos de licença especial adquiridos antes do advento da Emenda Constitucional nº 20/98 e não usufruídos. Situação jurídica consolidada. Efeito ex nunc da vedação constitucional à contagem de tempo de serviço fictício. Exmo. Senhor Primeiro Secretário Cuida-se de processo administrativo que veio a esta Procuradoria-Geral, por determinação de V. Exa. (fl 62), no qual o servidor interessado requer sejam contados em dobro, para fins de aposentadoria, os períodos de licença especial a que tem direito e que não foram usufruídos (fl. 54). Submetidos os autos à análise da Assessoria Jurídica (fl. 57) esta fez juntar cópia do Parecer nº 10/99–JMS (fls. 58/60), opinando, ao final, pelo indeferimento do pedido e pela sugestão de novo pronunciamento deste Órgão jurídico. Assim nos chegam os autos para opinamento. PRELIMINAR Preliminarmente, cumpre esclarecer que a matéria versada no Parecer nº 10/99 – JMS (fls. 58/60), como se pode verificar de uma simples leitura, era um questionamento do PREVI-RIO sobre o fato de uma servidora poder auferir aposentadoria com proventos integrais em 16/12/98. Naquele processado foi constatado que, para aquela servidora poder se aposentar com a integralidade de seus vencimentos, era necessária a contagem em dobro de períodos de licença especial, adquiridos antes da Emenda Constitucional nº 20/98, o que não havia sido, ainda, requerido pela servidora. Em razão de a fruição da licença especial ser um direito personalíssimo, opinou-se pela oitiva da servidora para saber do interesse no desfrute da licença ou na contagem em dobro para fins de aposentadoria com proventos integrais. Não houve nesse pronunciamento, até porque não era esse o cerne da questão, a abordagem específica sobre o tema que se nos apresenta, agora, neste administrativo. Feitos esses esclarecimentos iniciais, passo a analisar a questão como segue. FUNDAMENTAÇÃO A questão verte-se em saber se os períodos de licença especial, adquiridos antes da promulgação da Emenda Constitucional nº 20/98 e não usufruídos, poderão ser contados em dobro para fins de aposentadoria. Com efeito, a licença especial é um direito funcional, capitulado no art. 110 da Lei nº 94/79, que dispõe: “Art. 110 – Após cada qüinqüênio de efetivo exercício no Município o funcionário fará jus a licença especial de 3(três) meses, com todos os direitos e vantagens de seu cargo efetivo.” E, de acordo com o art. 65, VII, desse mesmo diploma legal, poderá o servidor contar em dobro o tempo de licença especial não gozada, para fins de aposentadoria ou disponibilidade. A licença especial também está prevista no art. 177, XXXI da Lei Orgânica deste Município e no art. 77, XVII da Constituição deste Estado, os quais asseguram esse direito funcional aos servidores públicos. De acordo com os dispositivos estatutários citados, são duas as opções que o servidor pode tomar, no que respeita às licenças especiais adquiridas: usufruí-las ou contá-las em dobro para fins de aposentadoria ou disponibilidade (arts. 110 e 65, VII). Dessarte, importa saber qual o momento em que os períodos de licença especial poderão ser contados em dobro, para fins de acréscimo ao tempo de serviço, tendo em vista o advento da Emenda Constitucional nº 20/98, que alterou toda a sistemática das aposentadorias públicas. Com efeito, após a edição da Emenda Constitucional nº 20/98, as aposentadorias públicas deixaram de ser concedidas de acordo com o tempo de serviço e passaram a sê-las pelo tempo de contribuição, respeitadas a idade mínima e o período mínimo de exercício do cargo antes da aposentação. É isso que se extrai da nova redação do art. 40, § 1º, I, II, II, a e b, e art. 8º do novel texto constitucional. Ao trazer a inovação de concessão de aposentadoria e pensões, com base no tempo de contribuição, a própria Emenda, por ficção jurídica, no seu art. 4º, aproveita toda forma de tempo de serviço cumprido, considerado pela legislação vigente para fins de aposentadoria como tempo de contribuição. Por outro lado, essa mesma Emenda veda que a lei estabeleça qualquer forma de contagem de tempo de contribuição fictício, ex vi do seu art 40, § 10. A proibição, portanto, é dirigida à lei que vier a dispor sobre a matéria. Desse modo, todos os dispositivos legais que permitiam a contagem de tempo de serviço fictício, como é o caso do art. 65, VII da Lei nº 94/79, estão revogados pela Emenda Constitucional nº 20/98. Ocorre que a revogação de citado artigo – e de todos que dispunham sobre a mesma matéria – se deu partir da promulgação da mencionada Emenda, em caráter ex nunc, isto é, sem retroação dos seus efeitos. Dessa maneira, os servidores que, durante a vigência do permissivo estatutário, inserido no art. 65, VII da Lei nº 94/79, contavam tempo de licença especial adquirido e não gozado poderão exercer o direito de contá-lo em dobro ou gozá-lo, baseados nas regras legais vigentes ao tempo da aquisição desse direito. Portanto, a Emenda Constitucional nº 20/98 não tem o condão de suprimir o direito à contagem em dobro do tempo de licença especial, adquirido antes da sua edição e não gozado, uma vez que esse direito já se incorporou ao patrimônio jurídico do servidor. E assim é porque é a própria Carta Fundamental que o protege, nos termos do art. 5º, XXXVI. Nesse sentido, pode-se afirmar que a vedação trazida pela Emenda Constitucional nº 20/98 só alcança as situações que vierem a se formar após a sua promulgação, operando efeitos ex nunc, não alcançando, pois, situações pretéritas. Como se tem dos autos, à fl. 52, o servidor possui períodos de licença especial concedidos e não usufruídos. Desse modo, poderão ser contados em dobro, para fins de aposentadoria, aqueles períodos que se completaram antes da edição da Emenda Constitucional nº 20/98. Por derradeiro, cumpre esclarecer que o Decreto “N” nº 19.157, de 17/12/00, no qual o servidor fundamenta o seu pedido, não é aplicável aos servidores do Poder Legislativo Municipal, a menos que determinação nesse sentido seja expedida pela Mesa Diretora. CONCLUSÃO Por todo o exposto, faz jus o servidor a contar em dobro, para fins de aposentadoria, os períodos de licença especial adquiridos antes do advento da Emenda Constitucional nº 20/98 e não usufruídos – que deverão ser transformados em tempo de contribuição –, os quais já se incorporaram ao seu patrimônio. A vedação constitucional de contagem de tempo de contribuição fictício tem efeitos ex nunc, alcançando, tão-só, situações contemporâneas à sua edição. É como me parece. À consideração de Vossa Excelência. Em 23 de julho de 2002. Jania Maria de Souza Procuradora-Geral da Câmara Municipal do Rio de Janeiro