Processos gerais no metabolismo proteico e síntese de aminoácidos

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Processos gerais e síntese de aminoácidos; Rui Fontes
Processos gerais no metabolismo proteico e síntese de aminoácidos
1-
Um determinado número de moléculas de cada proteína endógena sofre hidrólise durante um dia
mas, em geral, um número equivalente é sintetizado. A percentagem de moléculas afectadas por
este processo de renovação depende principalmente da proteína em análise sendo muito baixa no
caso do colagénio (cerca de 0,2% de renovação diária), relativamente modesta no caso das proteínas
dos músculos esqueléticos (2%/dia), elevada no caso das proteínas das vísceras (7-15%/dia) e
elevadíssima no caso de enzimas reguladas por transcrição/tradução (renovação total em horas).
Considerando o conjunto das proteínas de um adulto (cerca de 10-12 kg de proteínas num adulto
normal com 70 kg) cerca de 300 g de proteínas sofrem hidrólise por dia e um valor idêntico sofre
re-síntese o que representa uma taxa de renovação de cerca de 3% (em média, 1 cadáver novo por
mês). Apesar da sua modesta taxa de renovação, porque as proteínas dos músculos constituem cerca
de metade da massa total de proteínas do organismo, a sua taxa de renovação (cerca de 120g/dia)
contribui com 40% para a taxa global. Em geral, um indivíduo adulto saudável mantém
constante a quantidade total de proteínas endógenas. De facto, a massa de proteínas endógenas
“flutua” ao longo de um dia aumentando no período pós-prandial e diminuindo durante o jejum. No
entanto, tendo em conta a massa total de proteínas, as variações percentuais são mínimas e, além
disso, considerando um período de 24h (ou mais) pode dizer-se que a velocidade de hidrólise é, no
adulto, igual à de síntese. Um indivíduo que está nestas condições diz-se em equilíbrio azotado
(ou que tem um balanço azotado nulo).
2-
A hidrólise das proteínas endógenas é catalisada por protéases e a dos polipeptídeos formados
por peptídases acabando na libertação dos aminoácidos constituintes. No caso das proteínas
citoplasmáticas ou do retículo endoplasmático, nomeadamente as que têm taxas de renovação
elevada (caso das enzimas reguladas por transcrição/tradução) ou alterações estruturais, estes
processos hidrolíticos envolvem protéases do citoplasma que estão integradas numa estrutura
proteica designada de proteossoma. As proteínas que vão ser degradadas no proteossoma são
previamente conjugadas com a ubiquitina (um proteína) numa reacção em que se consome ATP.
As proteínas extra-celulares ou associados à membrana são sobretudo degradadas nos lisossomas
por protéases designadas catepsinas. Os componentes intracelulares que são degradadas nos
lisossomas são previamente reunidos em estruturas rodeadas de uma membrana constituindo os
vaculos autofágicos. As proteínas segregadas para o lúmen do tubo digestivo ou que resultam da
descamação do epitélio são, juntamente com as proteínas da dieta, hidrolisadas pelas protéases e
peptídases digestivas.
3-
A esmagadora maioria dos aminoácidos formados durante a hidrólise das proteínas endógenas
(cerca de 300g/dia) é reutilizada na síntese de novas moléculas proteicas mas uma parte não é
reutilizada. Alguns dos aminoácidos libertados no catabolismo das proteínas endógenas são
transformados de tal forma que ficam excluídos do ciclo de reutilização. Esta perda obrigatória de
aminoácidos endógenos (cerca de 25 g/dia no adulto)1 é, em grande parte, uma consequência da
presença, nas células, de enzimas que têm como substratos aminoácidos e catalisam transformações
catabólicas irreversíveis incluindo desaminações e oxidações. O azoto dos aminoácidos que
sofrem catabolismo é maioritariamente transformado em ureia (que se perde na urina)
enquanto o seu esqueleto carbonado (a parte desprovida de azoto) pode ser oxidado a CO2, em
última análise contribuindo para a síntese de ATP. O azoto das proteínas não se perde apenas na
forma de ureia. A urina contém outros compostos azotados que, em última análise, também provêm
do metabolismo dos aminoácidos; dentre estes destacaríamos a creatinina, o ácido úrico, o ião
amónio e, embora em quantidades muito mais pequenas, aminoácidos (modificados ou não) e
catabolitos de hormonas e neurotransmissores que tiveram aminoácidos na sua génese. Também se
1
A perda obrigatória de aminoácidos (obligatory aminoacids losses) pode, na prática, ser determinada avaliando as
perdas de azoto do organismo num indivíduo que tem uma dieta equilibrada sob todos os pontos de vista excepto um:
não ingere proteínas. Porque a ureia é, no rim e no intestino, reabsorvida para ser de novo re-excretada, é necessário
esperar vários dias antes de se tornarem patentes as consequências (diminuição da excreção de ureia) da exclusão das
proteínas da dieta.
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perdem aminoácidos endógenos nas fezes pois uma parte das proteínas do epitélio intestinal que
descama, das mucinas secretadas (sobretudo do intestino grosso) ou mesmo das enzimas digestivas
não são completamente digeridas. O facto de, em média, 16% da massa das proteínas ser azoto
permite estabelecer uma relação entre a massa de azoto perdida nas excreções e a massa de
proteínas que essa massa de azoto representa. Assim, para converter a massa do azoto excretado em
equivalentes de massa de proteínas (ou aminoácidos) multiplica-se a massa do azoto excretado por
6,25 (100/16=6,25). Cerca de 70% do azoto correspondente às perdas obrigatórias de aminoácidos
perde-se na urina (50% na forma de ureia e 20% na forma de creatinina, amónio e outros
compostos) e cerca de 20% nas fezes; os restante 10% correspondem às perdas de proteínas inteiras
na pele que descama, nas unhas e cabelos que crescem, nas secreções nasais, no fluxo menstrual ou
na ejaculação e ureia do suor.
4-
Poderia pensar-se que, para repor as perdas obrigatórias de 25 g de aminoácidos/dia, bastaria ingerir
uma quantidade equivalente de proteínas mas não é isso que acontece. Uma parte substancial dos
dos aminoácidos ingeridos fica sujeita à acção das enzimas catabólicas sofrendo, junto com os
libertados na hidrólise das proteínas endógenas, oxidação e desaminação irreversível; além disto
uma parte das proteínas ingeridas não chega a ser absorvida e perde-se nas fezes. Os trabalhos
experimentais com seres humanos adultos saudáveis apontam para valores da ordem dos 50 g/dia
como o mínimo de proteínas a ingerir para repor as perdas obrigatórias de aminoácidos [1]. Nas
situações em que a massa de proteínas endógenas está a aumentar diz-se que há um balanço
azotado positivo; na condição contrária diz-se que o balanço azotado é negativo; o balanço
azotado é nulo quando não há aumento nem diminuição da massa proteica. Porque é uma boa
aproximação à realidade considerar que a massa de aminoácidos livres (cerca de 150 g) é
estacionária, quando o balanço azotado é positivo (negativo, nulo) a massa de azoto ingerido é
superior (inferior, igual) à de azoto excretado; caso exista uma diferença entre os valores da síntese
e da hidrólise de proteínas esse valor reflecte-se numa diferença equivalente entre o azoto ingerido e
excretado.
5-
Poderia pensar-se que a massa de proteínas ingeridas seria um importante factor na definição da
variação da quantidade de proteínas do organismo. A massa de gordura do organismo aumenta
quando o valor calórico da dieta é superior à despesa energética mas, no caso do azoto, o sistema
funciona de forma diferente. A massa de proteínas endógenas baixa (balanço azotado negativo) se a
ingestão for inferior à quantidade necessária para repor as perdas obrigatórias (≈25g/dia) e fazer
face ao acréscimo de perdas resultante da ingestão (outros 25g/dia) mas uma ingestão de proteínas
acima do montante necessário para cobrir as necessidades (≈50g/dia) resulta apenas no
catabolismo dos aminoácidos excedentários e num aumento da produção de ureia. Ao
contrário do que acontece com a massa de gordura, a quantidade de cada uma das proteínas do
organismo só depende da dieta na medida em que (i) esta pode constituir um factor limitador da sua
síntese e (ii), acessoriamente, na medida em que o aumento da massa de gordura é acompanhado
pela formação de vasos sanguíneos, de adipócitos e de tecidos de suporte. A quantidade total de
proteínas do organismo aumenta (balanço azotado positivo) nos indivíduos (i) em fase de
crescimento (crianças e adolescentes), (ii) que estão a engordar, (iii) que estão a recuperar após um
período de um período de balanço azotado negativo ou (iv) que, através de exercício físico (ou
ingerindo esteróides anabolizantes), estão a aumentar a sua massa muscular. O contrário (balanço
azotado negativo) acontece normalmente (i) a partir dos 40-50 anos de idade, (ii) quando se
diminui a actividade física ou (iii) quando se emagrece voluntariamente, (iv) em consequência de
má nutrição ou (v) em situações de doença. Contudo, num indivíduo adulto saudável que mantém
constante a sua massa muscular a quantidade total de proteínas mantém-se também sensivelmente
constante porque os aminoácidos excluídos do ciclo de reutilização são repostos por ingestão e
incorporados nas proteínas sintetizadas.
6-
Poderia pensar-se que cada uma das moléculas de cada um dos aminoácidos que se perde para o
ciclo de reutilização teria de ser substituída por uma molécula igual mas esta ideia, só parcialmente,
é verdadeira. (i) Alguns dos aminoácidos excluídos do ciclo não podem ser sintetizados pelo
organismo humano pois não dispomos das enzimas indispensáveis para o processo e nestes casos os
aminoácidos dizem-se nutricionalmente indispensáveis (ou essenciais). Para substituir um
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determinado aminoácido nutricionalmente indispensável que sofreu catabolismo é necessário ingerir
esse aminoácido. Ou seja, no caso dos aminoácidos nutricionalmente indispensáveis, cada molécula
perdida tem de ser substituída por uma igual. (ii) Alguns dos aminoácidos excluídos do ciclo podem
ser repostos por síntese endógena a partir de intermediários do metabolismo da glicose e, nestes
casos, os aminoácidos dizem-se nutricionalmente dispensáveis (ou não essenciais). No entanto,
deve notar-se que, embora o esqueleto carbonado provenha da glicose, o grupo azotado vem de
outros aminoácidos que terão de ser ingeridos em quantidade suficiente para colmatar as perdas de
azoto. A “esqueleto carbonado” da alanina, por exemplo, pode ser sintetizada a partir do piruvato
mas o azoto da alanina “tem de vir” doutro aminoácido. (iii) Um terceiro grupo de aminoácidos
(cisteína e tirosina) forma-se a partir de aminoácidos indispensáveis (metionina e fenilalanina,
respectivamente) e poderão classificar-se como semi-indispensáveis2 [2, 3].
7-
No caso dos aminoácidos sintetizados a partir de intermediários do metabolismo da glicose (serina
[3C,1N,1OH], glicina [2C,1N], alanina [3C,1N], aspartato [4C,1N], asparagina [4C,2N], glutamato
[5C,1N], glutamina [5C,2N], prolina [5C,1N] e arginina [6C,4N]) embora o esqueleto carbonado
possa ser formado a partir da glicose os grupos amina resultam da transferência directa ou indirecta
de grupos amina de aminoácidos para esses intermediários. Para que um indivíduo adulto tenha a
capacidade de manter constante a massa das suas proteínas precisa de absorver, na forma de
aminoácidos, tantos átomos de azoto como os que perde na urina, nas fezes, nos genitais, nas
secreções nasais ou nos tegumentos. Se a quantidade total de azoto ingerido (na forma de proteínas)
não for suficiente para colmatar o azoto excretado o indivíduo fica em balanço azotado negativo.
Em geral, a deficiência de aminoácidos nutricionalmente dispensáveis corresponde a uma ingestão
quantitativamente inadequada de proteínas: na presença de azoto aminoacídico em quantidade
suficiente para formar os grupos azotados (amina ou amida) o organismo pode sintetizar um
aminoácido nutricionalmente dispensável a partir de intermediários do metabolismo glicídico e,
nesta síntese, todos os outros aminoácidos são, em última análise, potenciais dadores de azoto.
8-
Através da acção catalítica de variadas enzimas os aminoácidos podem libertar o azoto do seu grupo
amina (ou de outros grupos azotados) na forma de amónio (NH4+). O ião amónio é a forma
protonada do amoníaco (NH3); o seu pKa é cerca de 9,3, predominando, por isso, a forma protonada
quer no meio interno quer na urina. A maioria do amónio (azoto inorgânico) formado dá origem a
ureia que se perde na urina mas uma parte pode ser recuperado para o metabolismo por acção
catalítica (i) da desidrogénase do glutamato (ver equação 1) e (ii) da sintétase da glutamina (ver
equação 2). Por acção destas enzimas o azoto inorgânico do amónio pode ser convertido em azoto
aminoacídico.
α-cetoglutarato + NH4+ + NADPH → glutamato + NADP+ + H2O
glutamato + NH4+ + ATP → glutamina + ADP + Pi
9-
Para além de poder ter origem na acção da desidrogénase do glutamato, a síntese de glutamato
também tem lugar em reacções de transaminação (ver equação 3) em que diversos aminoácidos
cedem o grupo amina (azoto orgânico) ao α-cetoglutarato gerando glutamato e os α-cetoácidos
correspondentes. Assim, o glutamato e a glutamina (via sintétase da glutamina; ver equação 2)
podem formar-se endogenamente a partir de um intermediário do ciclo de Krebs (o αcetoglutarato); sabendo-se que os intermediários do ciclo de Krebs se podem formar a partir da
glicose (via glicólise e carboxílase do piruvato) conclui-se que o glutamato e a glutamina são
aminoácidos nutricionalmente dispensáveis.
α-aminoácido X + α-cetoglutarato ↔ glutamato + α-cetoácido X
10-
(1)
(2)
(3)
A síntese de alanina e aspartato é o resultado da transferência do grupo amina do glutamato para
os α-cetoácidos correspondentes: o piruvato e o oxalacetato, respectivamente. A transamínases
2
Quem classifica faz um exercício de organização dos conhecimentos da forma que lhe dá mais jeito. Também é
frequente chamarem à cisteína e à tirosina “condicionalmente indispensáveis” porque só são indispensáveis se a dieta
for pobre em metionina e fenilalanina, respectivamente.
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da alanina (ver equação 4) e a transamínase do aspartato (ver equação 5) catalisam,
respectivamente, a formação de alanina e aspartato mas, como estas reacções são fisiologicamente
reversíveis, também intervêm nos processos em que estes aminoácidos perdem o grupo α-amina
para o α-cetoglutarato. Existem muitas transamínases com especificidades distintas relativamente a
um dos substratos mas o outro substrato é (quase) sempre o glutamato/α-cetoglutarato (ver equação
3). Dependendo do sentido em que a reacção esteja a ocorrer uma reacção de transaminação pode
servir para formar um determinado aminoácido à custa da conversão do glutamato em αcetoglutarato ou para formar glutamato à custa da conversão de um determinado aminoácido no seu
α-cetoácido correspondente. Uma característica comum a todas as transamínases (e a muitas outras
enzimas envolvidas no metabolismo aminoacídico) é a presença de fosfato de piridoxal (derivado da
vitamina B6) como grupo prostético3.
glutamato + piruvato ↔ α-cetoglutarato + alanina
glutamato + oxalacetato ↔ α-cetoglutarato + aspartato
11-
Transamínases com diferentes especificidades intervém no processo de síntese da serina a partir
de 3-fosfoglicerato (um intermediário da glicólise) e da glicina a partir de glioxilato (contém um
grupo aldeído em vez do grupo amina no carbono α). No processo de síntese da serina a partir do 3fosfoglicerato intervém primeiro uma desidrogénase que converte o grupo hidroxilo do carbono 2
num grupo cetónico levando à formação do 3-fosfohidroxipiruvato (ver equação 6) que é substrato
da transamínase da fosfoserina (ver equação 7). A fosfoserina (formada após a reacção de
transaminação) é hidrolisada por uma fosfátase com a consequente formação da serina (ver equação
8). O glioxilato (aceitador de grupos amina em reacções de transaminação; ver equação 9) pode
resultar da oxidação do glicolato (que existe em muitas plantas comestíveis) por acção da oxídase
do glicolato (ver equação 10)4.
3-fosfoglicerato + NAD+ → 3-fosfohidroxipiruvato + NADH
glutamato + 3-fosfohidroxipiruvato ↔ α-cetoglutarato + fosfoserina
fosfoserina + H2O → serina + Pi
glutamato + glioxilato → α-cetoglutarato + glicina
glicolato + O2 → glioxilato + H2O2
12-
(6)
(7)
(8)
(9)
(10)
A reacção catalisada pela hidroximetiltransférase da serina (ver equação 11) para além de
permitir a síntese de glicina a partir de serina (e o inverso) também permite a metilação do
tetrahidro-folato (H4-folato): o N5,N10-metileno-H4-folato formado nesta reacção é indispensável
na síntese de timina e portanto do DNA. O facto de a glicina se poder formar a partir da serina (ver
equação 11) e de esta poder gerar-se a partir de um intermediário da glicólise (3-fosfoglicerato; ver
equações 6-8) permite compreender que quer a serina quer a glicina sejam aminoácidos
nutricionalmente dispensáveis.
serina + H4-folato ↔ glicina + N5,N10-metileno H4-folato
13-
(4)
(5)
(11)
A prolina e a arginina podem ser sintetizadas a partir do glutamato. Na via metabólica forma-se o
semialdeído do glutamato que pode seguir dois destinos distintos: (i) num deles dá origem à
prolina e (ii) no outro origina a ornitina e, posteriormente, a arginina. A conversão do
semialdeído do glutamato em ornitina é catalisada por uma transamínase (ver equação 12).
3
No decurso do ciclo catalítico o piridoxal-fosfato que está, no início do ciclo, ligado ao grupo 6-amina de um
resíduo de lisina da transamínase, converte-se em piridoxamina-fosfato, mas, no final do ciclo, regenera-se a forma
original.
4
A glicina também pode formar-se a partir da colina. Nesta via metabólica a colina é oxidada no grupo hidroxilo
formando-se betaína (trimetilglicina). A betaína é dadora de um metilo à homocisteína formando-se dimetilglicina
(betaína + homocisteína → dimetilglicina + metionina) que por sua vez pode ceder os dois restantes metilos ao
tetrahidrofolato (H4-folato) gerando-se a glicina (dimetilglicina + H4-folato → sarcosina + N5,N10-metileno-H4folato; sarcosina + H4-folato → glicina + N5,N10-metileno-H4-folato).
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glutamato + semialdeído do glutamato → α-cetoglutarato + ornitina
(12)
14-
A arginina (6C,4N) é sintetizada no ciclo da ureia (1C,2N) a partir de ornitina (5C,2N) e esta
pode formar-se (via semialdeído do glutamato) a partir do glutamato. A velocidade de formação de
arginina é, contudo, inadequada nos indivíduos em crescimento ou em situações em que, após um
período em que o indivíduo perdeu proteínas endógenas (por doença ou/e por má nutrição), este se
encontra em fase de convalescença a recuperar as proteínas perdidas. Do ponto de vista nutricional,
Stipanuk [2, 3] classifica a arginina como um aminoácido condicionalmente dispensável. As
enzimas do ciclo da ureia, para além do seu papel no catabolismo de todos os aminoácidos também
têm um papel anabólico: a síntese de arginina.
15-
A asparagina forma-se a partir do aspartato por acção catalítica da sintétase da asparagina (ver
equação 13). Ao contrário do caso da síntese da glutamina em que o azoto incorporado é azoto
inorgânico o dador do azoto na síntese da asparagina é a glutamina.
aspartato + glutamina + ATP → asparagina + glutamato + AMP + PPi
16-
A tirosina diz-se semi-indispensável porque é sintetizada a partir de fenilalanina, um
aminoácido nutricionalmente indispensável. Uma deficiência nutricional de tirosina pode ser
colmatada desde que ocorra a ingestão de fenilalanina em quantidade adequada para satisfazer as
necessidades dos dois aminoácidos. A reacção de formação da tirosina é catalisada pela hidroxílase
da fenilalanina, uma oxigénase de função mista (ver equação 14). Para que o processo possa
continuar a dihidrobiopterina formada é reduzida pelo NADPH numa reacção catalisada por uma
redútase (ver equação 15).
fenilalanina + tetrahidrobiopterina + O2 → tirosina + dihidrobiopterina + H2O
dihidrobiopterina + NADPH → tetrahidrobiopterina + NADP+
17-
(13)
(14)
(15)
O átomo de enxofre da cisteína (3C,1N,1S) tem origem na metionina (5C,1N,1S), um
aminoácido indispensável. Tal como no caso da tirosina também a cisteína é um aminoácido semiindispensável: as necessidades nutricionais de cisteína podem ser colmatadas desde que ocorra a
ingestão de metionina em quantidade adequada para satisfazer as necessidades dos dois
aminoácidos. Os carbonos da cisteína têm origem na serina. O processo de síntese da cisteína é
complexo porque se relaciona com a complexa via metabólica da degradação da metionina (ver
equações 16-21). Durante o catabolismo da metionina forma-se um intermediário (homocisteína)
que contém ainda 4 carbonos da metionina mas que, em vez do grupo metilo ligado ao carbono 4
por uma ligação sulfureto, contém um grupo tiol. Este intermediário reage com a serina formandose um composto (cistationina) que contém o átomo de enxofre entre os carbonos que derivaram da
homocisteína e da serina (ver equação 19). A clivagem da cistationina (ver equação 20) origina
cisteína (3 carbonos e azoto derivados da serina e o enxofre da homocisteína) assim como NH3 e αcetobutirato (derivados da homocisteína).
ATP + metionina → S-adenosil-metionina + Pi + PPi
(16)
S-adenosil-metionina + aceitador → S-adenosil-homocisteína + aceitador metilado
(17)
S-adenosil-homocisteína + H2O → homocisteína + adenosina
(18)
homocisteína + serina → cistationina
(19)
cistationina → cisteína + NH3 + α-cetobutirato
(20)
α-cetobutirato + NAD+ + CoA → propionil-CoA + NADH + CO2
(21)
Embora a metionina seja um aminoácido nutricionalmente indispensável existe um mecanismo que
permite "salvar" metionina em processo catabólico: a homocisteína é aceitadora do grupo metilo do
N5-metil-H4folato regenerando-se metionina (síntase da metionina; ver equação 22). O N5-metilH4folato forma-se por redução (dependente do NADPH; acção da redútase do N5,N10-metilenoH4folato; ver equação 23).
N5-metil-H4folato + homocisteína → H4folato + metionina
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(22)
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18-
N5,N10-metileno-H4folato + NADPH → N5-metil-H4folato + NADP+
(23)
Oito (valina, leucina, isoleucina, treonina, metionina, lisina, fenilalanina, triptofano) dos 20
aminoácidos 5 que são incorporados nas proteínas aquando da sua síntese são, classicamente,
classificados como nutricionalmente indispensáveis. Com três excepções (treonina, lisina e
triptofano) existem, contudo, transamínases que (com maior ou menor eficácia) são capazes de
catalisar a troca entre o grupo cetónico dos α-cetoácidos correspondentes e o grupo amina do
glutamato [3]. Embora absurdo do ponto de vista económico, seria possível usar os α-cetoácidos
correspondentes para substituir na dieta uma grande parte dos aminoácidos nutricionalmente
indispensáveis (ver equações 24-26). No caso da histidina também não existem, nos mamíferos,
vias metabólicas de síntese, mas a deficiência deste aminoácido só se torna aparente após
relativamente longos períodos de dietas sem histidina [4]. É possível que na origem desta resistência
esteja a capacidade de formar histidina a partir de carnosina, um dipeptídeo (β-alanil-histidina)
abundante no tecido muscular. Embora alguns livros de texto classifiquem a histidina num grupo à
parte, de acordo com Kopple e Swendseid [4], a histidina é um aminoácido nutricionalmente
indispensável.
α-ceto-isocaproato + glutamato ↔ leucina + α-cetoglutarato
α-ceto-metil-valerato + glutamato ↔ isoleucina + α-cetoglutarato
α-ceto-isovalerato + glutamato ↔ valina + α-cetoglutarato
(24)
(25)
(26)
19-
Tal como os aminoácidos dispensáveis também os aminoácidos indispensáveis sofrem catabolismo
a uma velocidade que depende da actividade intrínseca das enzimas envolvidas e da concentração
do aminoácido em causa. Para assegurar a manutenção da massa de proteínas do organismo há, não
só que ingerir uma quantidade total de aminoácidos adequada (50 g/dia em média no adulto
saudável com 70 kg), mas também que repor todos e cada um dos aminoácidos indispensáveis que
se perderam. Tendo em conta as necessidades mínimas de cada um dos aminoácidos indispensáveis
foram inventadas proteínas padrão: uma proteína padrão é uma proteína que, ingerida na
quantidade mínima indispensável para repor as perdas obrigatórias de aminoácidos totais, contém a
quantidade mínima de cada aminoácido indispensável para repor a perda individual de cada um
destes aminoácidos [5]. Se uma dieta contiver como único constituinte proteico uma proteína que
não contém um aminoácido indispensável (caso da gelatina que não contém triptofano) a
capacidade dessa dieta para colmatar as necessidades aminoacídicas é nula. Todas as proteínas
endógenas contém pelo menos um resíduo de triptofano e, por isso, nenhuma proteína pode ser
sintetizada na ausência de triptofano e o mesmo poderia ser dito relativamente a cada um dos
outros aminoácidos indispensáveis. Quando se ingere como única proteína gelatina nenhum dos
aminoácidos que resultam da sua hidrólise intestinal pode ser usado na síntese proteica porque falta
o triptofano. Nestas circunstâncias, com a excepção do triptofano, todos os aminoácidos aumentam
de concentração aumentando a velocidade da sua oxidação. Quando se ingere como única proteína
gelatina a quantidade de azoto perdido é igual à perda obrigatória somada a toda a gelatina ingerida
cujos aminoácidos são também perdidos. No caso da gelatina o aminoácido limitante da sua
qualidade dietética é o triptofano mas no caso de outras proteínas como, por exemplo, nas proteínas
do trigo e outros cereais o aminoácido limitante é a lisina. No caso das proteínas do trigo a lisina
não está ausente mas existe numa quantidade menor que a prevista nas proteínas padrão. A
percentagem de lisina nas proteínas de trigo é cerca de metade da percentagem de lisina numa
proteína padrão: assim, para colmatar as necessidades de lisina usando exclusivamente proteínas de
trigo haveria que ingerir não 50 g de proteína de trigo mas o dobro deste valor [2, 6].
20-
Em algumas proteínas (como a peroxídase do glutatião) existem resíduos de selenocisteína, um
aminoácido semelhante à cisteína e à serina. Na selenocisteína em vez do átomo de enxofre do
grupo tiol (caso da cisteína) ou do átomo de oxigénio do grupo hidroxilo (caso da serina) existe um
átomo de selénio. A síntese da selenocisteína ocorre a partir da serina quando esta está ligada a um
tRNA específico que tem como anticodão a sequência ACU e se denomina tRNASec (Sec é a
abreviatura de selenocisteína). A reacção é catalisada por uma transférase (ver equação 27) em que
o dador de selénio é o seleno-fosfato (“selénio activado”). O codão correspondente ao tRNASec
5
Ou 21, se considerarmos também o caso da selenocisteína.
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(UGA) é normalmente um codão de terminação mas em determinados RNA mensageiros contendo
sequências específicas (como é o caso do RNAm codificador da peroxídase do glutatião) este codão
liga-se ao anticodão do selenocistinil-tRNASec ocorrendo a incorporação do aminoácido
selenocisteína na estrutura da proteína em processo de síntese.
seleno-fosfato + seril-tRNASec → selenocisteinil-tRNASec + Pi
21-
Os aminoácidos hidroxiprolina e hidroxilisina constituem casos especiais pois existem na
estrutura do colagénio (a proteína mais abundante dos mamíferos) mas não existem no RNA
codificador do colagénio codões para estes aminoácidos. A síntese da hidroxiprolina e da
hidroxilisina ocorre por acção de oxigénases do retículo endoplasmático (hidroxílases da prolina e
da lisina) que catalisam a hidroxilação de resíduos de prolina e lisina do colagénio durante o
processo de acabamento pós-tradução (ver equação 28). A vitamina C é um cofactor das
hidroxílases da prolina e da lisina e a deficiência de vitamina C leva à formação de colagénio
anormal.
resíduo prolil ou lisil + O2 + α-cetoglutarato →
resíduo hidroxiprolil ou hidroxilisil + succinato + CO2
22-
(27)
(28)
O caso do aminoácido carboxiglutamato (constituinte de várias proteínas como a protrombina e
outras proteínas envolvidas no processo de coagulação sanguínea) tem algumas semelhanças com
os casos da hidroxiprolina e hidroxilisina já que a sua formação resulta da transformação de
resíduos de glutamato após a síntese da proteína. A transformação envolve a actividade de uma
oxigénase (ver equação 29) e uma reacção não enzímica (ver equação 30). A regeneração da forma
hidroquinona da vitamina K a partir da forma epóxido envolve a acção de oxiredútases.
resíduo de glutamato + O2 + vitamina K (forma hidroquinona) →
resíduo de glutamato na forma de carbanião + vitamina K (forma epóxido)
resíduo de glutamato na forma de carbanião + CO2 → resíduo de carboxiglutamato
(29)
(30)
1. Rand, W. M., Uauy, R. & S., S. N. (1984) Protein-Energy-Requirement Studies in Developing
Countries: Results of International Research in FOOD AND NUTRITION BULLETIN SUPPLEMENT
(UNIVERSITY, T. U. N., ed), http://www.unu.edu/Unupress/unupbooks/80481e/80481E00.htm, Tokyo
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2. Fuller, M. F. (2000) Protein and amino acid requirements in Biochemical and physiological aspects of
human nutrition (Stipanuk, M. H., ed) pp. 287-04, W.B. Saunders Company, Philadelphia.
3. Stipanuk, M. H. (2006) Biochemical, Physiological, Molecular Aspects of Human Nutrition, 2nd edn,
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6. Schaafsma, G. (2000) The protein digestibility-corrected amino acid score, J Nutr. 130, 1865S-7S.
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Processos gerais e síntese de aminoácidos; Rui Fontes
glicose
cisteína
metionina
3-P-glicerato
colina
serina
glicina
glioxilato
treonina
piruvato
alanina
aspartato
oxalacetato
asparagina
prolina
arginina
ornitina
Semiladeído
do glutamato
α-ceto-glutarato
glutamato
fenilalanina
glutamina
tirosina
prolina
hidroxiprolina
lisina
hidroxilisina
glutamato
carboxiglutamato
Selenocistinil-t-RNASec
Seril-t-RNASec
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